Achei por acaso essa matéria sobre o Takarazuka na internet enquanto procurava o link de um artigo meu (*e descobri que é a única referência em português no verbete sobre Oscar da Wikipedia*) e achei que valia a pena traduzir. E não deixa de falar da exclusão da smulehres do Kabuki, para aqueles que acham que sempre foi assim, quando, na verdade, é algo muito recente. É de 2006, mas continua atual, pois fala do Takarazuka e da Rosa de Veralhes. (ベルサイユのばら) A biografia de Shirahane Yuri está aqui. As informações da montagem da Rosa de Versalhes - Fersen e Antonieta estão aqui.
A Alternativa Feminina do “Kabuki”
O mundo japonês tradicional do teatro Kabuki é masculino, com atores homens desempenhando mesmo os papéis de mulheres. Mas há também um apaixonado outro lado: o Teatro Takarazuka – uma trupe de mulheres, para mulheres. A companhia rigorosamente treinada, estrelada por jovens mulheres solteiras e que tem se apresentado por quase um século, vem atraindo gerações de devotadas, ainda que fanáticas, fãs.
Hisako Fujimatsu, uma funcionária de escritório de 35 anos, tem ido assistir ao Takarazuka desde que sua avó a levou a uma das peças quando ela tinha 3 anos de idade. “Atrizes fazendo papéis masculinos são atraentes de uma forma diferente dos homens reais,” ela diz. “Elas são gentis, elegantes, bonitas e tolerantes. E acima de tudo, é bom que elas existam somente no mundo dos sonhos do palco.”
Com um regime de treinamento rígido semelhante ao do Kabuki – que baniu as mulheres de seus quadros desde o século XVII – somente as formandas da Escola de Música do Takarazuka tem permissão de subir aos palcos. Elas estudam por dois anos e tem idades entre 15 e 18 anos, com 50 moças entrando anualmente. Suas carreiras na Revue pode ser curta, já que elas devem abandoná-la em caso de casamento, embora algumas continuem carreiras lucrativas na TV ou no cinema.
O Takarazuka, com um teatro em Tokyo e muitos outros no oeste do Japão, tem cerca de 470 atrizes, divididas em cinco trupes com os nomes de Flor, Lua, Neve, Estrela e Cosmos. O lema do Takarazuka é “Humildade, Beleza e Graça.”
“No Japão, nós temos a cultura do Kabuki na qual homens fazem os papéis das mulheres. No Takarazuka é o oposto. As atrizes fazem os papéis dos homens dos sonhos das mulheres. E a audiência fica fascinada,” diz a jovem atriz principal Yuri Shirahane. Shirahane está vestida com um vestido com panniers [1] como uma princesa do século XVIII para viver o papel principal na mais amada peça da companhia, A Rosa de Versalhes, uma versão japonesa de Maria Antonieta.
Desde sua primeira adaptação para comédia (?) musical em 1974, A Rosa de Versalhes atraiu mais de 4 milhões de japoneseas – em sua maioria mulheres de meia idade e suas filhas. Entre elas a própria Shirahane, que assistiu o riquíssimo espetáculo do Takarazuka pela TV quando era menina.
Baseada em um mangá cult publicado em pela primeira vez em 1972, A Rosa de Versalhes (Berusaiyu no bara) conta a história da opulenta última rainha da França de uma perspectiva feminina. O mangá mostra a ficcional Oscar-Francois de Jarjayes criada como um garoto e que se disfarça de homem para proteger a princesa nascida na Áustria. [2]
A peça foi um momento decisivo para o Takarazuka Revue trazendo para o centro do palco personagens travestidas (gender-bending), diz Atsuro Kawauchi, crítico de teatro e professor no Shukugawa Gakuin College. “O Takarazuka costumava encenar histórias de amor atraindo tanto homens quanto mulheres amantes do teatro,” diz Kawauchi. “Mas os temas das suas peças mudaram desde A Rosa de Versalhes que ofereceu à audiência não somente uma história de amor, mas também companheirismo entre mulheres e auto-empoderamento,” ele diz.
