sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Guestpost: Primeiras impressões sobre Tonari no Kaibutsu-kun



A Juliana deixou um comentário no meu post sobre o caso Carminha, fazendo a ponte com o anime que estreou na semana passada, Tonari no Kaibutsu-kun (となりの怪物くん), baseado no mangá de Robico.  Eu mesma tinha escrito no meu post sobre  Suki-tte Ii na Yo。 (好きっていいなよ。) que iria esperar o segundo episódio de Tonari para comentar. Devo fazer isso neste fim de semana.  Parte das minhas impressões do primeiro capítulo se aproximam do que a Juliana escreveu, talvez, discorde de alguns pontos, mas, no geral, o primeiro episódio fez piada com questões muito espinhosas.  Quanto a história de que Haru não teria dito "vou te estuprar", mas minhas scanlations do mangá está escrito exatamente isso... No original em japonês, o que está escrito?  Alguém pode tirar a dúvida?  Enfim, segue o texto da Juliana, que é estudante de História na UFAM, portanto, futura colega.  O contato dela é este aqui.  Segue o texto:

Escrevo esse guest post a pedido da Valéria, na realidade esse post é um desabafo mesmo. Arigato mil vezes a Valéria pela oportunidade!!!

Tonari no Kaibutsu-kun estreou semana passada, e nos apresenta a história de Shizuku, uma tsundere que não se importa com ninguém, apenas com seus estudos, e Haru, um valentão que ora é perigoso e agressivo, ora inseguro e sensível. Tinha muitas expectativas em torno dessa história, e a empolgação dos que conhecem o mangá me contagiou.

As expectativas que eu tinha logo se transformaram em uma desconfiança, e da desconfiança, percebi que minhas suspeitas estavam certas. Estava diante de mais um anime onde a comédia e o carisma dos personagens mascaram a violência que a mocinha sofre, afinal “o importante é apenas se divertir”; Tonari no Kaibutsu-kun faz isso tão bem, é tão cativante que não estranhei a aprovação quase total do público. Ninguém consegue se incomodar com as brutalidades de Haru quando tudo é feito de forma tão divertida. Isso é o que mais me irrita! A violência no anime é até notada pelas pessoas, mas “deixa pra lá, vamos focar na comédia”. Ou seja, o ato é aceito, e bem aceito, desde que o público possa rir muito, Shizuku pode apanhar, porque o foco é comédia, se fosse um drama, aí sim o povo se indignaria. Ou talvez até não...



A aproximação do casal ocorre quando a professora sem noção pede para Shizuru entregar umas cópias para Haru em troca de um livro. Haru é conhecido por sua extrema violência, e após marcar a parede com o sangue de outro valentão é suspenso. Por que diabos uma professora pede para uma menina quieta ir ao encontro de um valentão, sabendo que ele responde tudo com o braço, e que poderia reagir mal (como reagiu) contra Shizuku eu ainda não entendi.

O fato é que ele realmente reage e ataca Shizuku achando que ela está o espionando a mando da escola. Nesse primeiro contato duas coisas se repetem ao longo do episódio: o medo que Shizuku tem de Haru, e o comportamento bipolar deste, quando constata que a menina não é uma espiã, acha que ela é sua amiga e a trata de forma bizarramente amigável.

Após receber sua recompensa, Shizuku é atacada novamente ao sair da escola. Se o primeiro contato deles não chegou a me escandalizar, não posso dizer o mesmo do segundo. Haru a ataca e lhe ameaça caso não fique quieta. Há muita discussão sobre o que Haru disse, principalmente porque em algum fansub a frase de Haru foi traduzida como “vou te estuprar”. Foi o único ponto espinhoso que fez muita gente pular para defender Haru, e acusar os conservadores-sem graça-neuróticos-chatos de fazerem muito barulho por nada. O mais “engraçado” é que na tradução que baixei, a frase ficou: “vou te bater”, e me senti horrorizada de qualquer jeito. Aliás, o episódio como um todo me indignou. Para o resto, a polêmica termina nessa frase. Afinal uma comédia romântica não pode ser criticada, é só diversão, eba!

