quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Comentando Elizabeth R - Série da BBC



Sempre que via alguma página comentando sobre atrizes que tinham interpretado a Rainha Elizabeth I (1533-1603), salvo se fosse coisa escrita por gente muito novinha ou desinformada, era obrigatória encontrar que Glenda Jackson tinha sido a atriz a melhor encarnar a filha de Henrique VIII no cinema e na TV. Sim, porque ela foi Elizabeth duas vezes, a primeira em Elizabeth R, de 1971, a minissérie que vou comentar aqui, a outra, em Mary Stuart (Mary, Queen of the Scots), que resenharei no futuro. Jackson já era uma atriz consagrada e recebeu dois prêmios Emmy pelo seu trabalho em Elizabeth R, além de dois Oscar de melhor atriz em 1969 por Women in Love, e outro em 1973 por A Touch of Class.

Como tinha muita curiosidade em relação a essa série e não conseguia baixar nem metade dos seis episódios, então, decidi encomendar no Amazon Britânico. O box com a série da BBC é muito bem feito, com três DVDs, cada um com dois episódios. Cada episódio tem cerca de uma hora e meia e só por isso vocês já podem tirar a grandiosidade da produção. Não são episódios cansativos, eu começava a assistir e queria ver direto, sem parar. E, ao contrário de Jane Eyre (1973), tem legendas e isso facilita na hora de assistir. Além do excelente roteiro e interpretações no geral muito boas, o grande destaque é o figurino. Todas as roupas da série são inspiradas em pinturas de época, algumas das de Elizabeth vieram direto dos quadros e só por isso a série já seria um deslumbre. As cores, às vezes, são muito fortes, talvez por ser uma das primeiras grandes séries em cores, mas isso não é defeito.



Os nomes dos capítulos são The Lion's Cub, The Marriage Game, Shadow in the Sun, Horrible Conspiracies, The Enterprise of England e Sweet England's Pride. Eles cobrem a vida de Elizabeth desde o governo de Eduardo VI até a sua morte, mas não o fazem seguindo uma cronologia rígida. Na verdade, eles funcionam aos pares. Os primeiros dois cobrem a adolescência e o início do governo da soberana; o terceiro e o quarto o seu flerte com o príncipe francês e a morte de Mary Stuart, quando ela já estava com mais de quarenta anos; os dois últimos a Armada e o final de seu governo. O primeiro e o último episódio talvez sejam os únicos que não merecem pelo menos uma nota nove. Vamos explicar os motivos.

Glenda Jackson tinha mais de 30 anos quando encarnou Elizabeth, assim, por mais competente que ela seja, não conseguiu encarnar uma menina entre os 13 e 15 anos. O episódio usa um recurso muito interessante mostrando a ação pelos olhos da menina, é assim que vemos a tentativa de Thomas Seymour – guardião da princesa Elizabeth – de seduzir a jovem. Seymour era marido de Katherine Parr, a viúva de Henrique VIII. Não fica claro no seriado se Seymour e Elizabeth chegaram a ter alguma intimidade, essa é uma das dúvidas mantidas ao longo da série. Seria Elizabeth realmente virgem? De qualquer forma, o episódio 1 é um definidor do caráter da personagem. Não gostei das imprecisões históricas, como colocar Elizabeth no leito de morte de Katherine Parr. A rainha viúva perdoou a enteada, só que por carta, e quem estava na beira do leito de Parr era Jane Grey, a rainha por nove dias. Gosto muito de Lady Jane, a sua representação no seriado foi um dos pontos baixos. Os destaques do episódio foram Ronald Hines (Lord Cecil) e Daphne Slater (Maria I). A partir do momento que Elizabeth é adulta, Jackson toma posse da personagem e é um deleite assisti-la atuar. E ela termina recebendo a notícia da morte de Mary da boca de Lord Cecil e diz "Posso não ser o Leão (Henrique VIII), mas vou mostrar que sou o filhote do leão." Daí, o título do episódio.



Já o último capítulo é muito bom. Tentem imaginar o trabalho da maquiagem, pois ela tem que fazer uma mulher de 35 anos parecer uma mulher de quase 70 fingindo ser uma mulher de 30. A aparência de Elizabeth é grotesca, mas reflete bem a vaidade e a necessidade que a personagem parecia ter de passar a imagem de que era imune ao tempo. Jackson tem um desempenho espetacular e a cena da morte de Elizabeth fecha a série em grande estilo. O problema para mim é a representação de Robert Devereaux, Lorde Essex. Essex foi favorito de Elizabeth, tanto que isso rendeu o filme com Errol Flynn e Bette Davis em que os dois tinham um romance. O bizarro da coisa é que eu nunca tinha parado para procurar informações sobre esse sujeito. Enfim, ele poderia ser neto de Elizabeth e no filme dos anos 1930, eles pareciam ter a mesma idade. Já na série com a Helen Mirren, Essex é o Hugh Dancy. Tenho aqui no HD, mas não assisti ainda, só passei os olhos, mas ali a idade bate. Pois bem, Essex tentou dar um golpe de Estado e, depois de alguma resistência por parte de Elizabeth, foi condenado à morte. Segundo as fontes, ele teria dito que a Inglaterra não era grande demais para ele e Elizabeth. Pois bem, o Essex do seriado de 1971 é uma figura patética que se joga aos pés do filho de Lorde Cecil, substituto do pai, e pede por sua vida. Liberdade criativa é importante, mas descaracterizar a personagem é algo que eu detesto.

