sexta-feira, 26 de julho de 2024

Quadrinho coreano sobre uma mulher infeliz no casamento que tenta se matar e tora de corpo com o marido estreia no Japão

O Comic Natalie deu destaque para o lançamento do primeiro volume do manhwa Dangsinui Ihaereul Dopgi Wihayeo (당신의 이해를 돕기 위하여), em japonês Anata no Kokoro ga Wakaru you ni (あなたの心がわかるように), em inglês What means to be you (O que significa ser você) ou To Help You Understand (Para ajudar você a compreender), de Leebora e Lanyong (roteiro( e Ocean (arte).  Basicamente, é a velha história da troca de corpos.  Tem ele todinho no Bato.to  Fiquei curiosa e fui dar uma olhada.  Resumo e alguns comentários.

A refinada Princesa Violet está pronta para se casar com Winter, o filho ilegítimo (e temperamental) de um nobre, para quitar a dívida de sua família. Para ela, é amor à primeira vista, mas o casamento mergulha no desastre quando o status real de sua família se torna nulo e sem efeito e ela é rotulada como uma vigarista. Três anos depois desse pesadelo, a ex-princesa decide acabar com tudo... apenas para acordar no corpo de Winter! Intrigada com a troca repentina de corpos e incapaz de confiar nos outros, os dois finalmente se entenderão?

Vamos lá, o traço é mais ou menos com alguns quadros bonitos.  A ambientação é uma mistura de Europa estilizada do século XIX e mundo corporativo coreano.  O pai da mocinha era o rei do país, tudo mergulhou em um caos, ele morreu.  No dia do casamento de Violet e Winter, o irmão mais velho da protagonista aproveita para fazer um discurso abdicando do seu direito ao trono e do status real da família.  Eles seriam plebeus a partir de então.

Winter fica furioso!  O sujeito diz para a noiva que pagou muito caro por uma princesa, muito provavelmente para se elevar socialmente, já que ele é um bastardo (*com direito a passado triste, claro*), e passa a tratá-la feito lixo, além de praticamente não ficar em casa.  Seguindo o exemplo dele, todos a tratam mal.  A mocinha cai em depressão, é humilhada seguidas vezes, assediada por um sujeito que não entendi bem quem é e o médico diz que ela está fingindo doença.  

Desesperada, nossa Violet decide morrer.  Toma uma overdose de remédios com uma garrafa de vinho.  Memórias de uma infância e adolescência felizes voltam nesse momento e ela flutua até perder a consciência.  Ao acordar, está no corpo do marido.  Só que ele é presidente de uma corporação, está fazendo um negócio grande.  Seu secretário percebe algo de errado e  obstrui a assinatura do contrato.  Será que Winter estaria de ressaca? Detalhe, rola aquele clichê da personagem olhar no espelho e ver seu eu verdadeiro e, não, o corpo que ocupa naquele momento.

Ah, mas a melhor parte até agora!  O marido, bonitinho, mas ordinário, acorda no corpo da mulher.  Demora a perceber, sai desesperado pela mansão e dá de cara com o médico, que petulante, diz que "ela" não tem nada e tem que parar de fingir.  Obviamente, isso não vai prestar e só a cara que Winter no corpo de Violet faz para o médico reduz o cara a um inseto.  Vamos ver no que vai dar quando ele encontrar o assediador... 

Imagino que tenha scanlations em português.  É derivado de livro.  Como tem situações de suicídio, abuso e violência, cada capítulo que abri até agora tem um aviso/advertência.  Pode ser promissor esse manhwa, agora, estou curiosa em saber como será, ou se haverá, qualquer intimidade entre os dois.  Certamente, o casamento não foi consumado, mas tem mais de 160 capítulos e eu sou velha e não tenho tanta paciência mais com essas coisas.  Se duvidar, uma das questões será a família dele tentando anular a união.  E, sim, antes deles ficarem juntos e trocarem de corpos, quero que o mocinho sofra, porque ele merece.

Erica Sakurazawa lança mangá sobre a pintora francesa Marie Laurencin e a estilista Coco Chanel

Erica Sakurazawa, de quem eu não ouvia falar faz algum tempo, foi a primeira mangá-ka josei que eu li e conseguiu me agradar.  Inclusive, há duas resenhas velhíssimas que fiz de obras dela, The Aromatic Bitters e Tenshi e Tenshi no Su (*que estão no Wordpress, vejam só!*).  Muito bem, segundo o Comic Natalie (*via ANN*), Sakurazawa estreou um mangá sobre a pintora francesa Marie Laurencin (1883-1956) e a estilista Coco Channel (1883-1971).

Paris 1921―Sasori-za no Onna to Shishi-za no Onna (パリ 1921―蠍座の女と獅子座の女), em português algo como Paris 1921― a Mulher Escorpião e a Mulher Leão (*preferi harmonizar usando mulher e, não, leoa*) estreou no site Kateigaho.com da Sekai Bunkai e é uma ficção histórica é centrada na pintora francesa Marie Laurencin e na estilista francesa Coco Chanel. O mangá se passa em Paris, na década de 1920, também conhecida como "loucos anos 20", quando as duas mulheres usaram seus talentos para chegar ao sucesso.  Sakurazawa desenhou o mangá com a cooperação da diretora do Museu Marie Laurencin, Yoshizawa Kimihisa.

Você gosta de cachorrinhos? Teremos um anime shoujo de cachorrinhos!

Post atrasado, porque o anime já foi anunciado faz algumas semanas, mas a estreia é somente em outubro.  Muito bem, a série Tono to Inu (殿と犬) estreia em outubro, ela é baseada no mangá de mesmo nome de Rie Nishida, que estreou em 2021 na revista Comic Polaris.  

Com três volumes até o momento, Tono to Inu é centrado em um samurai muito habilidoso, outrora temido no campo de batalha por sua grande habilidade. Mas depois que seu clã foi à ruína, ele viveu uma vida tranquila e humilde, seu rosto intimidador é a única prova de sua vida de guerreiro anterior. Um dia, ele encontra um curioso cão corgi, por quem ele imediatamente se apaixona, e eles começam uma vida juntos.  O cachorrinho ainda é um corgi!  O que pode dar errado?  O trailer está abaixo, as informações vieram do Comic Natalie, do ANN e do perfil do Twitter da série.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Quais os 30 Mangás TL mais vendidos do primeiro semestre de 2024 no Japão? (+18/NSFW)


Hoje, apareceu no Twitter o link para o site do Comic Seymour, um importante site de distribuição de e-books operado pela NTT Solmare Corporation, postou a lista dos 30 mangás TL mais vendidos do primeiro semestre de 2024.  Dos trinta títulos, acho que só conheço Nanako to Kaoru - Daraku shite Iku, Bokutachi wa。e Haramu Made Midare Ike ~Migawari Hanayome to Gunpuku no Mouai~, que estou para fazer resenha.  Enfim, tentei encontrar o Twitter de todas as autoras, assim, se vocês quiserem, podem acessar e ver a arte das mangá-kas.  Uma das coisas boas do Twitter é que a maioria das mangá-kas tem perfil lá.  Imagino que vários dos mangás da lista tenham scanlations.  Se vocês visitarem a página, verão imagens dos cinco primeiros colocados e as capinhas dos demais.  No final da página, há link para os 30 mangás BL mais vendidos.