A discussão girou mais em torno do significado da palavra, “estuprar” ou “bater”, do que com o contexto geral. Não vi ninguém reprovar o comportamento abusivo de Haru, só elogios ao seu jeito singular e sua personalidade variada que gera muita graça. “Gente ele não quis dizer estuprar, ele ameaçou sim, mas não foi pra tanto”. Nossa, quer dizer que se um delinquente te agarra à força, te afasta da vista de todos, ele pode falar qualquer coisa, que o ato em si não é violento? Estuprar, bater, fazer uma besteira, não dizer nada... é irrelevante? Tá...



Nesse momento as novas fãs de Haru, defendem: “ei, mas foi só modo de dizer, ele não ia fazer nada com ela não, está óbvio”. Óbvio? Haru é violento e impulsivo, responde tudo na mão, ainda mais se estiver se sentindo ameaçado. É claro que ele não estava falando sério...

Haru não sabe o que é gentileza, é impaciente, grosseiro, mas tenta se encontrar na situação que se colocou: como o novo amigo de Shizuku. Quando estão lanchando, ele bate na mesa com violência, só para saber se a amiga se divertiu na escola. É evidente que ele não sabe como lidar com as outras pessoas, e esse é o ponto chave do romance. Nenhum dos dois sabe lidar com pessoas. Tinha tudo para ser bem trabalhado.

Após ouvir umas verdades de Shizuku, lógico ele reage mal e derrama suco na cabeça dela. Shizuku não é uma menina fraca. Ela reage, faz o mesmo, e faz algo mais lúcido ainda, ela corre. Porque sabe o que aconteceria se Haru a pegasse. E mais uma vez posso ouvir pessoinhas dizendo: “ah, mas ele não ia machucar ela não”. Só digo isso: “que bom que ela correu”.

A sequência de Shizuku enfrentando os “amigos” de Haru, ele lhe defendendo, a chegada em casa até a declaração foi linda. Se tivesse terminado ali, eu teria esperanças de que as coisas iriam se ajeitar. Mas Haru passou de um perseguidor, para um perseguidor com a aprovação de Shizuku. Foi decepcionante. Perseguidores transformam a vida de qualquer um em um inferno, e ver uma garota nessa situação como se fosse agradavelmente cômico me irritou muito.



Chegamos ao clímax do absurdo. Os valentões decidem se vingar de Haru, e decidem usar Shizuku como isca para atraí-lo. Haru vai resgatá-la e logo surta achando que fizeram algum mal a ela. Nada anormal, pois qualquer um perderia a cabeça com a possibilidade (interessante que no “sequestro” de Shizuku sua integridade foi preservada, mais do que em todas as cenas dela com Haru); ignorando Shizuku ele parte para o ataque, mas como sempre impulsivo, acaba batendo nela. “Foi sem querer!!!” clama o público. Eu sei, mas a cena foi violenta, grosseira, forte. Odiei-o total. Porém achei que ele se mostraria arrependido, e rastejasse pedindo desculpas.

Para ela aquilo foi a gota d’água. Por que aquilo tudo que ela passou com Haru foi uma brincadeira boba, uma perda de tempo. Em nenhum momento ela toca a questão da intimidação, da violência. Haru e suas esquisitices estão apenas atrapalhando sua vida. Nem chorou por ter sofrido uma agressão. Ela apenas ficou cheia daquilo tudo.

Preciso dizer que Haru não demonstrou nem um pouco de culpa ao derramar sangue da amada? Como não foi intencional, ele deveria ter se sentido péssimo. Ele ficou péssimo sim, mas foi porque ela terminou tudo com ele. A cena final foi a pior: ele a segura pela camisa e dá um beijo grosseiro. Depois diz que não sentiu nada e vai embora. Shizuku não se mostra violada pelo beijo forçado, e sim pelas palavras de Haru.


