domingo, 30 de dezembro de 2012

Comentando Saiunkoku Monogatari #4



Hoje, agora de manhã mesmo, terminei de ler Saiunkoku Monogatari (彩雲国物語) #4. Acredito que será a última resenha de mangá que escreverei este ano e, bem, indo procurar quando fiz a resenha anterior, só posso dizer que fui muito negligente com este que é um dos melhores shoujo mangá que tenho lido e, talvez, uma das jóias que pouca gente conhece. A última resenha que fiz do mangá de Kairi Yura e Sai Yukino foi em fevereiro. Negligência minha, já que estou com todos os volumes lançados pela VIZ aqui comigo nas férias e o último volume sairá nos EUA em abril. Espero resenhar até o volume #8 até lá. Pensei em fazer uma resenha conjunta dos volumes #4 e #5, mas achei que seria injusto, especialmente, quando neste volume há um acontecimento tão importante. Vamos lá...

Quando começamos o volume #4, Shurei ainda está trabalhando disfarçada como um rapaz na Corte Imperial. Há uma falta crônica de funcionários subalternos qualificados e temporários são contratados para minimizar o problema. Estar tão perto de seu sonho impossível – tornar-se uma funcionária pública concursada – é doloroso para a moça, mas é igualmente penoso saber que seu período na corte está terminando, pois ela gosta do trabalho. Já na corte interior, o Ooku de Saiunkoku Monogatari, o pobre imperador Ryuki sofre de saudades da moça e decide que vai “fugir” e visitá-la em sua casa naquela noite e pede a companhia do general Shuei e do vice-ministro Koyu. Trata-se de uma quebra de protocolo, mas o jovem imperador parece disposto a ir sozinho se seus companheiros não o acompanharem... Como evento de fundo, e da maior importância, temos a proposta feita por Ryuki aos seus ministros de que o concurso público seja aberto para as mulheres em caráter experimental. No início do volume, a decisão está em suspenso, já que alguns ministros foram contra e o chefe de Shurei, o Ministro das Finanças, se retirou da assembléia.

Se o volume se concentrasse somente na discussão sobre o concurso e suas implicações para a sociedade como um todo e o status das mulheres em particular, este volume #4 seria excelente. Só que ele foi usado para outras coisas, também. Uma delas, revelar a identidade de Ensei, que já sabíamos ser oriundo da conturbada província de Sa. Ensei se revela um sujeito com um passado trágico, mas nobre – no sentido de ser virtuoso e ter bom caráter – além de muito sábio, pois nos será dito que ele salvou Seiran de mergulhar nas trevas quando o jovem foi deserdado, além de aconselhar Shurei sobre como superar definitivamente a perda da mãe. É um spoiler, mas quem lê a resenha quatro de um mangá deve ter lido o que veio antes ou estar em busca desse tipo de informação, pois bem, a mãe de Shurei morreu por ela. Ficou claramente estabelecido que a mãe de Shurei, por meio de algum artifício mágico, deu a vida para que a menina doente não morresse. Isso deve ter implicações futuras. Ao fim do volume #4, Ensei, e era atrás dele que os bandidos-assassinos estavam, parte, prometendo que realizará seu sonho de passar no concurso provincial e se tornar digno por mérito comprovado de assumir um posto da burocracia imperial. Acredito que iremos vê-lo novamente, e não fui buscar spoilers, é aposta mesmo, pois essa confusão na província de Sa ainda deve render.


Aparecem também dois garotinhos na história, filhos adotivos de um companheiro de "vida bandida" do pai de Shurei e da dama Shusui. Por engano, eles estão atrás de Ensei para matá-lo (*não que eles sejam capazes disso*) e sua função é dar um toque de humor ao volume e possibilitarem aos leitores penetrar na intimidade do chefe de Shurei, Kō Kijin, um homem altamente capacitado e que no dia a dia usa uma máscara que esconde seu rosto. Seria ele horrendo? Na verdade, ele é lindo. Tão lindo que causaria “inveja” a qualquer mulher. Shurei, em especial, já que a moça se acha feiz, coisa que não é em absoluto   Devemos lembrar que para os japoneses a beleza está ligada à delicadeza, ao que é pequeno, finamente esculpido, de aparência frágil. Um homem belo o é por ser assim e exerce fascinação sobre homens e mulheres indistintamente, ainda que isso não seja um atentado a sua masculinidade. No caso de Kō Kijin ficamos sabendo que ele tem dois traumas: foi rejeitado pela mulher que amava (*por ser mais belo que ela? Talvez...*) e causou tanto rebuliço no dia do concurso com sua “beleza” que somente ele e o tio de Shurei - Kou Reishin – conseguiram passar.  A máscara resolveu o problema e ninguém fala do assunto... 