1. Suki na Yatsu Hodo Ijimetai。XL na Rival Douki no Bukiyou na Dekiai de ako.
2. Ai ga Omoi Kishi Koushaku wa, Tsuihou Reijou no Subete wo Ubai Tsukushitai。de Umibara Yuta.
3.Nanako to Kaoru - Daraku shite Iku, Bokutachi wa。de Omame Tsukino.
4.Kiss de Fusaide, Bare Naide。de Fudono Fudou.
5.Kuro Bengoshi no Chijou Sekai de Ichiban Omoi Junai de Sumi.
6.Zetsurin Osananajimi no Dekiai H de Mitasaretai de Asaba Sabako.
7.Hatsukoi Gurui - Otouto da to Omotteta Osananajimi ni Gekijuu Kanjou wo de Natsuo Tsunao.
8.Tensei Saki de Meta Hatsugen wo Shitara Kouryaku Taishou no Ouji ga Hyouhen Shimashita de Overkill (bita).
9.Ijiwaru Osananajimi to Toroama Fuufu Seikatsu ~Kono Keiyaku Kon wa, Kekikakuteki Dekiai deshita de Hisamatsu Eight.
10.Taido mo Karada mo Zenbu Dekai Segawa-san no Gachi Koi Taishou ni Narimashita de The Waidan/Yasuda Meshimeshi (roteiro) e Haruyama Haruo (arte).
11.Zecchou Aite wa Konyakusha!? ~Konya mo Iku Made Hame Ochiru~ de Okonogi Happa.
12.Akuyaku Ouji no Ichizu na Shuuchaku, Hatenai Dekiai。de Mikurayama Anju.
13.Yandere Koroshi!! ~Shuuchaku Yabame no Osananajimi ni "Watashi mo Suki" to Tsutaetara。de Toyama Monaka (roteiro) e Kazuichi (arte).
14.Kono Mama ja Watashitachi, Shinyuurashiku Irarenai de The Waidan (roteiro) e Nekopi the Cat (arte).
15.Hatsujou suru Unmei - Elite α no Risei ga Genkai de Nanao Rion.
16.Zangyakukou no Kawaii Tsugai ~Aishitagari na Danna-sama ni Hajimete wo Sasagemasu~ de Crane (roteiro) e Kitaya Kuro (arte).
17.Sono Keisatsukan, Tokidoki Yajuu! ~Kitaeta Karada ni Mori~ de Torai Sigma.
18.Buchou no Yoru teku ga Sugo Sugite Koshi ga Ukimasu Uzukimasu de Ootsuka Akira.
19.Seifuku no Renjo Migawari Kekkon Nostalgia de Kanade Souma (roteiro) e Azumi Yuu (arte).
20.Osananajimi Bartender to Hajimeru Kaikan Lesson de Takashino Rami.
21.Inukai-san wa Kakure Dekiai Joushi - Konya Dake wa "Suki" wo Gaman Dekimasen! de Itosuge Joe.
22. Konna koto Yari tai no! ~Darenimo Tomerarenai Kare~ (*não consegui identificar a autora*)
23.Haikei Oji-sama Outei Denka, Ichiya Kagiri no Hazu ga Kon'yaku no Moushikomi wa Soutei-gai desu! de Azutaka.
24.Osananajimi wa Ichi Tamagosei no Shishi Supadari Futago to Torotoro 3 nin Seikatsu de Sakura Ao (roteiro) e Awai Poppo (arte).
25.Okuchi ga Ecchi na Jakuten Datte, Rival no Elite Douryou ni Barete Shimaimashita de Awai Poppo.
26.High-spec Kare ga Watashi wo Suki sugiru - Innen no Aite no Kojirase Ai wa Dekiama de de Sakura Ao (roteiro) e Kikkawa Tei (arte).
27.Haramu Made Midare Ike ~Migawari Hanayome to Gunpuku no Mouai~ de Kanzaki Yuzu
28.Burikaesu Juusei。~Kaasuto Joui na Otoko no, 10 Toshikoshi no Gekiai~ de Komagome.
29. Kakure Tenaide Dete Oide ~Shuuchakukei Motokare ni Trauma~ de Tofu Pizza Maru.
30.Mojo to Hime-sama Irekawari Isekai Tensei ~Oku Made Uzuku Kiss wo shite... de Aomori.

quarta-feira, 24 de julho de 2024

E a próxima temporada será a do Benedict + Resenha do Livro Um perfeito cavalheiro (An Offer From a Gentleman)

Ontem, a surpresa do dia foi um pequeno vídeo anunciando que a próxima temporada de Bridgerton.  Como muita gente torcia, será a vez de Benedict, o segundo filho mais velho e que cedeu espaço para Colin e Penelope na terceira temporada da série, que eu ainda não terminei de resenhar, mas farei antes do final das minhas férias (*Está acabando...*).  Enfim, segue o vídeo:

Como eu li o terceiro livro da série, Um perfeito cavalheiro (An Offer From a Gentleman) e gostei bastante, queria deixar alguns comentários sobre ele.  Pelos dois primeiros livros fiquei com uma impressão ruim em relação aos livros da Julia Quinn.  A história do casamento forçado, situações de abuso sexual ignoradas, uma informações estranhas sem que fossem rebatidas (*mulheres grávidas não podem cavalgar*) e uns anacronismos bem bestas (*Anthony e seu problema com cor de rosa*), são exemplos.  Citei os livros em mais de uma das minhas resenhas de Bridgerton, que tem tag no blog, então, ficou fácil achar tudo o que eu escrevi sobre a serie.  Eu não leria mais nada, mas fiquei tentada e fui atrás do livro 3 e do livro 4.  Até olhei o da Francesca, mas só por alto mesmo.

Enfim, o livro três e o quatro são divertidos, são basicamente romances Harlequin, ou Avon, dá na mesma, tudo saia pela Nova Cultural no Brasil, bem escritos e simpáticos.  Sim, romance de banca, produção em série, tipo mangá e romances de guerra ou faroeste, que eram voltados para o público feminino.  O fato de, pelo menos aqui no Brasil, terem promovido esse tipo de literatura popular à material de livraria para cobrar mais caro e fazer com que algumas pessoas não torçam o nariz, não muda sua origem.  Muito bem, o volume do Benedict reconta a história de Cinderela e a coloca no contexto da Regência Britânica com suas questões de classe social, legitimidade e bastardia.

