Eu estou com o texto sobre o que deu errado na novela em andamento, o que traz o que deu certo está aqui. Tomei o reforço da terceira dose da vacina ontem e meu braço está doendo bastante, fora que, como das outras vezes, a vacina da Pfizer tem um efeito curioso sobre mim, ela me dá sono. Melhor isso do que febre e tudo mais. Então, o texto sobre o último capítulo da novela, que acabei de assistir AGORA veio antes e está abaixo. Agradeço a todos que chegaram ao Shoujo Café através da novela, espero que tenham encontrado outros textos que lhes tenha agradado. Não consegui comentar a trama com a regularidade e a profundidade que gostaria, infelizmente.
Assim como foi ao longo da novela inteira, muita coisa foi resolvida de forma displicente e várias questões ficaram sem solução, foram simplesmente esquecidas. Samuel nem comentou sobre sua irmã, que eu imaginava que ressurgiria no fim da trama, talvez, com a ajuda de Luiz Gama (Deo Garcez) cuja aparição não serviu para absolutamente nada na história. O segredo do Coronel Eudoro (José Dumont) sobre a mãe de Pilar (Gabriela Medvedovski) e Dolores (Daphne Bozaski) foi igualmente ignorado. E, para piorar, a novela termina sob acusação de racismo nos bastidores e sem a presença de Roberta Rodrigues, a Lupita, que sumiu da trama sem maiores explicações. Sim, Nos Tempos do Imperador é uma novela ruim, ela não receberia de mim, nem uma nota 5, mas com alguns personagens interessantes e tramas que, se vistas isoladamente, funcionaram bem. Mas novela é mais que cenas isoladas, não é mesmo? Enfim, o que faltava resolver no último capítulo?
Abrimos o derradeiro episódio da novela com um letreiro avisando que vários meses se passaram e a absolvição de Samuel (Michel Gomes). Nélio consegue rastrear e trazer o agora beato Salustiano (Alexandre Zacchia). O antigo jagunço do Coronel Ambrósio (Roberto Bomfim) confessa que matou sem querer o patrão e Samuel simplesmente sai livre. Ninguém fala da identidade falsa, do fato dele ser escravo fugido, nada. Aliás, eu realmente não fui pesquisar, mas estranhei o fato dele voltar para a prisão depois da guerra, porque, normalmente, quando um prisioneiro é colocado na frente de batalha, não raro existe a promessa do perdão. Afinal, é uma troca. Como falei em vacina, quando estavam testando a da Varíola, na Inglaterra, houve essa proposta. Homens condenados à morte serviram de cobaias em troca do perdão.
Resolvido rapidinho o caso de Samuel, tivemos uma reunião na Quinta com família imperial e a Barral (Mariana Ximenes), ele e Pilar jurando amor eterno e, já sozinhos, dizendo que continuariam sua luta contra a sociedade injusta, Samuel como negro e Pilar como mulher. Cafona, clichê, mas não espero nada mais elaborado de Alexandre Marson e Thereza Falcão. Pulamos para D. Olú (Rogério Brito) e a greve que começou ontem. Os deputados negociando com ele o fim da paralização. O líder da Pequena África faz um discurso engajado sobre a injustiça da escravidão e que ele iria lutar pelo seu fim. Primeira coisa, a abolição não estava às portas, demoraria ainda dezoito anos pelo menos. Ponto dois, ficou parecendo que D. Olú nunca fizera nada por seu povo. Ele pode ter sido um pai problemático, mas era um líder dedicado. Só que precisávamos passar uma mensagem contra a escravidão e o racismo para marcar o final da trama.
Quem falta? A Imperatriste (Letícia Sabatella) vai tirar a Barral de cena. Sim, ela praticamente ordena que a amante de D. Pedro (Selton Mello) saia do país. Há a despedida dos amantes, claro, e eles se comportando como adolescentes como foi ao longo de toda a novela. Se o amor deles, premissa da novela, fosse construído de forma mais séria, madura, com dúvidas e culpas REAIS, a coisa teria funcionado melhor. A partir daí, temos várias cenas de afeto entre D. Pedro e Teresa Cristina, além de conversas sobre projetos compartilhados: Lei do Ventre Livre (1871), o futuro Museu Nacional, a imigração de europeus etc. Imagino que elas tenham sido gravadas posteriormente acompanhando o zum-zum-zum do Twitter. Como alguém disse, é como se a Barral fosse o espírito obsessor de Pedro II, ela sai de cena e o imperador descobre que a mulher é seu par ideal e começa a trabalhar e ser produtivo. Torna-se um outro homem.
