sábado, 22 de dezembro de 2018

Comentando Aquaman (EUA, 2018)


Terça-feira fui assistir Aquaman.  Estava curiosa e o trailer tinha me chamado para o cinema, por assim dizer, mesmo que não tenha gostado da personagem em A Liga da Justiça.  Com mais de duas horas de duração é um filme que se propõe muitas tarefas, a primeira e bem sucedida, contar a origem do herói, fazendo um paralelo com a lenda do Rei Arthur, já as demais, contar a origem de Atlantis, apresentar o vilão Manta Negra e derrotar a ameaça a grande ameaça à humanidade.  Ufa!  É bastante coisa.  Enfim, no geral, o filme dirigido por James Wan é competente, mas eu esperava mais, o filme não consegue ser tão bom quanto Mulher Maravilha, ou Pantera Negra.

Filho do humano Tom Curry (Temuera Morrison) com a atlante Atlanna (Nicole Kidman), Arthur Curry (Jason Momoa) cresce com a vivência de um humano e as capacidades especiais de um atlante. Quando seu irmão Orm (Patrick Wilson) deseja se tornar o Mestre dos Oceanos, subjugando os demais reinos aquáticos para que possa atacar a superfície, cabe a Arthur a tarefa de impedir a guerra iminente. Para tanto, ele recebe a ajuda de Mera (Amber Heard), princesa de um dos reinos, e o apoio de Vulko (Willem Dafoe), que o treinou secretamente desde a adolescência, no entanto, para cumprir sua missão, ele precisa encontrar um tridente lendário, o único capaz de garantir que ele se torne o rei dos mares.


As origens do herói são bem explicadas.
Se você quer uma diversão leve e que não lhe obrigue muito a pensar, Aquaman é para você.  Apesar de relativamente longo, o filme não cansa em nenhum momento.  Temos ação, cenas ternas, romance, e efeitos visuais muito bons.  Quer dizer, assim como comentei em Rogue One, não sei se o problema era o 3D, que escurece as imagens, ou a sala onde assisti (*mais provável*), mas parte do filme me pareceu muito escura.  E Aquaman, diferente de outros filmes da DC, não é um filme que quer passar essa ideia.  Não é um filme colorido, solar, mas ele não é dark e hostil, por assim dizer.  

Já que eu adiantei a parte visual do filme, o destaque, eu diria é a cidade, reino, sei lá, de Atlântida.  As naves e estruturas imitando animais marinhos, tudo muito sinuoso, claro, vários tons de azul, especialmente.  As armaduras são visualmente interessantes, elegantes e, ao mesmo tempo, ressaltando a musculatura dos sujeitos que as vestiam.  Sim, porque o objetivo de roupas coladas é esse mesmo. Já Mera em sua roupa grudada no corpo e com um decotão, me pareceu nada interessante, mas estava absolutamente linda com sua roupa de princesa inspirada em águas-vivas e que era parcialmente formada por esses seres.  Acho que foi a coisa mais bonita do filme, sabe?


Uma vista da cidade.
Agora, confrontando a cidade de Atlântida com a Wakanda de Pantera Negra, ou o visual de Aquaman e o do filme da Marvel, sem chance, é "Wakanda forever!" mesmo.  A identidade visual criada em Pantera Negra não foi igualada pela composição de Atlântida.  E, claro, bom que eu coloque isso logo, porque, sinceramente, ficou bem fraca essa parte.  Aquaman conta duas origens, a do herói, um tanto trágica, mas muito romântica, e que se entrelaça com a lenda do rei Arthur.  Clichê, alguém diria, e é, mas ficou bem feito, convenceu.  

A rainha das profundezas fugindo de um casamento imposto com um nobre cruel.  Ela chega à terra firme, ferida, e acaba sendo resgatada por um humano.  Os dois se apaixonam e nasce o herói.  A gente até desconfia que aquela família não será feliz por muito tempo, mas eu não vou contar spoilers aqui.  Enfim, tudo foi narrado de forma bem competente e sem perder tempo com bobagens.  Agora, a segunda origem, a dos reinos de Atlântida, foi forçadíssima.


