Lá em 2024, houve toda uma movimentação da ala mais vergonhosa da Câmara dos Deputados para fazer avançar o PL1904/2024. Os grupos de mulheres, assumidamente feministas ou não, se mobilizaram para colar nessa infâmia o rótulo de PEC do Estuprador, porque o objetivo era negar às mulheres e meninas o direito de interrupção da gravidez após 22 semanas nos casos previstos em lei, isto é, risco de morte da mulher, estupro e anencefalia, condenando-as por homicídio, cuja pena é maior que a de estupro. Gente como Sóstenes Cavalcanti, minion do Pastor Malafaia, tinha certeza de que a população brasileira iria acolher essa perversidade. Com os protestos de rua e na internet, eles tiveram que recuar, mas voltaram à carga tentando mudar o artigo 5º da Constituição Federal, dando ao feto os mesmos direitos de uma pessoa já nascida. Isso impediria o aborto em QUALQUER SITUAÇÃO condenando mulheres à morte e/ou levarem a termo gravidezes fruto do estupro.
E os justiceiros não têm nenhum problema em matar mulheres para vingar fetos imaginários, mesmo ao arrepio da lei e dos códigos que regem suas profissões. Mês passado, Paloma Alves Moura, de 46 anos, sangrou até a morte em um hospital (*de administração católica*) em Olinda. Sofrendo de grave endometriose, ela ficou dez horas sangrando sem que, segundo seus familiares, recebesse o atendimento necessário. Motivo? A desconfiança de que havia cometido um aborto. Eu conheço outros casos, acredito que a maioria das mulheres conheça. O fato é que os defensores das vidas em potencial, não raro, não têm problema algum em fazer sofrer e deixar morrer mulheres e meninas caso suspeitem que elas cometeram ou pretendem cometer um aborto, mesmo que seja acolhido pela lei.
E é bom enfatizar o MENINAS, porque, segundo a 19ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, são elas, especialmente quando negras, as maiores vítimas de estupro. E cito matéria da CNN, "O perfil das vítimas de estupro em 2024 revela que a maior parte dos crimes, 76,8%, foi classificada como estupro de vulnerável, em que as vítimas são menores de 14 anos. Dentro desse universo, 61,3% das vítimas totais tinham até 13 anos de idade, com a faixa etária de 10 a 13 anos concentrando o maior volume de casos." Pela legislação brasileira, é sempre estupro se a pessoa tem até 13 anos. SEMPRE. Outro dado importante é que a maioria dos casos de abuso acontece DENTRO DE CASA, normalmente, o abusador é alguém conhecido da menina ou membro da família (*pai, padrasto, avô, tio, irmão, primo, cunhado*). E vou citar dois casos que chegaram aos jornais e são exemplares quanto a isso.
Ano passado, um homem em Goiás conseguiu que a Justiça impedisse que sua filha de 13 anos pudesse ter acesso ao aborto legal, pois, sendo menor de 14 anos, sempre é estupro. Esse sujeito era acessorado por advogados ligados a um grupo católico de militância contra o aborto; já o suposto estuprador era um homem de 24 anos, amigo do pai da menina, com quem ela morava, e frequentador de sua casa. Quando a gravidez se tornou conhecida, ela estava com 18 semanas, mas o direito da menina foi negado e a gestação progrediu trazendo mais sofrimento para a vítima. Já semana passada, um pastor foi preso, aqui, em Brasília, por estuprar suas filhas, uma enteada, e torturar o enteado para que ele não o denunciasse.
Cortada para a Câmara dos Deputados no dia 5 de novembro, por 317 votos a favor, 111 contra e uma abstenção, foi derrubada uma resolução do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) de dezembro do ano passado que estabelecia prioridade de atendimento às meninas menores de 14 anos em caso de aborto, dispensando, inclusive, a autorização do responsável (*que poderia ser o criminoso*). Não se tratava de fazer nada do que não estava na lei, mas de reforçar seu cumprimento, especialmente, por se tratar de vulneráveis. Desde então, deputados e senadores da bancada religiosa (*católicos, evangélicos e espíritas*) estavam tentando não somente derrubar a resolução, mas fazer avançar novamente um projeto como o do PL do Estupro. 83 deputados não participaram da votação, mas eles não seriam capazes de reverter o resultado, mesmo se votassem todos contra o PDL-03/2025, doravante chamado de PDL da Pedofilia.
