terça-feira, 31 de agosto de 2021

Quais os shoujo mais vendidos da Amazon no Japão? Vejam a lista do Gooranking.

Estava mexendo lá no Gooranking e essa imagem, que usei no post, me chamou a atenção.  Sabia que teria alguma coisa a ver com shoujo.  Vamos olhar.  Enfim, eles publicaram uma lista de 30 de agosto com os shoujo mais vendidos do Amazon às 16h.  Por que esse horário?  Não sei.  De resto, a lista publicada tem somente cinco mangás, comentários após a lista:


1. Kageki Shoujo!! #1 (かげきしょうじょ!!)


2. Natsume Yuujinchou #27 (夏目友人帳)


3. Hakushaku Reijou wa Kenen no Naka no Elite Kishi to Kyousei-teki ni Tsugai ni saserareru  #1 (伯爵令嬢は犬猿の仲のエリート騎士と強制的につがいにさせられる 連載版)


4. Mystery to Iunakare  #9 (ミステリと言う勿れ)


5. Maji de Tsukiau 15-funmae  #1 (マジで付き合う15分前)

Vamos lá!  Kageki Shoujo!! está com anime no ar e isso deve estar empurrando as vendas do mangá.  Espero mesmo que o suficiente para nos darem uma segunda temporada, ou um movie.  Natsume Yuujinchou é um fenômeno do shoujo mangá, do tipo que estoura a bolha e tem várias temporadas animadas de TV, além de especiais e filmes.


 Mystery to Iunakare  e Hakushaku Reijou wa Kenen no Naka no Elite Kishi to Kyousei-teki ni Tsugai ni saserareru são josei.  O primeiro tem dorama previsto para janeiro.  Por que josei nessa lista?  Porque, às vezes, os japoneses não separam mesmo.  Há quem defenda, inclusive, que essa separação, essa nomenclatura, é muito mais usada no Ocidente do que no Japão.  Por isso, ainda é comum que nas premiaçõe japonesas, mangás josei levem o prêmio de melhor shoujo e na categoria geral, quase nunca apareçam, o prêmio vai, via de regra, para um mangá seinen.


As primeiras revistas para mulheres começaram a aparecer na virada dos anos 1970 para os 1980 com o nome de lady's comic (redisu), a maioria tinha forte conotação erótica.  Mais tarde, outras revistas adultas apareceram e josei passou a ser usado para a demografia.  Mais tarde ainda, veio o TL (Teen Love) que tem tantas revistas que é outra demografia para mulheres adultas, essa, sim, com um conteúdo que sempre tem erotismo e até pornografia. Antes das primeiras revistas josei/lady'scomic/whatever, mulheres adultas que liam shoujo, liam as revistas para meninas mesmo, que terminavam por trazer material que, hoje, talvez não estaria lá.  A revista shoujo mais adulta era a Seventeen, mas era somente isso.  (E para os desocupados, não, eu não estou escrevendo isso para confirmar a mentira que vocês inventaram de que eu defendo que A Rosa de Versalhes não é shoujo.  Vocês é que leem o que querem mesmo.)


Concluindo, pelo que investiguei, Maji de Tsukiau 15-funmae não é shoujo.  Sai em uma revista chamada Pixiv Ace da Kadokawa.  Revista com "Ace" no nome, normalmente, é seinen.  É mangá de romance?  É, mas não é shoujo, ou josei.  O Gooranking errou aqui.  Queria saber quem estava em sexto lugar.

Quais são os príncipes mais atraentes da animação? Vejam a opinião dos japoneses.


O Gooranking fez uma enquete com 1270 pessoas para saber quais os príncipes mais atraentes da animação.  Abri, porque sabia que teria shoujo e tem, claro.  É uma lista curta, mas decidi colocar somente o top 10, porque ele já é super curioso.  Quem estiver interessado na lista completa, basta ir até a página da pesquisa.