O Takarazuka revue, criado por Ichizo Kobayashi, que foi fundador da Hankyu Corporation of railways, apresentou-se a primeira vez em 1914. Seu nome vem do seu lugar de nascimento, Takarazuka, uma pequena cidade na prefeitura japonesa de Hyogo.
A companhia feminina tem um apelo especial, segundo o crítico Akira Izumo. “As fãs japonesas das atrizes do Takarazuka que representam papéis masculinos provavelmente se sentem mais próximas das atrizes porque elas também são mulheres,” Izumo diz. “Mas o sucesso do Takarazuka também deve muito ao sucesso ao criar estrelas utilizando A Rosa de Versalhes,” ele acrescenta.
Shinji Ueda, 73, lendário diretor da Revue, que escreveu dúzias de scripts para o Takarazuka nos últimos cinqüenta anos, diz que as atrizes se modificaram com o tempo. “A mudança é rápida. Como uma quantidade abundante de informação se tornou disponível pelo mundo a fora, as atrizes sabem o que é bom ou mau e quais papéis trarão benefícios para elas,” ele diz. “Dez, vinte anos atrás, elas simplesmente trabalhavam duro, praticando a sua arte, porque não havia muita informação circulando,” ele acrescenta.
As atrizes que interpretam os papéis mais desejados são celebridades para as centenas de fãs que esperam do lado de fora do Teatro Takarazuka em Tokyo quando o espetáculo noturno da Rosa de Versalhes termina. Os membros do fã clube fazem fila para assistiram as atrizes se retirando. Seguindo um acordo silencioso, as fãs nunca gritam ou se deixam levar pela emoção. Ao invés disso, elas tiram fotos ou dão presentes às atrizes.
O mundo japonês tradicional do teatro Kabuki é masculino, com atores homens desempenhando mesmo os papéis de mulheres. Mas há também um apaixonado outro lado: o Teatro Takarazuka – uma trupe de mulheres, para mulheres. A companhia rigorosamente treinada, estrelada por jovens mulheres solteiras e que tem se apresentado por quase um século, vem atraindo gerações de devotadas, ainda que fanáticas, fãs.
Hisako Fujimatsu, uma funcionária de escritório de 35 anos, tem ido assistir ao Takarazuka desde que sua avó a levou a uma das peças quando ela tinha 3 anos de idade. “Atrizes fazendo papéis masculinos são atraentes de uma forma diferente dos homens reais,” ela diz. “Elas são gentis, elegantes, bonitas e tolerantes. E acima de tudo, é bom que elas existam somente no mundo dos sonhos do palco.”
Com um regime de treinamento rígido semelhante ao do Kabuki – que baniu as mulheres de seus quadros desde o século XVII – somente as formandas da Escola de Música do Takarazuka tem permissão de subir aos palcos. Elas estudam por dois anos e tem idades entre 15 e 18 anos, com 50 moças entrando anualmente. Suas carreiras na Revue pode ser curta, já que elas devem abandoná-la em caso de casamento, embora algumas continuem carreiras lucrativas na TV ou no cinema.
O Takarazuka, com um teatro em Tokyo e muitos outros no oeste do Japão, tem cerca de 470 atrizes, divididas em cinco trupes com os nomes de Flor, Lua, Neve, Estrela e Cosmos. O lema do Takarazuka é “Humildade, Beleza e Graça.”
“No Japão, nós temos a cultura do Kabuki na qual homens fazem os papéis das mulheres. No Takarazuka é o oposto. As atrizes fazem os papéis dos homens dos sonhos das mulheres. E a audiência fica fascinada,” diz a jovem atriz principal Yuri Shirahane. Shirahane está vestida com um vestido com panniers [1] como uma princesa do século XVIII para viver o papel principal na mais amada peça da companhia, A Rosa de Versalhes, uma versão japonesa de Maria Antonieta.
