Finalmente, a resenha do volume #4! Eu estou em dívida, porque até hoje não fiz as resenhas dos cinco volumes da Rosa de Versalhes (ベルサイユのばら), de Riyoko Ikeda, que a JBC lançou em 2019. Como neste intervalo tivemos governo Bolsonaro e a pandemia da COVID-19, parece que foi em outra vida, mas com os cinquenta anos do mangá, que ainda estamos comemorando, e o anúncio da nova animação, falar da Rosa de Versalhes se torna ainda mais relevante. Pois bem, o volume #4 da edição brasileira corresponde aos volumes originais #7 e #8, estamos, portanto, na reta final da nossa história.
Não vou retomar a história toda, peço que leiam as resenhas anteriores (*volumes 1 - 2 - 3*), mas só para delimitar um pouco as coisas. A Rosa de Versalhes conta a história de três personagens, a rainha Maria Antonieta da França (1755-1793), o Conde Hans Axel von Fersen (1755-1810), seu amante, e Oscar François de Jarjayes (1755-1789), uma jovem da alta nobreza francesa, cujo pai, na falta de um herdeiro homem, decidiu criar sua filha caçula como um rapaz. Oscar, uma personagem fictícia, comanda a guarda real, que tem o dever de proteger a rainha e acabou se tornando a personagem favorita das leitoras, foi deslocada para a posição de protagonista, tornando-se uma das personagens dos mangás mais amadas de todos os tempos. A série foi o primeiro mangá shoujo histórico e rompeu a bolha do seu público alvo, atraindo, desde a época de sua publicação (1972-74), uma legião de fãs adultas, além de homens que também se encantaram pela série.
No volume #3, Oscar começou a tomar consciência de que ama André, seu companheiro de infância, criado pessoal e, neste estágio da história, seu subordinado na Guarda Francesa. André, por outro lado, sabe que está perdendo a visão do olho que lhe tinha sobrado, e isso o deixa em sofrimento profundo. Oscar abre o volume sendo repreendida por sua Ama, a avó de André, por beber demais, este hábito está associado ao turbilhão emocional da protagonista e é sugerido (*mais de uma vez*) que poderá fazer mal para sua saúde. A bebida é uma fuga para o fato de Oscar não ter se decidido ainda sobre como se posicionar em relação à revolução que está às portas (*mais adiante, já decidida, ela larga a bebida*). Permanecer fiel à monarquia, à amizade que tem pela Rainha Maria Antonieta, ou seguir o que sua consciência manda.
A seguir, o volume deixa a intimidade de Oscar e André e passa para o panorama político igualmente conturbado da França, há uma pressão para a convocação dos Estados Gerais, assembleia dos três grupos (estados), que formavam os súditos do rei: o clero, a nobreza e o povo (burguesia, trabalhadores urbanos, camponeses e todo o resto que houvesse). Esta assembleia fora criada no século XIV por Filipe IV (*o Belo, o Rei de Ferro, já recomendei dos Reis Malditos aqui no blog*) em sua luta contra o Papado, ou seja, nas suas origens, os Estados Gerais foram criados para fortalecer o poder do rei, mas em 1789, convocá-lo seria uma demonstração da fraqueza de Luís XVI. Sua última convocação, aliás, havia sido em 1614 no momento em que o Antigo Regime está se montando.
Dentro da Rosa de Versalhes, Luís XVI é apresentado como alienado dos seus deveres, indeciso e incapaz de tomar as decisões por si mesmo. Ainda que a autora tenha dito em entrevistas recentes que ele é sua personagem masculina favorita do mangá, a representação de Luís XVI na série se faz normalmente pela ênfase em suas incapacidades como rei, como homem-marido e, não raro, em um viés humorístico, como ocorre neste volume. A França pegando fogo e o rei tentando fugir de suas obrigações para se dedicar ao seu hobby, fazer fechaduras. Os nobres não querem a convocação, mas há Necker, ministro das finanças amado pelo povo, que pressiona o rei. A convocação vem em janeiro, as eleições no início da primavera, as reuniões começam em 5 de maio de 1789.
Aqui, cabe algumas correções ao mangá, ou à tradução, talvez, porque Ikeda parece consciente da distinção entre estado/estamentos e classe social. No volume #4, os estados/estamentos são chamados de classes sociais. Em uma sociedade de Antigo Regime, caso da França em 1789, as pessoas não eram divididas desta forma, não era a sua riqueza que determinava o seu lugar na sociedade, mas o grupo ao qual você pertencia. Por exemplo, Alain é nobre, mas é pobre. Ele tem vantagens dadas por ter nascido dentro deste grupo social, mas não tem dinheiro. E um dos dramas deste volume é o suicídio de Diane, irmã de Alain, porque seu noivo nobre a trocou por uma plebeia rica. Oscar inclusive comenta que isso está se tornando cada vez mais comum, nobres casando com mulheres não-nobres, mas com ricos dotes.
