segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Comentando Death comes to Pemberley (BBC, 2013, 3 episódios)



Elizabeth (Anna Maxwell Martin) e Darcy (Matthew Rhys) estão casados faz seis anos e têm um filho.  Todo o ano acontece em Pemberley um grande baile e a senhora da casa supervisiona todos os preparativos e aguarda a chegada dos convidados.  Nada de excepcional acontece, salvo o escândalo feito por duas jovens criadas que dizem ter visto na floresta o fantasma da Sr.ª Reilly, algo que deve ser creditado à ignorância das duas moças.  No entanto, uma sombra desce sobre Pemberley quando a irmã de Elizabeth, Lydia (Jenna Coleman), chega em prantos dizendo que um assassinato aconteceu, já que seu marido, Wikham (Matthew Goode) e um amigo, o Capitão Deny (Tom Canton), desapareceram na floresta e ela ouviu tiros.  Darcy e outros homens vão até o local e encontram Deny morto e Wikham  embriagado, afirmando que foi o culpado por sua morte.  Mas será que foi mesmo?  E quais os efeitos sobre a família Darcy de um crime em sua propriedade?

Death comes to Pemberley foi um especial em três capítulos exibidos pela BBC1 na época do Natal.  Trata-se de uma forma de comemorar os bicentenário do livro mais amado de Jane Austen, Orgulho & Preconceito.  O seriado é baseado no livro de mesmo nome de P.H. James, uma especialista em livros policiais e de mistério.  O review do The Guardian descreveu a série como uma espécie de CSI Pemberley e é meio que por aí mesmo.  Obviamente, com a desvantagem de não possuírem em 1803 as técnicas necessárias para desvendar o crime e nem uma mente afiada como a de um Sherlock Holmes para ler as evidências e apontar o assassino ou, pelo menos, que Wikham não tinha matado Deny.  Eu não vou dar spoilers, mas vou dizer o que me pareceu óbvio desde o primeiro momento: Wikham era inocente.  


Uma das coisas importantes em um material que utiliza personagens de outra obra é a fidelidade ao caráter das personagens. Pode-se escorregar em outras coisas, mas é preciso ser fiel nisso.  No caso de Death comes to Pemberley, a produção – não posso falar do livro, já que não o li – consegue ser competente e quase fiel.  Voltando para Wikham, isso quer dizer que ele continua um canalha, endividado por causa do jogo, mulherengo, mas não é um assassino.  Aliás, Darcy o odeia, no entanto, se nega de início a abraçar a hipótese de que Wikham é capaz de matar.

Acredito que somente uma das personagens fugiu bastante ao que era no livro e, também, em outras adaptações, o Coronel Fitzwilliam (Tom Ward).  O primo de Darcy tornou-se herdeiro de uma grande fortuna depois da morte de seu irmão e sobrinho.  Quem conhece Orgulho & Preconceito, sabe que Fitzwilliam era um sujeito legal, simpático, e franco, pois mesmo se interessando por Elizabeth é claro em dizer que não pode cortejá-la, porque precisa casar com uma mulher de posses.  Ele também era uma das poucas pessoas que sabia da tentativa de sedução Georgiana (Eleanor Tomlinson), irmã de Darcy por Wikham. No seriado, ele é apresentado como um homem arrogante, reacionário e capaz de tudo para atingir seus objetivos, neste caso, casar com a prima e afastar o fantasma do escândalo que Wikham ainda evoca.  


Eleanor Tomlinson é a mais linda de todas as Georgiana Darcy das adaptações.  Ela conseguiu desenvolver bem a personagem que em Orgulho & Preconceito era ainda muito jovem e tímida.  Georgiana oscila entre o dever para com a família, daí a possibilidade de casamento com o Coronel Fitzwilliam, e o amor que sente por um jovem advogado, Henry Aveston (James).  É o romance da minissérie e eu torci pelas personagens e para que o Coronel saísse do caminho.  De qualquer forma, não gostei de ver uma personagem simpática, o Coronel Fitzwilliam, transformada em uma criatura sombria e desagradável.

Outro problema que eu preciso apontar são alguns problemas de escalação de elenco.  Joanna Scanlan atua bem, mas ela é jovem demais para fazer a governanta-chefe de Pemberley, a Sr.ª Reynolds.  Ela não consegue parecer tão mais velha que Matthew Rhys ou Anna Maxwell Martin, que são muito competentes, mas são igualmente velhos demais para seus papéis.  Vejam bem, praticamente todos os atores e atrizes que encarnaram Lizzie e Darcy eram mais velhos que as personagens.  Colin Firth tinha 35 anos e Darcy, 28 no livro.  Mas ele convence como mais jovem.  Rhys é até passável, mas Martin, que tem 36 anos e parece ter 36 ou mais, não convence como uma mulher de 27 ou 28 anos.  Fora isso, ainda que eu tenha abstraído da coisa, porque Death comes to Pemberley é bem interessante, ela está longe do tipo físico que imagino para Elizabeth e nunca diria que ela tem os olhos que cativaram e seduziram o Sr. Darcy.


