Assisti ao filme Aladdin duas vezes, quinta-feira, legendado e sozinha; sábado, com a Júlia e dublado. Gostei bastante do filme, no geral, ele foi bem agradável de assistir e possibilitou o crescimento como personagens tanto de Jasmine, quanto do Gênio. Diferente de Dumbo, a última adaptação live action a chegar na tela grande, o filme é muito mais dependente do original, sendo mais uma releitura estendida do mesmo, do que um produto novo de fato. Problema? Nenhum. Só achei que o filme poderia ter uns dez minutos a menos e ter tido mais coragem e se atirado com tudo em Bollywood.
Nossa história se passa em Agrabah, aparentemente, um reino islamizado da Índia, onde vive o jovem Aladdin (Mena Massoud), um órfão que vive de pequenos roubos, e tem como único companheiro o macaquinho Abu. Um dia, o rapaz encontra uma moça misteriosa e a ajuda a sair de uma grande encrenca. Ele descobre que ela mora no palácio do sultão, mas a jovem, na verdade, a princesa Jasmine (Naomi Scott), mente dizendo que é uma criada. No afã de reencontrar a jovem, Aladdin acaba sendo capturado pelo Vizir do sultão, Jafar (Marwan Kenzari), que estava em busca de um "diamante bruto" que pudesse usar em uma missão perigosa.
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Os dois se apaixonam no primeiro encontro. |
Jafar tem grandes ambições e Aladdin não tem escolha a não ser aceitar a missão que lhe é imposta pelo vilão, indo parar no fundo de uma caverna mágica em busca de uma misteriosa lâmpada. As coisas não saem como Jafar espera e Aladdin consegue não somente um tapete voador, mas termina ficando com a lâmpada e o gênio (Will Smith) dentro dela. Detentor de três preciosos desejos, ele pede para se tornar um príncipe, pois somente assim ele poderia conseguir a mão da princesa. Só que as coisas não seriam tão simples e o caráter de Aladdin seria testado, não somente em relação ao seu amor por Jasmine, mas, também, em relação à amizade com o Gênio da lâmpada. Além disso, Jafar não vai deixar barato o fato do jovem o ter feito de tolo.
Aladdin nunca foi um dos meus desenhos favoritos da Disney. Com certeza, A Whole New World é uma das grandes músicas do estúdio, mas, no geral, outros filmes me atraem mais. O que torna Aladdin singular é que sendo um filme de herói junto com Tarzan, Hércules e outros, ele acaba sendo muito mais associado a uma das princesas, nesse caso, Jasmine. No original, a jovem é somente voluntariosa e não deseja se casar tão rápido, ou com qualquer um. No filme, ela se torna uma princesa empoderada e que pensa mais em reinar como sultana do que em casamento.
Sim, a Jasmine do filme é diferente. Ela é uma jovem que está se preparando para um papel, o de governante, mesmo sendo reprimida a todo momento pelo pai (Navid Negahban), que deixou de ser o bufão do desenho, e se tornou um governante responsável e um pai super-protetor, mas machista, e por Jafar, que beira a misoginia. A nova Jasmine promovida a co-protagonista e faz o solo mais importante do filme, é dela uma música nova chamada Speechless. Nesta canção, ela denuncia a tentativa de a silenciarem, de lhe tirarem a voz por ser mulher. É uma música poderosa, mas acredito que se a sua segunda aparição fosse suprimida, deixando somente o discurso da princesa, seria um ganho para o filme que poderia ter uns 10 minutos a menos.
A realidade é que essa versão de Aladdin é muito musical mesmo. Flertou inclusive com Bollywood, mas não teve a coragem para se jogar de vez e prestar uma homenagem integral ao cinema indiano. Acredito que o filme seria melhor se o fizesse. Essa musicalidade favorece Will Smith, que canta bastante e se sai muito bem como a criatura mágica que deseja se tornar um humano comum. As músicas cantadas por ele tem um toque de hip-hop que me fizeram lembrar do Will de The Flesh Prince of Bel Air (Um Maluco no Pedaço). O Gênio também recebe uma história para si, um interesse romântico, Dalia (Nasim Pedrad), a dama de companhia da princesa.
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Dalia só pensa em casar e, bem, em tudo que vem depois. |
Pedrad tem uma veia cômica muito forte e suas intervenções no filme são sempre engraçadas. Uma das suas melhores tiradas é quando ela insiste que Jasmine se case com o príncipe Anders (Billy Magnussen) e diz que ela nem terá que falar com ele depois de casada. Para a dama, o centro da vida de uma mulher é o casamento, já para a princesa, que é obrigada pelo pai a ficar confinada no palácio, o mundo é muito maior e uma mulher deveria ter maiores possibilidades de realização. Sim, há uma forte veia feminista no filme Aladdin, mas, no fim das contas, tanto Dalia, quanto Jasmine conseguem o que desejam.
