segunda-feira, 28 de maio de 2012

Comentando Mockingjay – Último Livro da série The Hunger Games – Parte 1



Na quarta-feira passada terminei a leitura de Mockingjay e por falta de tempo e por não saber bem como encaminhar o texto, acabei esperando um pouco antes de escrever. Assim como no caso do segundo livro, serão dois textos. Comecei a escrever, mas foi ficando longo demais e vou continuar em outra oportunidade. Enfim, gostei muito de Mockingjay durante boa parte do tempo, gostei mais deste último livro do que do segundo, mas, com certeza, este livro está muito longe da perfeição. Mas não me propus a ler a série The Hunger games em busca disso e o livro fechou de forma satisfatória a saga de Katniss. Pois bem, não pouparei ninguém de spoliers, então, continue por sua conta e risco.

Quando terminamos o livro 2 – Catching Fire – Katniss tinha sido resgatada da arena depois de ter desvendado a lógica do jogo (*o relógio e seus horrores orquestrados*) e destruído o campo de força. Junto com ela, estão Finnick Odair e Betee. Só que Peeta, assim como Johanna, ficam para trás. Katniss acreditava que tinha sido retirada da arena para enfrentar sua morte ou algo pior nas mãos do presidente Snow. Não tinha idéia de que havia sido resgatada pelos rebeldes – mais especificamente Plutarco, o Mestre do Jogo – e estava sendo levada para o (supostamente destruído) Distrito 13.

Katniss passa muito tempo dopada e se recuperando dos ferimentos que sofreu. Ela não tinha idéia de que todos, ou quase todos, menos ela e Peeta, sabiam da conspiração. O próprio Plutarco havia mostrado para a moça um relógio com o mockingjay em uma festa do tour dos vencedores. Mas a moça, claro, não entendera. Katniss não perdoa Haymitch pelo que ele fez, por tê-la enganado. Só que novamente os adultos sonegam informações e mentem, porque acreditam que sabem o que é melhor. Katniss é estourada demais para fazer “a coisa certa”, é o que pensam, sendo mantida nas sombras. Só que, para a moça, essa ignorância, além de traição, pode ter custado a vida de Peeta.

Para piorar as coisas, a menina descobre que todo o Distrito 12 foi destruído e que somente cerca de 10% da população escapou. Fortuitamente, sua mãe e irmã, Gale e sua família, estão entre os sobreviventes. Aliás, Gale teve papel fundamental no resgate e se adequou quase que perfeitamente no militarizado e perpetuamente em racionamento Distrito 13. Vejam bem, é muita sorte as pessoas que Katniss mais ama terem escapado, mas Suzanne Collins já tinha sido cruel demais com sua protagonista e, claro, ainda temos mais um livro para sofrer...

E nesse terceiro livro que Gale tem mais chance de aparecer, não que em qualquer momento eu acreditasse que poderia se desenvolver alguma coisa entre ele e a protagonista. O rapaz a ama, isso já sabemos, mas Katniss nunca havia pensado seriamente em nada a não ser a sobrevivência. Daí, é muito inusitada a conversa que lá na frente Peeta e Gale tem “Katniss vai escolher, ou não, mas se tiver que escolher, irá ficar com aquele que ela tenha certeza que não poderá viver sem”. De novo, a sobrevivência.

Depois de ter lido os três livros, eu discordo veementemente da moça do Feminist Frequency (*vide resenha do livro 1*) que reduziu o livro 2 e 3 da série a uma discussão sobre com quem Katniss vai ficar. A série continua sendo uma discussão sobre o amadurecimento em uma sociedade distópica, sobre a violência da guerra, sobre como a mídia manipula. A pobre Katniss passa por um longo período de depressão marcado primeiro pela versão futurística da morfina para acalmar seus pesadelos e terrores, depois, pela recusa de se enquadrar na controlada rotina do Distrito 13 (*é aí que ela se esconde dentro de um armário, o único lugar onde encontra privacidade e se sente segura*), até ser apropriada definitivamente como o rosto da revolta, o Mockingjay. Ela descobre que seu amigo Cinna havia planejado tudo, até seu traje...


Peeta, no entanto, está nas mãos da Capital, ele também é usado como rosto e voz para tentar pôr fim á rebelião. Seu fracasso, afinal, os rebeldes sabiam que seriam massacrados se aceitassem o cessar fogo, faz com que ele seja torturado cada vez mais. Katniss percebe que as coisas estão cada vez piores e se culpa pelas várias mortes, pela rebelião, pelo destino de Peeta, pela destruição do Distrito 12... Como já escrevi antes, ninguém sai imune da arena. E Katniss enfrentou a arena duas vezes. No livro três, quando ela participa da invasão da Capital, é como se ela o fizesse uma terceira vez ainda...

