sexta-feira, 26 de abril de 2019

Presidente oferece as mulheres brasileiras aos turistas, porque o mais importante é não sermos um paraíso gay


"O Brasil não pode ser um país do mundo gay, de turismo gay. Temos famílias. Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro" (Bolsonaro)

Vou contextualizar a frase abominável acima, porque isso é importante para o meu texto.  Ontem, o presidente de nossa nação finalmente comentou a recusa do Museu de História Natural de Nova York de sediar um evento em sua homenagem.  A tal homenagem promovida pela Câmara de Comércio Brasil-EUA rendeu muito e continua rendendo ainda.  O prefeito de Nova York se pronunciou, foi ofendido pelo assessor internacional do nosso presidente, o restaurante caríssimo que seria a segunda sede do evento declinou e, agora, um  hotel luxuoso, terceira opção, está sendo pressionado a não receber a tal homenagem.  Sim, estamos nesse pé neste momento.  

O presidente nega ser homofóbico (*apesar de tudo que já disse*), diz que é um rótulo que lhe colocaram, junto com outros, aliás (*racista, misógino, destruidor do meio ambiente e por aí vai*), mas me saiu com essa frase que abriu o nosso texto.  Nada de novo, lembremos que ele se elegeu focando em coisas como kit gay e mamadeira de piroca.  Pois é, falando em turismo, sabe um país que é visto como um point gay?  Israel.  Será que este país não deveria ser evitado por pessoas como nosso presidente, ou por pessoas que compartilham o mesmo tipo de valores cristãos que ele?  Vai entender, não é?  De repente, esse é um dos motivos para retirar nossa embaixada de Tel-Aviv.  Mas vamos lá!

Pouca coisa me surpreende nesse governo, mas queria mesmo saber se muitos cristãos vão ignorar que ontem nosso presidente defendeu que o Brasil seja um point do turismo sexual, atividade que promove a exploração de mulheres, meninas (*e meninos*), principalmente, e ainda repetir que ele defende "nossos valores". Sim, porque eu ouvi isso do púlpito da minha igreja, que finalmente temos alguém na presidência que defenda os valores cristãos.  Quais, não sei, conheço gente que deixou de frequentá-la por essas e outras coisas.  

O que que estava caracterizado na fala do supremo mandatário da nação é que o pink money, o dinheiro da comunidade homossexual que representa 10% dos turistas do mundo, ele não quer, assim como o dos turistas que vem para o Carnaval, se vocês lembram do fatídico vídeo da "chuva dourada".  Pois bem, mas se quiser vir atrás das mulheres (*e das meninas, talvez*), está liberado e é bem-vindo o dinheiro e a visita. “Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade (...)".  Talvez, não precise nem pedir, é só chegar e ir pegando mesmo, as mulheres brasileiras estão aqui para isso mesmo, agradar gringo.  Se duvidar, é até uma atitude patriótica fazer sexo com o turista.  Enfim, o importante é que sejam relações heterossexuais.

O ônus do turismo sexual é das mulheres e meninas,
o lucro real sempre é dos homens.
Vejam bem, na cabeça de gente que só pensa em sexo e da forma mais suja (*preciso qualificar, sabe?*) e/ou doentia possível, e projeta nos homossexuais os seus piores desejos e horrores, pink money só pode estar ligado a isso. Gays tem famílias e fazem parte de famílias.  Sim, senhor Presidente, todo homossexual tem uma família e famílias são plurais, nem todas são como a sua que  já está na terceira esposa, algumas são mais tradicionais, como a de uns amigos gays e lésbicas que tenho, que são estritamente monogâmicas, como minha e a do meu marido, aliás. 

Enfim, gays compram lembrancinhas, visitam parques, restaurantes, frequentam shows, se hospedam em hotéis e pousadas e fazem outros programas muito úteis para a nossa economia.  Geram empregos, esses que estão faltando.  E alguns vem atrás de sexo, também, assim como muitos heteros, mas ao generalizar as coisas, coloca-se tudo no mesmo balaio.  Segundo Câmara de Comércio e Turismo LGBT, esse grupo movimento ano passado US$ 218,7 bilhões no mundo e o Brasil é, na verdade, era, um dos países que tinha muito potencial em ampliar sua fatia nesse bolo.  

Podem esquecer.
Mas essa obsessão presidencial com os homens gays envolveu nós, mulheres.  E, não, não é engraçado. Não é somente a nossa dose diária de demonstração de ignorância e/ou incompetência. É a naturalização do comércio sexual, uma das formas mais básicas de violência contra as mulheres. Partindo do presidente, parece um aval para que todas as brasileiras sejam consideradas disponíveis como mercadoria. Elas podem ser apropriadas por quem as quiser.  Venha que pegar nossas mulheres está liberado!  De repente, essa demonstração de acolhimento ajude a resolver o problema dos nossos quase 13 milhões de desempregados.