O que estabelecia a resolução do Conanda que foi derrubada? "Diretrizes para o atendimento de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, com prioridade absoluta e atuação integrada dos órgãos públicos; Direito à informação sobre direitos sexuais e reprodutivos, inclusive sobre o aborto legal, de forma adequada à idade; Dispensa de boletim de ocorrência, autorização judicial ou consentimento dos responsáveis; Direito ao sigilo absoluto, escuta especializada e atendimento que evite constrangimentos ou exposição da vítima.". Querem negar inclusive o acesso à informação, sem ela, é impossível saber se você tem ou não tem algum direito. É o paraíso dos pedófilos, protegidos pelos religiosos que se dizem defensores da vida.
Observem que o objetivo é barrar o acesso ao aborto para meninas que foram ESTUPRADAS, algo garantido por lei desde 1940. E os dados são assustadores: "Em 2023, quase 14 mil meninas nessa faixa etária tiveram filhos no país, mas apenas 154 tiveram acesso ao aborto legal." A decisão do Conanda poderia ajudar a diminuir o problema, porque efetivamente meninas pelo Brasil inteiro estão tendo o seu direito negado, várias delas condenadas a morrer durante uma gravidez que sempre é de risco, abandonar a escola, ou se verem "casadas" com seus abusadores. E o deputado Otoni de Paula (MDB/RJ), que é pastor, veio com a história de que o PDL tem como objetivo "frear a indústria do aborto, a cultura da morte". Não! Quer é espezinhar e punir ainda mais as meninas vítimas de estupro.
O senso que saiu esta semana mapeou que existem pelo menos 34 mil crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos vivendo em uniões conjugais. A maioria absoluta são meninas e seus parceiros homens mais velhos. O Brasil ocupa a sexta colocação no ranking de casamentos infantis feitos pela UNICEF. Isso deveria ser mais assustador do que os 154 abortos legais, ou a resolução do Conanda, mas não é, porque, bem, os deputados e deputadas que votaram contra os direitos das meninas não se importam realmente com elas, nem querem prejudicar os homens que se apropriam de seus corpos e manipulam sua vontade, já que, pela lei, elas não são capazes de consentir.
Segundo a Folha, o texto aprovado pelo Congresso "(...) chama o direito ao aborto previsto por lei de "deturpação ideológica" e afirma que o Conanda "cria tipos penais e extrapola seu poder de regulamentar". Já o Ministério das Mulheres emitiu uma nota dizendo que "A gestação forçada é a maior causa de evasão escolar feminina e leva à morte de uma menina por semana no Brasil. A resolução do Conanda, construída com a participação da sociedade civil, não ultrapassa suas funções e nem cria novos direitos, ela apenas detalha como aplicar a lei para salvar vidas". Se passar no Senado, nem precisa de sanção presidencial. De novo, é preciso mobilização nas ruas, porque é necessário evitar, também, mais um desgaste para o STF, porque certamente a coisa irá parar lá.
Fora isso, o PDL exige que a privacidade da vítima seja violada, porque torna obrigatório o Boletim de Ocorrência, algo que é dispensado em caso de estupro. Vocês sabem, coloquei os dados, que na maioria dos casos o criminoso é conhecido ou parente da vítima, então, a denúncia dificilmente vai acontecer. Segundo a criminalista Mariana Rieping, "A lei brasileira é clara: basta o relato da vítima e o consentimento. Ao tentar transformar a objeção de consciência em uma forma válida de recusa, o PDL subverte a lógica da proteção à vítima e abre perigoso precedente para a interferência de valores pessoais na garantia de um serviço público de saúde”. Lembrem do caso da menina de 10 anos estuprada no Espírito Santo e que não conseguiu acesso ao aborto em seu estado, teve seu nome vazado por grupos religiosos bolsonaristas e viveu um inferno junto com sua avó. Tudo, claro, com o apoio da ministra na época e atualmente senadora, Damares Alves. A menina, a vítima, foi demonizada e gente de bem ficou desejando sua morte e castigo eterno.
A autora do PDL-03/2025 é uma mulher, a deputada católica bolsonarista Chris Tonietto (PL/RJ). Ela é uma das mais vocais defensoras do confisco de qualquer direito à interrupção da gravidez, mesmo ao custo de morte da mulher ou da criança estuprada. A urgência na votação foi estratégica. Os deputados a favor do PDL da Pedofilia aproveitaram-se, com a conivência de Hugo Motta, da COP 30 e da chacina no Rio de Janeiro para passarem essa violência contra crianças e adolescentes estupradas. Trata-se de uma insanidade, o que está em curso.
Há criminalistas que apontam que esse PDL é inconstitucional, porém, nada impediu que esses deputados e deputadas avançassem com essas propostas. É preciso fazer com que os seus eleitores e eleitoras fiquem sabendo do que se trata isso, porque muitos não sabem e dar o nome que merece: é PDL da Pedofilia, sim. E, caso queiram saber quem são os apoiadores do PDL da Pedofilia, é só clicar aqui.






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