A sociedade de classes nasce com a Revolução Francesa, "porque todos os homens (*do sexo masculino*) nascem livres e iguais", antes disso, não eram percebidos desta maneira. E teremos exatamente o pai de Oscar se desconstruindo ao longo desse volume, porque ele percebe que Oscar não consegue viver sem André. Ele começa violento, deixando claro para André a sua inferioridade e a impossibilidade de uma união entre ele e Oscar, para terminar o volume pedindo que ele esteja sempre ao lado da filha e subentendido fica que ele não estava falando somente na condição de criado/sombra. Aliás, uma das personagens que mais cresce nesse volume, porque passa por uma metamorfose compreensível, mas dolorosa, é o pai da protagonista. Ele aceita Oscar e o caminho que ela escolheu para si, mas até chegar lá...
Se é um erro chamar nobreza de classe social, Ikeda acerta muito ao estabelecer que um nobre poderia ser candidato a delegado do Terceiro Estado e dá destaque ao Conde Mirabeau e ao Duque de Orleans. Esses nobres são chamados nos livros didáticos de "nobreza liberal", eram a favor de reformas, abraçavam os princípios iluministas, desejavam uma monarquia constitucional ao modelo inglês e, no caso do Duque de Orleans, ele estava de olho na possibilidade de destronar o primo e cortar seus filhos da sucessão para assumir o trono como o rei dessa nova era. Para quem não lembra do volume #3, o Duque de Orleans aparece no mangá ligado aos panfletos que difamavam Maria Antonieta e as reuniões de intelectuais no Palais Royal que tanto fascinavam Oscar até que André acaba perdendo o olho no incidente com o Cavaleiro Negro.
Quando os Estados Gerais finalmente se reúnem, o delfim, o príncipe herdeiro, Luís José, está morrendo. E Riyoko Ikeda usa uma série de metáforas visuais para ilustrar o sofrimento do menino, a morte como uma grande ave de rapina negra, enquanto o menino era um pequeno passarinho. Oscar é mostrada em agonia por não poder lagar seus deveres e visitar o príncipe no palácio de Meudon. Maria Antonieta também sofre por não poder velar o filho, pois tem que cumprir funções protocolares e termina sendo ofendida pelos deputados nos Estados Gerais, que saúdam o rei, mas lhe oferecem silêncio e desprezo. Por fim, a morte da criança e a descoberta por parte da rainha que não há dinheiro suficiente para os funerais de estado.
Aqui, aparece uma dama chamada Madame de Ramballe, é um erro, deveria ser Lamballe e não era uma simples dama, a governanta do delfim era uma princesa além de melhor amiga de Maria Antonieta. Muito do papel da princesa na história foi transferida para Oscar, falei disso no volume#3, ou em um dos anteriores, mas a transliteração do nome está errada. A Princesa de Lamballe teve a chance de fugir, mas voltou da Inglaterra para ficar perto da rainha, terminou sendo massacrada nas ruas pelo populacho e sua cabeça decepada exibida para Antonieta em uma lança através de sua janela.
Os Estados Gerais se reúnem e Oscar e seus homens são escalados para proteger o lugar onde aconteceria a assembleia. Chove muito e Oscar pontua que o clima não irá favorecer as colheitas. Um dos motivadores da revolução foi uma sucessão de colheitas ruins. A autora insiste em mostrar o desgaste extra para as tropas e como isso faz com que a saúde de Oscar comece a se deteriorar. Em nenhum momento no mangá aparece a palavra tuberculose, mas é disso que se trata. Era uma doença comum, às vezes silenciosa, e que levava ricos e pobres sem distinção em um momento em que não existiam antibióticos.
Oscar levou uma vida intensa e os meses antes da Revolução Francesa são ainda mais exigentes e ela tem plena consciência de que sua saúde está declinando. É por conta disso que ela encomenda um quadro, algo que, segundo falas de outras personagens, ela se recusara a fazer até então. O mangá dá muita atenção a saúde de Oscar e há uma cena em particular na qual ela acaba cochilando, de tão cansada que está, no ombro de André, que pensa que nenhuma mulher deveria passar por isso. Mais tarde, porém, ele volta a pensar a mesma coisa, vendo o peso sobre os ombros de Oscar, mas usa "pessoa". O fato é que qualquer um na posição de Oscar e com os dilemas que a atormentam poderia ter problemas de saúde, a questão nada tem a ver com uma suposta debilidade feminina e a autora parece deixar clara esta ideia ao longo do volume.