An Offer from a Gentleman (*e o título original é importante na história*) tem momentos românticos, dramáticos, divertidos e eróticos, também, porque isso não pode faltar nos modernos romances populares para mulheres.  Apesar da mocinha e do mocinho não estarem em posição de igualdade, e isso no que se refere à classe social, que fique claro, porque mulheres e homens não estavam equiparados no período histórico que a Julia Quinn retrata, Sophie, este é o nome de nossa heroína, não se deixa intimidar e tem traços de personalidade e caráter bem marcantes.  Mas vamos deixa organizar as coisas! Como começa a história?

Sophie Beckett é a filha bastarda de um conde.  Sua mãe morreu no parto e sua avó entrega a menina ao pai quando ela tem três anos.  O conde de Penwood nunca legitimou Sophie, para todos os efeitos, ela era a filha órfã de um amigo ou parente distante, que ele acolhera sob sua tutela.  Sophie recebeu uma educação esmerada, mas não teve amor do pai.  Quando o conde se casa, sua nova esposa, Araminta, traz consigo duas filhas de um primeiro casamento. A condessa não desejava Sophie convivendo com suas filhas, mas o conde impõe que menina continue recebendo as mesmas lições, só que o conde morre quando a jovem tem 16 anos e ela termina sendo reduzida a condição de criada, na verdade, menos que isso, porque criadas recebem salários e tem dias de folga e ela não tinha nada.  Araminta, sua madrasta, a odeia.  Mais tarde retornarei a isso.

Fonte: @rafafinhass

A vida de Sophie era de humilhações e violências, mas ela, às vezes,  sonhava que as coisas poderiam ser diferentes.  Ela lê a coluna de Lady Whistledown e deseja poder ir ao último baile de máscaras que será oferecido pela Viscondessa viúva em sua despedida da grande casa dos Bridgerton, afinal, seu filho Anthony e sua esposa deveriam morar lá.  Com a ajuda de uma antiga criada da casa, Sophie é vestida com roupas que pertenceram a sua avó.  Como o baile era à fantasia, também, uma roupa absolutamente fora de moda não seria um problema.  O cocheiro leva a jovem às escondidas até o baile e ela entra de penetra, mas tem que ir embora até a meia noite.

Benedict Bridgerton estava no baile promovido pela mãe e fugindo da pressão para dançar com wallflowers (*como Penelope*), que ficavam nos cantos do salão, e moças que a viscondessa considerasse candidatas a noiva.  Ele não quer se casar, ele nem queria estar na festa, mas eis que aparece uma bela dama com um vestido prateado e sua atenção é totalmente capturada por ela.  Ele a convida para dançar e se surpreende em saber que a moça não sabe como fazer.  Na verdade, ele fica surpreso da moça não saber quem ele é e fica fascinado com a genuína alegria que emana dela.  Sophie está feliz, pelo menos por algumas horas ela se dará esse direito.

A identidade de Benedict é revelada, claro, a festa era na casa dele e Sophie fica um tanto atordoada.  Ela lera sobre ele nas colunas de Lady Whistledown. Mesmo contra o que seria considerado decente, Benedict leva a jovem para um dos terraços privados da casa e começa a lhe ensinar a dançar.  Na conversa entre os dois, ele tenta tirar informações da jovem e já se imagina indo à casa dela no dia seguinte, mas ela é lacônica e misteriosa.  Teria ela ido escondida ao baile?  Seria jovem demais?  Quem era a sua família?  Ela morava em Londres ou viera de outro lugar?  Ele tenta conseguir indícios de quem ela seria, mas em vão.

Eles dançam, eles se beijam, porque Sophie imagina que aquela é sua única oportunidade de estar com um homem como Benedict Bridgerton.  A interação entre os dois vai também além do que seria considerado decente, toca meia noite e ela foge deixando a luva para trás.  Ele até a teria alcançado, se Lady Danbury não o tivesse interceptado no caminho.

Com a luva em sua posse, ele vai até sua mãe para que ela identifique a qual família pertence.  Lady Bridgerton diz que é dos Penwood e que ela conheceu o antigo conde e outros membros da família.  A moça poderia ser uma das enteadas do falecido conde e Benedict vai até a casa  onde Sophie é mantida em regime de escravidão.  Ele interage com a condessa, uma mulher que não lhe desperta simpatia, sua mãe, aliás, já tinha sinalizado que ela não era boa pessoa, e as duas filhas.  Nenhuma delas é a dama mascarada.  Ele chega a ouvir o nome de Sophie, tida como uma criada displicente pela condessa viúva, e tem pena dela, mas não a vê.

Araminta, que já estava desconfiada que Sophie tinha feito algo de errado na noite anterior, porque um dos seus sapatos estava machucado ou sujo, enfim, junta os pontos e decide expulsar a jovem de casa.  Sophie era ingrata e estava sendo sustentada por ela desde que completara 20 anos e terminará o prazo no testamento de seu marido para que ela cuidasse da moça, ou perderia parte do dinheiro que lhe cabia.  Antes de mandá-la embora, porém, impõe uma tarefa impossível para a moça, limpar todos os sapatos até o amanhecer, e a trança no closet.  Sophie fica desesperada.  O que seria dela?  Desesperada, Sophie rouba um par de adereços de sapatos de Araminta como uma pequena paga por tudo que passara.  Ela os venderia.  Antes do amanhecer, uma das filhas da madrasta, a única que lhe mostrava alguma simpatia, a liberta.

Benedict passou dois anos sonhando com a dama mascarada, procurando por ela, até acreditar que era tudo em vão.  Até que, em uma noite, ele salva uma jovem criada de três abusadores bêbados.  Um deles era o filho do patrão da jovem que se apresenta como Sophie Beckett.  Depois de enfrentar o sujeito e dois amigos bêbados, ele leva Sophie embora e promete lhe arrumar um emprego na casa de sua mãe.  Eles estão no interior da Inglaterra e Benedict a leva para a casa que mantém no campo.  No caminho, são pegos por uma tempestade.  O rapaz, que se recuperava de uma doença, tem uma recaída e Sophie, que desejava fugir o mais rápido possível, acaba ficando cuidando dele.  

Ela se sente aliviada e frustrada ao mesmo tempo, afinal, ele não conseguiu descobrir sua identidade.  Mas como poderia?  Passaram-se dois anos, ela estava com o cabelo empoado, além disso, teve que vender suas madeixas para um fazedor de perucas, e tinha emagrecido.  Na casa da madrasta, os criados que a conheciam desde pequena lhe davam mais comida (*mesmo que às escondidas*) do que ela recebia dos patrões atuais.  Conforme Benedict vai melhorando, ele começa a se apaixonar pela criada, eles conversam, eles tomam chá juntos, ela é muito mais educada do que ele imaginava que uma criada seria (*e ela tem que inventar mentiras para justificar*).  

