quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Shounen Jump criticada por trazer conteúdo erótico (*Aviso: +16 anos*)


Sim, você leu direitinho.  Depois de ler o artigo do Sora News e olhar a discussão no Twitter, eu tive uma crise de riso.  Quem criticou?  Leitores no Twitter, gente que, talvez, não conheça a história da revista.  Enfim, o que me levou a abrir a matéria, só para início de conversa, foi ter entendido que a Jump tinha colocado uma foto de uma garota DE VERDADE com os seios de fora.  Isso, e alguém me corrija se for o caso, nunca aconteceu na história da revista.

A Jump já foi muito mais violenta.
Como o próprio SN explica, desde sua fundação em 1968, a Shounen Jump vem trazendo meninas e mulheres desenhadas em situações eróticas, algumas delas passíveis de serem consideradas ofensivas no Ocidente.  O que veio mudando com o tempo, talvez, é a representação do romance, até os anos 1980 praticamente ausente, e o conteúdo adaptado aos interesses das meninas e mulheres que curtem Boys Love, com meninos bonitos e amplo espaço para que as leitoras fantasiem a respeito de possíveis casais, ainda que eles só se concretizem em fanzines.  A partir daqui podem aparecer imagens que são para maiores de 16 e NSFW (*não abra no pc do seu trabalho.*).


Há outro fator, também, a revista, que surgiu voltada para um público infanto-juvenil, cada vez tem um número maior de leitores adultos.  O SN publicou dados de uma pesquisa com os leitores feita em 2019, com os seguintes dados: 46,8% dos leitores tem 18 anos, ou menos, enquanto 53,2% tem 19 anos, ou mais.  "Ah, você está dizendo que a revista vem se tornando mais erótica para atender esse tipo de leitor/a?"  Talvez, ela tenha se tornado muito menos violenta, desde um Hokuto no Ken, mas erótica?  Não!  E o SN cita até uma fala do autor de One Piece dizendo que fica satisfeito em saber que seus leitores se sintam sexualmente estimulados pelo seu mangá.  

Na verdade, não, as pessoas compram Shounen Jump, porque gostam do jeito da revista apresentar suas histórias e, claro, esse escândalo todo é FRESCURA, afinal, To Love Ru, que teve uma de suas séries, ou mais de uma, lançada no Brasil, é borderline hentai, sempre foi.  E a Jump já deve ter publicado material bem mais maduro e sexualizado antes, no próprio thread o pessoa posta imagens.  E, sim, coisa que não era moe, era mais realista, por assim dizer.  Clique aqui, é de Hokuto no Ken.  Então, o que há de novo?  Vamos lá, o que é novidade em alguns pontos:
  1. Ocidentais consomem cada vez mais mangás, ás vezes simultaneamente, em relação ao Japão,  e sentem como se esse material fosse seu, também. é certo?  é errado?  Eu, de minha parte, defendo que os japoneses não deem muita bola para as opiniões dos ocidentais, mangá e anime fizeram sucesso por serem o que são sem grande intervenção vinda de fora.
  2. Há gente que gosta de fazer escândalo na internet.  E recebe alguma atenção, ou muita, a depender dos interesses envolvidos.
  3. Norte americanos parecem considerar mamilos, desde que femininos, claro, como algo inapropriado, erótico.
  4. Ocidentais, especialmente os norte americanos, tem muita dificuldade em lidar com a sexualidade e há uma hipocrisia muito grande em torno do tema.
  5. Foi realmente engenhoso o que fizeram, à princípio, ninguém via os mamilos, você tinha que jogar luz azul (*a lanterna foi brinde?*) para desvelar os mamilos da personagem que eram, na verdade, uns bagulhinhos boiando na sopa do outro lado.  Olha, o SN chama de tapioca, não sei se o que chamamos de tapioca é o que nós chamamos, com certeza, não.
Terminando, eu não sou leitora da Jump, eu não sou público alvo de To Love Ru (*e quem lê a série sabe exatamente o que vai encontrar lá*), eu não vou colocar no mesmo patamar uma menina real e uma adolescente desenhada, tampouco advogo que adolescentes não têm sexualidade.  Quem lê a Shounen Jump encontra uma diversidade de materiais, mas o foco ainda é no leitor masculino jovem, que não necessariamente acredita que To Love Ru é a síntese do shounen manga, aliás.  Se alguém quiser ler outra coisa, há uma miríade de revistas no Japão com material muito diversificado.  