O pintor, que é outra personagem representada de forma cômica, decide que quer pintar Oscar jovem, ainda adolescente, quando a vira à frente da carruagem que levava Maria Antonieta em sua primeira visita a Paris. Oscar não se recusa, mas o quadro parece ser outro fator de estresse para a protagonista. Esse passado não existe mais e o futuro é nebuloso. De certa forma, Oscar tem que tomar duas posições dolorosas, uma em relação à monarquia, mais ainda, sua amizade com a rainha, a quem respeita e ama, e outra em relação ao amor por André, que representaria uma afronta a seu grupo social. Preciso marcar que a cena do quadro pronto é um dos poucos momentos em que o anime supera o mangá com André cego descrevendo uma pintura belíssima que não está vendo e que não existe, e Oscar tomando consciência da situação em que ele se encontra.
Quando chega a ordem de fechamento do prédio da assembleia nacional, porque os Estados Gerais tinham mudado de nome graças a união de setores do clero e da nobreza com o terceiro estado, os acontecimentos se precipitam. Os deputados fazem o famoso Juramento do Campo de Péla (*a tradução opta por manter o francês "jeu de paume"*), um jogo antecessor do tênis, de que não iriam se desmobilizar até que a França tivesse uma constituição. Ikeda desenha no mangá o quadro de Jacques-Louis David e que retrata o famoso acontecimento. O General Buiet, superior de Oscar e inimigo do pai da moça, reaparece na história e ordena que ela ataque os deputados e retire de lá os representantes do terceiro estado. Ela se recusa e é presa, os seus soldados se revoltam e alguns deles são selecionados para serem executados.
Oscar consegue fugir com a ajuda de André e tenta impedir que a Guarda Real, agora comandada por Gerodelle, cumpra a ordem que ela se negou a executar. O mangá introduz neste momento o Marquês de La Fayette, que lutou na Revolução Americana e será o principal redator da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Junto com outros nobres liberais, ele enfrenta a Guarda Real e duela com Gerodelle. Quando Oscar chega, ela se interpõe e pergunta se Gerodelle será capaz de levantar sua espada contra ela. Ele recua e novamente declara seu amor pela protagonista. Aqui, temos um erro crasso da autora, porque imagino que não seja um erro de tradução, teria que olhar o original, porque Gerodelle diz que preferiria morrer na guilhotina a derramar o sangue de Oscar. Não havia guilhotina em funcionamento antes de 1792.
Depois desse embate com Gerodelle, Oscar tem que enfrentar seu pai. Ele a acusa de envergonhar a família e diz que a prefere morta a traidora. Oscar talvez se deixasse executar pelo pai, mas André se interpõe e ameaça matar seu amo, que o humilha, ou, talvez, o estivesse testando. Escrevo isso, porque o General de Jarjayes joga na cara de André a sua condição inferior e que nunca seria possível que ele e Oscar ficassem juntos. É fato, eles pertencem a grupos sociais diferentes, porém, é evidente que o pai de Oscar sabe que os dois jamais se separariam.
Mais tarde neste volume, o general irá lamentar que André não seja nobre e pedir que sempre seja a sombra de sua filha. Com o romance dos dois em pleno desenvolvimento dentro de sua casa, ele não tinha como ignorar o que estava acontecendo. O volume quatro mostra muito bem a evolução do pai de Oscar, ele reconhece que a filha tem direito a sua autonomia e a escolher o seu companheiro, isso era subversivo no século XVIII e era, também, no Japão da publicação do mangá. Ao tratar do passado, Ikeda está falando diretamente as suas leitoras e questionando as estruturas de poder e gênero de sua época. Fora isso, o general estava blefando, pois graças à intervenção direta da rainha, Oscar não seria punida.