1.Alan Stuart (Otome Gamu no Hametsu Furagu Shika Nai Akuyaku Reijou ni Tensei Shite Shimatta…) - 162 votos
2. Geordo Stuart (Otome Gamu no Hametsu Furagu Shika Nai Akuyaku Reijou ni Tensei Shite Shimatta…) - 158 votos
3. Zen (Akagami no Shirayuki-hime) - 136 votos
4. Fera (Bela e a Fera) - 124 votos
5. Shun Makabe (Tokimeki Tonight) - 90 votos
6. Arslan (The Heroic Legend of Arslan) - 78 votos
7. Asbel (Nausicaä) - 74 votos
8. Lelouch Lamperouge (Code Geass) - 69 votos
9. Filipe (A Bela Adormecida) - 45 votos
10. Eric (A Pequena Sereia) - 33 votos


Ver duas personagens de Hamefura no topo, nem me surpreendeu, mas o resto da lista foi bem curiosa, sabe?  Não sabia que Zen era tão popular.  Não imaginava ver tantos clássicos.  E, claro, Disney!  E vejam que o escolhido foi a Fera, não sua versão príncipe.  E, só para continuar com Disney, meu príncipe favorito do estúdio, Filipe, conseguiu entrar no top 10.  Achei bem legal. 

segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Novelando com algum atraso: Algumas palavras sobre os capítulos #17 e #18 de Nos Tempos do Imperador

Atrasei bastante os comentários do episódio #17 e #18, o #19 entra no ar em alguns minutos, mas estava muito enrolada esses dias.  Ainda estou, na verdade. Por isso, decidi fazer como post no blog comentando de forma geral e pontuando algumas coisas importantes.  Comecemos pelo racismo reverso da semana anterior, a coisa acabou se desdobrando em críticas justas de ativistas negros como o AD Júnior e o Nilson Xavier, jornalista especializado em telenovelas, fez um texto sobre o caso.  Recomendo a leitura, assim como o texto do Tony Goes.  O mais chocante da história toda a autora falar que a cena passou, porque ela não tinha assessoria em 2018, como se racismo reverso não fosse algo mais que condenado na época, aquela cena, só para ficar nela, é um poço sem fundo.  Estranho, também, a Globo estar economizando nessa área de assessoria histórica.

Falo que é estranho a Globo relaxar com essa parte técnica, porque um dos meus melhores professores era contratado para essas coisas e conheci gente que trabalhou fazendo esse tipo de tarefa.  Agora, levando-se em consideração que Deus Salve o Rei teve assessoria histórica (*conheço o responsável, um colega dos tempos de faculdade*) e deu no que deu, não sei bem o que pensar do caso.  O fato é que se você se propõe a escrever uma novela que quer ser histórica, é preciso estudar, ou ter alguém que estude por você e lhe dê alguns nortes, ainda que o autor, ou autora, possa recusar.  O autor de um dos meus romances históricos favoritos, Os Pilares da Terra, falou que decidiu não seguir o que a historiadora que fez a pesquisa para ele recomendou em algumas cenas.  Direito ficção, agora, é fato que Nos Tempos do Imperador vem sendo bem decepcionante em termos de consistência histórica e mesmo fidelidade às personagens reais que está usando.  Antes de seguir, vamos tentar diferenciar "de época" de "histórica", porque são coisas distintas, ou deveriam ser.  Vou usar como exemplo duas novelas que assisti e comentei no blog para exemplificar.

