Northanger Abbey recebeu sua primeira adaptação em 1987 e, assim como em 2007, foi um filme para TV. Filmes televisivos podem ser muito bem executados, por exemplo, minha versão favorita de Emma é um filme para TV, assim como considero Persuasão/1995 primoroso e está na mesma categoria. Obviamente, se é um filme, muita coisa pode ficar de fora e a gente termina a experiência de assisti-lo pensando que mais dez minutinhos poderiam ter feito alguma diferença. Estabelecido isso, não sei muito bem como definir esse Northanger Abbey, talvez, tenha sido o material adaptando Jane Austen mais estranho que eu já vi e eu resisti muito em assistir, porque é um negócio que parece gritar o que há de pior nos anos 1980. Eu cresci nessa década e não sinto falta da estética do período, não. Antes de começar, porém, segue um resumo:
Catherine Morland (Katharine Schlesinger) é uma entre dez irmãos e fascinada por romances góticos. Para ela, é difícil separar realidade de fantasia. Logo no início da história, ela tem a oportunidade de se hospedar com o Mr. e a Mrs. Allen (Geoffrey Chater e Googie Withers), seus vizinhos abastados e sem filhos, em Bath, a cidade balneária mais importante da Inglaterra. Lá ela espera viver uma aventura como as que lê nos seus romances. Em Bath, ela é apresentada à alta sociedade e conhece Isabella Thorpe (Cassie Stuart) e seu irmão John (Jonathan Coy), filhos de uma amiga da Mrs. Allen dos tempos de escola. Mais tarde, Catherine descobre que Isabella está noiva de seu irmão, James (Philip Bird), e que ele e John são muito amigos. Em seu primeiro baile em Bath, Catherine conhece Henry Tilney (Peter Firth), um jovem bonito de família abastada, muito gentil, bem-humorado e que entende de mussellina (*um tipo de tecido de algodão*). Ela se apaixona por ele logo nesse primeiro contato. Quando voltam a se encontrar, Henry flerta com Catherine, só que ela está sendo assediada por John Thorpe, que decide criar situações para atrapalhar um possível romance entre os dois, porque ele a quer para si. Para conseguir Catherine, ele conta com a ajuda de sua irmã, que se tornou amiga da heroína e compartilha sua paixão pela literatura gótica sensacionalista.
Henry apresenta Catherine a sua irmã, Eleanor (Ingrid Lacey), que simpatiza com a jovem, apesar de ela ser muito pouco refinada, se comparada com ela e o irmão. Catherine também conhece o irmão mais velho de Henry e Eleanor, Frederick (Greg Hicks), um militar mulherengo que termina por se envolver com Isabella, que vê no jovem oficial um marido mais interessante do que James. Como o pai de Henry está interessado em saber mais sobre Catherine, John Thorpe inventa que a mocinha é herdeira dos Allen e que eles são mais ricos do que parecem. Por conta disso, o pai de Henry, o autoritário General Tilney (Robert Hardy), convida a jovem a visitar a Abadia de Northanger. E a pobre Catherine começa a delirar com os possíveis mistérios e segredos do lugar e se consumir de curiosidade sobre a morte da mãe de Henry. Sua curiosidade, no entanto, termina por causar certa decepção ao rapaz, o que a leva ao desespero. Além disso, o que fará o General quando descobrir que a jovem não é rica como ele imagina?
Northanger Abbey é um dos romances menos lembrados de Jane Austen; isso justifica, inclusive, as pouquíssimas adaptações. Escrito por volta de 1798-1799, ele parece ter sido menos revisado do que outras obras da autora, como Razão e Sensibilidade (Elinor e Marianne) e Orgulho & Preconceito (Primeiras Impressões), que tiveram seus primeiros rascunhos feitos na mesma época. Northanger Abbey deveria se chamar Susan, o primeiro nome escolhido para Catherine, e foi vendido para um editor em 1803. Nunca publicado, foi comprado de volta em 1816, quando a saúde da escritora já estava declinando. Austen tentou aprimorar o texto, que foi publicado junto com Persuasão, seu último romance completo, em 1817. Imagino que ter que se dividir doente entre as duas obras, uma delas o seu romance mais maduro e denso, tenha cooperado para que Northanger Abbey ficasse em segundo plano. Por isso, mesmo com as modificações, os especialistas em Jane Austen, coisa que eu estou longe de ser, apontam que o livro, uma paródia dos romances góticos, muitos deles escritos por mulheres e que faziam muito sucesso na época, é bem irregular em comparação com outras obras da autora.