Uns evoluem, outros involuem... Mas como?
Atlântida, a lendária cidade, ou país, da mitologia grega, é apropriada pelo filme (*pela DC, na verdade*), OK.  Assim como as Amazonas e outros mitos, eles estão aí para serem revisitados e reinterpretados.  A Atlântida do Aquaman é um reino super-tecnológico em nosso passado distante.  Por orgulho e vaidade, acontece uma tragédia e a cidade afunda.  Nas cenas, vemos pessoas morrendo, mas, ao afundar, vem a narração de que todo mundo se adaptou, uns evoluíram, outros involuíram.  Como assim?  Como pode?  Como foi?  Se eles não tinham superpoderes, afundou, morreu todo mundo, certo?  Deveria... Fora, claro, que o povo peixe e o povo crustáceo não me pareceu menos evoluído, os da Fossa, sim, mas eles, não.

Há muitas coisas jogadas em Aquaman e que, pelo menos aos meus olhos, enfraquecem o roteiro do filme.  Mera e Aquaman estão fugindo para o Deserto do Saara, um dos reinos perdidos de Atlântida está lá.  OK, não darei spoiler.  Eles estão com a roupa do corpo quando chegam no deserto.  Corta a cena, eles estão em um avião, com outras roupas, com dinheiro e tudo mais.  Caiu do céu?  Brotou das areias do deserto.  Suspensão de descrença é uma coisa, essas magias são outra, parece recurso de gente preguiçosa e que acredita que a audiência é burra.


Em "roupas civis" na Sicília.
Outro ponto difícil de engolir são os piratas, os únicos negros do filme, que roubam submarinos militares.  Olha, a não ser que suas armas fossem cedidas pelos atlantis, algo que não se confirma, é meio difícil de levar.  Mas realmente acredito que a sequência dos piratas e a criação do Manta Negra (Yahya Abdul-Mateen II)  é o que está sobrando no filme.  Poderiam ensinar o conceito de misericórdia para o herói sem ter que introduzir o vilão de um filme vindouro e sua narrativa de origem.  Se não estivesse lá, não faria falta.

Um vilão, nesse caso Orm, o meio-irmão de Aquaman, já era suficiente e seu ódio pelos humanos, mais que justificado.  Não fosse Aquaman tão simpático e o ator que faz Orm tão canastrão, seria fácil torcer pelos atlantis contra os humanos destruidores do planeta.  E eu não percebi que o rei de Xebel, pai de Mera, e que quer a guerra, não pense que ele está sendo constrangido, ainda que pareça estar, era interpretado pelo Dolph Ludgreen.


Um ator melhor, um pouco mais de
 tempo, o herói tinha boas motivações.
Que mais escrever?  Ficou parecendo que não gostei do filme, quando, na verdade, ele foi bem agradável.  A imagem ruim que eu tinha do Aquaman de Liga da Justiça meio que se diluiu e eu tinha escrito o seguinte na resenha "Espero que o filme do Aquaman dê uma calibrada no herói, porque ele precisa de algo mais do que o corpinho do Momoa e pose de rebelde para impressionar.".  No filme Aquaman, Jason Momoa é uma espécie de gigante de bom coração e que tenta acertar, mesmo quando erra.  Um sujeito que gosta de ter poderes, que não os lamenta, ainda que tenha que lidar com alguns traumas do passado.  É interessante que ele vence exatamente quando admite as suas fraquezas, que talvez não mereça ocupar o lugar que várias outras personagens dizem ser seu.  É nesse momento que ele retira a espada da pedra... quer dizer, o tridente da pedra. Curiosidade sobre Momoa, ele é formado, ou pelo menos cursou por um tempo, Biologia Marinha,

Deveriam ter explicado como Vulko, interpretado pelo excelente Willem Dafoe, entra na vida dele, mas a personagem em si - o guia, o fiel servidor do trono, o Merlim, enfim - foi bem construída.  Quando o menino Aquaman manifesta seus poderes no aquário, a cena é realmente impactante.  Apesar de todas as piadas com o fato de Aquaman falar com os peixes, ele efetivamente o faz no filme e em nenhum momento o seu dom, que é somente dele, parece ridículo.Aliás, Mera também tem poderes que parecem ser somente dela.  Seria um aspecto a explicar, talvez em um próximo filme, como alguns atlantis tem dons especiais.


