quinta-feira, 27 de junho de 2019

Comentado Toy Story 4 (EUA/2019):"Mamãe, não me molhe com suas lágrimas!"


Toy Story, a série, é uma instituição, uma série de respeito com quatro filmes: Toy Story (1995), Toy Story 2 (1999), Toy Story 3 (2010), e Toy Story 4 (2019).  Quando a série estreou, eu já era adulta, estava na faculdade e, por mero preconceito, não fui ao cinema assistir ao filme.  O primeiro filme que assisti no cinema foi o #3, que eu acreditava realmente que fosse o último.  Resenhei em 2010.  Li o texto e, logo no começo, pontuei que acreditava que Toy Story #3 era um golpe comercial, mas terminei concluindo que "Não foi um golpe comercial lançar esse terceiro filme, é um fechamento de um ciclo, e um dos mais felizes que eu já acompanhei.".  Agora, em relação ao último, ainda que tenha gostado bastante, isso se aplica.  Não precisávamos do novo Toy Story, ainda que eu tenha gostado bastante dele.

O novo Toy Story começa com um flashback, nove anos antes, quando Andy ainda era criança, os brinquedos tem que se unir para resgatar um carrinho que tinha ficado do lado de fora e estava sendo carregado pelo temporal.  Todos se organizam, inclusive Bo Peep, a pastorinha por quem Woody sempre foi apaixonado.  Neste momento, chega um sujeito para levar brinquedos que a irmã de Andy não queria mais.  Bo Peep, suas ovelhinhas e o abajur que formavam o conjunto, foram levados embora.  Woody se desespera, mas não há remédio, ela vai embora.


Woody decide que sua missão é proteger
o novo brinquedo favorito de Bonnie.
Nove anos depois, Woody e os outros brinquedos pertencem à Bonnie, a menininha de imaginação mais que fértil.  Só que ela não brinca mais com Woody, ele agora parece esquecido no armário junto com brinquedos de bebê e outros que não agradam mais à menininha.  É o primeiro dia no Jardim de Infância e Bonnie não quer ir sozinha.  Woody, apesar de advertido pelos outros brinquedos, se esconde na mochila e observa que Bonnie conseguiu se sair bem, fez inclusive um novo brinquedo, Garfinho.  

De volta em casa, Garfinho não aceita que deixou de ser  um descartável e se tornou um brinquedo de criança.  Ele quer se matar.  Woody e os outros decidem garantir sua proteção, só que quando Bonnie e os pais partem em uma viagem curta, Garfinho se joga do trailer e Woody decide ir resgatá-lo.  A partir daí, temos uma aventura que vai testar todas as crenças e certezas mais arraigadas do cowboy mais famoso da Disney-Pixar.


Todas as mulheres do filme repreendem
Woody, inclusive Dolly,
 a boneca de pano.
Toy Story 4, que eu assisti já faz uma semana, é bom.  Ri e chorei.  No entanto, preferia que tivéssemos vários especiais a um novo filme no cinema.  A nova película tem o compromisso de revisitar as personagens e estão todos lá: Buzz, Jessie, Cabeça de Batata, Botão de Ouro, Bala no Alvo, Rex etc.  Novos brinquedos são introduzidos, como o Patinho e o Coelhinho de pelúcia, Gabby Gabby e seus marionetes-zumbis,  Duke Caboom e, claro, Bo Peep.  Sim, a pastorinha está de volta, mas é uma personagem absolutamente nova.  Como essa resenha é escrita sob uma ótica feminista, vou focar em determinados pontos relacionados às mulheres do filme.



Bo Peep estava nos primeiros dois filmes da franquia.  Era uma personagem importante para o protagonista, Woody, sua amada, mas a função dela era dar um ou outro bom conselho e ficar no fundo.  No primeiro filme, os meninos (*Buzz e Woody*) eram os indiscutíveis protagonistas.  No segundo filme, mesmo com a introdução de Jessie, eram os machos que tinham maior espaço na película.  No terceiro filme, há mais Jessie, temos a Barbie, mas elas são coadjuvantes, os meninos continuam sendo os elementos centrais.  Nesse quarto filme, decidem empoderar as meninas.  O resultado é bom?  Sim e não.


Antes e depois.
Bo Peep era uma personagem passiva e pertencia ao Andy, não a sua irmã (*Uma colega disse que no primeiro filme andy dividia o quarto com a irmã menor, não me lembro disso, mas não fui rever o filme*).  Nesse último filme, ela vira brinquedo de menina, na verdade, uma estátua de um conjunto com um abajur.  Coloquei um vídeo no corpo da resenha mostrando a evolução dos filmes de Toy Story e vocês podem ver perfeitamente que ela era do Andy, ou ele brincava com ela pelo menos.  OK.  Refizeram o passado da personagem, é outra Bo Peep.

