quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Comentando a novela Jóia Rara (*Até o momento*)


Antes da confusão que foi a semana do nascimento da Júlia, tinha dois textos para preparar urgentemente para o blog, uma resenha de José do Egito (*que iria entrar primeiro e está incompleta até hoje*) e outra sobre os primeiros capítulos de Jóia Rara.  Como na confusão perdi sei lá quantos capítulos da novela e não consegui assisti-los ainda (*se é que vou um dia*), o texto virou uma mistura das minhas impressões gerais sobre a trama até agora.  Para não criar falsas expectativas, já adianto que Cordel Encantado me encantou (*para usar o verbo adequado*) e, ainda que a qualidade técnica da novela das seis seja de encher os olhos, Jóia Rara me parece um espetáculo morno, muito aquém da competência da equipe envolvida no projeto.  

Quando batemos os olhos em um capítulo qualquer de Jóia Rara, é possível perceber o talento dos profissionais envolvidos e o dinheiro investido na trama.  Acredito que seja um dos maiores investimentos em uma trama das seis nos últimos anos.  E, bem, por ser novela de época, os gastos com a produção já tendem a ser maiores.  Só que, a exemplo do que foi visto em Cordel Encantado, há um cuidado extra com fotografia, figurino, cenários, locações, e tudo que nos deleita os olhos.  Enfim, tudo é muito bonito, bem feito, só que beleza não segura uma novela.  A audiência, aliás, não está respondendo bem (*1 e 2*).  Por isso, reforço que falta algo na trama de Jóia Rara que me seduza e convença e sobra uma série de pequenos (*e grandes*) detalhes que me desagradam... Mas, agora que comecei, sei que sigo assistindo até o final, ainda que não me preocupe em seguir fielmente, pois perder um ou mais capítulos não faz diferença para boa parte das tramas apresentadas.  


Desde antes da estréia de Jóia Rara, a mistura entre trama de época, com tons sérios, densos, Cabaré e Budismo, me fez torcer o nariz.  O que atraiu a atenção em Cordel Encantado, obra anterior de Thelma Guedes e Duca Rachid, foi o tom de fábula, de cordel mesmo, que foi finamente executado e conseguiu atrair elogios e aprovação quase unânime, apesar dos protagonistas, mas volto a esse ponto mais tarde.  Apesar de ver a trama do Budismo como um equívoco, especialmente no período histórico escolhido, gosto muito dos atores do núcleo budista, muito mesmo.  Caio Blat, Ângelo Antônio, (*o desconhecido*) Fábio Yoshihara  e o sempre excelente Nelson Xavier atuam muito bem e compensam a falta de conexão entre uma parte da história e as outras tantas.  A ambientação no mosteiro, a ida ao Nepal, mostra o quanto investiram na novela, tudo transpira beleza, mas é mero preciosismo, sem função real para o andamento da trama.

Agora, Franz (Bruno Gagliasso) chegar ao Himalaia, nos anos 1930, e encontrar gente falando português e apaixonado pelo futebol brasileiro, não desceu.  Trataram o futebol, na época um esporte ainda em ascensão, como se já tivesse a difusão que ele só viria a ter décadas mais tarde.  E foi a única vez que deram atenção ao rádio... não que neste caso fizesse diferença, claro.  E só faltou Ananda Riponche (Nelson Xavier) falar que curtia carnaval e queria conhecer as praias do Rio. Mais recentemente, parte do elenco esteve no Nepal e a temática do futebol foi resgatada, afinal, Pérola, reencarnação do Riponche, ama futebol.  Meu espanto foi a rapidez com a qual as personagens vão do Brasil ao Nepal e retornam... Me lembrou as ponte aéreas das novelas de Glória Perez.  Falando em Gagliasso, ponto positivo é vê-lo interpretando um sujeito "normal", acho que era o que faltava ao repertório do moço. 



Com o passar dos capítulos, e a descoberta (*já deixada clara no início da trama*) que Pérola é a reencarnação do grande mestre, passamos a ter um cursinho intensivo básico de budismo nepalês...  A trama, que é bom, andou pouco.  Pensei que iriam explorar a questão de gênero, e até chegaram a flertar com isso, afinal, os monges procuravam um menino e perderam vários indícios de que Pérola era o Riponche. Poderiam ter investido um pouquinho nesse ponto, ou na resistência de algumas personagens a essa história de reencarnação, mas tudo passou meio batido e tome sequências chatíssimas no cabaré... Aliás, a fascinação pelo cabaré é ainda mais intrigante... Em 1945, eu pensaria no sonho de ser rainha do rádio, algo muito tentador, mas mal se fala desse meio de comunicação fundamental.  Se Hilda e Odilon (Tiago Abravanel)  sonhassem com o rádio, eu entenderia.  Se olhassem para Carmem Miranda e sonhassem com Hollywood, também.  E havia o Teatro de Revista, os Cassinos (*fechados em 1946*), como alternativas mais tentadoras.  Só que o Cabaré Pacheco Leão precisa ser um dos lugares mais importantes da trama, daí forçarem a barra para que os vários núcleos se encontrem ali.  