Falando de Aladdin, Mena Massoud consegue se sair muito bem como o protagonista. Sua One Jump Ahead é muito marcante e adquiri tons melancólicos. De todas as músicas, esta é aquela em que a versão original é bem superior à nacional. O Aladdin de Massoud demonstra todo peso da solidão, do abandono e da vulnerabilidade, apesar de manter a sua dignidade e capacidade de sonhar. "Riffraff, street rat", ele não teve chance de ser outra coisa. Quando encontra o Gênio, e a parceria com Will Smith é ótima, ele termina tendo o mundo aos seus pés e, ainda assim, consegue vencer a tentação e manter-se íntegro. Seu prêmio? O coração da princesa e a possibilidade de sair da miséria e ajudar os outros.
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Jafar tem muita ambição e ZERO libido. |
Falando de Jafar, bem, ele passou por uma mudança considerável no filme, ele perdeu toda a libido. Ele não deseja Jasmine, ele deseja o poder. Anulou-se aquele temor que muita gente nutria de que Jafar pudesse ter alguma cena sexy com Jasmine. Não há nada, o desenho de 1992 tem muito mais erotismo do que essa nova versão. Sim, essa é a verdade. Aliás, o ator que faz Jafar, Marwan Kenzari, é bonitão, mas tem uma voz que não é nada sexy. A dublagem brasileira acompanhou direitinho e escalou alguém com uma voz quase idêntica. Enfim, fizeram a coisa de tal forma, que o fato de um ator bonitão interpretar Jafar não fez diferença para o público, ou para a relação dele com a princesa.
Enfim, Jafar não demonstra nenhum interesse real por Jasmine e vai além, ele a quer calada, silenciosa, ela não deve ter nenhuma função, ela é, no máximo, um degrau para o poder. E, bem, nesse Aladdin, Jafar não se insinua em nenhum momento para a princesa. Em relação à princesa, ele é somente a encarnação do patriarcado opressor em tela. De resto, Jafar sente-se humilhado e é de fato enquadrado pelo sultão e até pela princesa algumas vezes. No filme, ele tem um passado, foi um ladrão de rua, esteve preso por 5 anos no reino vizinho, que ele quer invadir e conquistar para se vingar, e se corrompeu.
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Um pai amoroso, mas que acredita que as mulheres não devem reinar.
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Salvo por essas mudanças, um maior empoderamento de Jasmine, uma história para o Gênio, e um Jafar sem libido, o filme segue o original de muito perto. Quem queria um filme novo em folha seguindo o que oi feito com Dumbo, deve ter se decepcionado. Já quem queria ver Aladdin de carne e osso, deve ter ficado bem satisfeito, especialmente, quando vê em tela praticamente tudo que está no original. Basta pegar, por exemplo, a sequência da música Friend Like Me. Sim, eu sei, não é o Robin Williams, mas não tinha, infelizmente, como ser, vocês sabem.
Falando no visual, ele é bem impressionante. A sequência da caverna ficou ótima, uma das melhores do filme. A correria de Aladdin na cidade, ou nos confins da terra ficaram muito bem na tela. O desfile do Príncipe Ali por Agrabah é uma mistura deliciosa de escola de samba com Bollywood. Quanto ao figurino, ele bebe em diversas influências e coloca em Agrabah vestimentas típicas de várias regiões islamizadas. Tudo é muito mais colorido que no desenho original e o efeito ficou muito bom.
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Príncipe Ali entra na cidade misturando
Bollywood e Escola de Samba.
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Caminhando para o fim, uma outra alteração importante foi na música Arabian Nights, cujo trecho acusado de ser ofensivo aos muçulmanos, "Where they cut off your ear if they don’t like your face/It's barbaric, but hey, it's home" (Onde eles cortam sua orelha, se não gostam da sua cara/É bárbaro, mas hey, é meu lar), sumiu e deu lugar a "Where you wander among every culture and tongue/It's chaotic, but hey, it's home" (Onde você circula por todas as cultura e línguas/É caótico, mas hey, é meu lar). A própria Disney já tinha mudado esse verso em relançamentos de Aladdin, mas é uma mudança significativa.
A Bechdel Rule não é cumprida, eu acredito, porque quando Dalia e Jasmine conversam é sobre casamento, príncipes e Aladdin/Príncipe Ali, o que não quer dizer que não tenhamos uma personagem muito forte, que é a princesa. De resto, quando vi Hakim, o líder da guarda, fiquei me perguntando de onde conhecia o ator Numan Acar, que interpreta a personagem com toda a dignidade. Enfim, ele é o mulá gente boa de Ali & Nino.
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Ficou bem bonita a sequência do tapete. |
Concluindo, gostei de Aladdin bem mais que de A Bela e a Fera, ainda que considere que o filme poderia ser mais curto. A superioridade de Aladdin fica por conta do elenco, que realmente estava muito bem e da direção. Agora, comparando com Dumbo, acredito que a direção e o roteiro do filme do elefantinho foram mais arrojadas e ousaram se distanciar do original. Quanto à experiência da Júlia, não pretendia levá-la, só que ela pediu muito e meus sentimentos se confirmaram: o filme estava um tiquinho além dos interesses dela. No meio do filme, ela dispersou e pediu para ir embora. ficou até o fim, retomou a atenção, mas em Dumbo, por exemplo, ela não perdeu o foco do filme nenhuma vez.
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