sábado, 8 de abril de 2023

Mangás: editoras francesas trazem clássicos esquecidos de volta à vida (artigo traduzido)


O Lacradores Desintoxicados postou o link de uma matéria bem interessante da seção de Economia do tradicional jornal francês Le Figaro sobre o lançamento de mangás clássicos no país.  A ideia do texto é que eles seriam um legado (héritage) para as gerações futuras e ajudariam a explicar o sucesso que os quadrinhos japoneses fazem hoje no mundo inteiro e o desenvolvimento das suas várias demografias e gêneros.  

Algo importante, que a matéria destaca é a falta e críticos especializados em mangá na França, especialmente, no caso de jornalistas mulheres e cito o trecho:“hoje na França, poucos jornalistas de mangá são mulheres, e muito naturalmente há menos homens interessados ​​em shoujo [mangá destinado ao público feminino] e suas grandes autoras como Moto Hagio.” E esse olhar masculino, sem empatia e não treinado para obras feitas por mulheres e para mulheres e meninas impacta as críticas que saem em revistas, ou jornais, ou podem implicar simplesmente no silenciamento sobre o material.  Algo muito frequente, aliás.  Outro aspecto estacado no texto são os limites do próprio mercado, edições mais caras são quase inacessíveis aos mais jovens, ou seja, o mesmo problema daqui do Brasil, ao que parece.


Mantive a mesma estrutura do artigo e fiz minha tradução.  Provavelmente, nem tudo ficou OK, meu francês é preguiçoso, mas o Lacradores traduziu parte do texto, ou todo ele, no post do Twitter que eu já linkei.  Pode ser que a tradução dele seja melhor que a minha, é só consultar.  O título da matéria original é "Mangas: les éditeurs français redonnent vie aux classiques oubliés" e eu colocarei em nota o nome original das obras sempre que conseguir descobrir quais são e quando for necessário.  Quando o nome do autor estiver na capa, caso haja imagem, não colocarei na nota.  

Havia outra sugestão de artigo na página do Le Figaro.  Devo traduzi-lo depois, porque parece interessante, também, o título é Mangás: como as editoras alternativas estão lidando com os gigantes do mercado (Mangas: comment les éditeurs alternatifs font face aux mastodontes du marché).


Mangás: editoras francesas trazem clássicos esquecidos de volta à vida
Por Arthur Bayon
Le Clan des Poe [1], Confidences d’une prostituée [2] e Autant en emporte la brume [3] são os três primeiros títulos da coleção Akata Héritage. Akata

INVESTIGAÇÃO – As reedições bem-sucedidas de mangás publicados no Japão nas décadas de 60 a 90 estão em alta. Alguns editores se arriscam ao desenterrar tesouros inéditos na França.

"Um mangá legado é, na minha opinião, uma obra que conseguiu passar no teste do tempo, uma herança do passado que deve ser transmitido às gerações futuras", disse Masahiro Choya, chefe das coleções de mangá da Panini. Uma definição que Bruno Pham não rejeitaria. A editora da Akata lança no dia 6 de abril uma nova coleção com o nome apropriado de Héritage, com o desejo de mostrar que “esta cultura viva se transmite”.

O primeiro mangá desta coleção é nada menos que o tão esperado Poe Clan, um painel vampírico "totalmente visionário" de Moto Hagio publicado no Japão entre 1972 e 1976. "É o retorno de uma importante autora que já foi publicada em francês mas provavelmente um pouco cedo demais, numa época em que o mercado não era o que é hoje, quando o público não tinha exatamente a mesma maturidade e quando havia menos leitores”, acredita Bruno Pham, que hoje se diz confiante no público alvo desta obra.

O público é realmente receptivo a retornos nas prateleiras de mangás "vintage", muitas vezes enfeitados com as palavras "Perfect Edition" ou "Édition Prestige" para indicar um formato ampliado, uma nova tradução, papel de melhor qualidade, páginas coloridas, um prefácio ou uma análise da obra. Algumas séries foram publicadas na França nos anos 90 e 2000, mas estão esgotadas. Outros são novos em nosso país.

“Até agora, o mercado de mangás era essencialmente um mercado de novidades. Uma série, uma vez terminada, não consegue mais ser vendida, encalha." diz Timothée Guédon de Kana, cujo selo Sensei tem vários sucessos retrô (50.000 cópias vendidas do Harlock [4] completo e 30.000 Lady Snowblood [5], por exemplo). A chegada de um novo público revitalizou essas vendas em segundo plano e esta é uma oportunidade de relembrar coisas publicadas há alguns anos.

