sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Entrevista com Riyoko Ikeda - Final



Finalmente terminei a tradução da entrevista que Riyoko Ikeda deu para a edição italiana da Rosa de Versalhes. Estava com um pouco de preguiça de terminar. esta última parte é também a que eu menos gosto e que mostra as contradições de Riyoko Ikeda e como ela tem uma visão fechada em relação aos usos do mangá. Entendo qeu ela se preocupe com a espontaneidade e caráter popular do mangá, mas não ver com bons olhos o seu estudo acadêmico e considerá-los como péssimo material para estar em sala de aula é um exagero. ao mesmo tempo, ela se orgulha da Rosa de Versalhes ter ajudado a mudar a visão que as pessoas tinham sobre mangá... É isso, para as outras partes da longa entrevista, é só clicar: 1 - 2 - 3 - 4 - 5 - 6 - 7 - 8 - 9 - 10.
ENTREVISTADORA: Qual foi o desafio mais difícil que a senhora enfrentou em sua nova carreira de cantora lírica?

RIYOKO IKEDA: No início achei muito difícil aprender italiano, necessário para qualquer cantora, mas depois de algum tempo me habituei. Vocês usam uma língua realmente complexa!

ENTREVISTADORA
: Recentemente a senhora voltou a desenhar ocupando-se de dois projetos: o que pode falar sobre eles?

RIYOKO IKEDA: Certo. O primeiro é a transposição para os quadrinhos do roteiro da telenovela coreana “Tae Wang As Shin Gi” (A Lenda do Grande Rei e dos Quatro Guardiões), uma série do gênero histórico-fantástico que está fazendo um grande sucesso mesmo aqui no Japão. Em Japonês se chama “Taio Shijinki” e, assim como aconteceu com A Rosa de Versalhes, foi transformado recentemente em espetáculo teatral da companhia Takarazuka. Também estou me ocupando de uma série muito divertida, uma releitura irônica da Rosa de Versalhes intitulada “Berubara Kids” que é publicado em tirinhas na edição de sábado do jornal Asahi Shinbun. Também tenho um caderno onde anoto várias idéias e tenho anotadas cerca de quinhentas que poderei desenvolver em novos mangás, não somente do gênero histórico; então um dia talvez possa acontecer que alguma dessas idéias veja a luz!

ENTREVISTADORA
: Recentemente os mangás se tornaram matéria de estudo na universidade. O que acha disso?

RIYOKO IKEDA: É uma iniciativa com a qual não concordo muito. A força do mangá vem do fato de ser fruto da cultura popular e quando se começa a estudá-lo e analisá-lo é provável que ele perca a sua espontaneidade. Quando um famoso museu pediu algumas das minhas imagens para uma exposição eu recusei, porque não acredito que os mangás sejam obra de museu: por exemplo, também o Kabuki quando começou a ser considerado uma arte e não um entretenimento popular, terminou por perder o seu fascínio e somente recentemente se deu conta desse erro imperdoável. Não quero que os mangás tenham o mesmo fim.

ENTREVISTADORA
: E em relação à escolha, sempre muito freqüente, de ensinar na escola usando mangá?

RIYOKO IKEDA
: Também em relação a isso, sou contra. As crianças não são estúpidas e quando um adulto decide utilizar um mangá para fazê-los estuda, eles se sentem enganados. Há livros muito mais adequados para estimular a sua curiosidade e não é absolutamente coreto acreditar que um texto com partes complicadas seja considerado fora do alcance de uma criança.

ENTREVISTADORA
: Que tipo de educação a senhora recebeu e que livros leu quando pequena?

RIYOKO IKEDA: Gostava muito de Souvenirs Entomologiques de Jean-Henri Fabre, que aconselho a todas as crianças. Naturalmente, eu lia também alguns mangás, que naquele tempo eram considerados não somente como produtos descartáveis, mas também acima de tudo como um gênero pouco educativo. Minha mãe, porém queria que eu fosse exposta a uma riquíssima variedade de estímulos, de forma que pudesse escolher qualquer coisa que me agradasse e a qual pudesse me dedicar quando adulta. Ela percebeu que eu gostava de quadrinhos e creio que era por isso que me permitia ler muitos deles, ainda que antes de chegarem em mim passavam todos pelos seus severos olhos de censora! Me fazia também ter aula de piano, canto, de koto [instrumento musical de cordas japonês], de cerimônia do chá e me acompanhavam a muitos espetáculos teatrais. A única coisa que não me agradava era o teatro No, mas apenas disse que não me interessava e ela não me obrigou mais a ir aos espetáculos. Mas amava muito as várias formas de espetáculos populares, como os trovadores e os atores que se apresentavam na rua. Eles tinham algo de “obscuro” que exerciam um fascínio misterioso sobre mim, diametralmente oposto ao dos espetáculos opulentos que eram apresentados em palcos iluminados, ainda hoje prefiro a escuridão à luz, a considero mais estimulante.