Desde sua primeira adaptação para comédia (?) musical em 1974, A Rosa de Versalhes atraiu mais de 4 milhões de japoneseas – em sua maioria mulheres de meia idade e suas filhas. Entre elas a própria Shirahane, que assistiu o riquíssimo espetáculo do Takarazuka pela TV quando era menina.
Baseada em um mangá cult publicado em pela primeira vez em 1972, A Rosa de Versalhes (Berusaiyu no bara) conta a história da opulenta última rainha da França de uma perspectiva feminina. O mangá mostra a ficcional Oscar-Francois de Jarjayes criada como um garoto e que se disfarça de homem para proteger a princesa nascida na Áustria. [2]
A peça foi um momento decisivo para o Takarazuka Revue trazendo para o centro do palco personagens travestidas (gender-bending), diz Atsuro Kawauchi, crítico de teatro e professor no Shukugawa Gakuin College. “O Takarazuka costumava encenar histórias de amor atraindo tanto homens quanto mulheres amantes do teatro,” diz Kawauchi. “Mas os temas das suas peças mudaram desde A Rosa de Versalhes que ofereceu à audiência não somente uma história de amor, mas também companheirismo entre mulheres e auto-empoderamento,” ele diz.
O Takarazuka revue, criado por Ichizo Kobayashi, que foi fundador da Hankyu Corporation of railways, apresentou-se a primeira vez em 1914. Seu nome vem do seu lugar de nascimento, Takarazuka, uma pequena cidade na prefeitura japonesa de Hyogo.
A companhia feminina tem um apelo especial, segundo o crítico Akira Izumo. “As fãs japonesas das atrizes do Takarazuka que representam papéis masculinos provavelmente se sentem mais próximas das atrizes porque elas também são mulheres,” Izumo diz. “Mas o sucesso do Takarazuka também deve muito ao sucesso ao criar estrelas utilizando A Rosa de Versalhes,” ele acrescenta.
Shinji Ueda, 73, lendário diretor da Revue, que escreveu dúzias de scripts para o Takarazuka nos últimos cinqüenta anos, diz que as atrizes se modificaram com o tempo. “A mudança é rápida. Como uma quantidade abundante de informação se tornou disponível pelo mundo a fora, as atrizes sabem o que é bom ou mau e quais papéis trarão benefícios para elas,” ele diz. “Dez, vinte anos atrás, elas simplesmente trabalhavam duro, praticando a sua arte, porque não havia muita informação circulando,” ele acrescenta.
As atrizes que interpretam os papéis mais desejados são celebridades para as centenas de fãs que esperam do lado de fora do Teatro Takarazuka em Tokyo quando o espetáculo noturno da Rosa de Versalhes termina. Os membros do fã clube fazem fila para assistiram as atrizes se retirando. Seguindo um acordo silencioso, as fãs nunca gritam ou se deixam levar pela emoção. Ao invés disso, elas tiram fotos ou dão presentes às atrizes.
[1] Para um vestido com pannier, clique aqui.
[2] Ao que parece, segundo me contaram, é realmente assim na peça do Takarazuka. Oscar se finge de homem. No anime e no mangá, todo mundo sabe que se trata de uma mulher, ou acaba descobrindo logo, logo, já que ela não finge coisa alguma. Como eu nunca assisti o Takarazuka encenar A Rosa de Versalhes (sob... sob...) precisava colocar essa nota.
[2] Ao que parece, segundo me contaram, é realmente assim na peça do Takarazuka. Oscar se finge de homem. No anime e no mangá, todo mundo sabe que se trata de uma mulher, ou acaba descobrindo logo, logo, já que ela não finge coisa alguma. Como eu nunca assisti o Takarazuka encenar A Rosa de Versalhes (sob... sob...) precisava colocar essa nota.
8 pessoas comentaram:
bem interessante esse texto. nem imaginava que existia uma versão "for girls only" do kabuki.
Achei muito interessante a matéria, e é interessante também notar a segmentação na sociedade japonesa, mangás para homens e mangás para mulheres, teatro representado por homens e teatro representado por mulheres. É bem pitoresco ver algo assim nos dias de hoje, só mesmo o Japão para abrigar algo assim em pleno século XXI - e não estou falando negativamente.