Sucessos comerciais


Evangelion, Banana Fish e Phénix, três títulos lançados em 2022. Glénat / Panini / Delcourt

Mais de 100.000 cópias da série Evangelion (1995) de Yoshiyuki Sadamoto (Glénat) foram vendidas em 2022. Mais um sucesso, foram os 46.369 exemplares vendidos desde abril de 2021 do volume 1 de Banana Fish (1985-1994) de Akimi Yoshida (Panini), que foi rejuvenescido com uma recente adaptação em desenho animado. Podemos citar também as 10.000 cópias vendidas desde agosto de 2022 de Phénix, l’oiseau de feu (1968-1988, Delcourt) de Osamu Tezuka, considerado o “Deus do mangá”.

Lançado no início dos anos 2000 por J'ai Lu sob o título de Racaille Blues, Rokudenashi Blues (1989) [6] foi revivido em 2022 pela (editora) Pika com bons resultados – 17.300 cópias vendidas dos quatro primeiros volumes. “A ideia foi atualizar o que consideramos verdadeiras obras-primas, mangás graças aos quais houve um antes e um depois em tal e tal gênero”, explica o diretor editorial Mehdi Benrabah. "Rokudenashi Blues é assim emblemático do género “furyo”, protagonizado por jovens delinquentes japoneses, do qual são herdeiros títulos como Tokyo Revengers ou Wind Breakers."


Fleurs de pierre [7], Lone Wolf & Cub e Dynamic Heroes [8], mangas à volta dos 30 euros. Revival/Panini/Isan

A Isan Manga, por sua vez, vendeu mais de 24.000 cópias de Dynamic Heroes, a sequência de Grendizer, graças aos fãs nostálgicos do famoso desenho animado lançado na França a partir de 1978. O preço, 29,95 euros por volume, não desanima os leitores. A editora assume este posicionamento de preço por causa de “um material de grande qualidade, que não amarela”, para que “as pessoas façam valer o seu dinheiro”. Jean-François Dufour, diretor da coleção (e também co-fundador da Japan Expo), espera que o mangá ganhe assim suas credenciais de nobreza: “Meu avô tinha as versões integrais de Victor Hugo todos em couro, eu queria encontrar isso, lembrar disso.” Em 2023, Isan oferecerá títulos antigos de Tetsuya Chiba e Osamu Tezuka (Black Jack, mas também Bomba! e Pomme mécanique [9]).

Vincent Bernière, diretor editorial da Revival, acaba de ganhar o Heritage Prize em Angoulême com sua nova edição de Fleurs de pierre (1984) de Hisashi Sakaguchi. Publicado em outubro de 2022 em grande formato de capa dura a 29 euros o volume, este relato da Segunda Guerra Mundial do lado iugoslavo já é um sucesso com uma primeira tiragem de 4000 exemplares quase esgotados. Detalhe engraçado: a digitalização das placas originais de Fleurs de pierre convenceu os japoneses a relançar o mangá em casa... “Que Hisashi Sakaguchi tenha sido tão esquecido no Japão e na França, é como se, de repente, redescobríssemos Le Secret de l’espadon”, a primeira aventura dos heróis dos quadrinhos Blake e Mortimer, inflama o diretor editorial.

Em faixa de preço semelhante, a edição de prestígio de Lone Wolf & Cub (1970) da Panini vendeu 8.635 exemplares entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2023.

Primeiras experiências confusas


As primeiras publicações de Moto Hagio na França, Le Coeur de Thomas (Kazé, 2012) e Anthologie (Glénat, 2013) não encontraram seu público. Kaze / Glénat

A publicação de mangás clássicos não é novidade na França, mas esse segmento editorial há muito luta para atrair o público francês. Vide o exemplo das coleções de curta duração Asuka Classic e Kaze Classic entre 2008 e 2012.

A experiência da Glénat, uma das mais antigas editoras francesas de mangá, é particularmente esclarecedora. Já nos anos 90, a editora publicou os clássicos de Osamu Tezuka (Astro Boy, King Leo, Black Jack), mas esses heróis da “velha guarda” não podiam competir em termos de vendas com a escavadeira Dragon Ball. A editora voltou a tentar a sorte em 2009 com uma coleção Vintage. "As vendas foram muito, muito baixas, alguns milhares de cópias, se tivéssemos sorte", diz Satoko Inaba, diretora editorial da Glénat Manga. "Não era um esquema comercial sustentável, estávamos realmente fazendo isso pela cultura." A coleção termina em 2013 com a Antologia de… Moto Hagio.

Tudo mudou com a reedição em 2016 de Akira (1982-1990) de Katsuhiro Otomo, considerada uma obra importante. As vendas acumuladas totalizaram 1,5 milhão de cópias no final de 2022, incluindo 400.000 somente em 2022.