Mandada embora pela dona, termina em um antiquário, mas foge de lá, porque não suporta ficar em uma prateleira.  Ela não quer, também, ser o brinquedo de uma criança só.  Ela quer ser livre.  o não-conformismo é interessante, é como contrapor duas visões de mundo sendo que uma delas, a da exaltação da vilazinha segura do interior (*nesse caso, o quarto de uma criança*), é a favorita do cinema norte-americano, surte efeito.  Ela vem se virando e superando obstáculos ao longo de anos, aprendeu, também, a liderar.  Mesmo sendo de porcelana, ela não se deixou quebrar, ou destruir.  E temos uma heroína de ação.
Novos brinquedos.
Essa heroína de ação, no entanto, subordina Woody (*achei tão exagerado quanto o esquecimento de Bonnie*) e manipula os outros machos em tela sempre que pode.  Vide o caso de Duke Caboom, o motociclista vaidoso.  Permanecemos com um estereótipo comum, que é o da mulher ardilosa.  E ela se impõe ao protagonista, Woody, que acaba pintado como alguém que acredita saber das coisas, mas é um provinciano, alguém que não sabe de nada.  A outra mulher forte e ardilosa do filme, a vilã que se redime, é Gaby Gaby.  Ela parece má, mas o que ela quer, o que quase todo brinquedo quer, exceção para Bo Peep e meia dúzia, é ser amada por uma criança.  Para isso, ela é capaz de tudo, inclusive, sequestrar o Garfinho e mutilar Woody (*sem spoilers*).

Ter mais personagens femininas é bom para as meninas.  Não vou negar isso.  Ao mesmo tempo, não sei se essa mudança súbita em Bo Peep, essa transformação em personagem baddass, é o melhor que poderiam fazer nesse quarto Toy Story.  Poderiam ter criado uma nova personagem ao invés de remodelar uma antiga.  Poderiam manter Bo Peep como primeiro amor de Woody.  Fora isso, a coisa me parece forçada em alguns momentos e em detrimento de Woody, que termina sendo ridicularizado.  De qualquer forma, o filme funciona bem e somos capturados pela nostalgia.


O primeiro amor que renasce.
Outra coisa que me parece forçada é que Bonnie tenha se esquecido de Woody completamente.  Tenho uma menina de cinco anos em casa, lembro, também, da minha relação com meus brinquedos.  ainda que pudesse ficar um bom tempo sem brincar com algum deles, quando os revia, reencontrava, era como se tudo começasse de novo.  A insensibilidade de Bonnie em relação à Woody, é bem triste e eu não imagino a menina do filme três e dos especiais fazendo isso.  Não imagino mesmo.  Ela chega a lembrar de Woody só para tirar dele a estrela de xerife e colocar em Jessie.  Desculpe, isso não empodera a Jessie, é somente cruel e injusto mesmo.  E Júlia gostou muito mais dos bichinhos de pelúcia novos do que das personagens femininas "fortes" do filme. Com ela, não surtiu efeito.

Falando nisso, salvo por Buzz que tem um pouco mais de tempo de tela e ótimas cenas com os bichinhos de pelúcia psicopatas, a atenção maior é para os novos brinquedos (*Bo Peep incluída*) e Woody.  Garfinho, o suicida, é mero alívio cômico, uma desculpa para que Woody viva a aventura que é central ao filme e, no final, tenha que escolher entre ficar esquecido no armário de Bonnie, ou iniciar uma nova jornada.  É uma escolha difícil, porque implica em dar adeus aos amigos e romper com toda a sua visão de mundo.  Woody não conseguia se perceber como algo que não fosse o brinquedo de uma criança.  


Buzz continua sendo o meu favorito.
Não sei se tenho muito mais a dizer sem contar spoilers.  Veria o filme de novo, queria mesmo assistir legendado.  Há cenas pós-créditos, então, não saia correndo do cinema.  Fiquei emocionada várias vezes, mas ando meio maria-mole mesmo.  Todos que estavam na sessão vibraram, riram, e aplaudiram no final.  Ah, sim!  Há muitos easter eggs, desde brinquedos que aparecem em especiais da Pixar e de Toy Story até outros segredinhos.  Assistindo uma vez só, não dá para ver tudo.

E, sim, como a animação evoluiu!  Fiquem atentos ao gato.  Ele parece absolutamente real.  Se pegarmos os primeiros filmes, a diferença é enorme, absurda.  Agora, o caráter estático que favorecia os bonecos, lhes dava charme, foi praticamente eliminado e isso trabalha um tanto contra determinadas personagens, como a boneca de porcelana aventureira.  Ela é flexível demais.  Mas é isso.  Duvido que daqui uns cinco anos não tenhamos mais um filme no cinema.  Fora isso, especiais virão e eles tendem a ser muito bons.  


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