Benedict sente culpa por se interessar por Sophie, por sentir desejo por ela, afinal, ele ainda sonhava em casar com a moça mascarada, ela, sim, era da mesma classe social que ele. Ao beijar a jovem, ele sente algo estranho, mas não consegue imaginar que sejam a mesma mulher. E Sophie quer fugir, porque sabe que não poderá ter nada com aquele homem.  Mas, depois do incidente do lago, quando a moça é surpreendida o espiando enquanto se banha (*e ele se meteu na água fria para aplacar sua luxúria*), ele lhe faz a oferta que ela não poderia aceitar jamais, se tornar sua concubina.  Percebem que o título original é importante?  "Uma oferta/proposta de um cavalheiro".  Pararei a descrição minuciosa aqui, estou no capítulo 8, acho.

Muitos homens ricos tinham concubinas, não vou usar o termo amante como tradução para "mistress", porque o sujeito montava casa para a mulher e a sustentava integralmente por toda a vida, ou enquanto lhe fosse conveniente.  Ter uma concubina não impedia um homem de se casar, mas poderia significar que os filhos e filhas nascidos daquela relação nunca seriam legitimados.  Sophie não deseja isso para nenhuma criança, muito menos par um filho seu.  E ela vai resistir à proposta de Benedict, mesmo que ele seja insistente em um nível autoritário, e que ela sinta desejo por ele, também.  E a ideia de que uma mulher sente desejo, que isso é normal, que podemos gostar de sexo é importante nesse tipo de literatura, pelo menos nos seus filões mais importantes.


Sophie, quase que à força, termina trabalhando para Lady Bridgerton e sendo dama de companhia de Eloise, Fancesca e Hyacinth.  Ser tão bem tratada a deixa surpresa, observar uma família que não é disfuncional, faz com que suas lembranças de dias ruins se tornem mais vívidas. E Benedict piora as coisas indo visitar com frequência a mãe.  Nesse estágio da série, Colin e Benedict tem suas próprias casas de solteiro e Gregory, o caçula, está na universidade.  Eloise continua enrolando para se casar e Francesca, diferentemente da série da Netflix, quer aproveitar a temporada e casar quando lhe convier.

Nessas visitas de Benedict, ele sempre faz investidas e tenta convencer Sophie.  Ele pode ser gentil, ele pode ser inconveniente, mas não desiste.  Dentro dele há algo que lhe empurra para a ideia do casamento com a moça, afinal, ele acredita amá-la e ela está ali, não é uma criatura de sonho, mas ele imagina que seria algo impossível.  Alguém de sua posição não pode se casar com uma criada.  Quem ajuda a desatar o primeiro nó é Lady Bridgerton.  Esqueça a mãe meio mosca morta da série, neste livro, ela luta pela felicidade do filho como uma leoa.

Lady Bridgerton diz, bem lá no início do livro, que dá mais importância ao caráter e à felicidade dos filhos do que à riqueza e posição.  Ao conhecer Sophie, ele já sabe o que está acontecendo, ela consegue ler os sentimentos do filho.  Com a convivência, ela passa a gostar da moça.  O que ela diz para Benedict é que eles teriam que pagar algum preço pelo seu casamento.  Não poderiam frequentar a alta sociedade, teriam, muito provavelmente, que morar no interior.  Mas isso, se ela fosse uma criada.  Sophie, eles descobrem, é uma bastarda não legitimada.  

O problema seria maior, vejam, não por ter nascido fora do casamento, até alguns dos filhos do Rei George III tinham vários bastardos, mas essa situação de ilegalidade.  Por fim, Sophie termina cedendo e tem lá uma noite de sexo com Benedict.  Na série da Netflix, colocam Penelope e Colin fazendo amor em um sofá, mas, nos livros, são Benedict e Sophie.  É uma sequência bonita, não tão erótica quanto a do lago, mas tem seu calor, também.  Sophie decide fazer algo que tinha jurado que não faria, mas ela queria viver este momento com o homem que amava.  E assim foi.  Só que, no dia seguinte, quando Benedict acredita que venceu e que a moça aceitou ser sua concubina, ela diz que não é nada daquilo.  Ele fica ofendidíssimo (*com razão, se pensarmos pelo ledo dele*) e termina tendo suas memórias destravadas, o que torna tudo pior.

O resultado é que ele confronta Sophie e é injusto com ela, porque a moça não tinha como fazer muito diferente.  Nesta altura, a moça também descobre que sua madrasta veio morar na casa da frente dos Bridgertons.  Resultado, ela tem que partir.  Só que se Sophie descobriu, a madrasta também o fez e ela odeia a moça com todas as suas forças.  Resultado?  Nossa mocinha é sequestrada e termina na cadeia acusa da de roubar os clipes de sapatos, mas algo mais valioso, também, a aliança de casamento da madrasta.  

Sophie é colocada em uma cela fétida e tem dois destinos diante de si, a morte, ou a deportação para a Austrália.  Araminta quer que ela sofra lentamente, quer que ela seja mandada para a Austrália.  Para quem não sabe, a colonização britânica na Austrália começou principalmente com colônias penais.  E ser enviado para o outro lado do mundo, uma viagem longuíssima em condições miseráveis já deveria causar a morte de muita gente.  Só para se ter uma ideia "Entre 1788 e 1868, cerca de 162 mil condenados foram transportados da Grã-Bretanha e da Irlanda para várias colônias penais na Austrália.". (FONTE)  Sophie estava perdendo a esperança, mas eis que teremos o barraco na cadeia, que é a melhor parte do livro.

Depois de descobrir a identidade de Sophie e já tendo sido rejeitado antes várias vezes, Benedict está arrasado.  Deseja esquecer tudo, se embriagar até perder a consciência.  Colin chega em sua casa e eles decidem praticar esgrima. No livro, é dito que as duas coisas que Benedict mais gosta é esgrimir e desenhar/pintar, algo que ele escondia da família. Ele também não gosta muito de farras e orgias, ou não mais, ele já está com 30 anos. Se você viu a série, sabe o quanto mudaram a personagem aqui. Eis que, durante o exercício, Colin lhe dá alguns conselhos e ele decide chutar a sua vida na alta sociedade e ir atrás de Sophie, casar-se com ela DE VERDADE.  Só que ela se foi e sua mãe não sabe onde a moça está.

No meio da confusão, chegam Francesca e Hyacinth com a última coluna de Lady Whistledown (*Penelope reconheceu Sophie como a dama mascarada*).  Sophie foi presa.  Benedict diz que vai até lá, a mãe, diz que faz junto e ela não aceita um "não" como resposta.  As meninas, pro outro lado, tem que ficar.  E, na cadeia, temos um barraco fenomenal que se não estiver na série da Netflix será lamentável.  Coisa das boas novelas de Walcyr Carrasco.  Benedict quase estrangulou Araminta?  Sim, mas foi quase e sei que isso seria cortado da série.

