domingo, 5 de outubro de 2025

Precisamos de mais dramas de época com "cara de iPhone"? (Artigo traduzido)

Não conhecia o site Life Style Asia, mas um artigo apareceu na minha TL do Facebook e achei que valia a pena traduzi-lo.  Como concordo com boa parte das ideias que estão no texto, minha simpatia estava garantida, por assim dizer.  Compartilho do desprezo pela versão da Netflix de Persuasão, mas não concordo que o filme de 1995 seja mais ou menos, mas isso não é tão relevante.  É meio que um sinal de que a pessoa não tem mais de 30 anos o fato de não citar a série Orgulho e Preconceito de 1980, que é excelente.  Como costumo fazer, mantive a estrutura original do texto, as mesmas imagens e há várias, nos mesmos lugares.  Coloquei os links presentes na matéria, também.  Como vários dos filmes séries citadas têm resenha no blog, basta clicar nos links a seguir: Orgulho & Preconceito - 1995, Razão e Sensibilidade - 1995, Persuasão - 2022, Persuasão - 1995, Persuasão - 2007, Emma - 2020 e Bridgerton (*a tag*).   E eu não tenho resenha do filme de 2005, preciso fazer ainda este ano por motivos óbvios: os vinte anos do filme e preencher a lacuna aqui no blog.  Para quem quiser ler o artigo original, basta clicar: Do We Need More “iPhone Face” Period Dramas?.

Precisamos de mais dramas de época com "cara de iPhone"?

Por Pilar Gonzalez (2 de outubro de 2025)

Com a iminência de uma nova onda de adaptações de Jane Austen, o gênero drama de época está em jogo — entre uma reinvenção significativa e o risco de menosprezar as melhores partes do material original.

Para contextualizar, o que motivou este artigo foi o lançamento do primeiro trailer de O Morro dos Ventos Uivantes, de Emerald Fennell (ou, como gosto de chamá-lo, 50 Tons de Heathcliff). Como esperado, o vídeo desencadeou outra rodada de debates online sobre dramas de época, especificamente sobre as maneiras como as adaptações distorcem seus materiais originais. Isso me lembrou do desastre que foi Persuasão, de 2022 (falarei mais sobre isso depois) e me fez pensar na nova onda de remakes de Austen que se avizinha.

Não quero ser esnobe; ainda assistirei a O Morro dos Ventos Uivantes nos cinemas para ver a visão completa de Fennell antes de dar minha opinião final, sem ser solicitada. Afinal, ela colocou o título entre aspas: uma sutil indicação visual de que o filme não pretende ser fiel à obra seminal de Emily Brontë. E esse pequeno detalhe importa? Bem, sim — porque ele invariavelmente molda expectativas que mudam a forma como fãs do material original e não leitores julgam a qualidade de uma adaptação.

O que torna uma adaptação de drama de época "boa"?

Na verdade, a pergunta se aplica a adaptações em geral, embora dramas de época tenham suas próprias nuances. Não estou aqui para impor restrições ou afirmar que tudo deveria ter terminado com o incomparável Orgulho e Preconceito de Joe Wright. Embora remakes medíocres sejam ruins, sua existência é um sinal de que as obras de Austen sobrevivem em nosso imaginário coletivo, e as pessoas continuam a encontrar valor em revisitá-las.

Susannah Harker e Jennifer Ehle na minissérie da BBC de 1995 Orgulho e Preconceito.

Além disso, debater a "melhor" adaptação de Austen é um exercício inútil. É como escolher sua cor ou prato favorito — todos têm seus motivos, e ninguém se mexe. Um exemplo: nunca peça para comparar a minissérie Orgulho e Preconceito da BBC com o filme de Wright, a menos que você esteja pronto para ser o árbitro de uma discussão acalorada e interminável (embora todos concordemos que ambos são espetaculares à sua maneira).

Brenda Blethyn, Rosamund Pike, Keira Knightley e Jena Malone em Orgulho e Preconceito de 2005.