Não há pessoa que possa legitimar esse tipo de fala e continuar batendo no peito que é cristão. Não há. Nem citando Santo Agostinho ("Se a prostituição for abolida, a luxúria incessante destruirá a sociedade", De Ordine), porque o presidente não fez discernimento entre as mulheres "de família" e "as outras" que estão disponíveis para que as primeiras (*e os meninos, também*) não sejam assaltados pelos homens sem freio. São todas as mulheres, qualquer mulher, pode vir e fazer sexo com elas.  É tanta coisa errada nesse raciocínio, começando na homofobia mais deslavada e terminando no machismo mais rasteiro que dá nojo.  Sim, nojo!  Só que não foi o único engulho do dia.

Esta mulher não é o cidadão normal, é um desrespeito à família.
Depois dessa conversa sobre o Brasil não ser um paraíso gay e venham fazer sexo com as brasileiras, que está liberado pelo presidente cristão conservador, veio a história da propaganda do Banco do Brasil.  Enfim, o banco público, o meu banco, fez um anúncio voltado para o público jovem com o intuito de estimular a adesão ao banco.  A propaganda, que era bem interessante, trazia brancos, negros, diversidade, porque somos um país plural.  No meio de tantos jovens, havia uma pessoa trans que eu sequer identifiquei.  Pois bem, a propaganda ofendeu o presidente do Brasil, rapidamente, o presidente do BB aquiesceu retirou a campanha do ar e o diretor de marketing foi demitido.

Segundo o G1, "Ao avaliar o vídeo, o presidente do Banco do Brasil considerou que faltaram outros perfis de jovens brasileiros que o Banco busca alcançar com suas campanhas de publicidade".  Ou seja, o filmete publicitário não tem o tipo de "diversidade" que o presidente acha válida e o supremo mandatário da nação acredita que é seu dever e direito intervir da mesma forma que quer regular o que as pessoas fazem com suas genitais e afetos.  Aliás, nenhuma propaganda governamental poderá usar termos como LGBTI e semelhantes.  Se não falarmos, eles não existem.


Só que o próprio presidente irá falar, afinal, trata-se de uma obsessão, uma forma de canalizar o medo e a ignorância de muitos que lhe deram o voto e garantir que não parem para refletir sobre questões como a reforma da previdência e o desemprego.  Concluindo, é lamentável que tenhamos chegado a esse ponto, que homofobia, misoginia e racismo sejam legitimados pela presidência, mas é o que temos.  Resta tentar reverter isso no voto, nas ruas e em nossas mínimas ações.  


Qual é o coletivo de 'cidadãos normais'?  Essa foto exemplifica.
P.S.1: Como sempre pode ficar pior, o presidente disse ter censurado o comercial por respeito à família, no singular.  De que tipo de família estamos falando, não sei, nem qual ofensa a propaganda cometeu, mas suponho que seja a família tradicional, branca e racista. Agora, o presidente do Banco do Brasil , Rubem Novaes, foi além e disse que "Durante décadas, a esquerda brasileira deflagrou uma guerra cultural tentando confrontar pobres e ricos, negros e brancos, mulheres e homens, homo e heterossexuais etc, etc. O 'empoderamento' de minorias era o instrumento acionado em diversas manifestações culturais: novelas, filmes, exposições de arte etc., onde se procurava caracterizar o cidadão 'normal' como a exceção e a exceção como regra".  Enfim, espero que o BB sobreviva a essa administração e continue, ou volte, a prestar excelentes serviços.  De resto, o cidadão "normal" deve ser o homem branco, hetero, rico, no máximo classe média, e (pseudo) cristão.  Homem do sexo masculino, porque, para esses caras, mulher não é a "norma" é somente o corpo que pode ser apropriado, ou a boca que se presta a reproduzir as narrativas que eles inventam.

P.S.2:  Tinha esquecido de incluir no texto algo que se relaciona tanto com o assédio sexual, quanto com o Banco do Brasil.  Na véspera do Dia Internacional das Mulheres o presidente usou seu Twitter para atacar um curso obrigatório para funcionários do B.B. sobre assédio moral e sexual.  O presidente do banco, posteriormente, suspendeu a exigência.  Escreveu o presidente“Olha só o nível de aparelhamento que existe no Brasil. Isso aqui é processo de educação. Não precisa fazer curso nesse sentido. Nos futuros editais, não teremos mais essa obrigatoriedade. Um conselho que eu dou a vocês é: que se, porventura, alguém que for aprovado no concurso e for exigido esse diploma, você pode entrar na Justiça, que tu vai ganhar (sic). Se bem que eu vou tentar junto ao Banco do Brasil ainda para que se evite isso”.  Viu?  E não adianta dizer que não sabia que ele era assim para se defender.  Quem votou nele, ou lavou as mãos, escolheu esse cenário que vivemos hoje.  Lástima, mas é verdade.

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