sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Algumas Palavrinhas Atrasadas sobre a Final do Master Chef Profissionais


Sei que este post está bem fora do timing, mas só terminei de assistir ao Master Chef Profissionais hoje. Não tive como ver em casa, comecei a ver a segunda temporada (*por sugestão da amiga Érika*)  me empolguei com ela, acabei viajando, e tive que pedir para meu marido baixar o resto do programa na casa do irmão dele, porque a conexão na casa dos meus pais funciona precariamente. Enfim, mas a vantagem de assistir e analisar depois é que as coisas estão frias e é possível ter um afastamento crítico (*não neutralidade*) que, talvez, no calor do momento, eu não tivesse. Seguem alguns pontos, serão poucos:

Disse no meu primeiro (*e único*) texto sobre o Master Chef Profissionais e repito, qualquer um dos dois – Marcelo e Dayse – poderia ter ganhado. Observando a análise dos juízes, e somente isso mesmo, já que eu não comi nada, tampouco teria capacidade para avaliar, ambos os competidores eram muito competentes e tiveram um desempenho marcadamente superior ao longo do programa.  Daí, acredito ser injusto usar o Master Chef para produzir um texto (*muito bom, por sinal*)  sobre a confiança do homem branco medíocre, porque, bem, a julgar por tudo o que os juízes disseram do Marcelo até o final, ele pode ser tudo, menos medíocre.

Qualquer um dos dois poderia vencer.
Marcelo começou com o pé esquerdo, se destacou em provas individuais e, via de regra, se saiu mal ao trabalhar em grupo. Ele parecia ter um quê de gênio e, bem, quando você é deveras inteligente, criativo, whatever, você tende a ter dificuldades para cooperar com outras pessoas. Só que cozinha profissional é trabalho em grupo, também. Talvez, no Master Chef comum, ele não conseguisse sobreviver até o fim, mas no formato profissionais, ele teve espaço para se destacar, mostrar do  que era capaz e colheu elogios por sua ousadia. Era um sujeito egocêntrico, talvez mimado, humilde da boca para fora (*vide o discurso dele na final e  sua atitude geral*), PORÉM não é isso que o Master Chef avalia, como bem a Paola colocou no seu supostamente polêmico discurso final.

Agora, Marcelo pode ser o que for, e a gente não pode, também, descartar as questões de edição que ajudam a criar personagens (*e acho que nos três programas finais o Marcelo meio que embarcou na caracterização do menino maluquinho meio perverso*), mas ele não se recusou a emprestar produtos para a Dayse na final. Ele poderia negar, ou ignorar, mas, mesmo com as deficiência de personalidade que tem, ele ajudou. Outra coisa, li gente falando que ele não apertou a mão da Dayse. Ele apertou. Foi seco, foi de má vontade, mas ele não virou as costas e foi embora batendo o pezinho. Independentemente do que ele tenha dito depois, diante das câmeras, ele se conteve, mesmo se vendo como melhor o tempo inteiro. Dario me pareceu muito mais infantil (*e menos brilhante*) que o Marcelo.

Dario começou bem e terminou se comportando como um moleque bobão.
A Dayse, e eu torci por ela a partir do quarto final do reality show, foi subestimada por praticamente todos os concorrentes. E repito que não foi somente machismo, o que já não seria pouco, mas era preconceito de classe. Dayse parecia ser a mais pobre e menos refinada dos competidores. Salvo o Ivo, claro, mas ele tinha nome e os jurados ficavam cheios de dedos com ele, afinal, ele era quase um igual, da~i esperarem muito mais dele o tempo inteiro.  Em relação ao classismo, Paola mesmo deixou isso evidente sem querer uma vez, era uma prova com ingredientes refinados e a  julgadora achava que o perfil da Dayse era outro. Bem, que outro? Ela era "uma cozinheira de mão cheia", um elogio sem dúvida, mas, possivelmente, não uma chef, ainda mais, de primeira linha.  Faltava o quê?  Será que era (*somente*) por ser mulher?  Percebem o elitismo atravessanndo a  coisa toda?

Eu que já ouvi coisas como “Calada, ninguém dá nada por você” ou “Não imaginava que você tivesse um currículo tão bom”, sabe o que é ser tratada como alguém que não merece (*ou deveria*) estar em um determinado espaço. No meu caso, o acadêmico, ou uma instituição de ensino de elite. A Dayse era desqualificada o tempo inteiro e o que chocou muita gente foi ver os “brothers” – Ivo, Dario, Marcelo – literalmente a ignorando. Fádia, por quem eu torci até que ela mostrou esta faceta elitista agressiva, teve uma prova de eliminação inteira telegrafada do mezanino pelo Dario e, ainda assim, se achava melhor que a Dayse,que sempre se saiu muito bem. Ela considerou a Dayse inferior até o último minuto.  E citei uma mulher, porque quero reforçar que o machismo foi só parte do problema. Fádia nào fazia pouco caso da Dayse por ela ser mulher, mas por não fazer parte da panelinha, ter ousado ser algo mais do que "uma cozinheira d mão cheia". Daí, o  menu da Dayse homenagear suas origens humildes, os produtos que sua mãe usava  para cozinhar, foi lindo.