Mas, para o propósito deste artigo, reduzi os motivos pelos quais as adaptações de dramas de época fracassam e dão certo, resumindo-os em dois pontos principais. Você pode concordar ou discordar, mas esses são apenas pontos que considero cruciais como escritor; a maioria das observações gira em torno da narrativa, mesmo quando abordam elementos inerentemente visuais do cinema.

O Fenômeno da Cara de iPhone

Vou começar com o gancho do título deste artigo: o que os internautas estão chamando de fenômeno "Cara de iPhone" ou "Cara de Instagram". Podemos defini-lo como o visual típico, quase homogêneo, de celebridade — inegavelmente refinado naquele sentido moderno, que tira o público de um filme de época. Pode-se referir a cabelo e maquiagem, mas também aponta para as modificações físicas que se tornaram populares hoje em dia: botox, rinoplastia e, claro, facetas (porque as pessoas no século XIX preferiam consertar os dentes a encontrar uma cura para a tuberculose).

Dakota Johnson em Persuasão de 2022.

Muitos exemplos me vêm à mente, mas vamos usar Persuasão, de 2022, como ponto focal. Dakota Johnson, que interpreta sua heroína Anne Elliot, se parece com Dakota Johnson — bonita, sim, mas não uma mulher vivendo na Inglaterra da era Regência. Isso é o suficiente para quebrar a ilusão do cenário histórico de um filme. Os homens do filme também não são poupados disso: Henry Golding, que interpreta o primo traiçoeiro de Anne, William, parece estar prestes a desfilar no tapete vermelho do MET Gala, em vez de arrasar pelas extensas colinas do interior britânico.

Dakota Johnson e Henry Golding em Persuasão (2022).

Há contra-argumentos a serem apresentados aqui: "Você não pode mudar os rostos deles" ou "Por que somos tão obcecados pelo que as pessoas fazem com seus corpos?".  Ambos são válidos, mas não podem ser desculpas para uma produção cinematográfica ruim. Se Robert Eggers consegue transformar Bill Skarsgård em um Nosferatu monstruosamente irreconhecível, então certamente escolhas estéticas mais propositais podem ser feitas para contar uma história que respeite seu material de origem. Acho que o que quero dizer é que eu gostaria que as pessoas se esforçassem um pouco mais.

Parte do que fez uma adaptação excepcional de Austen como Razão e Sensibilidade (1995), de Ang Lee, funcionar é a aparência "despojada" de seus atores. Isso não quer dizer que não houvesse cosméticos envolvidos, mas eles serviam à história e não deixavam as tendências de beleza atuais se infiltrarem nela. A maquiagem (e os figurinos) fizeram o que deveriam: recriar o mundo de Austen — não perfeitamente, mas da forma mais fiel possível.

Kate Winslet e Emma Thompson em Razão e Sensibilidade (1995).

"Moderno" é ruim? Não, se você realmente se dedicar a ele

Orgulho e Preconceito, de Wright, prova que uma adaptação moderna pode ser perfeita. Os figurinos são 100% fiéis à época? Não, e Wright admite isso, afirmando que preferia os estilos da Inglaterra do século XVIII, em vez das silhuetas no estilo Regência de Austen (início do século XIX). No entanto, a liberdade criativa funciona a favor do filme, não contra ele. Os figurinos são deslumbrantes e os atores imbuem seus personagens com uma autenticidade que parece ao mesmo tempo original e fiel à visão de Austen.

Matthew Macfadyen e Keira Knightley em Orgulho e Preconceito (2005).

Acho que podemos dizer que é uma daquelas raras peças que transita entre a adaptação "fiel" de um drama de época e a abordagem contemporânea, o que é um equilíbrio incrivelmente difícil de alcançar. Ainda assim, para todos os efeitos, inclina-se firmemente para o drama histórico. Sabe exatamente o que quer ser. O roteiro tem uma crueza vívida e sincera que não só é fácil de acompanhar, mas também atemporalmente ressonante, mantendo-se fiel à linguagem marcante da obra de Austen, ao mesmo tempo que lhe confere algo absolutamente único. Em outras palavras, contribui para a conversa existente.

