domingo, 29 de junho de 2025

Comentando Elio: Um filme não precisa ser revolucionário para ser bom

Ontem, assisti Elio, novo filme da Disney-Pixar com a minha filha de 11 anos.  Sala vazia, somente nós duas, em um dos shoppings mais importantes de Brasília.  Considero uma grande injustiça.  Elio é um filme muito sensível, muito mesmo. Sabendo que ele foi refeito, que o conceito original foi alterado, me admira muito que tenha terminado saindo tão arrumadinho com a produção acidentada que teve. Infelizmente, a Disney não investiu na promoção de Elio e, agora, vem essa história de que foi a pior estreia da Pixar em todos os tempos. Senti falta do curta na abertura, também. Segue o resumo do filme, continuo depois. 

Elio é um menino de 11 anos que mora com sua tia, a Major Olga, em uma base militar norte-americana.  Ele perdeu os pais, não sabemos se meses ou anos antes, e seu estado de luto o mantém alienado do mundo.  Ele não tem amigos e acredita que sua tia não o quer, que ele atrapalha sua vida.  De fato, Olga abriu mão de um sonho, integrar o programa de treinamento de astronautas para cuidar do sobrinho, mas ela acolhe Elio e o ama, apesar de ter, sim, que lidar com sua frustração.  Um dia, depois de entrar em uma exposição fechada sobre a sonda Voyager 1, ele decide que quer ser abduzido e vai fazer o possível para conseguir, o que, efetivamente, acontece.  A partir daí, Elio consegue aprender o valor da amizade, da família e tem que fazer escolhas que podem mudar o destino de muitos seres.  

Elio é uma história de amadurecimento (*coming of age*) na qual um menino deixa de ser uma criança e passa a ser outra coisa, ainda não um homem, mas alguém que tem consciência de que precisa assumir responsabilidades, diante do mundo, do universo até, e das pessoas que ele ama e o amam.  Você já viu essa história muitas vezes, muitas, de forma bem e mal contada. Em Elio, temos uma história bem contada, a relação entre a tia e o sobrinho é crível.  Uma mulher que vive para o seu trabalho e que de repente, recebe uma criança que está perdida, porque as duas referências emocionais, o pai e a mãe, foram perdidas.  Ela não tem experiência, ela precisa amadurecer, também, e o faz, mas sem abrir mão de sus personalidade, ainda que tenha que rever seus objetivos de vida.

Já o menino, sofre por se achar um peso.  Elio quer amigos, mas não sabe que quer.  Se sente um alienígena em uma base militar.  Ao que parece, essa parte, do crescer em uma base, ou trocando de base para base, sem criar raízes, foi a experiência vivida por Adrian Molina e que ele quis colocar dentro do filme.  Quando é abduzido, pelo menos na versão do filme, Elio parece estar em um sonho no qual é importante, amado, feliz, onde não sofre bullying e não precisa se esforçar para se enquadrar.  Houve um momento que eu imaginei que Elio seria TEA, alguém dentro do Espectro Autista, mas o filme não enveredou por aí.  E, nesse novo mundo, ele faz um amigo, Gordon, uma criança como ele e que tem problemas para se relacionar com o pai.

Ainda que todos os aliens pareçam muito humanos em seus comportamentos e dramas, Elio traz aliens com aspecto muito variado, coisa rara de ser em filmes.  Gordon poderia ser transformado em um alien humanoide como a maioria que vemos por aí, mas ele parece um verme e poderia ser visto como um monstro.  Mensagem clara temos aqui, o exterior é só o exterior.  Elio e Gordon são duas crianças solitárias,, com problemas familiares e vão formar um elo muito forte.  Gordon quer agradar ao pai, ele pertence a uma raça guerreira e conquistadora, mas ele tem alma de artista.

Esses dramas super comuns, mas humanos, vividos por gerações de seres em diferentes culturas e com desdobramentos dos mais diversos conseguem dialogar bem com a audiência.  E Elio parece apelativo, é porque, talvez, muita gente esteja em busca de emoções incomuns e extremas que um filme com enfoque familiar, naquele sentido mais genuíno se proponha a entregar.  Elio não é um Toy Story 3, por exemplo, uma sequência impecável e que nos comove em sua sequência final, mas eu quase chorei assistindo ao filme.  Talvez, influenciada, também, pelo fato de ser a minha primeira ida ao cinema depois da cirurgia de catarata e conseguir ver os pelinhos nos braços de Elio e no corpinho de Gordon.  Estar vendo com clareza me a valorizar essas pequenas coisas.

A única parte do filme que não me agradou, talvez por ser absurda e longa demais, foi a dos rádio amadores e dos detritos no espaço.  E achei o figurino pobre.  Olga é militar, mas ela está usando uniforme o tempo inteiro.  Militares usam roupas civis quando estão fora de serviço, quando estão em casa e isso mesmo quando moram em bases.  Escolha meio preguiçosa, eu diria.

Outra coisa, Elio é cheio de referências a filmes de terror, reconheci umas três (*a de Alien foi muito evidente*), mas imagino que havia mais algumas, só que terror não é meu gênero favorito.  Há uma sequência que é clara homenagem ao voo de Luke Skywalker antes de destruir a Estrela da Morte.  Curioso que eu tenha visto poucos comentários, ou nenhum, sobre essas cenas homenagem nas críticas que olhei.  A maioria só faz acusar Elio de ser emocionalmente apelativo e de não revolucionar em nada.  

Todos os sites que comentaram a produção isso desde antes da estreia, enfatizam que o primeiro trailer, lançado dois anos atrás é muito diferente do atual.  Assisti aos dois, um é mais sombrio, o outro muito solar e colorido.  Um dos responsáveis por Elio, Adrian Molina, foi deslocado para Viva: A Vida é uma Festa! 2 (2029).  Elio tinha tudo para dar errado, mas é um filme coerente e que entrega o que se propõe a fazer.  É revolucionário? Não, absolutamente, não.  Mas será que é preciso que todo filme seja revolucionário?  Será que os críticos não estão cobrando demais?  Elio me tocou muito mais que Divertidamente 2, que não precisava existir como filme para o cinema, e mais, ser um filme novo já é revolucionário em tempos de sequências e franquias vazias de significado para além do financeiro.

O filme não cumpre a Bechdel Rule, ou a cumpre raspando.  Há mulheres militares, mas não lembro se elas têm nome, ainda que conversem sobre temas diversos, como suas carreiras.  E Elio é um filme sobre sobre o crescimento de um menino, além de ser um filme que celebra a importância família, que não é tão convencional assim, e da amizade. Bem tradicional em suas mensagens, é verdade, mas que é sincero naquilo que deseja transmitir.  Reforço que nenhum estúdio tem o dever de revolucionar a cada novo filme e que a Disney colaborou para que Elio não tivesse a atenção necessária, os esforços em propaganda estavam em outro lugar, não em um filme original.  Espero que o reconhecimento venha no streaming, porque Elio é um filme que merece ser assistido.

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