Também não fazia ideia de que as atrizes de Takarazuka acabavam se casando, sempre pensei que elas continuavam representando até a velhice.
Elas se aposentam em média com 30 anos. São poucas as que ficam e fazem papéis de pessoas maduras e idosas.
A comparação com o Kabuki é meio que inevitável. E devo dizer que fiquei meio chocado com essa de Oscar se fingir de homem. Eu nunca tinha ouvido falar disso. E acho até meio estranho. Por mais que as versões de Berubara do Takarazuka sejam...ahn, peculiares, não acho que eles mudariam uma coisa TÃO importante assim.
Quanto a idade das atrizes, a maioria se aposenta até mesmo antes dos 30. Muitas nem chegam a virar joukyuusei (não sei bem como traduzir isso, mas em ingles é algo como upperclassmen, geralmente são as atrizes que já estão há mais de 7 anos na companhia). E há excessões, vide a Kasugano Yachiyo, que entrou na companhia em 1929 e ainda está nela!
Ah, Valéria, quando você tiver um tempo muito grande, eu aconselho que você dê uma olhada na tese de uma doutora australiana. Ela escreveu sobre o Takarazuka e é uma das melhores fontes de informação do Revue. Veja aqui: http://wwwlib.murdoch.edu.au/adt/browse/view/adt-MU20050310.103233
Igor, eu também achei estranho. Mas o texto da matéria diz isso, então, coloquei a notinha. Quem me passou a informação foi uma professora que ficou no Japão algum tempo. E ela é fã do takarazuka, assistiu vários espetáculos e tal. O marido dela é japonês ou filho de. E esse livro, eu tenho. Foi ela quem indicou. :D Só não terminei de ler ainda. ;) Valeu a sugestão.
A matéria sobre o Takarazuka é bem interessante, no entanto vale ressaltar o porquê do banimento das mulheres no Kabuki.
No inicio (e durante mais de 25 anos), o Kabuki era constituído única e exclusivamente por mulheres interpretando tanto personagens masculinos quanto femininos. As apresentações eram sátiras e paródias à religião e a temas cotidianos. Infelizmente ao longo do tempo, o Kabuki "perdeu seu foco", e algumas mulheres se ofereciam como Oirans após as apresentações.
Por este motivo, Tokugawa baniu as mulheres do Kabuki e, "extinguiu” o Kabuki. Somente quase 50 anos depois é que o Kabuki veio a reaparecer.
Com o "reaparecimento", o Kabuki tomou a forma que conhecemos hoje em dia, que é aoresentações dramáticas interpretadas por homens.
@Kadu
Vale lembrar, que essa segmentação da sociedade não era tão grande, foi com a chegada dos ocidentais que houve essa segmentação.
Até pouco depois do inicio do periodo Edo, não havia uma grande diferença entre homens e mulheres, como ainda hoje existe.
Capucena, esta questão é disputada. Havia companhias só de mulheres, mas havia companhias de homens e mulheres. Aliás, as mais importantes eram mistas. E, apesar deste recorte popular, apresentavam-se até para a família imperial.
Outra coisa, a desculpa da prostituição foi usada, mas os atores que substituíram as atrizes nos papéis masculinos eram igualmente requisitados.
Foi na mesma época que expurgaram o Kabuki que, por exemplo, proibiram camponeses e comerciantes de portarem armas, expulsaram os missionários cristãos, diminuíram ao mínimo qualquer contato com o exterior.
Vejo essa expulsão como um fenômeno de "ordenamento" do mundo. E esse ordenamento era aristocrático e patriarcal. E, claro, a desculpa moral (prostituição) foi somente desculpa, pois os querídissimos shoguns só baniram as mulheres de uma área muito popular, atrelando á profissão de atriz (como no ocidente, aliás, a pecha de prostituição), mas não acabaram com a prática, que no Japão floreseceu e floresce de múltiplas formas.
Por tudo isso, a resposta fácil atriz de kabuki=prostituta, para mim não serve.
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