Naturalmente lia também muitos livros e romances. Os eventos da Rosa de Versalhes nasceram da leitura do livro de Zweig, que me deixou apaixonada quando estava no colegial. Todavia, naquele tempo aquele livro contribuiu para despertar meu interesse pela figura de Maria Antonieta, pensando sobre ela criei o nome A Rosa de Versalhes, mas não pela Revolução Francesa em geral. Estas passagens só me interessaram quando eu comecei a desenvolver o projeto do mangá para o que era uma revista comercial, e que, portanto, tive que criar personagens e histórias capazes de atrair a atenção do público. Foi nesta fase que nasceram todos os outros personagens e a rosa deixou de ser uma só!

ENTREVISTADORA
: Uma última pergunta: o que lhe deixa mais orgulhosa em ter sido a autora da Rosa de Versalhes?

RIYOKO IKEDA
: Quando o publiquei, os mangás eram livros que se liam uma vez e depois se jogava fora. A Rosa de Versalhes se tornou a primeira obra que fez o público refletir se valia a pena colecionar e tê-la em sua biblioteca. Deste ponto de vista, é um mangá que fez mudou completamente a percepção deste gênero pelo grande público e esta é uma coisa que me deixa extremamente orgulhosa. Sou também felicíssima que tantas pessoas em todo mundo leram o mangá com prazer e o amam até hoje, depois de tanto tempo!

FIM

6 pessoas comentaram:

Nossa, não li nem vi Berubara, mas acho essas entrevistas maravilhosas. É sempre tão legal saber o que pensa um autor, como ele lida com a sua obra. Espero ler e gostar de Berubara algum dia.

Acho que entendo o ponto de vista da Ryoko Ikeda, eu imagino o que ela sente quando pensa em suas obras em um museu. Hoje em dia fala-se tanto em Sítio do Pica-pau amarelo que eu nunca consegui gostar dele. Quando as pessoas colocam determinadas coisas em um pedestal fica muito difícil atingir aquele público que se pretendia atingir. I.E.Tentei ler David Copperfield duas vezes, da primeira vez uma tradução mais atual, totalmente preciosista, vocabulário requintado, estruturas arcaicas, da segunda vez peguei um livro do fim dos anos 40 no meu trabalho, a leitura era muito mais acessível e o livro que me parecia uma sessão de tortura alguns meses antes se tornou uma delícia (ainda mais vendo as antigas normas de escrita da nossa língua). É absolutamente sensacional quando algo é feito com a intenção apenas de agradar, sem cultuar nem congelar.

Na cultura japonesa eu as vezes paro para analisar, as herdeiras diretas das gueixas seriam as Hostesses. É praticamente a mesma coisa só que de uma forma evoluída. Enquanto as gueixas minguam e se tornam uma atração turística as hostesses aumentam em número a cada dia fazendo a mesma coisa que as gueixas sempre fizeram, entretendo pessoas (que provavelmente não têm com quem falar), assim como as gueixas eram as celebridades de 80 anos atrás, hoje as hostesses têm a sua vez de aparecer na televisão e serem tema de livros, filmes e mangás.

Não sei se é bem por aí... Acho que ela não vê quadrinhos como algo que pode ser estudado e, sim, merece se lembrado. Acho que o risco de engessamento é uma impossibilidade no caso dos mangás, sabe? Porque para cada clássico - e Ikeda se orgulha das pessoas colecionarem seus mangás, o que é o mesmo que colocar em um museu - existem trocentos materiais que jamais terão este status.

Mas entendo seu ponto em relação aos livros. Mas O Sítio é muito legal. É que você não viu a melhor transposição para a TV. Você nem deveria ser nascido na época.

Não sabia que ela estava trabalhando em um mangá de Taiou Shijinki (é o nome japonês do drama). Ele foi adaptado duas vezes pelo Takarazuka ano passado. Tenho o DVD de uma das versões. É visualmente impactante. Alguns dos melhores figurinos que eu já em qualquer peça do Takarazuka. Combina bem com a arte da sra. Ikeda.

Eu cheguei a ver um pouco do Sítio pela TVE (em uma época que tv a cabo era raridade e o sinal da TVE era um dos poucos bons o suficiente e por isso tive sorte de ver muita TVE e TV Cultura), o que eu nunca curti foram os livros. Acho que o português dos livros é muito engessado para uma criança, reparei agora que nunca recomendo Monteiro Lobato no trabalho, sempre recomendo Pedro Bandeira, Júlio Emílio Braz, Grupo Confabulando, Stella Carr-Ribeiro e Márcia Kupstas, mas nunca lembro do Monteiro Lobato, deve ser implicância minha.

É implicância sua, sim. Monteiro Lobato continua sendo ótimo, aliás muito melhor do que os autores contemporâneos. E não é que eu não goste de Pedro Bandeira, eu adoro os Karas.

O que eu sempre achei sacal era a Coleção Vaga-Lume. Meu irmão caçula adorava.

Eu amo a Coleção Vagalume até hoje, eu acredito que ela fala muito mais aos adolescentes que 90% do que é lançado hoje. É uma leitura fácil, rápida e instigante. Eu nem citei essa coleção, mas amo vários dos livros que sairam nela.

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