Izabela, uma das primeiras a apontar o machismo no mundo da alta gastronomia.
E chegamos ao discurso final da Ana Paula Padrão e da Paola Carosella. A chef, principalmente, foi acusada de ter abraçado um discurso feminista (*como se ser feminista fosse doença, falha de caráter, ou sei lá o quê*) e prejudicado o Marcelo com suas notas. Primeira coisa, ele não perdeu por causa das notas dela.  Todas as notas foram abertas e basta observar como votou cada um dos juízes. Houve uma curva bem definida com a Dayse sendo melhor no início e no final e Marcelo se saindo muito bem nos pratos principais, chegou a ficar na frente. Simplesmente, a conta não fechou para ele. Paola foi a única a dar notas 10 e, se bem estive atenta, foram duas, ambas para o Marcelo. Obviamente, parece estranho que alguém que se rasga em elogios dê nota 2 ou 4. Ela deu um quatro para a Dayse, também, aliás.

Eu sou professora e se eu elogio um trabalho, ou prova, é porque a vale entre 9 e 10.  Agora, vou tentar analisar usando minha referência como professora. Já tive que tirar ponto de trabalhos excelentes, porque ficou faltando algum detalhe mínimo, mas formalmente importante. Exemplo, era necessário colocar bibliografia. O grupo, ou o aluno/a, fez um texto estupendo, que eu sabia ser deles, mas esqueceram a tal bibliografia, ou outro aspecto formal. Perderam pontos, mas nunca seriam tantos, tipo, iria ser um 10 e ficou com 9 ou 8,5. O problema é que a Paola se rasgou em elogios para todos os pratos do Marcelo e as notas não acompanharam. Só que, como escrevi, ele não perdeu por causa disso. As notas dela nunca destoaram tanto da dos outros juízes.

Algumas notas de Paola foram realmente esquisitas.
Quanto ao discurso, tanto da Ana Paula, quanto da Paola, em que elas mentiram? Em ambientes profissionais dominados por homens, as mulheres são subestimadas, excluídas, julgadas or sua aparência, às vezes, protegidas (*porque são fracas, menos capazes, podem chorar etc.*) e tem sua progressão profissional muitas vezes obliterada por serem exatamente isso, mulheres. A apresentadora do Hell's Kitchen, programa parecido com o Master Chef do SBT, disse coisas semelhantes e contou umas histórias cabeludas até  de tentativa de insubordinação, porque para alguns homens ser mandado por uma mulher é o fim do mundo, mesmo que ela pague o seu salário. 

 Jacquin disse que via algo dele no Marcelo e citou por alto um caso de problema em sua família e como preferiu, por amor ao trabalho e responsabilidade, terminar o serviço e, somente então, ir ao encontro dos seus.  E o tipo de cumprimento que só um homem receberia mesmo.  Vai uma mulher fazer algo assim!  Poderia receber algum elogio, mas, pelas costas, seria a carreirista, sem coração, que só pensa em dinheiro, ou a obcecada com trabalho, que não valoriza o que realmente importa (*marido, filhos, família*).  Mulheres não preferem cuidar dos filhos e filhas doentes, elas sabem que isso é sua responsabilidade e que, muitas vezes, não se pode esperar uma divisão de tarefas com o pai, mesmo que ele queira.  Aí, vem certos economistas machistas e dizem que o justo é que as mulheres recebam menos, ou não ocupem postos de chefia, pois não tem tanto compromisso com o trabalho, a profissão. Cortam as asas do passarinho e, depois, o culpam por não conseguir voar.

Até o final, boa parte dos coleguinhas estava contra a Dayse.
Voltando ao Master Chef Profissionais, durante o programa ficou evidente o machismo de alguns competidores. E o Ivo foi terrível já no primeiro capítulo com a terceira eliminada, Izadora Dantas, em outro episódiofoi igualmente machista com a Priscyla (*e se desculpou com ela, mas a Priscyla fazia a sonsa o tempo inteiro para  sobreviver*) e com a Dayse sempre que pode. Todo mundo viu a broderagem acintosa do Dario e do Marcelo e a Dayse acabou angariando simpatia, mas ela não ganhou por causa disso, ganhou por ter sido competente, constante no seu desempenho (*a  única prova de grupo que perdeu, foi a única em que Marcelo estava na equipe, aliás*) e tido um bom desempenho na final. Foi isso que a Paola comentou e foi lindo.

Ah, mas a Dayse desconversou sobre o machismo na cozinha, disse que ganhou por ser ogra e que não é feminista. Bem, bem, problema dela. O fato dela negar, ou tentar contemporizar, ou não acreditar, enfim, que sofra alguma discriminação de gênero, não elimina o que está dado, visto e reconhecido por praticamente toda audiência, e o que a Paola marcar tudo isso na sua fala. É comum que mulheres que trabalham em ambientes masculinos e são bem sucedidas tentem “fazer parte do grupo”, “ser mais um dos caras” e receber um afago " poxa, você nem parece mulher!", quando, pelas costas esse " elogio" pode ser revertido em crítica  em dois tempos. Mulheres profissionais em ambientes masculinos precisam ser cascudas, muitas vezes justificar a sua posição pela competência o tempo inteiro (*que existe, claro*) e mostrarem que não são “mulherzinhas”. Se chegaram lá, chegaram pelo seu esforço (*também*) e se outras não chegaram é culpa delas.


Izadora foi massacrada por Ivo  no primeiro capítulo.
Para quem pensa assim, espero que a ficha caia um dia. Se resto, este Master Chef foi bem instrutivo para que as pessoas pudessem refletir sobre o machismo estrutural, a exclusão das mulheres, o preconceito de classe, enfim, um monte de coisas feias que prejudicam principalmente as mulheres, mas, também os homens. Para muita gente, foi uma final feminista.  Que seja!  De resto, agora viciei nesse programa e adoro os juízes e a Ana Paula Padrão. Vou ver o barraco, quer dizer, reunião, dos participantes assim que puder.

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