Como pontuei no início da resenha, esse filme me causa certo incômodo. Sempre que lia resenhas sobre ele, elas eram extremamente desfavoráveis, para usar uma gíria que parece estar na moda, parecia o vale da estranheza entre as adaptações de Jane Austen, especialmente, se levamos em conta a qualidade de Orgulho & Preconceito/1980. Não é ruim nos moldes de Persuasão da Netflix, aquilo é feito para (*supostamente*) agradar às novas gerações de fãs, que são subestimados em sua inteligência por gente da minha geração e mais nova um pouco que acha que compreende seus gostos. Agora, esse Northanger Abbey tem os pés firmes no texto de Jane Austen, mas tem um ar meio trash e é perturbador na criação das cenas dos delírios de Catherine, que sempre se remetem à ideia de estupro com a mocinha fantasiando com TODO e QUALQUER homem que lhe apareça pela frente, inclusive o General Tilney.
Como assisti em seguida ao filme de 2007, e recomendo a leitura dessa outra resenha antes, a minha impressão é que o Andrew Davies, que estava bem inspirado naquela época, pegou o que o filme de 1987 inventou e pensou assim "Vou mostrar como se faz. Vou pegar essa feiúra toda e transformar em um espetáculo que pareça realmente elegante." E mais, eu nunca vi um elenco tão feio colocado em um filme, nem algumas crianças escapam. E mesmo quem não era feio, caso da atriz que faz Eleanor, Ingrid Lacey, parece que foi enfeiada para a película. Sério, é um desastre nesse aspecto. Katharine Schlesinger, por exemplo, ainda tem uns olhos enormes, sempre vidrados, que parecem sugerir algum transtorno. E mais, o Peter Firth não é o irmão mais velho feio do Colin Firth, eles não são parentes. O Firth desse filme é só feio mesmo e aparentando ser mais velho do que era, mas a voz dele é agradável. Se junto com o conjunto ainda tivesse uma voz desagradável, seria o fim da picada.
Vou adiantar uma discussão que geralmente coloco mais para o final das minhas resenhas, porque acredito que seja importante para dar o tom do filme: o figurino. Esse Northanger Abbey está colocado na década de 1790. Não vemos em tela aquilo que identificamos como moda Regência da maioria das produções austenianas e acredito mesmo que muitas das roupas que foram utilizadas devam ter sido tomadas emprestadas de outras produções e minha principal aposta é The Scarlet Pimpernel de 1982. Especialmente, as masculinas. As roupas masculinas desse período, as usadas pelos homens que queriam estar na última moda, eram bem arrojadas e John Thorpe é quem melhor encarna essa moda um tanto extravagante.
No geral, o visual me passa uma impressão de decadência, talvez a ideia seja essa mesmo e encontrei um artigo que me fez refletir sobre isso. Bath, conhecido pelas suas águas medicinais, é um lugar de excessos, de luxo desmedido e de gente que quer ser elegante, mas que somente consegue ser ridícula. Olhar para essa parte em Bath me lembra as caricaturas britânicas que satirizavam as damas e cavalheiros da época e seus hábitos extravagantes. Como se fosse uma espécie de crítica à decadência moral da sociedade da época, ainda sob o impacto da Revolução Francesa. E é a moda masculina na série que melhor aponta para isso. Os mais velhos se vestem como no Antigo Regime, usando perucas, e as roupas ainda coloridas das cortes europeias do século XIX. Jovens como Thorpe e James usam casacas com lapelas enormes e chapéus que parecem uma pré-cartola. Não sei se Thorpe poderia ser chamado de fop, mas ele parece estar no limite.
Um fop era um homem elegante e obcecado por estar na última moda. Thorpe é tudo isso, mas é um alpinista social e não consegue ser elegante de verdade, nem galante com as mulheres; ele somente quer parecer ser, porque, bem, ele está lutando para subir na vida e é um exibido. E temos Mr. Tilney que, inclusive por conta da sua profissão, que nem é dita, ele é pastor, já está com os dois pés firmes no século XIX e se veste com elegância e sobriedade. Um homem dos novos tempos. É na boca de Tilney que o roteiro coloca que eles, os ingleses, são civilizados em contraposição aos que são primitivos e violentos. Ele está incluindo os franceses nesse grupo, afinal, ele deplora os revolucionários jacobinos. Exatamente por isso, me pergunto se o filme não está nos sugerindo que a história deva ser situada depois de 1794, o que a forma dos vestidos das mulheres sugere, aliás. Enfim, temos três figurinos bem marcados para os homens. Os jovens abandonaram as perucas, salvo pelo Capitão Tilney, o irmão de Henry, porque fazia parte do uniforme mesmo.