Quem se divertiu com o episódio pode estar se perguntando por que eu “viajei tanto”. Eu respondo: eu não viajei, eu vi uma menina sendo ameaçada, agredida isso é fato. Haru assim como todos os seres humanos não é bom, nem mau. Porém ele é o típico cara agressivo que é vitimizado. A mensagem que fica é que a culpa é das pessoas que tem medo dele, e não dele que impõe medo. E não falo de alguém que aparenta ser o que não é, falo de um carinha que arremessou outro longe porque perdeu no jogo.

Aprender a tratar alguém com cuidado. E aí que espero que Haru encontre seu caminho. Ele está tentado aprender. Eu não sei se terei ânimo para acompanhá-lo. Eu quero que Haru mude. Não quero que ele continue o delinquente que é, porque achar que o jeito dele é bom o suficiente para amar a Shizuku é cruel demais. Se Shizuku não se incomoda com o jeito agressivo dele, ela também precisa de ajuda. Pensar que uma garota fria que nunca se importou com ninguém, mereça um amor violento e difícil de lidar como lição, é doentio.

Essa temática de garoto violento que “precisa” da mocinha boazinha para ser “salvo” é irresponsável. E a mocinha quem salva? O intimidador vira vítima, excluído do mundo, onde somente sua amada o entende. É o que vemos o tempo todo na vida: meninas que apanham de seus namorados, precisam de permissão para sair, ligar para dizer onde estão. Elas acham que a culpa é do mundo que não entende seus namorados. E que o dever delas é cuidar dos coitadinhos para que não façam besteira. Isso porque em momentos raros, o cara é gentil, e são nesses raros momentos que a menina acha que deve se apegar para continuar na relação. Haru é problemático, sozinho, confuso... mas de jeito nenhum isso é problema para Shizuku resolver. Nenhuma menina merece esse desafio, todas merecem relacionamentos saudáveis, e não relações doentias.

Se o anime vai seguir essa linha, ou se vai mudar, não sei. Vão dizer que um episódio é pouco para julgar tudo, eu também acho; mas isso não me impede de fazer ponderações sobre o que vi, até porque quando as críticas são boas ninguém acha que é exagero. Shizuku tem uma personalidade incrível, não é uma garota agressiva, não é fraca, não é boba. Haru tenta encontrar seu caminho no mundo, tentar aprender sobre sentimentos e atitudes gentis, quer se importar com Shizuku. Eu espero uma redenção, o que não significa ignorar o modo como as coisas foram conduzidas no primeiro episódio.



Eu me assusto quando percebo que os jovens de hoje simplesmente não se importam com essas coisas, conheço muitos jovens e adolescentes críticos, inteligentes, ativos, que tem sonhos e projetos, que sabem escrever e falar bem, que não se acomodam, tem idéias legais e as realizam. Entristece-me quando chega a hora de refletir sobre questões sociais, e eles se fecham com a mais pobre e ignorante desculpa: “ai é ficção, não me incomodo porque não existe”. Separam “diversão” de “reflexão”, e perdem a chance de amadurecer mais um pouco.

Antes de terminar, eu escrevi esse guest post inspirada no post da Valéria sobre a Carminha. Só um conselho para fãs de anime que não posso deixar passar: animes e novelas tem o mesmo peso social. Se incomodar com a violência na novela e fechar os olhos para o mesmo tema em animes não é muito coerente, porque estamos escolhendo onde pode e onde não pode criticar. Assim como Carminha, Shizuru também é vítima de violência, mas são contextos diferentes, porém ambos devem ser questionados. Deixo a reflexão porque muitas pessoas que conheço são ótimas para criticar outras mídias, mas são obtusas demais quando as críticas se dirigem a animes e mangás.

De resto, só agradecer pela enésima vez a Valéria pela oportunidade.

