domingo, 22 de junho de 2025

Aprendendo coisas novas: Matéria sobre o 4B me apresentou o teatro feminino coreano Jeongnyeon e a Yue Opera chinesa, também.

Esta semana, assisti um vídeo do movimento 4B feito pela Deutsche Welle (DW).  Não sabe o que é 4B?   É um movimento iniciado por feministas coreanas em 2016, o 4B é para "4 Nãos" em coreano:  não namoram homens, não se casam com homens, não fazem sexo com homens ou não têm filhos com homens.  Tenho mais de um post sobre o 4B, o mais importante é este aqui. A matéria é boa, mas associa o 4B, sem maiores discussões, à taxa de natalidade do país, que é de 0,72 filhos por mulher (*na verdade, ela aumentou um pouquinho em 2024*).  Zero discussão sobre como o capitalismo estimula a competição e aumenta enormemente os gastos com a educação dos filhos.  

Na mesma semana, uma matéria do IG, apontava que as crianças na Coreia do Sul começam a fazer cursinho ainda no jardim de infância e que a educação havia de tornado um "luxo privatizado", porque quem não tem como pagar esse extra educacional á se vê como um perdedor.  Mais adiante, é dito que a Coreia do Sul também é uma das nações mais caras do mundo para se criar uma criança: "De acordo com as informações divulgadas pelo jornal sul-coreano Chosun Ibo, criar um filho até os 18 anos na Coreia custa o equivalente a 7,79 vezes o PIB per capita, o que, em dinheiro vivo, se traduz em cerca de 365 milhões de KRW. Em segundo lugar ficou a China, com um custo de 6,9 vezes o PIB per capita, seguida pela Alemanha (3,6) e pela França (2,2)."  Então, quando vierem com esse papo de que o 4B, a vontade de alguns milhares de mulheres, está derrubando a natalidade, não acreditem.  Pode agradar a quem está liderando o movimento, pode servir de arma dos masculinistas contra as feministas coreanas, mas o problema vai além da resistência à violência misógina, passa pelo bolso mesmo.  Enfim, o vídeo está abaixo.  Tem legendas e dublagem em português.  Continuo depois dele.


Olhando esse vídeo, lá bem para frente, aparece uma militante lésbica que trabalha com cultura pop e é um tanto crítica ao 4B (*posso estar errada, mas o movimento parece coisa de mulher hetero mesmo*) e ela citou o revigoramento do teatro feminino coreano.  Como tenho pouquíssimos conhecimentos de Coreia, fui atrás de informações sobre o Jeongnyeon, o nome do teatro coreano no qual as mulheres fazem os papéis femininos e masculinos.  Seria anterior  ao Takarazuka?  Teria sido criado por influência japonesa?

Bem, o teatro Jeongnyeon foi criado em 1948.  Ele bebeu em outras formas de teatro feminino e o Takarazuka (*que nem era o único teatro musical feminino do Japão na primeira metade do século XX*) não foi a única fonte.  Nas pesquisas, acabei descobrindo que existe um teatro chinês feminino que só é menos popular no país que a Ópera de Pequim (!!!) e é patrimônio da UNESCO, a Yue Opera ou Shaoxing Opera.  A Yue Opera foi criada em 1906, o Teatro Takarazuka é de 1913.  A Yue Opera se tornou popular a partir de 1917, quando saiu da província do interior onde foi criado para Shangai e outros centros urbanos importantes.  E há alguns raros atores homens na Yue Opera, já  houve no Takarazuka, foram duas tentativas de integrar homens à Revue, mas eles não existem mais.  O Takarazuka tem uma inspiração no teatro de revista ocidental muito evidente e faz peças contemporâneas, ao que parece, e eu estou reunindo informações ainda, a Yue Opera e o Jeongnyeon optam por peças baseadas em histórias clássicas e mitológicas locais.

Um pôster da peça "Byeol Hana" de 1958, com as atrizes Kim Kyung-soo, à esquerda, e Kim Jin-jin.

Buscando mais informações sobre o Jeongnyeon, achei um artigo chamado "Female Masculinity and Cultural Symbolism: A History of Yeoseong gukgeuk, the All-Female Cast Theatrical Genre" (Masculinidade feminina e simbolismo cultural: uma história do Yeoseong gukgeuk, o gênero teatral com elenco exclusivamente feminino) de autoria de Ju-Yong Ha e publicado na The Review of Korean Studies.  Ele está disponível em inglês para download.  Não tive tempo de lê-lo, mas destaco uma parte do resumo:

Na história cultural coreana, a xamã mudang frequentemente assumia uma persona masculina, e na dança mascarada talchum, homens desempenham papéis femininos. No início do século XX, gisaeng, as artistas femininas, começaram a apresentar changgeuk, uma versão operística de pansori, que tinha uma tradição de artistas masculinos até então. Na Coreia pós-colonial, no final da década de 1940, outra versão do changgeuk foi criada por mulheres, com apenas cantoras. Esse gênero teatral, composto exclusivamente por mulheres, é conhecido como yeoseong gukgeuk. O legado do gisaeng, já desmantelado na década de 1930, foi reinterpretado e o yeoseong gukgeuk se desenvolveu, ganhando enorme popularidade entre o público majoritariamente feminino. Ver mulheres em papéis masculinos e, por meio dessa "masculinidade alternativa", libertou as mulheres coreanas de sua própria opressão. (...) a construção dos papéis de gênero na performance musical na Coreia na década de 1950 foi reinterpretada por artistas femininas, rompendo assim a masculinidade heroica social e cultural. As artistas apresentavam uma realidade idealista, juntamente com fantasias sexuais, que eram atraentes para o público feminino.