As roupas das mulheres e seus cabelos são do final da década de 1790. Sem nuances nesse caso. Cinturas altas, decotes profundos para mulheres jovens e nem tanto. Catherine pode eventualmente aparecer com roupas mais ingênuas, por assim dizer, mas é uma escolha de figurino para marcar a personalidade da mocinha em contraposição com o ambiente excessivo e com Isabella, sua falsa amiga, que entra em cena já vestida de vermelho berrante da cabeça aos pés e é identificada imediatamente pelo Henry do filme como uma mulher de moral um tanto frouxa. A maquiagem é forte e é muito mais coisa dos anos 1980 do que de 1790. Exceção para uma personagem inventada para o filme, Marquesa Thierry (Elaine Ives-Cameron), uma amiga do General Tilney e sua informante das fofocas da sociedade. Ela é francesa, fugiu da revolução e usa uma maquiagem aos moldes da corte francesa que não existe mais. Ela é uma relíquia de um passado destruído pela revolução e mais um elemento para reforçar a atmosfera gótica, quase uma vampira.
A segunda metade da década de 1790 meio que libertou os cabelos das mulheres, depois de séculos de contenção, e o cabelo solto e esculpido para parecer natural ou um pouco selvagem faziam parte das mudanças revolucionárias. Então, as mulheres estarem em sua maioria com cabelos soltos não está errado, o problema, e isso é gritante no caso da mocinha, é o fato de algumas delas estarem com cortes dos anos 1980. Katharine Schlesinger usa mullets, além de uns penteados muito feios mesmo. Assim, pegaram a década de 1790 e cruzaram com o que havia de pior nos anos 1980. O resultado é, como pontuei lá em cima, um tanto perturbador.
Me estiquei muito nessa parte, eu sei, acho que já teve gente que largou o texto e foi embora. Enfim, esta versão de Northanger Abbey faz questão de colocar o quanto Catherine é ignorante. Ela não sabe pintar, desenhar, ela não fala outras línguas, ela só lê romances, porque não há ninguém que oriente os seus estudos. E ela é muito sincera em admitir suas limitações, ainda que a crítica que Austen faz no livro às famílias grandes não esteja no filme, porque havia a chance de colocar, mais que na película de 2007. No original, a família de Catherine não pode investir na educação da filha e ela, como a mais velha entre as meninas, é obrigada a cuidar dos menores. Esse tipo de exploração das meninas é comum em famílias grandes até os dias de hoje.
O Mr. Tilney desse filme é atencioso com Catherine, mas é irritantemente debochado. Ele a corrige e é complacente com a protagonista. Tilney elogia os romances, mas lhe alerta que não se deve misturar realidade com ficção. A relação é muito mais desigual e de tutela do que no filme de 2007, que amenizou o livro; o filme de 1987 potencializa esse lado da personagem. E a adaptação não traz uma frase importante de Tilney que serve para desculpá-lo um pouco: "(...) Pense em quantos anos eu tive a vantagem sobre você. Eu já havia começado meus estudos em Oxford, enquanto você era uma boa menina fazendo seu bordado em casa!" ("(...) Consider how many years I have had the start of you. I had entered on my studies at Oxford, while you were a good little girl working your sampler at home!”). A diferença entre eles é de 8 anos. Se colocassem dizendo isso, toda a atitude dele corrigindo e debochando de Catherine seria muito amenizada.