Quem salva de verdade Sophie é Posy, que assume que roubou os clipes de sapato e que a aliança da mãe está guardada em casa, junto com o testamento do conde, onde ele deixou estabelecido que Sophie teria direito a um dote.  A revelação faz com que Lady Bridgerton ameace com seus advogados (*no plural, porque gente rica nunca tem um advogado só*) a madrasta de Sophie.  Antes da revelação, a mãe de Benedict já tinha dito que iria queimar Araminta diante da boa sociedade, a condessa viúva diz que é superior em titulação de nobreza, mas Violet Bridgerton diz ser mais popular (*e rica*).  Agora, com a informação de Posy, ela tem a lei para jogar em cima da outra.

O barraco é maior, eu só falei de algumas partes.  O resultado é um acordo pelo qual Araminta iria confirmar que Sophie era filha de um primo distante do conde e, portanto, não seria bastarda.  Isso bastaria para dar para a moça a legitimidade necessária para que o casamento com um Bridgerton não fosse um escândalo.  O resto do livro é deixo para vocês, o ápice é a altercação na cadeia.

Jovem mulher passando roupa, cerca de 1800.  
Louis-Léopold Boilly (1761–1845)

Dentro de An Offer from a Gentleman temos questões de gênero que se entrelaçam com questões de classe.  Quando está na casa de campo de Benedict, que ele chama de "My Cottage", mas era muito maior do que isso.  Sophie fala tanto para ele quanto para a governanta que ela só pode ficar sozinha com o rapaz, porque ela é uma criada.  Benedict pensa diversas vezes em o quanto as criadas, ou a criadagem em geral era invisível.  Ele se surpreende com certos pudores de Sophie, afinal, criadas entravam sem grande problema em todos os cômodos de uma casa, logo, a nudez masculina não deveria ser um problema para ela.  Poderia não ser, se ela não estivesse apaixonada, mas o que está em questão é que, para as classes aristocráticas e para a burguesia, criados devem trabalhar e não são vistos, em muitos casos, sequer como humanos.

O mocinho do livro é menos irritante, muito menos, do que o Duque e Anthony, ele é capaz de se arrepender das coisas que faz com sinceridade e sabe o significado da palavra consentimento. Quer dizer, ele sabe quando a questão é sexo, mas não na relação de proteção que impõe à Sophie.  Ela a salva do estupro principalmente por ver as irmãs em toda jovem mulher em perigo.  Agora, quando ela quer ir embora, o que obviamente estragaria todo o progresso da história, ele a ameaça, diz que vai acusá-la de roubo e assumir sua custódia, porque precisa "salvá-la de si mesma".  Além de saber o que é melhor para ela por ser homem, ele é, também, um aristocrata e ela é somente uma criada.  Submissão é o mínimo esperado.  

Durante o barraco na prisão, vem à tona uma questão importante, mas que a autora não desenvolve. Araminta odeia Sophie por ela ser amada pelo marido.  Ela se sentia menos importante para o antigo conde do que a menina.  Fora isso, segundo a vilã, o marido a culpava por não ter lhe dado filhos.  Então, ela invejava a mãe de Sophie, a quem se referia como prostituta, por ter conseguido.  A menina era um sinal de seu fracasso.  Bem, deveria ser um sinal do fracasso do conde de Penwood, mas, no fim das contas, o peso da (*suposta*) esterilidade recaía sobre as mulheres.  Como Araminta é vilã, e ama mais uma filha do que a outra, e tratou Sophie como escrava, além de roubar-lhe seu dinheiro, a autora não vai mexer com isso aqui.  Mas lembrei da cena do live action de Cinderela no qual a madrasta ouve o pai da mocinha dizendo que ela é a pessoa que ele mais ama na vida, ou algo assim.  A madrasta guardou com rancor essa informação.  O problema é que o pai de Sophie nunca conseguiu colocar em palavras seu amor e a deixou ilegítima.

Prometo que estou terminando e nem sei se ainda existe alguém lendo, porque ficou muito longo.  Muito bem, a próxima temporada de Bridgerton será de Benedict.  Há um boato de que a mãe de Cressida é Araminta.  Será?  É esperar para ver.  Benedict, na última temporada, foi confirmado como bissexual, antes, não estava claro.  Eu imaginava que Sophie poderia ser uma mulher trans, mas como Francesca foi escolhida para representar o casal diverso, imagino que Sophie seja uma mulher cis na série.


Espero que não escalem uma atriz negra para o papel, porque mesmo sendo Bridgerton história alternativa, colocar uma pessoa negra como criada e passando pela pressão que Benedict colocou sobre ela pode, sim, chamar sentidos ligados à escravidão.  Discuti isso nas resenhas de Ana Bolena do Channel 4 (*tem no Globoplay*).  Sophie será branca?  Oriental, talvez.  Não sei.  Será uma mulher cis ou trans?  Vamos ver por quanto tempo irão segurar a identidade da atriz que fará o papel.  De qualquer forma, eu acredito que Sophie seja uma das mocinhas mais amadas da série de livros.

Uma saída muito clichê para explorar o fato de Benedict ser bissexual seria colocar Sophie se travestindo de homem na sua versão criada.  Poderiam justificar isso como uma forma de enganar a madrasta, ou fugir de seu passado. Aí, teríamos aquela situação Mulan em que o mocinho se apaixona por um rapaz sem saber que é uma moça.  O fato é que dificilmente vão seguir o livro de perto.  Podem esquecer isso!  O que eu espero é que tenhamos pelo menos três coisas na adaptação: o baile, o lago e o barraco na cadeia.  Aliás, deem para Violet Bridgerton a chance de ser uma mãe leoa, porque, nos livros, ela é muito mais interessante. 

Antes do fim, aquela cena constrangedora em que Colin diz que não se casaria com Penelope está neste livro.  Benedict, Anthony e Colin estão entrando na casa da mãe e Penelope está saindo e ouve a ofensa.  Foi muito mais impactante do que na série.  Os irmãos ficam mortificados e Benedict e Anthony sentem vergonha por Colin.  Penelope guardou no fundo do coração a ofensa.  No final do livro, depois de um novo salto no tempo, Lady Whistledown está cansada e se pergunta se não é a hora de aposentar sua pena.  Eu realmente vejo como uma escolha ruim terem adiantado o livro de Penelope e Colin.  Agora, se nada mudar, é esperar até 2026 pela quarta temporada.  É isso.  O livro é divertido.

terça-feira, 23 de julho de 2024

Ranking da Oricon: Semana 08-14/07


Eis o ranking da Oricon e temos três shoujo no top 10, na verdade, dois, porque temos a edição comum e a especial de Watashi no Shiawase na Kekkon.  Sabe que eu pensei que tinham parado de publicar esse mangá?  Enfim, não pararam e a série continua popular, ou não estaria entre os dez mais vendidos. Por falar nisso, cadê notícias da segunda temporada, ein, Netflix? O outro mangá é Yubisaki to RenRen, que teve animação este ano e está sendo publicado pela NewPop.  E temos quatro mangás femininos fora do top 10.  Como apostei na semana passada, Mystery to Iunakare, que sai pela JBC em nosso país, ainda está entre os trinta títulos mais vendidos do Japão.  Isso é que é resistência!  Acredito que, desta vez, seja a última semana mesmo. 