Até mesmo a versão de Emma de Autumn de Wilde, de 2020 — com toda a sua glória em tons pastéis — captura a essência do texto, apesar de alguns equívocos nas caracterizações e imprecisões. Visualmente, permanece inovador, ao mesmo tempo em que convence o público de seu cenário da Regência e da era georgiana. Os figurinos são impecáveis, o cabelo e a maquiagem contidos, e o roteiro nunca parece artificial ou modernizado à força. E bem, podemos desculpar o rosto esculpido e modelar de Anya Taylor-Joy aqui porque ele realmente se encaixa na narrativa, com Austen descrevendo sua heroína Emma Woodhouse como "bonita, inteligente e rica". A garota "It" essencial do período, se preferir.

Mia Goth e Anya Taylor-Joy em Emma (2020).

Adaptações livres também podem ser excelentes — se souberem o que são (e o que não são). Aliás, alguns dos meus filmes favoritos são versões decididamente modernas de obras antigas. Pense em 10 Coisas que Eu Odeio em Você (baseado em A Megera Domada, de Shakespeare), Easy A (vagamente inspirado em A Letra Escarlate, de Nathaniel Hawthorne) e O Diário de Bridget Jones (uma versão icônica de Orgulho e Preconceito) — todos filmes que mal se parecem com seu material original à primeira vista, mas demonstram uma profunda compreensão de seus temas e personagens.

Heath Ledger, Allison Janney e Julia Stiles em 10 Coisas que Eu Odeio em Você (1999).

Como em qualquer arte, você pode "quebrar as regras" com sucesso quando domina os fundamentos. É por isso que esses filmes continuam brilhantes: eles interrogam, distorcem e reinventam com maestria o material de origem para refletir o zeitgeist, porque sabem o que fez a obra original ressoar em primeiro lugar.

Eu nem consigo odiar Bridgerton pelo que ele é, apesar de todas as suas falhas (parei de assistir assim que ouvi um cover de "thank u, next" da Ariana Grande durante uma cena de baile, mas isso pode ser um problema meu). A série tem plena consciência de que está reescrevendo a história, abraçando sem remorso seus elementos exagerados, excitantes, melodramáticos e com cara de iPhone. É divisivo, sim, mas pelo menos é honesto e não é indiferente.

Phoebe Dynevor e Regé-Jean Page na série Bridgerton.

Estudo de Caso: Como Persuasão, de 2022, não foi tão persuasivo

Persuasão, de 2022, para ser franca, não entendeu a tarefa. Na verdade, pareceu perder completamente o sentido do texto. Sua personagem principal, Anne Elliot, é uma heroína corajosa e "excêntrica" que bebe garrafas de vinho tinto em seu quarto e olha ironicamente para a câmera à la Fleabag (uma sequência inútil de quebras da quarta parede que, ao contrário de Fleabag, não acrescentam nada à história).

Desde o início, fica claro que os cineastas queriam que ela atraísse a garota Millennial ou da Geração Z, cansada e "liberada" de hoje (se quisessem um exemplo perfeito, bastariam olhar para Elizabeth Bennett, interpretada por Keira Knightley). Mas Anne não é nada disso. Essa afronta é mais perceptível para os fãs de longa data da obra, mas mesmo aqueles que não estão familiarizados com a história provavelmente terão essa sensação de "frieza" insípida e inteligência esforçada que simplesmente não parece merecida.

Nia Towle, Dakota Johnson e Izuka Hoyle em Persuasão (2022).

Persuasão é, como o título sugere, em última análise, a história de uma mulher impressionável, gentil e de fala mansa, cujo fracasso inicial em defender seus desejos a leva a um de seus maiores arrependimentos na vida: perder o homem que ama, o Capitão Frederick Wentworth. Ela se curva às opiniões dos outros, incluindo sua família rica, que considera Wentworth um parceiro inadequado devido à sua falta de fortuna. Mas quando as circunstâncias mudam e o capitão retorna à sua vida, Anne tem a chance de finalmente dar nome ao que deseja: um processo lento, mas constante, que é reconfortante e gratificante de ver se desenrolar.