De resto, os outros episódios tem grande qualidade, ainda que inventem e modifiquem coisas. Robert Dudley, Lord Leicester (*padrasto de Essex*) é apresentado como o grande amor da rainha. Robert Hardy, que foi Cornelius Fudge nos filmes de Harry Potter, é velho demais para fazer o jovem Leicester, mas ele toma posse da personagem e se sai muito bem. No terceiro episódio, ele já está com a idade certa, por assim dizer, e, depois, a maquiagem o envelhece como acontece com os outros. A série pinta o romance dele com Elizabeth como incendiário, porém casto. Ela não abriria mão de um milímetro do seu poder e o casamento não era uma boa escolha para uma mulher no século XVI. Outra que não fica bem nos primeiros episódios é Vivian Pickles, que faz Mary Stuart. Ela era mais velha que Glenda Jackson e a rainha dos escoceses era mais jovem que Elizabeth. Deveriam ter usado duas atrizes, mas, de novo, ela se sai bem nos episódios que centram em sua morte. E, bem, a violência da execução da rainha foi surpreendente, especialmente em um seriado de 1971. E o desempenho de Jackson como a angustiada rainha que não queria executar sua prima foi impressionante.



E uma das coisas que mais gostei da série foi de Filipe II (Peter Jeffrey), rei da Espanha. Não sabia que o rei da Espanha tinha cortejado Elizabeth, pensado em casar com ela depois da morte de sua irmã, a rainha Maria. Há uma cena na qual Filipe observa escondido Elizabeth se vestir que deixa a impressão que ele está se masturbando. Outra coisa ousada para uma série de 1971, eu suponho. Depois, ele vai envelhecendo ao longo dos episódios, assim como Elizabeth. É interessante ver como as convenções de precedência da nobreza acabam levando o velho rei a fazer as escolhas erradas para o comando da Armada que ele lança sobre a Inglaterra. Chega a ser cômico mesmo. Agora, não pensem que os espanhóis estão na série para parecerem ridículos, ou que exista a exaltação dos protestantes. Quando os ingleses destroem a Armada, Elizabeth em triunfo age muito mal com os seus marinheiros, os trata como vagabundos. Seu almirante-chefe fica indignado, afinal, os marinheiros britânicos foram heróicos e salvaram o país, mas se curva à vontade real. Enquanto isso, o velho Filipe, dá ordem para que todo o apoio seja dados aos derrotados marinheiros espanhóis. A bondade do velho Rei em um momento tão pouco auspicioso, contrasta com a tirania da vitoriosa Elizabeth. E eu continuo não gostando de Filipe II, mas Peter Jeffrey, deu um show nos dois episódios em que apareceu e a personagem ficou ótima. Não há maniqueísmo, todos tem defeitos e qualidades em Elizabeth R e isso também torna a série grandiosa.

Falando de atrizes que fizeram Elizabeth, já assisti vários filmes (*além de documentários e docudramas*) centrados na rainha. O mais antigo filme sobre Elizabeth que lembro de ter visto foi A Rainha Tirana (The Virgin Queen, 1955), com ninguém menos que Bette Davis. Aliás, ela interpretou a rainha duas vezes, pois já tinha feito o papel em Meu Reino por um Amor (Essex and Elizabeth, 1939). Outra Elizabeth que eu me lembro é Flora Robson – que fez a rainha em várias produções – em Fogo sobre a Inglaterra (Fire over England, 1937), filme inglês que tinha como protagonistas os muitos jovens (*na época*) Laurence Olivier e Vivien Leigh. Mais recentemente – ou nem tanto – interpretaram Elizabeth no cinema e na TV Cate Blanchet, Helen Mirren, Judi Dench e Anne-Marie Duff. Estou listando somente as interpretações que me lembro, porque abrindo o IMDB vejo que assisti outros filmes com aparição de Elizabeth, mas as interpretações não me marcaram em absoluto. Dito isso, para mim Glenda Jackson é a Elizabeth absoluta.



Não estou falando em "verdadeira" Elizabeth, pois ninguém sabe exatamente como ela era e nisso concordo com Robert A. Rosenstone (A História nos Filmes, Os Filmes na História) ao criticar as análises de filmes feitas por historiadores. Se bem que ele falava de Joana D'Arc, sobre Elizabeth se sabe muito mais. De qualquer forma Glenda Jackson é muito verossímil como a rainha em suas mais diferentes fases da vida. Isso tudo e um figurino e maquiagem impressionantes, e um roteiro bem articulado, faz a diferença. Cate Blanchet é uma atriz brilhante, mas seu Elizabeth é um filme confuso e pretensioso. Salva-se a atuação dela e do Geoffrey Rush. O conjunto é ruim e, claro, as personagens não envelhecem. Enfim, é isso. Recomendo a série, há pedaços dela no Youtube. Agora, devo assistir a série com a Helen Mirren, que de bônus tem o Hugh Dancy e Jeremy Irons. Para uma excelente review do figurino da série, sugiro este site.

3 pessoas comentaram:

Eu vi o filme da Cate Blanchet e gostei muito do Geoffrey Rush (se bem que tudo que ele faz é glorioso). Das outras séries e filmes que listou, só vi "Virgin Queen" da BBC, por causa do Tom Hardy (que faz o Robert Dudley), confesso. Mas a série é legal, eu gostei bastante. A maquiagem do Tom velho foi convincente, mas a da Elizabeth foi perfeita! Achei nível Piaf! Ela parecia mesmo uma velha! Acho que pra quem gosta desta história, é uma boa série.

Parece ser uma série bem interessante (pena que essas coisas nunca saem por aqui). O único filme que vi sobre Elizabeth I foi o com a Cate Blanchet, que achei muito legal e bem feito. Não conheço muito desse período ou sobre a vida da rainha, então, não posso opiniar muito sobre a veracidade das coisas. Fico de olho no que você resenhou.

Está aí uma série que vou assistir! Ótima review a sua!

Related Posts with Thumbnails