Após o entrevero, Oscar se sente impotente e se declara para André, mas volto a isso mais adiante. Para salvar seus homens, Oscar vai até Bernard pedir que ele insufle o povo a libertar os homens que foram presos. Há certo humor na visita, porque Rosalie se lança nos braços de Oscar e Bernard mostra-se extremamente ciumento. Além disso, Saint-Just, futura liderança jacobina, que Oscar já havia visto de relance na rua e pensara ser uma mulher, é apresentado como primo de Bernard, que adverte o moço, que ainda é menor de idade, que ele iria se meter em encrenca. De fato, o Saint-Just real foi apreendido pelas autoridades à pedido de sua mãe e enviado para um reformatório pouco tempo antes do início da revolução. Riyoko Ikeda tem grande admiração pelos jacobinos, Robespierre, em especial, é venerado por todos os revolucionários na Rosa de Versalhes, inclusive por Oscar, mas Saint-Just recebe sua parcela de admiração, também. Em um de seus mangás futuros, Oniisama E... (おにいさまへ…), uma das personagens terá o apelido de Saint Just por causa de sua beleza.
Bernard ajuda Oscar e os homens da protagonista terminam sendo libertados. Ele aconselha Oscar a ir para o exterior, mas ela diz que jamais faria isso, que morreria com sua nação. Oscar já escolheu o seu lado e não é o da nobreza, nem o da monarquia. Depois disso, temos o último encontro entre Maria Antonieta e protagonista. Se o rei aparece como uma figura humorística mesmo no meio de tanta tensão, Antonieta neste volume quatro tem uma aparência grave e austera. Ela está ciente de que a monarquia está em risco e, com ela, o futuro de seus filhos. Ikeda confere à Maria Antonieta total consciência de classe (*no sentido marxista mesmo*), ela acredita que a monarquia absoluta é o único regime e que ele deve sobreviver a todo custo.
Oscar e Antonieta conversam como amigas, mas a soberana deixa claro que será usada a máxima violência contra o povo. Oscar então confronta a Rainha, inclusive trazendo para a conversa o amor de Maria Antonieta por Fersen, é por ele que Antonieta deseja viver. A rainha não nega e esta é a segunda cena em que Antonieta desmorona emocionalmente, a outra é a da morte de seu filho mais velho. Elas se separam como amigas, mas sabem que é para sempre. Falando em Fersen, ele aparece pouco neste volume, mas é mostrado na Suécia arrumando as coisas para voltar para a França contra todos os conselhos, ele sabe que a rainha corre perigo e ele precisa ajudá-la de alguma forma.
Até aqui, e este texto já ficou enorme, pouco falei do romance de André e Oscar. No volume anterior, Oscar já sabia onde estava seu coração, mas é no volume quatro que ela dá os passos necessários para que eles fiquem juntos. E é preciso que seja Oscar mesma a agir, porque ela está em uma posição superior. Para uma mulher nobre (*e li isso a primeira vez, se não me engano, porque estou longe da minha biblioteca, em A Sociedade de Corte do Norbert Elias*), um homem não-nobre não era um homem, ele não deveria sequer ser cogitado como parceiro, jamais seria um igual.
Já um homem nobre poderia se apropriar das mulheres do povo, isso era reproduzir as estruturas patriarcais de dominação, mas para uma mulher nobre isso deveria ser vetado, seria uma subversão da ordem, das hierarquias, ela se rebaixaria e ofenderia os homens de seu grupo social. A honra dos homens é frágil e depende da honra das suas mulheres. Por isso mesmo, tem que ser Oscar a fazer com que André deixe de ser uma sombra e permite que ele se torne o homem de sua vida.
Mais uma vez, temos a subversão dos papéis de gênero e isso deve ter falado diretamente para as meninas e mulheres que liam o mangá, pois o início dos anos 1970 foi marcado pelas discussões feministas e a luta por direitos iguais. Não pensem que isso só ocorria no Ocidente. Oscar toma a iniciativa ao se declarar, ela toma a iniciativa no primeiro beijo e ela convida André para o seu quarto na véspera da partida dos dois para Paris. Ikeda está pisando em terreno minado, pois produzia para uma revista voltada para meninas, mas é capaz de colocar na relação de Oscar e André tanto o amor, aquele vendido como eterno, puro e superior, mas, também, o desejo sexual.
Nesse sentido, o desejo de Oscar é detonado por uma pequena cena que parece sem sentido, como se fosse somente fanservice. Oscar e suas tropas tinham tomado chuva, André, sabe-se lá por qual motivo, se refugia no escritório da comandante para se enxugar e Oscar o surpreende sem camisa. É um momento de humor, mas Oscar fica absolutamente descomposta. Tomo esta cena como marco. Daí para frente, eles se aproximam e teremos muitos beijos entre os dois até que chegamos à noite de amor, que será lida dentro da trama como um casamento, maior, mais belo e solene do que qualquer cerimônia poderia ser. Ainda assim, Oscar que dissera para André, no início do volume, que jamais se casaria, avisa ao rapaz que, após a batalha, eles se uniriam em matrimônio. Afinal, seria um outro mundo, sem as barreiras de classe que impediam a uniam entre uma nobre e um plebeu (*pobre*) sem o consentimento do rei.