Assim como o pai de Shurei – que era um assassino à serviço velho imperador – o tio da moça só se finge de tonto e cordial. Quando os homens dessa família abrem os olhos é sinal de perigo! Como todo mundo vai parar na casa de Kō Kijin por causa dos garotinhos, ficamos sabendo de uma série de detalhes e que o tio da moça usou seu subordinado, Koyu, para colocar Shurei no trabalho temporário. Ao que parece, Kou Reishin é admirador extremado do irmão e quer abrir as portas para que a sobrinha, a quem muito estima, realize seu sonho. Isso é o que parece... Então, para conseguir seu intento – abrir para a sobrinha a possibilidade de fazer o concurso – ele precisava impressionar o outro ministro mais poderoso, Kō Kijin. Este, muito perspicaz, sacou logo de início que Shurei era uma moça... Já Shurei, não reconhece no nobre sem máscara o chefe que tanto admira.  Aliás, fico imaginando se ele não está apaixonado por ela... Mas vamos ver o caminhar da história...

Depois de um volume sem se verem, Shurei encontra com o imperador novamente. Eu gosto muito de Ryuki, de como ele é clueless em matéria de amor e sexo, de como ele acaba se sacrificando para abrir para Shurei a possibilidade de realizar seu sonho.  Ele é altruísta e tem plena compreensão de que a moça que ele tanto ama iria perder seu brilho se fosse obrigada a voltar para a corte interior, ela quer ter um papel no mundo.  Ryuki sabe o quanto a moça se sentia inútil no Ooku, de quão talentosa ela é, mas algo dentro dele diz que se ela realizar seu sonho, eles talvez nunca fiquem juntos. A melhor cena dos dois é  a que ele dá para Shurei um galho de cerejeira para que ela possa tentar fazer seu jardim florescer novamente é bonita, ainda que termine em uma piada... A moça lhe é grata mas pondera para que que só um tolo plantaria uma cerejeira no verão e só um tolo iria contra a tradição como ele está fazendo. Kō Kijin coloca claramente para o tio da moça que abrir o concurso não é só uma medida pontual, algo que vai beneficiar somente Shurei, é um ato simbólico que questiona toda a organização patriarcal daquela sociedade que diz que o governo é para os homens. Ryuki não percebe isso, Shurei sabe bem o impacto que esta decisão terá.


Saiunkoku Monogatari não se furta de discussões muito sérias e o volume termina com Shurei sentindo todo o peso do concurso sobre si. Ela é desafiada por Koyu a passar entre os 20 primeiros colocados, somente isso poderá lhe dar legitimidade entre os concursados. Ele diz claramente que ela será discriminada, pode ter suas opiniões ignoradas e ser perseguida simplesmente por ser mulher. Isso, claro, se passar. E como a nova lei diz que se nenhuma mulher passar no concurso no primeiro ano as coisas voltarão a ser o que eram, Shurei precisa ser bem sucedida e abrir caminho para todas as outras mulheres. A arte nesse volume está belíssima e a seqüência da conversa entre os dois é um primor.  Difícil, doloroso e historicamente realista. Todas as pioneiras de qualquer área tiveram que mostrar que eram melhores que os homens que estavam na mesma posição. Eu dou aula no Colégio Militar de Brasília e as histórias sobre a primeira turma de meninas viraram lenda. E, claro, o último aluno a entrar no quadro de honra – aquele que reúne alunos que foram os primeiros colocados em todas as séries desde a 5ª série até o 1º ano – é a coronel aluna da primeira turma de meninas. Se elas fracassassem, dariam motivo para que as portas se fechassem para outras meninas depois delas. Entendem o peso? Esse é o drama de Shurei. E o concurso foi feito pensando nela, pois até para se candidatar uma mulher tem que ter credenciais que somente uma elite pode conseguir reunir.