Agora, a mãe de Elizabeth, a Sr.ª Bennet (Rebecca Front) e a Lydia de Jenna Coleman ficaram ótimas.  Elas são fiéis ao espírito original das personagens e trouxeram, especialmente Coleman, grande vivacidade e humor para o seriado.  Acredito que a melhor cena dos três episódios é de Coleman com Martin.  Elizabeth precisa dizer uma terrível verdade para a irmã (*nada de spoilers aqui, pois se trata do segundo, e mais importante, mistério do seriado*), Lydia está toda coquete na frente do espelho, isso na véspera da execução do marido, e diz que não quer ouvir, que prefere saber da história pelas fofocas, pois assim, poderá virar a cara e fingir que nada daquilo é digno de crédito. ^_^ Genial!  Outra cena muito boa é quando o Sr. Bennet (James Fleet) suplica para que Darcy o leve para procurar Wikham e Deny na floresta fria e escura, porque, bem, ele não quer ficar com a mulher e a filha histéricas e delirantes dentro de casa. Darcy aquiesce rapidinho. :)

Voltando para Darcy e Elizabeth, o seriado – e livro deve fazer isso ainda melhor – permite-nos ver um pouco do que seria a vida de casado de um dos mais amados casais da ficção.  Eles são felizes, Darcy trata Elizabeth como sua igual, mas eles não são imunes às crises.  O caso de Wikham, muito bem interpretado por Matthew Goode, e a presença de Lydia em Pemberley geram certo desgaste e Lizzie começa a se questionar se Darcy não estaria arrependido por ter se casado com ela... Bem, bem, Darcy tem que fazer um grande esforço para suportar a cunhada e a sogra, e isso desde o começo, mas ao longo do seriado os acontecimentos fazem com que a relação dele com Wikham ganhe outro tom.


De resto, o seriado permite um vislumbre do sistema jurídico inglês da época e uma das personagens mais importantes de Death comes to Pemberley é o magistrado, Sir Selwyn Hardcastle (Trevor Eve), apresentado de saída como antipático e tendo uma relação um tanto difícil com a família Darcy.  Na verdade, o responsável por isso é o pai do magistrado, Hardcastle sênior, que exercia a justiça de forma implacável.  A tal Sr.ª Reilly, o fantasma da floresta de Pemberley, é a mãe de um menino, de 11 ou 12 anos, condenado à morte por Hardcastle porque estava caçando em sua floresta.  Quem conhece os filmes de Robin Hood sabe que caçar nas florestas do rei ou particulares é crime grave, no entanto, o seriado questiona a dureza do tratamento dado a uma criança.  A morte do garoto marcou Darcy e Wikham, ambos meninos naquela época.

O que sobra para comentar?  Quase todos os homens da série são lindos, destaque para o Coronel, Wikham e Deny.  O Darcy de Rhys é passável, mas não me empolgou, não.  E não há cena de camisa molhada, algo que a produção fez questão de marcar em todas as entrevistas, mas há uma cena de cama entre Elizabeth e Darcy na qual Rhys aparece sem camisa.  Outro destaque é o figurino.  Elizabeth usa roupas bem sem graça, mas gostei do vestido e chapéu da Sr.ª Younge (Mariah Gale).  Não posso explicar o que a antiga governanta de Georgiana faz no seriado, desculpem.  Já Georgina aparece com os mais belos vestidos em estilo regência, o talhe da atriz torna tudo mais elegante e lindo de se ver.  


Uma escolha legal foi vestir Lady Catherine de Bourgh (Penelope Keith) e sua acompanhante com roupas da moda anterior, com cintura bem marcada pelo espartilho e saias ligeiramente armadas. Ficou muito bem delimitado que a velha dama pertence a outra época, assim como seus (pre)conceitos e que Elizabeth, com sua inteligência, humor refinado e bom senso, fez muito bem para Pemberley, ainda que ela acredite que Darcy não pensa assim. Nos flashbacks de Orgulho & Preconceito que aparecem no filme, as mulheres aparecem com vestidos do mesmo tipo.  E voltando ao destoar da idade dos atores que fazem Elizabeth e Darcy, isso fica ainda pior nos flasbacks... Mas é só um detalhe, ainda que incomodo, de uma série muito bem cuidada.

Recomendo uma olhadinha em Death comes to Pemberley.  Tudo ficou muito bem feito, o elenco é bom, o mistério não é lá essas coisas, mas não ofende a inteligência de ninguém.  Além disso, algumas questões sobre moral, costume e tradição são bem apresentadas.  Fora isso, pelo menos para mim, é sempre um prazer ver algumas de suas personagens favoritas aparecendo de forma respeitosa e criativa em outras obras.  Agora, é tomar vergonha e ler o livro.

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