domingo, 29 de janeiro de 2023

Extrema-direita norte americana exige que mascotes da M&M"s sejam sexualizadas e marca decide aposentar todos os bonequinhos

"Conservadores americanos criticam mascotes 'lésbica' e 'obesa' de M&M's, e marca aposenta personagens", este é o título de uma matéria que foi comentada pelo Ian Neves do História Pública (*vídeo dele no final do texto*) e é um negócio tão absurdo, que eu precisava fazer um texto sobre a questão.  Você deve conhecer o M&M's, aquele confete de grife que também tem versão amendoim.  Eu prestei atenção, quando entrava nas Lojas Americanas, que houve umas edições especiais com o pacote de outra cor, acho que um era rosa, enfim.  Quando compro M&M's é por causa da Júlia, minha filha de nove anos.

A marca tinha mascotes, que eu sempre pensei como sendo todos sem personalidade definida, mas com cores diferentes e com formato ou de confete, ou e amendoim.  Estava enganada.  Eles eram divididos em meninos e meninas (*Júlia sabia isso antes de mim, porque ela estava atenta às marcas de gênero colocadas em objetos e animais antropomorfizados*), as personagens femininas, como de praxe, eram em menor número e tinham algo de sedutor.  E não sou eu que estou dizendo, os próprios reclamantes (pseudo) conservadores colocaram a boca no trombone quanto a isso.  Pelo jeito, havia gente fantasiando alguma relação íntima como as meninas confete do M&M's.

Em 2021, a marca decidiu fazer um rebranding e modificar esteticamente as personagens femininas, além de criar mais uma, a lilás em formato amendoim. Segundo o Business Insider, a marca estava criando seu primeiro novo mascote em mais de uma década. Encontrei, inclusive, uma propaganda (*logo abaixo*) que apresentou a personagem lilás, ela mostra gente de várias etnias, gordos e magros, além de sugerir alguma diversidade sexual.  Tanto que eu pensei que estavam acusando a roxinha de ser obesa e lésbica, mas a coisa vai um pouco além.  

A confete marrom de longas pernas torneadas e sapato altíssimo teve seu salto ligeiramente reduzido e mudou o modelo dos seus óculos (*o que não incomodou ninguém, aparentemente*).  Já a confete verde teve suas botinhas de salto alto trocadas por tênis.   A ideia seria tirar o foco das marcas de gênero (*que indicam o que uma sociedade lê como feminino, ou masculino*), em especial, aquelas que teriam um papel sexualizador, porque, sim, saltos altos podem ser lidos desta maneira, basta pegar seu papel central na pornografia.  O que é curioso, porque houve um  momento na História Ocidental em que salto alto, durante boa parte da história ocidental, era coisa de homem, ou, pelo menos, deveria ser.  

O fato é que pesquisas de 2020, apontam que cada vez mais mulheres estão trocando o salto alto por sapatos mais confortáveis, então, o rebranding estaria acompanhando tendências de mercado e dialogando com um público mais amplo.  Sendo uma empresa capitalista, isto é, que visa lucro, ela estaria fazendo o correto, não é mesmo?  Não para os (pseudo) conservadores que tem fantasias sexuais com as mascotes da empresa.

Muito que bem,  o jornalista e apresentador Tucker Carlson da Fox News, e que entrevistou Bolsonaro, foi um dos porta-vozes da campanha contra o rebranding dos mascotes do M&M's.  Segundo ele, "(...) o personagem verde “agora é lésbico, talvez” e que “também há um M&M roxo obeso de tamanho grande”.".  Detalhe é que a personagem roxa tem formato de amendoim, como os masculinos já tinham e, bem, o confete é redondo, mas não é lido como obeso, desde que com saltos altos. Tuckson também reclamou que a empresa estava transformando os mascotes em seres andróginos (!!!), porque, ao que parece, mascotes de chocolate, ou amendoim, precisam ter marcas de gênero que sinalizem a sua orientação sexual.

Já o comunicador Nick Adams, um queridinho de Donald Trump, acusou a empresa de sexismo (!!!) e afirmou que “a masculinidade está sob ataque como em nenhum outro momento na história mundial”.  Veja bem, ambos os sujeitos estão meio que assumindo que sentem desejo sexual pelas mascotes dos M&M's e se sentiram revoltados, porque a empresa decidiu que as personagens não deveriam se prestar a isso.  Esse é o mesmo pessoal que quer barrar qualquer discussão sobre gênero, sexualidade e temas ligados à diversidade na mídia e nos currículos escolares, acusa as feministas e LGBTQUIA+ e estarem pervertendo as crianças e quer banis shows de Drag Queens.  

O fato é que a coisa parece ter escalado em uma grande controvérsia nos EUA e um artigo no site State News insinuou que a própria empresa calculou a coisa para ganhar relevância sabendo que os (pseudo)conservadores morderiam a isca.  O fato é que a empresa soltou um comunicado, que está traduzindo na matéria do G1, e pare dele diz o seguinte: "Não tínhamos certeza se alguém notaria. E definitivamente não achamos que isso quebraria a internet. Mas agora entendemos: até mesmo sapatos de um doce podem ser polarizados. Era a última coisa que a M&M's queria, já que nosso objetivo é unir as pessoas".

Então, houve realmente um cálculo, mas o fato é que a M&M's anunciou que irá "dar uma pausa" nos mascotes e colocar a atriz e humorista Maya Rudolph como símbolo da empresa.  Como ler isso?  Vitória dos reacionários, ou admissão de que a empresa realmente tinha uma estratégia para se colocar em evidência.  De qualquer forma, ao anunciar a aposentadoria, mesmo que temporária, de seus mascotes, muita gente reclamou e achei várias propagandas em inglês com os bonequinhos que são realmente divertidas.

Como estudiosa de gênero e feminismo, esta confusão toda com a M&M's me parece muito ilustrativa de como certos setores da sociedade leem o papel das mulheres e naturalizam a projeção de seus desejos sobre personagens da cultura pop, porque é isso que os bonequinhos de M&M's são.  Esse pessoal lê qualquer mudança que possa mexer com a forma como organizam os papéis femininos e masculinos, seu lugar na sociedade, como uma ameaça.  Ou seja, se não é para o prazer do homem-cis-hetero-que-se-acha-branco é um atentado à civilização cristã ocidental.

Se isso foi planejado pela empresa para chamar atenção para a marca, trolar também, afinal, era uma forma de mostrar o quanto a sociedade se polariza em torno de discussões absurdas, eles estão de parabéns.  Espero que tenha gerado alguma reflexão, também, e que os mascotes voltem logo e sem retornarem ao padrão anterior. Lembrando, que as marcas se aproveitam de pautas sociais para lucrar, elas não criam essas pautas. Agora, se a empresa realmente cedeu ao escândalo desse povo, é algo lamentável.  Vou dar o benefício da dúvida.  Abaixo, o vídeo do Ian Neves.

2 pessoas comentaram:

OK! Os comerciais podem até sugerir algo, mas ninguém está ligando! A extrema direita sempre causando com coisas que ninguém nunca se importou antes! Não é a toa que viraram terroristas loucos!

Tanta coisa importante para se preocupar. É ridículo que o povaréu caia nessa cortina de fumaça.

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