1. ONE PIECE #109
2. Jujutsu Kaisen #27
3. Kaiju Nº8 #13
4.Watashi no Shiawase na Kekkon #5
5.One Punch Man #31
6.Yubisaki to RenRen #11
7.Watashi no Shiawase na Kekkon #5 Edição Especial
8.Kaoru Hana wa Rin to Saku #13
9.Nigatsu no Shousha -Zettai Goukaku no Kyoushitsu #21
10.Uzaki-chan wa Asobitai! #12
12. Koiseyo Mayakashi Tenshi-domo #3
21. Kumichou Musume to Sewagakari #12
24.Mystery to Iunakare #14
27.Tonari no Stella #6

segunda-feira, 22 de julho de 2024

Até queria, mas não consigo comprar a premissa de A Casa do Dragão.

 

Me deparei com esse vídeo em inglês e acabei cedendo e escrevendo este post.  Eu acompanho mais de um canal de Youtube que fala do universo criado pelo  George R. R. Martin.  Toda semana, desde a série anterior, vejo os vídeos da Mikannn principalmente, mas não só, com as reviews e tudo mais.  Cheguei até a escrever dois posts sobre a Daenerys (*1 - 2*), quando a enlouqueceram e outro quando alguém naturalizou as violências contra as mulheres dizendo que era Idade Média.  Sabe, aquele período em que se podia fazer de tudo contra as mulheres, enfim...  Para quem não sabe, sou uma medievalista aposentada e, às vezes, essas coisas me dão certo comichão.

Todo mundo que conhece mais ou menos a obra do Martin, ou está acompanhando as matérias sobre ela e os seriados, sabe que ele se inspira na História com "h" maiúsculo para escrever a sua saga.  Muito bem, A Casa do Dragão, que está no ar na HBO e fazendo muito sucesso, teve como inspiração a disputa entre a Imperatriz Matilda e seu primo Estevão pelo trono da Inglaterra. A longa guerra civil entre os dois é chamada de Anarquia (1138-1153).  O problema é que a disputa entre os Targaryen é muito diferente daquela que ocorreu na Inglaterra.  Meu post é sobre isso.

A Imperatriz Matilda, ou Maud, (1102-1167) era a única filha legítima de seu pai, Henrique I (c. 1068-1135), o rei que deve ter tido o maior número de filhos bastardos da história da Inglaterra. Ela foi chamada a vida inteira de Imperatriz por ser viúva de Henrique V (1081 ou 1086-1125), Imperador do Sacro Império Romano Germânico.  Ela não estaria na sucessão ao trono da Inglaterra se seu único irmão legítimo, William Adelin (1103-1120), tinha morrido no trágico naufrágio do White Ship, que, aliás, é o ponto de partida de um dos meus livros favoritos, Os Pilares da Terra.  Foi um acidente, mas Ken Follett transformou o caso em uma conspiração.

Henrique I correu para se casar de novo, mas não teve nenhum filho com a nova rainha.  Sendo assim, ele convocou seus lordes laicos e eclesiásticos para que eles jurassem reconhecer Matilda como monarca.  Ela mesma nunca clamaria o título de "rainha", mas de "Lady of England and Normandy", seja isso o que quiser significar.  É preciso ter em mente que Henrique I era somente o terceiro rei normando da Inglaterra, ele tentou se aproximar dos saxões, ele passou a perna em seu irmão do meio (*o mais velho morrera sem descendência*) para tomar para si o trono para si.  Ele entendia de trairagem e entendia muito bem os riscos de uma guerra civil depois de sua morte.

Depois da morte de Henrique I, parte dos lordes preferiram apoiar o seu primo, Estevão (1092 ou 1096-1154), como rei. Observem, PRIMO, não irmão. Estevão teve o apoio da Igreja Católica inglesa e Matilda atravessou o Canal da Mancha em 1139 para tomar o trono.  Atravessou o Canal, porque Matilda, contra a sua vontade, aliás, foi imposição do pai, estava casada com um nobre francês, Geoffrey Plantageneta (1113-1151), Conde de Anjou que esses lordes ingleses não queriam nem perto do trono, nem perto da Normandia.  Matilda teve três filhos homens com o Conde de Anjou e, claro, isso reforçava seu direito ao trono.

No final das contas, depois de muita destruição, Estevão ficou no trono e teve que passá-lo para o filho mais velho de Matilda, Henrique II (1133-1189). Sim, pai de Ricardo Coração de Leão (1157-1199), de João Sem Terra (1166-1216) e marido da formidável Leonor da Aquitânia (c. 1124-1204).  Se vocês quiserem um bom documentário sobre Matilda e Leonor da Aquitânia, sugiro o documentário da BBC, She Wolves England's Early Queens Episode 1: Matilda and Eleanor, conduzido pela historiadora Helen Castor, ou o livro dela, que deu origem à série.

E o que acontece em A Casa do Dragão?  Viserys se tornou rei passando a frente da prima, Rhaenys, filha do príncipe herdeiro, porque ela era mulher.  Esta manobra parece muito mais próxima do que fizeram com Matilda, só que, neste caso, a decisão foi do rei, que era avô dos dois.  Rhaenyra era herdeira do pai, porque era a única filha, mas ele casou-se de novo e teve TRÊS FILHOS HOMENS. Se a lógica era que somente um homem poderia sentar no trono de ferro e estamos em um mundo patriarcal, Rhaenyra estaria fora, ou, no máximo, passaria para o fim da fila.

Mas Viserys queria insistir na filha, ora, se ele quisesse garantir o lugar da filha de forma indiscutível, deveria tê-la casado com o tio, Daemond. Sim, eu sei que Viserys não confia no irmão, mas estamos falando de reforçar a legitimidade de Rhaenyra.  E o autor poderia olhar as formas alternativas de sucessão possíveis naquilo que a gente chama de Idade Média, em especial, nas Ilhas Britânicas.  Entre os celtas e os saxões, em especial, o trono passava de irmão para irmão.  Esgotada uma geração, aí, sim, passávamos para a outra.  Aliás, é assim na Arábia Saudita, ou era até a última sucessão.

Voltando para a insistência de Viserys com a filha, se houvesse se passado, sei lá, 100 anos desde o descarte de Rhaenys, OK, mas era a geração seguinte. Todo mundo estava vivo praticamente e ele tinha TRÊS FILHOS HOMENS com sua nova rainha.  Faz sentido?. Só se Vyserys fosse um rei louco e ele, pelo menos dentro da história do Martin, é louvado como um bom rei.  Qual rei sábio e responsável empurra o país para a guerra civil desse jeito?  Dentro da lógica da própria história, os Verdes têm razão. Não, claro, que toda essa história da sucessão tenha alguma lógica.