Mas esse teatro feminino estava em crise desde muito tempo.  Um dos motivos apontados é a falta de financiamento estatal e de grandes empresas, dificultando, inclusive, a criação de uma escola como a do Teatro Takarazuka.  Só que um K-drama do ano passado chamado "Jeongnyeon: The Star is Born" está ajudando a revitalizar o interesse pelo teatro feminino A história se passa nos anos 1950 e mostra a ascensão de uma jovem ao estrelato.  Pensou Kageki Shoujo (かげきしょうじょ!)?  Pois é, eu também. Como o governo coreano não é trouxa e sempre vê o potencial dos produtos da sua cultura pop, porque o Jeongnyeon é parte da cultura popular, se movimentou para promover um evento chamado "Korea's First Women's Opera: Women Who Became Legends" (A primeira ópera feminina da Coreia: mulheres que se tornaram lendas) através da Korea Cultural Heritage Foundation (Serviço de Patrimônio da Coreia).  Detalhe importante, "Jeongnyeon: The Star is Born" é baseado em uma webtoon. Tem scanlations em inglês.

De um lado o dorama, do outro a Webtoon.

Enfim, eu sempre gosto de descobrir coisas novas e descobri esses dois teatros femininos, o coreano e o chinês.  Preciso ler o artigo que citei e a entrevista que eu acho ser com a artista que disse que comentou sobre o Jeongnyeon.  Ela está aqui.  Se alguém se interessar e quiser que eu traduza, é só deixar algum comentário, imagino que não haverá nenhum (🤣), blogs não são mais tão populares e praticamente ninguém comenta aqui, inclusive por ter moderação, sem ela, não dou conta do chorume, porque esse tipo de comentário sempre aparece.  Concluindo, vou ficar de olho para ver se encontro mais alguma coisa sobre a Yue Opera e o  Jeongnyeon.

8 pessoas comentaram:

Também não conhecia ambos os teatros femininos coreano e chinês, muito interessante o paralelo deles com o Takarazuka. Não tenho muita paciência para k-drama, mas acho que vou dar uma lida nos quadrinhos, sim. Obrigada pelos links! (E acabei descobrindo que ainda tem gisaengs na Coréia, eu as conhecia de um quadrinho BL histórico).

Deix'eu fazer uma mea culpa aqui porque eu comumente leio os posts mas não deixo comentários. Perdão, Valéria! Em tempos de redes sociais cada vez mais instáveis na mão de bilionários megalomaníacos, o blog se mantém como um bastião da internet de outrora. Vou me esforçar para comentar mais ^^

Interessante demais saber disso, Valéria! Obrigada por compartilhar esse novo conhecimento conosco!

E faço das palavras da Kotsuki as minhas: em uma internet monopolizada pelas big techs, o blog surge como um espaço mais orgânico e realmente comunitário. Mesmo não comentando em todos os posts, saiba que diariamente visito o Shoujo Café para ver se tem postagem nova - hábito esse que alimento há pelo menos uns 10 anos. Grande abraço!

Boa matéria, muito interessante, não sabia disso tudo! E eu e meu irmão acompanhamos o site a vários anos, a mais de 10 anos e a propósito, estou curioso, você planeja assistir Frozen o Musical da Broadway (mas é a versão do west end cast) que estreiou a alguns dias na Disney Plus?

Ah! Que isso! Eu sei que muita gente lê e sei que você me acompanha sempre. ❤️ É que, no geral, os posts não são comentados e, ao mesmo tempo, se eu deixar comentários livres, eu sei que chegarão comentários dignos de grande portal, porque o tipo de gente sempre disposta a comentar, raramente tem algo de digno para dizer. 🤐

Muito obrigada por me acompanhar. Mas não se sinta obrigada a comentar. Eu sei que há sempre gente boa por aqui, mas é fato, a julgar pelo número de visitas, que o público está minguando. é um fenômeno que vem de algum tempo. Os mais jovens preferem outros meios de informação interação.

Não sabia do musical. Vou assistir com certeza. E obrigada por comentar e me acompanhar. ❤️

Oi, Valéria. Tbm estou sempre lendo seu blog, já tem uns bons anos, mas só comentei uma única vez. E queria falar de um problema, q talvez só aconteça comigo: eu entro no blog pelo celular e o endereço do site vem com https, só q não dá pra acessar, diz q o site tá fora do ar ou a conexão não é segura. Pra conseguir entrar, eu tenho q apagar o s de https e aí funciona normalmente. Às vezes, eu compartilho seus textos pelo zap e o link tbm sempre vai com https e as pessoas não conseguem acessar. Não sei se esse problema é só no meu celular, mas se estiver acontecendo com mais pessoas, talvez explique a queda no número de visitas

Já aconteceu isso comigo quando fui compartilhar alguma matéria daqui do blog pelo whatsapp! Além disso, o meu navegador (Chrome) no celular indica que a conexão do Shoujo Café não é segura. Mas por eu já conhecer o site, permito o acesso.

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