Primeiro, trata-se do núcleo cômico mal utilizado.  É muita gritaria, muita falta de assunto, muita trama que não anda ou convence, muitos atores e atrizes subaproveitados.  Segundo, cabaré nunca foi algo mainstream, sempre flertou com a prostituição, por exemplo; não era coisa de "moça de família" (*muitos diriam que nada na carreira artística era...*) e me espanta muito a forma como algumas personagens – como a protagonista – circulam pelo lugar sem constrangimento ou o sonho de Hilda (Luiza Valdetaro), moça rica, filha do vilão mor da novela, sonhar em ser cantora de cabaré... De resto, o excesso de Glamour, lembra o exagero do Bataclan da última versão de Gabriela.  Fosse o Pacheco Leão tão chique, os pobres da novela não o frequentariam; fosse tão democrático, os ricos não se fariam presentes abertamente.  Só que o Rio não é Ilhéus, mas uma metrópole e havia lugares exclusivos e bem mais discretos para os endinheirados. No início da trama, quando do enterro do amigo de Franz, o apartheid, fruto da dupla moral, é sugerido, mas meio que morreu ali.


O salto de dez anos na novela, acabou dificultando um pouco certas questões, também.  Foi um lapso de tempo grande demais e não acompanhamos praticamente nada da vida das personagens.  Por exemplo, parece forçado que a personagem de Nathalia Dill tenha morado tanto tempo com os inimigos e não dado andamento a sua vingança.  Ou ainda, quantos anos tinham Viktor (Rafael Cardoso ) e Hilda em 1935?  Se eram tão novinhos, por que não usar outros atores? Uma cena de Viktor garoto fascinado por Sílvia poderia ter sido muito interessante. Se eram adolescentes (*15?  16? 17?) em 1935, estão bem maduros em 1945.  Dificilmente, Ernest (José de Abreu) teria deixado sua filha solteira por tanto tempo, já  Viktor é tratado como “novinho” por todos, mas deve estar perto dos 30.  De qualquer forma, nem Valderato, nem Cardoso, parecem tão mais novos que Bruno Gagliasso.  Também, me parece complicado essa atividade toda dos integralistas em 1945.  

Os comunistas são perseguidos e  presos a partir de 1935, mas a coisa não foi muito melhor para os integralistas, especialmente depois de 1938.  Pior, os fascistas brasileiros, ainda que com um ideário influente, não se recuperaram do golpe, não formaram partido próprio, enquanto os comunistas ganharam espaço com o fim da II Guerra, a vitória da URSS e a Guerra Fria.  Por que a História vale para um lado e, não, para o outro?  As autoras acertaram – ou, pelo menos, podem acertar – ao inserir na trama a história sinistra dos empreendimentos nazistas no Brasil travestidos de orfanatos e outras instituições de caridade (*1 e  2*).  Agora, como a atenção está em outros espaços, talvez essa parte interessante de Jóia Rara seja subaproveitada, também. 


Falando dos protagonistas, Bianca Bin era intragável como Açucena em Cordel Encantado, talvez, culpa da própria personagem, mas, de qualquer forma, seu desempenho dramático era bem abaixo da média.  Curiosamente, ela parece ter crescido como atriz.  Sua Amélia consegue ser muito convincente e simpática.  O problema, e eu tinha apontado isso como ponto baixo de Cordel Encantado, foi a rapidez do romance dela com Franz.  Em dois capítulos, eles se apaixonaram, transaram e engravidaram.  Virgindade feminina, mesmo quando a época pede, parece coisa irrelevante para as autoras. Aliás, estou esperando Hilda (Luiza Valdetaro) “se entregar” para Toni (Thiago Lacerda) e entrar em uma enrascada.  E nem precisei esperar, olha só.  Por que tudo é tão óbvio?  Que pelo menos a mocinha da Luiza Valderato não tenha que dividir sua “primeira vez” com outra personagem, vide Cordel Encantado e Gabriela.

