sexta-feira, 12 de maio de 2017

O Mangá que está ajudando crianças sírias refugiadas a sonhar


Por acaso, acabei tropeçando nesse emocionante matéria da BBC sobre um projeto humanitário que visa oferecer o mangá de Capitão Tsubasa (キャプテン翼) para crianças refugiadas árabes.  O tradutor para o árabe é um jovem sírio que fugiu de seu país e foi estudar no Japão.  Ele quer que as crianças possam, pelo menos por um instante, esquecer dos problemas e traumas e sonhar, inclusive com um futuro melhor.  

Não é a primeira vez que Capitão Tsubasa é usado para trazer esperança para crianças no Oriente Médio, o anime foi usado para isso no Iraque e eu achei a matéria de 2007 onde comentava sobre isso.  Enfim, mangá, anime, a depender das escolhas, claro, e esses shounen que exaltam amizade, solidariedade e superação são fantásticos para isso, podem ter um efeito muito benéfico.  De qualquer forma, segue a matéria da BBC:

O Mangá que está ajudando crianças sírias refugiadas a sonhar
Por Andreas Illmer
BBC Notícias

"A situação na Síria é terrível - tão terrível que eu acho que isso impede as crianças de sonhar, mas são os sonhos delas que um dia tornarão a Síria um bom lugar de novo", diz Obada Kassoumah.  "Eu gostaria de poder lhes dar um pouco de esperança e fazê-las acreditar que sim, elas podem ter sonhos."

Obada é um estudante sírio em Tóquio, que, por uma mistura de acaso e determinação, tornou-se o tradutor de mangás para o árabe.  E por outra virada do destino, muitas dessas edições árabes da saga de futebol Capitão Tsubasa foram doadas para agências de auxílio e estão sendo distribuídas para crianças de refugiados sírias em toda a Europa e Oriente Médio.  Para Obada, o projeto começou como um inesperado trabalho de tradução, mas tornou-se algo muito pessoal e importante.


Uma escapada por um fio

Como um estudante de japonês na universidade na capital síria, Damasco, Obada recebeu uma bolsa de estudos para ir para o Japão em um programa de intercâmbio. Isso foi em 2012, e a agitação no país já havia começado.  A situação tornou-se cada vez pior, e muitas vezes ele seria parado pela polícia na rua por suspeitarem que, como um jovem, ele poderia ser rebelde.  Quando a situação ficou muito perigosa, seus pais decidiram enviá-lo para morar com sua tia na Jordânia até que ele pudesse sair para Tóquio.  Já era quase tarde demais - foi apenas através de conexões pessoais que ele conseguiu atravessar a fronteira.

Quando sua bolsa de estudos terminou um ano depois, ele foi capaz de permanecer no Japão por se matricular como um estudante regular, e pegou um trabalho a tempo parcial traduzindo Capitão Tsubasa.  "Eu mesmo tinha assistido Capitão Tsubasa quando criança na TV e adorei", diz Obada, de 26 anos. "É uma história sobre uma criança ter um sonho de se tornar um jogador de futebol profissional e que trabalha duro para tornar esse sonho realidade.  E isso é algo bonito, isso é algo que você deve fazer essas crianças verem."


Inicialmente, adaptar o mangá para o mercado árabe foi uma mera decisão comercial de uma editora japonesa.  Mas eles foram abordados pelo Prof. Masanori Naito, um especialista do Oriente Médio na Universidade Doshisha em Kyoto.  O Prof. Naito passou vários anos em Damasco como estudante de doutorado na década de 1980 e estava procurando maneiras de ajudar as pessoas afetadas pelo conflito.  Ele sugeriu que a editora doasse alguns volumes do mangá para crianças refugiadas. "A tragédia da Síria", diz ele, "é uma preocupação muito séria para mim. Na época, eu trabalhava em aldeias que agora estão nas mãos das forças rebeldes".

A detentora dos direitos autorais originais no Japão, a editora Shueisha, mostrou-se imediatamente disposta a financiar as doações, disse ele.  Através da cooperação com várias ONGs internacionais e a Unicef, os mangás estão sendo distribuídos a crianças sírias, que escaparam do terror e do trauma da guerra civil que assola seu país de origem, em campos de refugiados em toda a Europa, Turquia e Oriente Médio.


"A história é muito distante da realidade que eles conhecem", explica Naito. "Mas para as crianças é muito importante ser capaz de escapar da realidade por um tempo.  E esses livros também podem dar-lhes alguma esperança para o seu próprio futuro.  O mangá”, ele diz, poderia até ser "uma ferramenta de soft power contra o desespero e a radicalização".

Uma surpresa do Japão

Um dos lugares onde o Capitão Tsubasa agora oferece uma pequena fuga da realidade é uma casa para refugiados em Berlim, onde na semana passada as cópias foram entregues pela ONG germano-turca Wefa a cerca de 60 refugiados.

Para esses refugiados sírios em Berlim, o mangá pode proporcionar uma ruptura com a realidade.  "Foi realmente algo bastante único e tivemos uma reação completamente diferente do normal", disse Ismet Misirlioglu, do Wefa, à BBC de Berlim.  "O que as crianças geralmente obtêm são, é claro, roupas e comida e ficaram realmente surpresas quando de repente tivemos volumes de mangá – em sua própria língua", diz ele, rindo.  "E você realmente poderia dizer isso vendo seus olhinhos!"  A Wefa em Berlim está planejando dar mais volumes nos próximos semanas.


O dever de ajudar

De volta a Tóquio, Obada Kassoumah ainda está trabalhando colocando cada vez mais aventuras do capitão Tsubasa em árabe. Ele está atualmente traduzindo o volume sete de trinta e sete.

Para muitos jovens, a guerra é a única realidade que eles conhecem.  Para ele, voltar para a Síria não é uma opção.  Em vez disso, ele vai ficar no Japão por agora e se formar – ele sabe que a Síria vai precisar de suas habilidades no futuro e ele espera ter um grande impacto se vier a trabalhar na construção de ligações entre os dois países.

"Tenho amigos que estão lutando com o governo e outros amigos que estão lutando com os rebeldes", diz ele com uma voz pesada.  "Somos todos uma família – e agora eles desejam a morte uns aos outros, tentam matar uns aos outros." Mas ele espera que suas traduções coloquem um sorriso no rosto de uma criança síria em algum lugar, tentando esquecer o terror do passado.

"Como um sírio é como se fosse o meu dever ajudar – e, através desta atividade, eu posso ajudar.  "Desta maneira as crianças podem – pelo menos por um pequeno momento – esquecer todas as memórias ruins que têm da guerra."

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