Oscar toma a iniciativa, mas Ikeda a coloca recuando no último momento. Aqui, a transgressão se mistura com o reforço dos papéis de gênero tradicionais. Oscar deseja André, mas ela é a donzela, ela recua, e ele assume, então, a posição dominante. André não a deixa fugir daquilo que deseja por medo, ele reafirma seu amor, mas, também, seu desejo por Oscar e ela acaba se sentindo segura. Já me deparei com leituras um tanto estranhas desta cena, como se André tivesse agido de forma abusiva, sem o consentimento de Oscar.
Temos, sim, um clichê de gênero, neste sentido um duplo, de gênero literário (*em romances românticos a mocinha deve parecer/ser vacilante e ser inexperiente sexualmente*) e de gênero papéis masculinos e femininos; Oscar não tinha experiência sexual, diferentemente de André (*é Ikeda quem diz*), que a conduz nesse momento, a protagonista precisava se sentir segura, a insistência aparente dele nada tem a ver com violência, ou desrespeito à vontade dela. E toda a sequência é linda, belamente ilustrada e com diálogos emocionantes.
Curiosamente, tanto o filme live action, quanto a animação, retiram de Oscar o protagonismo do convite. Não ficaria bem para ela convidá-lo para seu quarto. Como o pai de Oscar poderia consentir em algo assim, porque, no mangá, ele sabe perfeitamente o que está acontecendo. Então, no live action temos a noite dos dois em um estábulo, no anime, em uma floresta. Terreno neutro e sem a agressividade do quarto da mocinha, afinal, que modelo de relacionamento estaria se vendendo para as adolescentes? O mangá é uma obra feminista, suas adaptações não são. Vamos ver como ficará o novo anime.
Treze de julho, Oscar e André partem juntos para o campo de batalha. Alain e os outros soldados tentaram demovê-lo disso em uma passagem anterior. Ele está cego, não teria como lutar, mas eles terminam por aquiescer e combinam estratégias para lhe dar suporte. André jamais iria abandonar Oscar, afinal, ele é sua sombra e, agora, seu marido. Quem conhece o mangá e ele tem cinquenta anos, sabe que André não irá sobreviver. Oscar terá que engolir sua dor e seu luto e liderar seus homens na tomada da Bastilha, pois ela precisa apoiar o povo, afinal, ela era parte desse mesmo povo.
O final do volume é emocionante. Oscar e seus homens usam de sua experiência como militares a favor da revolução. O último quadro é a fortaleza sobre carga de artilharia com pedras rolando. Apesar do protagonismo de Oscar, da louvação à Robespierre, em todos os momentos Ikeda deixa claro que quem constrói a História é o povo em movimento, não indivíduos em particular. Oscar está dentro de uma corrente que a arrasta para a revolução, que é um movimento de massas, mesmo Robespierre em todo o seu brilhantismo é fruto das suas condições materiais, da sua experiência de classe.
Nunca vi Ikeda citando historiadores como George Rudé (A Multidão na História), E. P. Thompson (Costumes em Comum), ou Christopher Hill (O século das revoluções: 1603-1714), mas a narrativa desse volume está em perfeita consonância com o que chamamos em historiografia de "história vista de baixo", na qual é a massa que empurra os acontecimentos. De qualquer forma, a autora fez parte da juventude comunista na época na universidade, logo, pensar a História a partir da experiência coletiva e das condições materiais não era algo estranho para ela.
E é isso. Pretendo resenhar o volume #5 ainda este mês. Já me demorei demais e preciso concluir essa missão. Resenhar volumes tão longos é mais complicado do que o volume padrão e a gente fica com a tentação de escrever sobre tudo e não deve fazer isso. Antes de concluir, preciso lembrar que minhas outras resenhas da Rosa de Versalhes foram roubadas e replicadas em um site especializado na série de Riyoko Ikeda. Se você encontrar este texto em outro lugar, com data anterior a desta publicação, por favor me avise. Aparentemente, a pessoa parou, mas nunca se sabe e preciso reunir mais provas para um futuro processo.
1 pessoas comentaram:
Comecei a amar A Rosa de Versalhes pelo Shoujo café e estou amando as resenhas! Obrigada!
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