One Piece.
Um mangá não define a Shounen Jump, ainda que diga alguma coisa sobre o público japonês, seu mercado editorial e seus limites.  Isso é analisado academicamente e é um objeto de estudo legítimo.  De resto, seria ofensivo DE VERDADE se fosse uma menina nua, não uma piada erótica com uma personagem desenhada em um mangá que, por princípio, é erótico.  Talvez, o negócio fosse perguntar, será que To Love Ru, que eu nem sei quantas séries tem, está no lugar certo?  É possível fazer a crítica, sem ser escandaloso, puritano, ou tentar castrar a imaginação alheia.

6 pessoas comentaram:

Eles colocam tapioca dentro de uma bebida. Eu experimentei quando estava no Japão. Jogue タピオカ no google imagens que aparece. ^^

Então, esse foi um bafafá dos grandes e envolve luta feminista no Japão.

Só para contextualizar, o mangá onde isso aconteceu foi Yuuragi-Sou no Yuuna-San (Publicado no Brasil pela Panini este ano como "Yuuna e a Pensão Assombrada"). Não é querendo te corrigir e pagar de chato, mas pra ficar mais fácil de fazer pesquisa depois. Ah, a coisa de "tapioca" que usaram pra fazer o mamilo da Yuuna é porque é assim que é chamado aquelas bolinhas de chá taiwanês, os tais do Pobá.

Enfim, há cerca de um mês atrás, foi feito um pôster colaborativo da Cruz Vermelha com um mangá chamado Uzaki-Chan, para campanhas de doação de sangue, em uma imagem super sexualizada. Grupos feministas logo vieram à tona, mas foram impiedosamente silenciados sob o pretexto de que "estariam atrapalhando a liberdade artística dos artistas", aquele papo que sempre ouvimos de que "tudo hoje em dia é mimimi"; "o mundo tá ficando chato", etc. Foi uma briga que infelizmente pendeu muito mais para o lado dos auto-intitulados grupos anti-feminismo (!), apesar que surgiram várias pessoas sensatas falando inclusive sobre recorte de gênero, mostrando que o mundo inteiro está engajado em lutas sociais e indo pra frente, apesar dos pesares - contrariando aqueles otakus ocidentais chatos com aqueles argumentos feitos no achismo de "lá ninguém se importa com isso". O lado ruim disso tudo é que por envolver grandes empresas e editoras, tudo é rapidamente silenciado, não chegando a um recorte e discussão profunda como objetificação da mulher.

Pouquíssimo tempo depois surgiu a imagem de Yuuna, que, bem, por mais criativo que seja, é puramente pornografia, sim, e nunca houve nada tão erótico na história da Jump de fato - violência e erotismo mais realista, sim, ainda mais em época de mangás como Cobra, City Hunter e Hokuto. Porém em nenhum desses havia objetificação do corpo feminino pura e simples. Quer dizer, na verdade até havia, mas esses artistas bebiam muita influência ocidental como cartazes Pin-Up e filmes de ação que estavam bombando na época, então não havia tanta conscientização como há hoje. Alguns autores até se arrependeram por suas representações femininas feitas no passado (como o Hirohiko Araki de Jojo em suas primeiras obras). To-Love-RU era erótico, mas muito menos que Yuuna, e quando estrearam a segunda série, que era mais apelativa que a primeira, ela foi mudada de revista (para a Jump SQ), talvez por causa do conteúdo mais pornográfico.