Ainda sobre Mr. Tilney, Henry é muito próximo do irmão e o Capitão Tilney dessa versão é totalmente diferente da do filme de 2007. Ele é expansivo, ele conversa com todo mundo, sorri e flerta descaradamente. Está escrito na cara dele que se trata de um canalha, um boy lixo. Dá-se a entender que Henry foi educado como o irmão, mas optou por ser diferente. Já o General Tilney parece bipolar. Em Bath, ele é alegre, expansivo, encantador, no primeiro encontro com Catherine, a minha impressão é que ele queria a moça para si. Já em casa, em Northanger Abbey, ele é soturno, autoritário e abusivo, principalmente, com Eleanor. Há uma cena da moça desesperada falando com Henry que não suporta estar morando com o pai. Henry a acalma, mas não há o que fazer. E, no final do filme, ele não cria nenhuma cena para apontar para um final feliz para a jovem.
Se o filme de 2007 temos um encerramento corrido com o auxílio da narradora, o de 1987 termina de forma brusca mesmo, como se um beijo fosse o suficiente para resolver questões complexas. Volto a isso daqui a pouco, pois é preciso comentar que inventaram que Eleanor tinha se apaixonado aos 14 anos, em seu primeiro baile, por um dos subordinados do irmão militar. Primeira coisa, qual moça de boa família iria debutar aos 14 anos na Inglaterra do final do século XVIII? Nenhuma. Seria uma irresponsabilidade paterna e o General parecia muito afeito às convenções. E Jane Austen parece estabelecer uma idade aceitável para essas interações: os 16 anos. Antes disso, é escândalo, é confusão, é tragédia e temos bons exemplos em Razão e Sensibilidade e Orgulho e Preconceito. Segundo, o amado da moça parece ser amigo de Henry, passou algum tempo hospedado em Northanger Abbey, provavelmente, ali eles se conheceram. Nenhum dos dois filmes comenta que os papéis misteriosos que Catherine encontra são, na verdade, listas de lavanderia desse moço, esquecidas por seu criado pessoal.
E vamos falar de Catherine Morland. Além dos olhos esbugalhados, de penteados lamentáveis, ela é usada para potencializar a estranheza do filme. No livro, Catherine é descrita como uma tomboy antes de se tornar leitora compulsiva de romances. O filme de 2007 mostra isso no início, sempre usando a voz da narradora, que não existe em 1987, que já introduz a moça aos 17 anos, ávida por aventuras em Bath. Ela recebeu uma educação pouco requintada e é tratada principalmente por sua mãe (Helen Fraser) como uma cabeça de vento sem salvação, por assim dizer. As interações dela em Bath são parecidas com o livro, mas inventam uma cena doida dela correndo pela cidade com as saias levantadas até os joelhos para tentar avisar os Tilney de que foi enganada por Thorpe e que ele mentiu para eles. Ela invade a casa do General da forma mais insana possível e, para a minha surpresa, o pai de Henry não a escorraça de lá, mas a trata com uma gentileza absurda e, também, um interesse suspeito. Foi a primeira cena do General Tilney no filme. No livro, ela não é recebida e tem que se esforçar para desfazer a confusão.
Já em Northanger Abbey temos aquelas situações estranhas, com ela se perdendo pela abadia, umas como sonho, outras como realidade. Há a cena do canário na gaiola, um pássaro que, no filme, ela desconhecia. Tilney explica o que ele é e ela lamenta que o bicho esteja preso, ao que o rapaz diz que ele não poderia viver de outra forma. Talvez seja uma analogia com a forma como o General trata as pessoas de sua família e que ela não aceitaria isso de bom grado, ou as palavras dela um alerta para que Henry tomasse uma posição e rompesse com essa submissão absurda em relação a um pai cruel.
Agora, a cena mais estranha, levando-se em conta que os delírios eróticos começam antes da estadia na abadia, é a do sarau com a marquesa e duas moças, uma delas a única atriz realmente bonita no filme, no qual Henry canta em italiano várias músicas e meio que flerta com essa moça. Catherine está sentada entre encantada e incomodada, mas o pequeno pajem da marquesa, um menino negro (Raphael Alleyne), puxa sua manga e ela sai com ele para o jardim. Lá, o menino começa a dar estrelinhas no jardim. E ninguém nem nota que ela saiu. E a cena não tem função nenhuma. Ou seria sonho? E quando ela é expulsa de Northanger Abbey pelo General a sequência é toda tão insípida, tão sem emoção, não chega perto do livro e perde muito para o filme de 2007. Já o confronto de Henry Tilney com o pai horroroso é uma das melhores cenas do filme, porque mesmo com os problemas que já apontei, os atores são bons e o texto no geral é de Jane Austen.