6 pessoas comentaram:

A parte do estuprar está mesmo no mangá em japonês, just my two cents.

Eu fiquei mt intrigada e como sempre levo em alta consideração os posts do blog, resolvi dar uma lida no mangá. Concordo c os argumentos da postagem, s dúvidas. E o que me fez ler até o capítulo mais recente do mangá é o fato da personagem masculina melhorar. Além do que a Shizuku é uma das poucas protagonistas que é admirável e ela que me prendeu a esse mangá.

Ótimo texto.
"E que o dever delas é cuidar dos coitadinhos para que não façam besteira. Isso porque em momentos raros, o cara é gentil, e são nesses raros momentos que a menina acha que deve se apegar para continuar na relação."

E usam isso à exaustão pra justificar um personagem estuprador.

Também sou dessas que se deixou levar pelo hype. Antes do anime começar fui ler o mangá, crente que ia gostar. Achei só mais uma história onde a mocinha sofre nas mãos do namorado abusivo (abuso velado, played for laughs nesse caso). Os primeiros dois capítulos, se me lembro bem, jogam esse problema e tudo é resolvido com "se você continuar a fazer isso não seremos mais amigos :>" e uma coisinha dessas parece ser suficiente pra acalmar um pouco a Fera, ao menos até o começo do volume dois, que foi o máximo que consegui ler.
Apesar da atitude do Haru ser pintada em cores ruins, a autora transforma isso em algo MOE. Porque no final das contas ele é tão foooofo e ama ela, ele só não consegue se controlar! Blergh.
Ouvi gente falando que Kaibutsu era uma subversão do shoujo (assim, da demografia em geral, porque parece que só conhecem o escolar), porque faz piada de clichês. Vi homem falando que Haru é que é homem de verdade, que não é romântico: joga a mulher na parede e chama de lagartixa!
Sobre a palavra "estuprar" naquela situação, tem um texto interessante sobre isso: https://altairandvega.wordpress.com/2012/10/03/words-usually-mean-things-this-is-less-debatable-than-you-think/

Olá! Gostei muito do texto, e realmente concordo com você! Tenho kk o péssimo hábito de ler mangás que acho o traço bonito, e acabei lendo esse mangá até o fim. Já o anime, achei muito fraco perto do mangá, mas os dois primeiros episódios são mais parecidos com os quadrinhos.

Aviso de spoiler: Li o mangá até o final pois o personagem de Haru mostra algumas facetas de alguém ou com bipolaridade ou/e hiperatividade extrema. O que explica várias situações, mas não justifica a sua crítica. Esperei até o fim para ver se ia rolar alguma crítica ou desenrolar sobre esses problemas, mas já aviso que fica tudo meio q superficial mesmo. Uma pena, pois o personagem dele é problemático o suficiente para que a discussão sobre esses problemas existisse...

Um abraço!!

Me senti contemplada pela análise e crítica. Li o mangá quando eu era bem mais nova e eu não conseguia perceber o quão abusivo, agressivo, desrespeitoso o Haru é. Ele tem um comportamento passivo agressivo que faz a gnt questionar "será que ele está sendo violento msm? " " Ele é tão fofo"... Mais pra frente no anime mostra ele seguindo a Shizuku e demonstra um ciúmes doentio do Yamaken, chegando a falar pra ela não ir mais ao cursinho!! Isso é um absurdo! Shizuku não se mostrou abalada, mas aquilo é abusivo!
Tô muito feliz de ter encontrado pessoas que também viram isso e problematizaram a forma que o anime aborda isso! Banaliza demais! Imaginem as cenas mas com pessoas de vdd?! Eu me senti mal de pensar!! Ainda bem que anos depois, revendo a história pelo anime, mais velha agora, pude perceber tantas violências e comportamentos inaceitáveis que infelizmente ainda são comuns e todos como normais ou engracadinhos !
Obg gnt
Desabafei aqui

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