A história de converter a estátua homenageando o imperador pela vitória na Guerra do Paraguai em dinheiro para escolas é verdade, mas é fato, também, que D. Pedro II, tão preocupado com a educação, não fundou nenhuma universidade, tampouco foi estabelecido no país um sistema de educação básica organizado. No caso das universidades, tivemos que espirar a república, já às vésperas dos anos 1930, primeiro a USP (1927), depois a UDF (1935), esta última, já no governo Vargas e com a função de formar professores para o ensino básico e que, posteriormente, foi absorvida pela Universidade do Brasil (UFRJ). Para se ter uma ideia, a primeira universidade das Américas, a São Marcos, em Lime, Peru, foi criada em 1551. O Brasil estava MUITO atrasado e D. Pedro não fez muito para ajudar a minorar este problema.
Seguimos para o trio Clemência (Dani Barros), Vitória (Maria Clara Gueiros) e Quinzinho (Augusto Madeira). Os autores decidiram unir Vitória e Clemência, as duas atrizes são muito boas e conseguiram passar credibilidade a uma situação que foi inventada, porque ambas tinham pouco ou nada a fazer na trama e injetar diversidade sexual parecia interessante. Há reclamações de que o casal se formou em cima de uma ideia distorcida sobre mulheres lésbicas, a decepção com Quinzinho as uniu. Não sei se é por aí, elas poderiam ser bissexuais e se descobriram. Clemência poderia ser mesmo uma lésbica oprimida pela heterossexualidade compulsória. Se a microtrama fosse vista de forma isolada, seria boa, mas novela é algo maior do que cenas e sequências e entrechos curtos. O fato é que Clemência deixou de ser rabugenta e passou a se arrumar e estar SEMPRE limpa depois de conseguir se acertar com Vitória. E isso foi bom para a personagem.
Já o final de Quinzinho foi bizarro como era o humor feito pelos autores quando Licurgo (Guilherme Piva) e Germana (Vivianne Pasmanter) estavam em cena. A personagem encheu o saco a novela inteira, teve um romance sem noção com Vitória (*não gosto dele não por ver incesto, mas por atrapalhar uma trama realmente boa, que era a da relação dela com as crianças*) e, a cereja do bolo, terminou com uma sósia da mãe (Ingrid Guimarães). Sim, os autores decidiram que esse incesto disfarçado seria engraçado. Porque, no fim das contas, não era só admiração que Quinzinho tinha pela mãe, era desejo mesmo. Alguém realmente achou isso engraçado?
Ainda no campo das bizarrices, Gastão (Daniel Torres), que tinha sido colocado ontem como comandante das tropas brasileiras depois da renúncia de Caxias, cansado da obsessão do imperador pelo presidente paraguaio. E Jackson Antunes estava fantástico em suas últimas cenas como o Patrono do Exército, preciso ressaltar, nem deu as caras no final, sua última aparição foi no penúltimo capítulo. E bem no momento em que Gastão está narrando a morte de Solano López (Roberto Birindelli), Leopoldina (Bruna Griphao) descobre sua nova gravidez. Os autores precisavam juntar duas notícias tão díspares como se fossem coisas boas em igual medida? Poderiam ter nos poupado disso. Aliás, não houve uma única cena da Princesa Isabel (Giulia Gayoso) neste último capítulo. NENHUMA.
Depois de seu arco de redenção, Zayla, interpretada pela excelente Heslaine Vieira, não mudou muito. Ela continuou com fixação em homens que estavam com outras mulheres. Como a novela nunca tinha convencido que Guebo (Maicon Rodrigues) amava Justina (Cinara Leal), foi fácil separar os dois. A ex-empregada da Barral não tinha o ímpeto pela libertação dos escravos que o jovem marido possuía, ela queria seguir a lei e, claro, ela tinha um sonho PROFISSIONAL, ser professora. Caminho aberto para Zayla, a filha de D. Olú e Mãe Cândida (Dani Ornellas) larga a casa dos pais pela vida dura no Quilombo, afinal, ela já tinha aprendido a ser humilde com os tantos sofrimentos que lhe foram impostos, mais que isso, ela estava se firmando como modista, só que uma mulher de verdade precisa ser comandada pelo coração, afinal, ela não é egoísta e covarde como Justina. Zayla agora tem um homem, no caso um dos mais bonitos da novela, que a chame de sua. E, sim, é essa mensagem bonita que temos desse triângulo mal arranjado.