Enfim, é exigir de mim muita suspensão de descrença e ainda me ofendem dizendo que Rhaenyra foi inspirada na Imperatriz Matilda. Definitivamente, o que mais faz sentido nessa série em A Casa do Dragão são os dragões mesmo. Acho o design dos bichinhos bem legal e a batalha que levou Rhaenys à morte foi muito boa.  É isso.  E quem quiser um canal especializado no universo do Martin, recomendo Cala a Boca, Thiago e ele tem um vídeo discutindo a sucessão, ele sugere que a resolução seria casar a Rhaenyra com o irmão, Aegon.  Só que, dentro dessas lógicas dinásticas, que o autor usa como referência, é muito normal e aceitável casar um homem muito mais velho com uma mulher bem mais jovem, porque a possibilidade de ser um  casamento fértil existe, já o inverso, bem, poderia ser uma corrida contra o tempo.  E tem o canal da Mikannn, claro.  Ela está fazendo muitos vídeos sobre a série.

Comentando Guerra Civl (Estados Unidos/2024): Seria um filme premonitório?

Sábado, assisti com uma amiga o filme Guerra Civil (Civil War), uma das sensações do início deste ano, porque atraiu muita gente para os cinemas, porque era uma produção de um estúdio independente e, no caso do Brasil, em especial, porque tem Wagner Moura desfilando lindo pela tela.  Estabelecidos esses três pontos, não sei se gostei do filme, ainda que reconheça que é um bom filme de ação com uma dose inesperada (*por mim*) de violência.  Talvez, exista algo de premonitório nele, mas comentaria depois do resumo da história:

Estamos em um futuro próximo, os Estados Unidos estão em uma violenta guerra civil.  O presidente do país se recusa e entregar o poder e é reconhecido como um ditador, sendo combatido pela chamada "Western Alliance", que une Texas e Califórnia, e a Florida Alliance.  Lee Smith (Kristen Dunst) é uma veterana fotógrafa de guerra e sobrevive a um atentado na cidade de Nova York, onde conhece a jovem aspirante à mesma profissão, Jessie Cullen (Cailee Spaeny).  Lee carrega muitos traumas por anos de trabalho em ambientes extremamente violentos, mas não se vê abandonando a profissão.

No hotel, ela encontra com seu antigo mentor, Sammy (Stephen McKinley Henderson), que trabalha para o New York Times e seu companheiro de Reuters, Joel (Wagner Moura), que deseja seguir para Washington DC e ser o jornalista a fazer a última entrevista com o presidente antes que ele seja assassinado, ou executado, como queiram.  O presidente afirma todos os dias na mídia que está prestes a vencer a guerra civil.  Sammy tenta  demovê-los de irem até Washington e todos decidem seguir juntos pelo menos até  Charlottesville (Virginia), base mais avançada da WF.  Joel termina decidindo levar a novata Jessie contra a vontade de Lee, que termina por assumir em relação à jovem o mesmo papel que Sammy um dia teve em sua vida.

No caminho, snipers, destruição, gente se matando por motivos indefinidos, fanáticos executando prisioneiros, gente do governo que está caindo cometendo massacres.  É mostrado, também, que o dinheiro norte-americano não tem mais valor algum e o país experimenta situações inimagináveis para a nação mais rica do mundo, como racionamento de água, alimentos e energia, além de apagões.  Com uma selvageria que vai escalando, Jessie tem seu batismo de sangue da pior forma possível e Joel consegue satisfazer o seu desejo, mas não da forma esperada.

Primeira coisa, parte das informações que coloquei na resenha, como o fato do presidente ser um ditador, não ficou claro em nenhum momento do filme, são informações obtidas na Wikipedia, uma matéria da Vulture e outra da The Daily Yonder.  Propositalmente, ou não, a ideia que o filme me passou foi de caos.  Temos um presidente que está caindo, isso é dado que o filme deixa claro, mas não se ele está mais certo ou errado que os igualmente violentos membros da WF.  O que importa, como fica claro em uma das sequências mais importantes do filme, é que se alguém está atirando em nós, a gente atira de volta, o resto não tem importância.

Agora, essa selvageria rasgada choca as personagens principais, porque é algo que elas, Joel e Lee pelo menos, estão acostumados a ver acontecendo em algum lugar da África, Ásia, ou América Latina, não nos Estados Unidos, o berço da democracia e liberdade.  Sabe a ideia do nós e eles, sendo esse "nós" os civilizados?  Então, o filme faz humor, porque eu vejo como engraçado mesmo, com essa ideia fundadora da própria cultura norte-americana.  A mesma selvageria que aparece nos flashbacks de Lee, está acontecendo nos Estados Unidos diante dos olhos deles.

Por isso mesmo, quando o grupo passa por uma cidadezinha pacata, se choca da guerra não ter chegado até lá.  Quando Joel pergunta para uma entediada atendente de loja se eles não sabem que os Estados Unidos estão em guerra.  A moça responde que sabem, sim, mas preferem ficar fora dela.  É ridículo, mas o ficar fora é garantido por sujeitos pesadamente armados no topo dos edifícios.  Sammy, na sua experiência, parece ser o único a perceber que as coisas estão piores do que aparentam estar, mas na sua necessidade de ser o primeiro, Joel se recusa a ouvir e Lee e Jessie seguem com ele.

Estou falando muito da personagem de Wagner Moura, mas a protagonista e dona do filme é Kristen Dunst em uma atuação contida e carregada, na expressão corporal e no olhar, de uma dor e trauma enormes.  Ela tornou-se famosa ainda muito jovem ao fotografar o que Jessie chamou de "massacre dos antifas(cistas)" em uma universidade norte-americana.  Mesmo contra a sua vontade, ela orienta Jessie sobre como fazer seu trabalho que consiste, segundo ela, em tirar fotos e deixar que outros façam as perguntas.

A jovem Jessie, que tem 23 anos, mas está construída para parecer mais jovem, causando contraste com Lee, vai absorvendo as lições e passando por inúmeros traumas ao longo do caminho.  Ela tem talento, Lee percebe isso de saída, mas teria o espírito de uma fotojornalista de guerra?  Agora, algo que me deixou com a pulga atrás da orelha, e não consegui resposta, é o quanto o filme exagerou ao mostrar o trabalho de jornalistas correspondentes de guerra.

Eu sabia, porque tive que ler sobre isso quando dava aula no 3º ano, que as tropas regulares, as dos Estados Unidos, em especial, isso desde a Guerra do Vietnã, pararam de levar jornalistas e fotógrafos consigo.  O que nos chega do front é propaganda oficial e quem estava vivo durante a 1ª Guerra do Golfo (1990-91) deve se lembrar de como a coisa funcionava.  Tropecei em fóruns discutindo o filme e todos que afirmavam que o filme era preciso ao mostrar os profissionais em seu trabalho citavam fotojornalistas de guerras até o Vietnã, o marco que eu tinha.  As imagens que chegaram do Vietnã ajudaram a criar uma opinião pública contra a guerra e contra os militares norte-americanos, por isso mesmo, o governo dos EUA e o Comando Militar do país decidiram limitar isso.  

