quinta-feira, 28 de abril de 2016

Como os japoneses vêem o embranquecimento (whitewashing)


Já é o terceiro post sobre o assunto o embranquecimento, “Whitewashing”, na TV brasileira e no cinema americano aqui no blog, eu sei. Não queria voltar ao caso tão cedo, mas o Rocket News 24 trouxe uma entrevista de rua com alguns japoneses – todos jovens, ou muito jovens – e eles expressaram algumas opiniões sobre o assunto.  Não poderia deixar de publicar.


As legendas estão em inglês, mas sei que, logo, logo, aparece legendado em português.  Segue meu resumo:

1. Ninguém se mostrou ofendido com a escalação de Scarlett Johansson para Motoko Kusanagi.  Para eles e elas, trata-se de uma grande atriz e ela ficaria ótima no papel.  Eles se espantaram com as críticas feitas no Ocidente.  Queriam uma atriz melhor?  Seria essa a questão? 
2. Depois, estranharam a reclamação e acabam emitindo o mantra básico de que atores e atrizes brancos devem dar maior lucro ao filme do que orientais.  



3. Algo muito importante para os entrevistados, trata-se de um filme baseado em anime e mangá.  Trata-se de fantasia.  As personagens não são realmente japonesas e não faz sentido exigir fidelidade. Aliás,  ter olhos grandes seria algo mais fiel ao original.  (*Voltarei a isso lá no final*)
4. Quando comentam o fato do ator Edward Zo ter sido recusado para as audições em Death Note, “porque não queriam um ator asiático no papel”, há alguma indignação.  Trata-se de discriminação, deveriam tê-lo deixado pelo menos tentar e por aí vai.  No entanto, os jovens terminam quase que aceitando o fato, afinal, “Hollywood é assim”. Não há nenhuma reflexão profunda sobre racismo.



O autor do vídeo termina dizendo que os sentimentos dos japoneses – e 98.5% da população do país é etnicamente japonesa – é de quem não sente na pele aquilo que a minoria de origem asiática nos EUA passa. Eles são representados em todo lugar, são maioria em um país que tende ao homogêneo.  Acrescento que os entrevistados nunca devem ter sentido na pele a rejeição por serem como são, preconceito racial é algo estranho para esses jovens.

Voltando ao ponto 3, ele coloca por terra a idéia de que escolhem “os melhores”, ou que embranquecimento não existe de verdade.  Vejam só, as personagens de Death Note são originariamente japonesas, você não precisa manter isso na adaptação, OK.  A história irá se passar em uma grande metrópole dos EUA?  Talvez.  Então, qual o motivo para não aceitar audições de atores negros, asiáticos, e outros para os papéis principais?  Não faz sentido, mas justamente por isso, faz todo o sentido. E não estou falando de importar japoneses, mas de usar asiático-americanos,  ou, pelo menos, permitir que concorram aos papéis.  



O cinema norte americano torna brancos papéis originalmente escritos para outras etnias.  Katniss em Jogos Vorazes deveria ser morena, baixinha, de longos cabelos negros.  A produção deixa claro que não deseja protagonistas que não sejam caucasianos e pegam uma atriz branca, tingem seu loiro cabelo, e a colocam no papel.  

Em um mundo justo, um ator ou atriz poderia fazer qualquer papel, ser humano ou ET, ser homem ou mulher, ter qualquer cor.  Seu talento brilharia ainda mais.  No entanto, o argumento só vale para quem é branco.  Daí, Otelo pode ser interpretado por um branco pintado de negro, mas Romeu não pode ser um ator negro, proque ficaria estranho e o público não se identificaria.

2 pessoas comentaram:

o cinema japonês é que deveria adaptar esse anime! Sinceramente! to cansado de hollywood!

Um dos únicos casos que eu sei de 'pessoas de cor', como dizem os americanos, que interpretam os papéis de personagens que eram originalmente brancos, é o do musical Hamilton.

E o caso de Hamilton é bem interessante, porque é um musical biográfico sobre um dos fundadores dos EUA, ou seja, todos os personagens que aparecem lá são baseados em pessoas que realmente existiram e que eram, de fato, brancas. Alexander Hamilton e George Washington são latinos, Thomas Jefferson é negro, Eliza Hamilton é asiática, etc.

Isso é uma escolha intencional do autor (e ator principal), até onde sei. Segundo ele, é 'a história da América de ontem contada pela América de hoje', um jeito de fazer os rebeldes revolucionários de ontem ter a cara dos de hoje, e também para dar oportunidades para atores não-brancos brilharem na Broadway, já que eles são ignorados até em papéis 'neutros', onde a etnia do ator não teria relevância.

Gosto da explicação dele, mas é claro, essa escolha de elenco do Hamilton ainda gera uma certa polêmica, mesmo com a aclamação enorme que a peça está tendo.

Enfim, acho interessante contrastar essa situação com a de Hollywood, agora. Fico pensando que se não tiver mais gente não branca nos bastidores, não vai ter mais gente não branca nos holofotes. Mas para chegar nos bastidores, é complicado...

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