Falta falar de quê ainda? Sim, claro, a morte de Tonico (Alexandre Nero). O fim do vilão foi uma obra de arte coletiva. A mensagem que se passa? A Justiça não funciona, melhor tomar as coisas em suas próprias mãos. Nesse momento precisamos disso? Não. Seria muito melhor passar uma mensagem, ainda que idealizada, de que o mal é punido e que a Justiça pode ser feita. Só que para que Nélio (João Pedro Zappa) e Dolores pudessem casar e ter paz, Tonico precisava morrer. Mas Lota (Paula Cohen) despachar Tonico fez todo sentido. Quando Celestina (Bel Kutner) aparece na cena do crime, e como ela encontrou o lugar nunca saberemos, o traste já estava morto e ela ajuda Lota a se livrar do corpo. Sororidade no crime. OK. Consigo lidar com isso de forma positiva.
No fim das contas, ficou por isso mesmo. Ninguém se preocupou em investigar a morte do vilão e nunca saberemos que ele foi o responsável pela Questão Christie, que ele quase revelou as cartas quentes que o imperador trocava com a Barral e que ele sabotou o Brasil na Guerra do Paraguai. E nossos livros de história ficarão incompletos para sempre. Muito triste.
Por fim, porque quero terminar este texto e há o outro para finalizar (*sim, escrevi muito para jogar fora*), tivemos o casamento mais esperado da novela. Nélio, que foi redimido e rejuvenescido aos nossos olhos, e casou com Dolores. Reforço que junto com Augusto (Gil Coelho) e Leopoldina, eles foram o melhor casal da novela e Dolores era a mocinha moral da trama. O que faltou de construção de relacionamento com Pilar e Samuel e mesmo a Barral e D. Pedro, sobrou aqui. Daphne Bozaski e João Pedro Zappa estão de parabéns, espero que sejam bem aproveitados no futuro, ainda que seja melhor não ter esperança, vide o Pedro Henrique Müller, que foi o Otávio em Orgulho e Paixão e daria um excelente Gastão, fazendo ponta de garçom no cassino. Falando na cena do casamento, passaram-se muitos meses e o cabelo de Pilar continuava curto. Deveriam ter colocado um aplique, ou algo do gênero.
E antes do fim, porque comentei as coisas fora de ordem, tivemos D. Pedro de novo velho em Paris e morrendo feito indigente nas ruas da cidade. Não foi bem assim, ele adoeceu e não morreu largado na neve feito o fotógrafo René Robert em janeiro passado. Enfim, não sei o que vai sobrar na memória das pessoas de Nos Tempos do Imperador. Se alguma personagem histórica ganhou com a trama foi a Imperatriz Teresa Cristina e, talvez, a princesa Leopoldina, mas, de resto, D. Pedro II, a Condessa de Barral e a Princesa Isabel saíram muito chamuscados.
A novela foi toda irregular, marcada pelas restrições impostas pela pandemia e a incapacidade de lidar com elas, por um humor que beirava o bizarro em muitos momentos, situações racistas e machistas, ainda que tomasse para si uma série de bandeiras como a defesa dos direitos das mulheres e a luta contra a escravidão. Como já escrevi antes, espero que a Globo não dê oportunidade para que Alexandre Marson e Thereza Falcão façam a terceira fase da trilogia. Acredito que ninguém precisa ser atormentado por outra novela de época da dupla de autores, ainda mais protagonizada pela Princesa Isabel que eles decidiram criar. Desculpe, não precisamos, não.
Para concluir, no fim das contas, Nos Tempos do Imperador era uma novela espírita disfarçada. Depois que a Barral, o espírito obsessor de Pedro II foi embora, o homem danou a trabalhar e se tornou super produtivo e amoroso com a esposa. Na última sequência, ainda é mostrado reencarnado como professor de História (*suponho*) do Colégio Pedro II (*melhor assim, porque professores do ensino básico, técnico e tecnológico federal ainda tem uma remuneração decente, desde os governos do PT, que fique claro, porque estou na carreira desde FHC*) e guiando seus alunos e alunas pelas obras de reconstrução do Museu da Quinta da Boa Vista.
Falando sério, ver o museu sendo reconstruído, rememorar o incêndio, me fez chorar e com narração de Selton Mello, me fez chorar. Um dos meus maiores arrependimentos na vida é não ter levado minha filhinha até lá, porque achava que ela era jovem demais e que teríamos tempo. Não tivemos. Como um colega carioca e professor de História disse logo após o incêndio, o Museu da Quinta era o primeiro e único museu de muitos brasileiros, o museu das crianças pobres do Rio de Janeiro. O que se perdeu NUNCA poderá ser recuperado.
1 pessoas comentaram:
Meus maiores desapontamentos:
1 - Tonico não foi para a prisão;
2 - Barral devia ter sido uma vilã como Domitila;
3 - Zayla e Lupita mereciam mais.
Gostei do texto. Parabéns!
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