Pior é que mesmo sendo “almas gêmeas”, Franz acreditou fácil em todas as mentiras armadas por seu pai, Ernest Hauser.  Aliás, é sempre um prazer vê-lo atuando e seu vilão periga roubar corações e torcida ao estilo do Senhor de Montsserat, de o Direito de Amar.  Aliás, continuo apostando em Bruo Gagliasso para Adriano e, agora, queria o José de Abreu como Sr. de Montsserat.  Ele seria perfeito!  Isso não seria espanto, já que os mocinhos ao redor dele, salvo pela menina gracinha Mel Maia, são todos muito, mas muito bobões.  Enfim, ele passa humanidade, coisa que os outros vilões da trama parecem não ter, daí, são caricaturas e, não pessoas.  



Ernest é crível na sua alegria por acreditar que sua esposa, a infeliz Iolanda (Carolina Dieckmann), espera um filho seu, ou quando é privado do convívio com sua neta querida.  Essas nuances o engrandecem, enquanto isso, Mundo – interpretado de forma excelente Domingos Montagner – praticamente jogou Iolanda – uma Carolina Dieckmann contida e sofrida – nos braços do vilão, e ainda se faz de ofendido e traído.  Saber que ele vai culpar a moça pela mentira e pela perda do bebê, o torna tão ou mais cretino que o Ziah, de Salve Jorge, sua personagem anterior. Eu entendo, e é totalmente de acordo com a condição de comunista/revolucionário da personagem, que ele veja no casamento um entrave, e a rejeite para protegê-la. O estranho é que ele, que tem um discurso machista nordestino, não se preocupe com a honra e a segurança da moça.  Transar com ela, OK, morar com ela, também, casar, não? O destino de Iolanda é ser torturada pelo marido vilão e pelo amado supostamente um dos heróis da trama.

Frau Gertrude (Ana Lúcia Torre) vai bem no seu papel de mulher ferida e mãe enlouquecidamente apaixonada pelo filho.  Como vilã menor, que pode guardar outros segredos, ela se destaca.  Agora, de doer estão Carmo Dalla Vecchia e Nathalia Dill.  Ambos são bons atores, mas alguém – não parece ser escolha pessoal, já que ambos estão na mesma linha de atuação – cismou que eles precisam trazer sempre o peso da inveja e da maldade em seu semblante e/ou roupas.  Dill, depois dos primeiros capítulos, adotou um figurino e maquiagem pesados, escuros, fora o tom de voz estridente.  Alguém em sã consciência aturaria uma criatura como ela?  Alguém se convenceu de que a intragável Sílvia poderia conquistar o coração ferido de Franz?  Desculpe, eu, não.  E, pior, ela é detestável e histérica em tempo integral.  



Sílvia tinha tudo para ganhar nossa simpatia, pois sabemos que Ernest é a ruindade em pessoa, mas sua linha de ação é tão doentia, que todas as possibilidades são queimadas cena após cena.  Para piorar, ela maltrata até a Pérola.  Crueldade com crianças, ainda mais boazinhas ou indefesas, inviabiliza qualquer redenção.  É quase o mesmo tipo de exagero que fizeram com o Félix... Quase!  Já o Manfred, personagem de Dalla Vecchia, no início parecia ter uma sombra sobre seu rosto.  Como acreditar que alguém com “sou invejoso, vingativo e incapaz de amar” escrito na testa poderia ter alguma boa intenção?  Mas, ainda assim, ele vai tocando a personagem no mesmo tom e ninguém desconfia dele.  Só havia um pequeno alívio, uma certa mudança na linha de (*má*)  atuação, quando ele estava com Lola (Letícia Spiller).  Só que durou pouco. 

Falando em Lola, queria marcar que a história de platinar o cabelo das atrizes também foi uma escolha estranha.  Nos anos 1930 e 1940, havia louras, morenas e ruivas de sucesso em Hollywood, que deve ser o modelo escolhido para a novela.  Não gosto muito da forma como a personagem de Letícia Spiller está sendo conduzida, mas percebe-se que estão fazendo um contraponto com a Aurora, de Mariana Ximenes.  Uma é a mulher que tudo aceita, que se arrasta aos pés do amado; a outra, é bonita, sim, livre (*em se tratando de sexualidade*), mas inteligente e orgulhosa.  O passa fora que ela deu em Manfred quando ele tentou elogiá-la dizendo que ela era um caso raro de mulher bonita e inteligente foi nota dez. Queria que a Sílvia seguisse nessa linha, mas desisti.  Soube recentemente que ela será morta, o que nem será desperdício, dado o fiapo de história que lhe deram.