Mas esse filme supera a adaptação de 2007 em um ponto importante: John Thorpe. Neste filme, ele é um delirante, um canalha e abusivo. Fica muito claro que ao dizer que Catherine é uma herdeira para o General Tilney, ele o faz por acreditar na sua mentira e para conseguir atrair a atenção de um homem bem relacionado como o pai de Henry Tilney, mostrando-lhe que ele é alguém interessante. O que Thorpe não imaginava é que o militar iria querer a falsa rica herdeira para seu filho. Quando ele percebe que Catherine está interessada em Henry Tilney, ele tenta fazer chantagem emocional, mas, também, usar da violência, apontando para o marido que poderia ser. Ele a segura com força pelo braço. E, o que foi surpreendente, ela reagiu.
Ela não se deixa intimidar por ele. A Catherine desse filme não se mostra amedrontada ou em qualquer débito em relação às atenções que Thorpe lhe dedica. E, sim, a vingança faz sentido, ele conta para o General que se enganou e que Catherine é uma aventureira sem dinheiro algum. Outro ponto positivo é coisa pequena, Mr. Allen age como no livro e tenta proteger Catherine do escândalo com um cuidado paternal. É ele quem começa a alertar Catherine de que Thorpe não se comporta como um cavalheiro e pode comprometer sua reputação. Enquanto isso, Mrs. Allen é uma deslumbrada que não percebe o perigo que a moça corre. E esse cuidado paternal é importante, porque nem a mãe nem o pai de Catherine parecem muito interessados nela, na sua educação, nos seus sentimentos. São muitos filhos, muita atenção para dividir e nem somos informados de que são dez filhos nesse filme de 1987.
No livro, a mãe de Catherine também não é muito compreensiva com o trauma da moça ao ser expulsa de Northanger Abbey. A protagonista acredita que Henry a despreza por ter invadido os aposentos de sua mãe e inventado fantasias sobre seu pai, que esse foi o motivo da ação do Genneral. É muito diferente da atenção amorosa que ela recebe da mão no filme de 2007. A mãe do livro quer que Catherine esqueça o que passou e volte a ser útil, isto é, dividir as tarefas domésticas e ajudar a cuidar dos irmãos e irmãs mais novos. Esse tema poderia ter sido abordado por Andrew Davis em 2007, mas também não foi.
Davis poderia ter explorado, porque o seu Emma é muito bom em trazer as questões de classe, mas discutir classe social pode ser importante para falar dos homens e, neste caso, teríamos que discutir gênero e desigualdades que, talvez, não lhe parecessem tão urgentes. Vai saber, não é? Enfim, no filme de 1987, nem isso, a mãe parece não ter esperança em relação à Catherine. E eis que quando a moça está vagando meio atordoada no meio de um matagal, me aparece Henry Tilney. E ele diz que não precisa da autorização do pai para casar. Isso é verdade, ele tem mais de 25 anos, ele pode se casar sem a assinatura dele. Ele a beija, e fim. E é tudo tão esquisito, tão pouco satisfatório, que esse filme é, sem dúvida alguma, a adaptação mais estranha que eu já assisti de Jane Austen.
Concluindo, há uma sequência das personagens em uma das casas de banho termais de Bath. A cidade era um balneário desde a época romana; suas águas quentes e com minerais eram muito apreciadas, são até hoje. Só que no século XVIII, a medicina da época atribui ao lugar um valor maior. Havia outras cidades com banhos medicinais, mas Bath é uma personagem de mais de um dos livros de Jane Austen; ela morou lá por um tempo. E em Bath, havia banhos públicos para os pobres, também, o que me surpreendeu. Os últimos banhos foram fechados em 1978.
Ao que parece, a representação do filme é bem fiel, mesmo que estranha, especialmente o lanchinho, eu diria. As pessoas usavam roupas especiais, havia banhos mistos, para mulheres somente e alguns que alternavam dias da semana para um sexo e outro. Então, sim, ter homens e mulheres juntos era possível. É sempre bom lembrar que a moral do período Georgiano (1714-1837) não era a mesma que vai se construir no período Vitoriano (1837-1901). O pessoal era bem mais livre e aprontava abertamente muito mais do que muita gente acredita. Agora, acabou a resenha.


































































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