Procurando, encontrei que a partir de 2003, segunda Guerra do Iraque, por causa da pressão da imprensa e outras instâncias, as tropas norte-americanas voltaram a levar jornalistas consigo, PORÉM eles e elas precisam assinar contratos que estabelecem restrições ao que pode, ou não pode, ser dito, ou mostrado. Além disso, são as tropas que decidem onde levarão os jornalistas, o que permite um certo controle das histórias que serão contadas. Entendem o que significa isso?  E, sim, continuam a existir os jornalistas independentes, mas esses estão por sua conta e risco.

Obviamente, há jornalistas cobrindo guerras de muito perto e eles e elas são vitimados durante o conflito.  Jornalistas já morreram cobrindo a Guerra na Ucrânia e a ação de Israel na Faixa de Gaza causou um número sem precedentes de profissionais da imprensa, foram 103 até março deste ano.  Ainda assim, me pergunto se eles e elas seguem com as tropas em fogo cerrado?  Por que é isso que acontece no filme.  Outra coisa, essas tropas e, no caso do filme, falo da WF, que quer derrubar o presidente ditador, aceitariam carregar jornalistas com ele que registrariam massacres e execuções sumárias?  Se a ideia é que é uma realidade distópica e  que convém desligar metade do cérebro, OK, eu entro na brincadeira, porque como filme de ação e que provoca horror e tensão, Guerra Civil funciona bem.

Agora, o filme se contradiz até ao apresentar o trabalho dos jornalistas de guerra, porque, logo no início, Lee dá para Jessie seu colete de imprensa para que ela se proteja e Joel diz para a jovem que sempre deve usar o colete e o capacete.  Só que, quando eles estão em Washington DC e debaixo de fogo cerrado, nenhum deles usa capacete.  Só os colegas da agência concorrente parecem preocupados em se proteger, porque não avançam com as tropas, e se identificar.  

Encontrei um artigo chamado Cobertura Jornalística de Guerra que termina da seguinte maneira: "A cobertura jornalística na guerra exige total atenção do profissional. É importante estar ciente que em áreas de conflitos o risco é ainda maior e, por esse motivo, é fundamental identificar o momento de interromper a cobertura e buscar abrigo em um local seguro. Afinal, a vida deve ser preservada."  Os protagonistas do filme não levam isso em consideração, não.  Há a questão da ambição de Joel, é um dado importante no filme, mas o comportamento meio suicida do grupo não se manifesta somente em Washington DC.  Quando Sammy os adverte, fica parecendo que ele age assim por ser velho e lento (*ele é muito obeso, mas a questão não é colocada em palavras*).

Dentro do filme, duas questões não importam, os papéis de gênero e a identidade racial.  Lee e Jessie não são lembradas que são mulheres em nenhum momento, elas fazem tudo o que Joel faz, ou ele faz tudo o que elas fazem, menos tirar grandes fotos de situações muito violentas.  Em nenhum momento a ideia de que Jessie poderia ser violentada (*e há uma sequência que poderia apontar para essa possibilidade*) aparece, o único medo parece ser a morte mesmo.  

O aspecto racial, e Sammy é negro e Joel latino, não vem é um problema em nenhum momento.  No caminho para Washington DC, não vemos nenhuma milícia de supremacistas brancos, nos acampamentos de refugiados todos estão juntos e as forças da WF que caçam o presidente dentro da capital é liderada por uma mulher negra.  Aliás, entre os atiradores e milicianos pelo caminho, nenhum é mulher, mas nas tropas da WF, há mulheres soldados, assim como na equipe do presidente que será deposto.

Em um futuro próximo distópico nos Estados Unidos, me parece difícil imaginar que misoginia e racismo não teriam um papel central.  É mostrada a xenofobia e por parte das forças do governo que está caindo, os soldados exigem que os jornalistas provem que são "verdadeiros americanos", ou, como o militar diz no filme, "Que tipo de americano", mas nenhum dos militares, que são todos indiscutivelmente brancos, coloca em dúvida que Joel, que é nascido na Flórida, é um deles, quer dizer, eles iriam matar todo mundo, mas a identidade latina da personagem de Wagner Moura não é uma questão.

Enfim, o objetivo do filme, e isso ele faz muito bem, é mostrar a profissão de jornalista de guerra.  Se de forma realista, ou não, não consegui descobrir, as questões que levaram à guerra civil não são importantes, porque a ideia é que o conflito brutaliza todo mundo, independentemente de que lado estejam ou no que acreditem.  Não discutir o conflito pode parecer uma covardia do filme, e tudo o que sabemos do conflito é meio que extra filme.  Querem ver?

Este mapa dos Estados Unidos estabelece como as forças em conflito estão divididas, mas ele está em material de promoção e, não, dentro da película em si.  Custava colocar um pouco mais de informação sobre a guerra civil e seus motivos dentro da história?  Por qual motivo se evitou fazer isso?  É para que a audiência fique boiando ou decida seu lado sem pesar o que está acontecendo.  Pelo mapa a divisão é a seguinte: Estados Leais ao Presidente (azul), Western Forces (verde), Florida Alliance (vermelho) e New People's Army (amarelo).  Se se falou em New People's Army no filme, perdi.  Quando à Florida Alliance, ela é citada, mas não é explicada.

Muito bem, algo que gostei bastante foi da fotografia, da forma como a beleza e o horror foram mostrados.  O uso do flashback também casou muito bem com a ação e apresentou de forma competente como Lee era atormentada pelo seu passado, pelas muitas guerras que presenciou.  Talvez, o desfecho da película fosse óbvio, mas eu terminei me surpreendendo.  E o filme não vai se preocupar, também, em julgar ninguém.  Repito, pelo filme, eu não teria como saber que o presidente era um ditador.  O filme não me disse nada e isso é um problema.

Agora, estamos em ano eleitoral nos Estados Unidos e Guerra Civil pode ser premonitório.  Afinal, se Trump não ganhar, muito provavelmente, não reconhecerá a derrota e irá inflamar seus seguidores.  Ele mesmo já falou em banho de sangue.  O candidato republicano também sinalizou que irá ampliar seus poderes, caso seja eleito, no que, provavelmente, terá o apoio da Suprema Corte do país.  Logo, a ideia de Guerra Civil de verdade não está muito longe do horizonte dos Estados Unidos.  Como se trata da nação mais importante do mundo, problema deles é problema do mundo inteiro.

Concluindo, Guerra Civil é um bom filme, com destaque para Kristen Dunst e Wagner Moura, cujo papel vai crescendo ao longo da película.  Ele tem o objetivo de mostrar como jornalistas de guerra trabalham e, não, em discutir como a guerra civil começou.  E é um filme violento, muito mais do que a média do que o cinema norte-americano costuma mostrar, mas a gente não encontra fotos dessas cenas realmente violentas do filme em uma busca, elas não foram usadas na propaganda, por assim dizer.  A depender das expectativas que você alimentar sobre o filme, talvez, possa se decepcionar.