Nossa heroína não é a glamorosa Dakota Johnson: na verdade, o livro descreve que sua "o auge de sua beleza se foi cedo", pelo menos para os padrões de sua época. Com sua natureza reservada e gentil, ela certamente não beberia durante o dia nem faria piadas sarcásticas. Ela é a garota para todas as garotas que foram levadas a sentir que sua gentileza é fraqueza, e é por isso que tantos leitores a adoram (inclusive eu). A história não trata de matar a ternura com cinismo ou ressentimento, mas sim de alimentá-la com uma admirável força interior. "Talvez você goste da Heroína, pois ela é quase boa demais para mim", escreve Austen, descrevendo Anne em uma carta de 1817 para Fanny Knight, sua sobrinha mais velha.

Hardy Yusuf, Jake Siame e Dakota Johnson em Persuasão (2022).

Lydia Rose Bewley, Richard E. Grant, Dakota Johnson e Yolanda Kettle em Persuasão (2022).


Cosmo Jarvis em Persuasion (2022).

Infelizmente, o filme, de alguma forma, transformou Persuasão em uma história sobre o luto amargo por uma antiga paixão, da maneira mais barulhenta possível. O que, por si só, é bom — mas não é Persuasão. Como personagem, Anne é adorável precisamente porque faz exatamente o oposto: aprende a navegar pelas segundas intenções e maquinações daqueles ao seu redor com graça silenciosa e respeito próprio. Esquecer isso é esquecer o talento de Austen para criar mulheres complexas. Mas suponho que, se servir de consolo, nenhuma adaptação cinematográfica de Persuasão realmente acertou em cheio as delicadas complexidades da personagem de Anne; os filmes de 1995 e 2007 a retratam como uma pessoa muito mansa e submissa, embora sejam muito melhores do que a versão de 2022.

A adaptação parece não conseguir decidir o que quer ser: um drama histórico wrightiano que infunde inventividade suficiente para ressoar com o público moderno, ou um remake contemporâneo que habilmente quebra as regras. O resultado é algo que parece quase vivo, uma história que não está nem aqui nem ali, que erra todos os alvos e remove qualquer traço do espírito de Austen.

Anne Elliot e o Capitão Frederick Wentworth em uma ilustração de 1922 de CE Brock/Foto cortesia da Jane Austen Society of Australia, Inc.

Como passamos de "Nunca poderia ter havido dois corações tão abertos, nenhum gosto tão parecido, nenhum sentimento tão uníssono, nenhum rosto tão amado. Agora eles eram como estranhos; não, piores que estranhos, pois nunca poderiam se conhecer. Era um distanciamento perpétuo", para "Mas um segundo atrás, não havia duas almas mais em sintonia do que Wentworth e eu. Agora somos estranhos. Piores que estranhos. [suspiro] Somos ex-namorados". Eu também estou suspirando, Dakota, mas por um motivo diferente.

A adaptação de 2022 poderia ter funcionado melhor se tivesse abraçado seu tom contemporâneo de cara, reformulando-se como um remake "solto" ambientado nos dias atuais ou em uma realidade alternativa. É aí que definir o tom e gerenciar as expectativas do público se torna crucial: faça uma escolha, comprometa-se com ela e garanta que as liberdades criativas aprimorem a história — ou, pelo menos, adicionem algo significativo — em vez de miná-la.

Só posso esperar que a próxima leva de remakes de Austen (e remakes literários em geral, como o novo A Época da Inocência, que está em andamento... sobre o qual permanecerei cética até que me provem o contrário) se baseie em seus queridinhos, em vez de destruí-los. Os clássicos devem continuar a ser alvo de engajamento — é assim que se mantêm relevantes. Adaptações e releituras não precisam ser fiéis à letra, mas se pretendem desconstruir e recriar, devem fazê-lo munidos de conhecimento, respeito e esforço cuidadoso. É o mínimo que podem fazer para honrar o brilhantismo de seu material de origem.

1 pessoas comentaram:

Concordo com algumas coisas do texto, principalmente o parágrafo final. Ultimamente estou muito desanimada com o jeito de alguns filmes e séries.

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