Todo Arthur tem seu Merlim.
A Bechdel Rule não é cumprida, porque quando as duas personagens femininas com nome se encontram, elas falam de Aquaman.  No entanto, tanto Atlanna, Nicole Kidman sendo pouco exigida, e Mera são mulheres fortes, com capacidade de liderança, inteligentes e tudo mais, mas em papeis tradicionais, a mãe e a namorada.  Estão à serviço de uma narrativa que gira em torno de um homem, mas é isso, o filme é Aquaman e é o que tem que ser.  Não é demérito.  Agora, uma coisa que não pontuei quando falei do visual, tanto a peruca de Mera, quanto a de Nicole Kidman me pareceram muito artificiais.  Não parecia cabelo boa parte do tempo e Hollywood sabe fazer muito melhor que isso.

De resto, não consigo entender toda essa  necessidade de reconfigurar o Aquaman, de torná-lo uma personagem mais agressiva e hipermasculina por assim dizer.  Eu realmente nunca vi problema nele, mas a minha referência é aquele desenho velhíssimo da Liga da Justiça que passava na TV quando eu era criança (*anos 1970-80*) na qual todo mundo, sem distinção, era ridículo.  Verdade que sempre gostei mais do Namor, bem mais, mas o Aquaman, que foi criado em 1941, sempre me pareceu OK.  E é curioso que quem ajudou a definir a imagem do herói na Era de Prata foi uma mulher, Ramona Fradon, que era uma das poucas mulheres na indústria de quadrinhos norte-americana nos anos 1960.  Soube disso pelo documentário She Makes Comics


O tal vestido de águas-vivas.
É isso!  Queria ter feito uma resenha melhor, acho que o texto ficou aquém da média, por assim dizer.  O filme é bom e funciona bem quase o tempo todo.  De qualquer forma, considero Mulher Maravilha um filme superior, lidou melhor com as origens da heroína, construiu melhor a mitologia das amazonas.  Agora, o vilão - no caso Orm - tinha motivações mais fortes do que a média dos vilões de filmes de heróis.  Se fosse um ator melhor, se tivesse mais tempo em tela (*Manta Negra pra quê?*), ele poderia produzir aquela simpatia que alguns vilões de anime/mangá recebem.  Afinal, somos uma espécie daninha, estamos destruindo o planeta e o vilanesco rei de Atlântida não estava dizendo nenhuma mentira a nosso respeito.  Nós somos uma ameaça.


3 pessoas comentaram:

Vi o filme na segunda e achei muito divertido. Não achei que estava muito escuro/sombrio, a não ser na parte do foço, mas acho que essa era a ideia dessa parte. De resto, achei com bastante cor.
Sobre os personagens, o Arthur/Aquaman me pareceu um cara grandão de quem eu iria gostar de ser amiga, irmã, prima, sei lá. Um cara bem legal. A Mera foi minha personagem preferida, principalmente por sempre ter coragem de fazer o que achava certo, mesmo com medo de não poder voltar. A Amber Heard falou em entrevista que usou peruca. Num primeiro momento achei que ela devia ter pintado o cabelo. Aí lembrei de uma amiga que pintou o cabelo de vermelho e disse que se sentia a Carrie (Carrie, a estranha) na cena do baile toda vez que lavava o cabelo. Imagino que isso, e o fato do cabelo se mexendo debaixo d'água serem de computação gráfica tenham ajudado na sensação de cabelo falso. Provavelmente devem ter feito o mesmo com o cabelo da Nicole Kidman.

Exsencialmente essa imagem do Aquaman vem dos anos 90. Foi muito importante para a manutenção do personagem, que era considerado pelo público como uma piada. Acho que se Snyder tivesse permanecido, teríamos tido a clássica cena da perda da mão e sua substituição por um arpão.

https://vignette.wikia.nocookie.net/marvel_dc/images/4/47/Aquaman_Vol_5_3.jpg/revision/latest?cb=20150419004605

Depois retrocederam isso nos quadrinhos e voltaram dentro do possível ao original. Parece que agora a ordem é conciliar as duas visões e arrancar um Aquaman definitivo do meio disso tudo.

Esse eu passei. Sei que parece divertido, mas não me empolguei em ver. Diante de tantos filmes que a criançada queria ver nas férias, esse ficou de escanteio.

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