De resto, deixo para um próximo texto os comentários sobre outras personagens.  Acho que haverá outro texto.  Não comentei, por exemplo, o quanto senti falta de atores e atrizes negros na primeira fase; na segunda, eles e elas aparecem mais, no entanto, não há personagem negro de real relevância... Nem vedete negra existe.  Sinto, também, falta de mulheres fora dos papéis tradicionais: mãe, esposa, irmã, mocinha, sofredora, passional, histérica, sedutora, apaixonada, etc. Nenhuma foge realmente dos estereótipos de gênero.  Tinha esperanças em relação à Sílvia, mas perdi, o mesmo vale para Hilda... Amelinha, por sua incapacidade de pensar antes de agir, periga se tornar uma chata.   Sobra Aurora... talvez... Continuo assistindo a novela e devo ir até o final, mesmo que aos trancos e barrancos... Nem preciso dizer que a abertura é bem simpática e a trilha sonora é de acertos, não é?  Mas isso é com a parte técnica, e essa, raramente falha. 

4 pessoas comentaram:

Eu gosto muito das suas resenhas.
Só que eu não estou assistindo a novela então não tenho como avaliar tudo. É estranho pq eu sei o que acontece na novela, sei quem é quem, mas não assisto rsrsrsrs E um dos motivos é que as caras dos atores me faz lembrar Cordel Encantado. Eu assisti a novela um dia e não me convenceu pq na outra novela o "Franz" era malvado e corria atrás da "Açucena". Sem falar nos outros atores (eu gostava do papel da Natalia Dill em Cordel e não estou gostei do papel agora)... Eu acho que deveriam ter escalado outros atores, até para dar mais oportunidade para os atores da casa.

P.S: Ainda não a parabenizei pelo nascimento da Júlia. Muita felicidade para vocês, saúde e paz ;)

Eu gosto muito das suas resenhas.
Só que eu não estou assistindo a novela então não tenho como avaliar tudo. É estranho pq eu sei o que acontece na novela, sei quem é quem, mas não assisto rsrsrsrs E um dos motivos é que as caras dos atores me faz lembrar Cordel Encantado. Eu assisti a novela um dia e não me convenceu pq na outra novela o "Franz" era malvado e corria atrás da "Açucena". Sem falar nos outros atores (eu gostava do papel da Natalia Dill em Cordel e não estou gostei do papel agora)... Eu acho que deveriam ter escalado outros atores, até para dar mais oportunidade para os atores da casa.

P.S: Ainda não a parabenizei pelo nascimento da Júlia. Muita felicidade para vocês, saúde e paz ;)

Eu não assistia TV, primeiro por falta de tempo, segundo por falta de interesse mesmo. Mas esses dias, meu pai me doou uma TV pequena e que só pega a Globo. Eu ligo pra passar o tempo enquanto faço outras coisas em casa e acabei assistindo vários cap dessa novela. Não entendi muito bem, mas achei super estranho o fato de levarem com muita normalidade os Monjes e a reencarnação na guria Pérola. Se hoje em dia o tema é tabu, imagina naquela época. Só vi gente com raiva na novela, e quando achei que veria romance, o noivado da filha do malvadão lá se dá por desfeito. kkkk Não espero muito das novelas, mas concordo com seu ponto de vista. Beijos pra vc e pra Júlia!

Eu assisti ao primeiro capítulo da novela e outros mais, e não gostei muito. O que me incomoda é a repetição de personagens, com os mesmos atores, só que em outras novelas. Hilda, de Valdetaro, é igual à Gerusa, de "Gabriela", e à Antônia, de Cordel: mocinha sofredora, que se apaixona pelo homem errado, refém do pai/avô/irmão. Montagner também está igualzinho ao Ziah: bronco, machista, galã brucutu.
Você tocou numa falha grave da novela, a meu ver: a falta de negros. A trama mais importante se passa no núcleo pobre, e neste, quase não se vê negros, nem no cortiço, nem fábrica, nem no cabaré (que tem todas as contradições que você apontou). Tá certo que nas fábricas existiam muitos imigrantes, mas negros também eram o grosso da mão de obra na década de 40. Essa questão fica ainda mais gritante na escolha da protagonista. Amélia deveria ser morena ou negra, ainda mais que a colocaram como a irmã de Montagner. Nanda Costa deveria fazer a personagem, passa uma imagem de mulher forte, faria um casal lindo com Gagliasso, e poderia se passar, de verdade, por mãe da Mel Maia. Bianca Bin e Gagliasso parecem irmãos, e não acho que os dois funcionem bem juntos. Mas novela da Globo é um jogo de cartas marcadas, fazer o quê.

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