A Glénat agora observa as notícias para promover seu riquíssimo catálogo e clássicos: novo desenho animado Parasite (1988-1994) na Netflix, adaptações hollywoodianas de Ghost in the Shell (1989-1991) e Gunnm (1990-1995)... publicação de Trillion Game, a última série de Ryouichi Ikegami, celebrada este ano em Angoulême, também permitiu exumar Sanctuary (1990-1995), assim como,  Crying Freeman (1987-1988), conhecido na França graças ao filme de Christophe Gans.

Os freios permanecem


Trecho da capa do primeiro volume de Arion de Yoshikazu Yasuhiko, cuja publicação está prevista para o final de maio. naBan

O renascimento dos clássicos do mangá não atinge todos os leitores. Para Masahiro Choya, da Panini, o hábito de publicar obras antigas em grande formato, com o consequente aumento do preço, é o principal obstáculo, principalmente entre os jovens, cujo orçamento é mais limitado.

Gráficos “antiquados” também podem ser confusos. “O desenho de Tezuka, em algumas obras, é bastante datado e isso pode frear os leitores mais jovens, acostumados a gráficos mais modernos, talvez mais incisivos", acrescenta Julien Pierre da Delcourt. "Mas isso é contrabalançado por um modernismo muito avançado em certos assuntos abordados e por uma arte narrativa excepcional."

Para Vincent Bernière, do Revival, a falta de aparato crítico em torno do mangá também limita o acesso aos clássicos e seu pleno entendimento, apesar da adição de prefácios e posfácios, até notas de rodapé na maioria dessas reedições. “Além da revista especializada Atom, são poucos os meios críticos que permitem dizer 'eu amo Urasawa e seu mestre é Sakaguchi'”, acredita. Da mesma opinião, Bruno Pham, da Akata, acrescenta que “hoje na França, poucos jornalistas de mangá são mulheres, e muito naturalmente há menos homens interessados ​​em shoujo [mangá destinado ao público feminino] e suas grandes autorascomo Moto Hagio. 

No entanto, a roda dos clássicos continua girando. Após o sucesso de Destination Terra [11] de Keiko Takemiya (1977, com tiragem de 17.000 exemplares), a jovem editora naBan se prepara para publicar Arion (1979) e Venus Wars (1991) de Yoshikazu Yasuhiko, conhecido por seu trabalho em Gundam licença. Futuros best-sellers “vintage”?

[1] Poe no Ichizoku (ポーの一族).
[2] Shoufu Naomi Yawa (娼婦ナオミ夜話).
[3] Kiri no Naka no Shoujo (霧のなかの少女).
[4] Uchuu Kaizoku Captain Harlock (宇宙海賊キャプテンハーロック) de Leiji Matsumoto.
[5] Shura Yukihime (修羅雪姫) de Kazuo Koike e Kazuo Kamimura.
[6] Rokudenashi Blues (ろくでなしBLUES) e Morita Masanori.
[7] Ishi no Hana (石の花) de Hisashi Sakaguchi.
[8] Dynamic Heros (ダイナミックヒーローズ) de Go Nagai, Dynamic Pro e Ochi Kazuhiro.
[9] Bonba! (ボンバ).
[10] Tokei Jikake no Ringo (時計仕掛けのりんご).
[11] Terra E... (テラへ), que não é shoujo, é shounen, apesar de ser de Takemiya Keiko.

6 pessoas comentaram:

Obrigada por traduzir a matéria! O valor das edições tem sido um desafio.

Como a França valoriza os mangás! É o país que mais consome essas obras! Apesar que Itália, Espanha e Vietnã, não ficam atrás!

A França é o segundo mercado de mangás no mundo, então a Itália (*que deve ser o terceiro ou quarto, tem os EUA*), a Espanha e o Vietnã ficam atrás, sim.

EUA consome mais mangás do que a Espanha e Vietnã? EUA só consome mangás populares! Na Espanha e Vietnã, tem até mangás dos anos 80 e 90 que americanos nunca ouviram falar! E de forma oficial! Mangás do Mitsuru Adachi, Izumi Matsumoto e vários no estilo deles que nem eu conheço! Sei por causa de youtubers que mostram nas suas línguas!

PS: Quando fala que a França é o maior consumidor, claro que estou falando depois do Japão! Isso é óbvio!

Ciro, não há dúvida que o Japão é o maior mercado de mangá, você não escreveu que era. De resto, eu não tenho dados para Itália, Espanha, ou outro país que não seja a França em relação ao Japão.

Impressão minha ou sucesso do mangá na França acabou atraindo público de outros países francófonos europeus ? (por extensão)
Como anda o mercado de mangá na Ásia ? (excluindo o Japão, claro)

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