Neste livro, é apresentado um modelo de sociedade muito diferente daquela vista na Capital. O Distrito 13 é o perfeito inverso. Tudo é controlado, medido, cinza, triste. As pessoas são saudáveis, mas privadas de lazer e ao que aprece de escolhas. Trata-se, também, de um mundo militarizado, com adolescentes a partir dos 14 anos fazendo treinamento militar. Mas eles recebem bem os refugiados do Distrito 12 e a mãe de Katniss, Prim e Gale conseguem se encaixar bem. Katniss e Haymitch sofrem, claro, eles são sobreviventes dos Hunger Games, mas acabam se submetendo.

Acho que uma das melhores coisas dessa primeira parte do livro foi ver a reconciliação entre Katniss e Haymitch. Ele, apesar dos pesares, ocupou o lugar de pai para a menina. Ainda que ele erre – e os adultos erram muito em The Hunger Games – ele desenvolveu real apreço por Katniss e Peeta. E, claro, apesar de Katniss achar o contrário, era dela que ele gostava mais, já que os dois eram muito mais parecidos. Assim, terminamos descobrindo que não foi somente Katniss que Snow ameaçou e puniu. Haymitch também pagou seu preço por desafiar a capital e a bebida foi o que lhe sobrou, ainda que mesmo como bêbado ele saiba fazer as escolhas e os acordos certos. Obviamente, aqui caberia falar de Finnick Odair, mas vou deixar par ao segundo texto.

É nessa primeira parte do livro que conhecemos, também, a presidente Coin. Mulher competente, mas dura e manipuladora. Ela quer que Katniss cumpra ordens, mas nem se quisesse – e ela não quer – a protagonista seria capaz de obedecê-la. Coin quer o melhor para seu povo, mas é quase inflexível com as regras e as aparições de Katniss, ainda que necessárias, deveriam ser todas planejadas. Katniss aceita ser o rosto da rebelião com algumas condições, a mais importante delas, que os vencedores capturados pela Capital – Peeta, Johanna, Anne Cresta (a amada de Finnick) e mesmo Enobaria – sejam poupados. Coin naõ quer cooperar, mas Katniss é inflexível e a presidente não vai perdoá-la por isso.

Vou parar por aqui. Mas antes de ir, é preciso reforçar que apesar dos problemas – e vou focar em alguns deles na parte dois do texto – o livro três reforça ainda mais a vontade da autora de criar um futuro no qual os papéis de gênero sejam neutralizados. Sem contar com Katniss, temos mais três mulheres exercendo liderança: Coin e as líderes da revolta nos distritos 8 e 2, Comandantes Paylor e Lyme. Collins também coloca uma mulher como instrutora militar de Katniss e metade do destacamento de elite no qual a moça é encaixada são mulheres. Isso não é pouca coisa, levando-se em conta o que é oferecido na ficção.


Collins merece todos os elogios por mostrar que mulheres podem ser e são fortes de várias maneiras. Prim, por exemplo, é uma das personagens mais fortes da trama sem pegar em uma arma. Que mulheres podem igualmente ser perversas e traiçoeiras, mas não por serem mulheres, mas por se deixarem levar por idéias e sentimentos pouco evoluídos, por assim dizer. Ela também cria uma protagonista que em nenhum momento é valorizada por seu corpo ou beleza. Katniss é amada por dois sujeitos de grande valor, mas em nenhum momento ela é reduzida a objeto do desejo, ou usa seu corpo como arma de sedução, ou se entrega às lágrimas como forma de chantagem ou de ilustrar que ela é uma menina. Por isso, e muito mais, eu considero The Hunger Games uma trilogia feminista. E acredito que a autora tinha realmente a intenção de que fosse assim, não foi por acaso.

Temo que os filmes, assim como o primeiro tirou as mulheres das minas, mexam em muita coisa para tornar a série mais palatável aos machistas de plantão, aqueles que acham que mulheres são enfeites em filmes e que personagens de ação precisam ser homens ou seres masculinizados, isto é, carregados de estereótipos de gênero. Nossa Katniss é forte, mas não é esse tipo de personagem e eu fiquei muito feliz de vê-la sofrer, chorar, lutar, fugir, errar, amar, e, mesmo, se esconder dentro de um armário. Até o próximo texto.

4 pessoas comentaram:

Muito bom o texto, estou curiosa para a parte II o/

Boa sorte ^^

Eu estou muito ansiosa pelas críticas que você vai fazer. Muito mesmo

Esse terceiro livro é tão bom quanto os outros. Na apresentação do Distrito 13 e de toda a sua descrição fiquei achando que poderia ser uma alusão com países socialistas da antiga URSS. Talvez não tenha sido a intenção da autora, mas foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando li.

"Ela também cria uma protagonista que em nenhum momento é valorizada por seu corpo ou beleza. Katniss é amada por dois sujeitos de grande valor, mas em nenhum momento ela é reduzida a objeto do desejo, ou usa seu corpo como arma de sedução, ou se entrega às lágrimas como forma de chantagem ou de ilustrar que ela é uma menina. Por isso, e muito mais, eu considero The Hunger Games uma trilogia feminista. E acredito que a autora tinha realmente a intenção de que fosse assim, não foi por acaso."

Uma das falas mais bonitas que eu já li na vida. Obrigada por essa resenha linda, super concordo com tudo. <3

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