Enfim, o que isso tem a ver é que pela discussão de arte já estar levantada pelo caso da campanha de sangue, e agora com mais esse caso da Yuuna, foi levantada a pergunta de: "por que um material pornográfico está na Shonen Jump, não há ninguém para barrar essas coisas?", que evoluiu para um "por que não há editoras mulheres na Jump?". Com esse questionamento, começou um posicionamento machista de que "na revista principal da Jump não se pode ter editoras porque elas não entenderiam o coração dos meninos". Enfim, foi assumido que não editoras mulheres na Jump Semanal, apesar de haverem nas outras revistas como a Jump SQ e a JUMP+. Assumiu dimensões tão grandes que até autores se posicionaram a favor do "coração de menino", até alguns que eram elogiados por representarem mulheres fortes em suas obras, como o Samidare (autor de "Lúcifer e o Martelo"). É uma diferença muito grande pessoas falarem que "só homens entendem outros homens" em quase 2020, achando que isso interfere em liberdade criativa, do que em 1980, quando estavam descobrindo o que era fazer mangá na forma narrativa que conhecemos hoje.

Por fim, acho que por sermos leitores ocidentais, devemos ter nossa crítica e visão ocidental, sim, por estarmos consumindo o material por aqui. Não podemos deixar de criticar e analisar por achar que não iremos ter a mesma opinião dos japoneses, só porque o "material foi feito para eles, então só eles que opinem".

Vamos por partes:

1. Coloquei o nome do mangá errado. Tenho que corrigir e o farei mais tarde. Obrigada. De resto, difícil acreditar que o mangá de repente ofereceu esse tipo de erotismo de graça, como se o autor tivesse acordado com a personalidade alterada e os editores estivessem cegos.
2. Desculpe, mas não vamos misturar campanha de doação de sangue com objetificação do corpo feminino com mangá. São coisas diferentes e, sim, nesse caso as reclamações são absolutamente pertinentes. Vi o caso, não comentei, mas sei do que se trata.
3. Não coloque panos quentes na objetificação feminina na Jump, essa parte do seu comentários ficou feia. Isso acontecia, acontece e é, também, uma das marcas da revista.
4. Pode criticar, não pode, como coloquei no ponto 3, querer fechar os olhos para o conjunto da Jump. Quem jogou isso no ventilador queria, sim fazer escândalo.
5. Há editoras mulheres no Japão, ainda que elas sejam minoria. Que não tenha nenhuma na Jump, não me surpreende, mas eu duvido muito que ela conseguisse ser editora da Jump sem entender o funcionamento da revista, seus temas e o que o público na média quer e suporta ver.
6. Podemos opinar, podemos analisar, mas eu enfatizei no meu texto e mantenho que nós não definimos o que o mercado lá produz e, claro, eu não sou público da Jump. De resto, é muito simples, há muito mangá, basta não consumir aqueles que lhe ofendem. Se isso interferir nas vendas, as mudanças virão. Aliás, elas sempre vem, o problema é que nem sempre do jeito que a gente quer, mas, bem, o mundo não gira em torno do meu umbigo. Ainda bem, aliás, porque seria muito chato.

O pior de tudo é a hipocrisia dos ocidentais ,quando as séries voltadas ao público adolescente como Baby e várias outras além de filmes, mostram coisas bem piores e ninguém fala nada ,só pq é mangá vem com essa treta.

Não estava misturando, eu citei o caso da campanha de doação de sangue porque fez parte do mesmo escândalo. A da capa de Yuuna foi em seguida dessa, que foi referenciada nos trendings do Twitter japonês, por ambas se tratarem de mercado editorial. Por isso a citação e o texto grande. :)

Os threads que estão no texto não trazem a imagem da campanha de doação de sangue e, bem, mangá é mangá, campanha de doação de sangue é campanha de doação de sangue.

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