Mudanças lentas ou decisões radicais? Qual o poder que um imperador tem para fazer com que a sociedade mude ou permaneça a mesma?  Basta um decreto, ou é preciso algo mais?  Saiunkoku é fascinante, porque mesmo mantendo o casal de protagonistas afastado, ele não faz com que o nosso interesse diminua. Ao mesmo tempo, o desafio de Shurei, a trama abertamente feminista e as autoras questionam sem medo as hierarquias e não caem na armadilha de reforçar o machismo e até a misoginia, pois bem, sua visão sobre os papéis das mulheres no passado e no presente é bem limitada. A China antiga de Saiunkoku não é a China real, mas um lugar imaginário.  O site The Mary Sue fez uma crítica pertinente às fantasias históricas, como Guerra dos Tronos ou Assasssin's Creed, que são capazes de chutar a verossimilhança histórica em quase tudo, menos no que tange ao papel das mulheres. Nesse caso, reforçam de maneira mais absurda uma idéia de limitação, subordinação e castração. Saiunkoku não segue essa vereda e eu espero que tenhamos o melhor de dois mundos no final. Shurei e Ryuki juntos e a moça como alta funcionária do imperador.

Roteiro, arte e personagens, tudo se combina em Saiunkoku Monogatari para fazer uma história que pontua alto tanto como entretenimento, quanto como representação positiva das mulheres. É algo que nos faz falta nos dias de hoje, quando o backlash dentro dos shoujo mangá parece nos vender protagonistas cada vez mais dependentes e orbitando em torno de rapazes que nem sempre merecem o seu amor. Eu estou para sentar e escrever um post comparando Shurei e Misao de Black Bird; se não me enrolar, esse texto sai semana que vem. É isso! Espero correr com as resenhas daqui para frente. Férias servem meio que para isso...

4 pessoas comentaram:

Amooo Saiunkoku Monogatari....infelizmente só vi o anime, mas é perfeitooo, entrou para minha lista de favoritos! Uma pena nenhum fansub traduzir o mangá =/

Saiunkoku Monogatari é uma das pérolas que tenho lido online, as traduções online estão paradas na edição 6, mas como sou fominha já busquei o mangá em chinês e vi como termina haha. Depois disso fui buscar a origem do mangá, e descobri o romance o qual ele foi baseado e me apaixonei mais ainda. Só fico um pouco triste que todos os romances antigos japoneses tenham uma tendência trágica. Outro mangá no mesmo estilo que mescla a época atual com um outro conto é Gekka no Kimi baseado na história de Genji Monogatari.
Questão mangá prefiro Saiunkoku Monogatari, mas em questão de romande clássico japonês prefiro Genji Monotagari.
Anyways obrigada pela resenha, sempre bom que o público seja apresentado à mangás tão bons!

SPOILER__



At age 32, he marries Kou Shuurei. At that point she was a famous official but she gives up her official status and accepts Ryuuki's proposal.
This is also the year when a new girl passes the examinations. This new girl is Shuuran from the Brown Providence and also becomes the first Female Prime Minister of Saiunkoku.
Ryuuki's reign is famed for a period when women were exceptionally famous. Hyou Shusui advanced schooling, Kou Yuri conducted a lot of charity and raised the quality of life throughout saiunkoku. Shuuran governed well. Ran Jyuusanhime was famed in the military while Heki Karin was famed in the arts. Sai Rin became the minister of crafts while being the wife of the Prime Minister.
Kou Shuurei is one of the most famous because her life was not too long.. The year after her marriage, Kou Shuurei died in childbirth at age 30. She died saying "my just a little more time ended" Few records of her life remain leading to her legendary status.
Shi Ryuuki immediately made Riou his successor but Riou gave up his succession right to Shuurei's daughter who lives 70 years as a rare Queen. Riou becomes prime minister after Tei Yuushun Kei Yuuri and Ri Kouyu and restarts the tradition of Hyou family in the government.
Shuurei's daughter is one of the rare Queens of Saiunkoku's history (asides from the ancient queens) and was said to closely resemble her mother.


Resumindo ela morre dando a luz....triste.

Terminei de assistir o anime de Saiunkoku Monogatari hoje e vim logo saber se tinha resenha sua aqui. Me surpreendi por ser um título tão antigo e fiquei maravilhada com a história. Merecia uma terceira temporada para fechar as lacunas em relação a família Hyou e revelar para Shuurei que ela faz parte de ama família com podres mágicos tão poderosa. Sem contar que tantos amores não correspondidos dá aquela pontinha de decepção no quesito romance do anime, mas sem dúvida a protagonista é mais carismática e admirável que já assisti! Determinada, justa, inteligente.. tudo que buscava nas protagonistas de shoujo que envolvem romance!
E foi uma acalento encontrar esse título depois da frustração de Hana Yori Dango e suas relações violentas, abusivas e naturalizadas..
Uma pena realmente o mangá não ser trazido pelas editoras brasileiras. Compraria com certeza, é uma preciosidade para a ludicidade feminina em tempos como o nosso!

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