Um romance ou novela de época recorre somente de forma muito tênue à História.  Raramente teremos datas, lugares e pessoas reais sendo apresentadas de forma rigorosa, ou consistente, porque o que importa mesmo é a mensagem que se quer passar, ou a história das personagens criadas para a obra que estão em cena.  Por exemplo, a novela Além do Tempo era uma novela de época.  Sabíamos que estávamos no final do século XIX, mas não sabíamos bem quando.  Era possível supor que estávamos depois da abolição, mas o uso de excessivo de títulos de nobreza parecia não combinar bem com um Brasil República.  E eram títulos estrangeiros, que nunca foram explicados na trama.  O figurino também era frouxo, um tanto indefinido, mesmo que interessante.  A única referência temporal que tivemos foi a existência da Torre Eiffel, porque uma personagem diz querer ir à Paris para vê-la. A obra foi inaugurada em 1889.  Além do Tempo foi uma excelente em sua primeira fase e funcionava muito bem em recriar o clima geral do final do século XIX.  As personagens, via de regra, não apreciam gente do século XXI perdidas no passado.

Já a novela Tempo de Amar era uma novela histórica.  O período histórico era muito bem marcado, havia referências claras à acontecimentos no Brasil, em Portugal e no resto do mundo, como a quebra da Bolsa de Nova York e a Grande Depressão.  Volta e meia alguma personagem histórica era referenciada (Salazar, Getúlio Vargas, Washington Luís etc.) para introduzir alguma questão política.  A novela trouxe para a história discussões relevantes sobre os direitos das mulheres, racismo e tudo mais.  Era uma boa novela.  Era, sim, mas não raro colocava as personagens discursando (*esse mal das obras históricas da TV e cinema brasileiros*) e projetava nos anos 1920-30 comportamentos modernos demais, ou idealizados demais, que terminavam por minar a credibilidade de certas situações.  No geral, a novela falava mais do presente (corrupção na política era tema constante) do que do passado que parecia retratar.

O que é uma obra de ficção histórica, então? Aquela que depende do pano de fundo histórico para funcionar, mesmo que as personagens históricas não estejam em cena, ou sejam meras coadjuvantes menores da produção.  Uma obra histórica normalmente tenta ser o mais precisa possível, mesmo fazendo concessões, algo compreensível em uma obra ficcional.  Vemos muito disso em A Casa das Sete Mulheres (foto acima), ainda assim, a minissérie funciona como ficção histórica, como aventura e, claro, como romance.

O que Nos Tempos do Imperador é afinal?  Uma novela de época na qual o pano de fundo histórico importa muito pouco, ou uma novela histórica?  Olha, eu não sei.  Ainda que tenhamos em cena personagens reais em posição de protagonismo, elas se comportam de forma tão absurda que não há como dizer que é somente uma novela histórica que ainda não se encontrou.  Algumas pessoas estão chamando a novela de fanfic, isto é uma obra de fãs usando personagens de outros autores e colocando-as para fazer coisas que em situação normal não fariam.

Quando Nos Tempos do Imperador foi anunciada, temia que fossem fazer uma tremenda propaganda, quase uma história de santo (hagiografia) de Pedro II.  Se a novela tiver alguma repercussão, acho que terá o efeito contrário, teremos o imperador sendo lembrado como um adúltero sem nenhum respeito pela esposa, um desocupado que arruma desculpas para se encontrar com a amante a todo instante e um chorão que vive contando suas mágoas para todo mundo.  D. Pedro II está sendo difamado pela novela, não encontro outro termo para colocar aqui.  Seu defeitos reais não aparecem na trama, mas encheram o caminhão com outros que ele não tinha.

Quem se propõe a escrever uma novela histórica tem que se informar.  Pegue o material histórico da Glória Perez, ela toma liberdades, ela voa, por assim dizer, mas ela é muito correta na abordagem da História em suas séries.  Alguém poderia dizer "Ah, mas ela é formada em História!".  Sim, ela é, mas estou falando de fazer o dever de casa.  Pesquisar, não tomar liberdades excessivas, não beatificar, ou demonizar personagens reais.  Quer ver?  Citando novamente Casa da Sete Mulheres, a série se equilibrou muito bem entre ficção e história, tomou muitas liberdades, mas fez o que tinha que fazer, ofereceu entretenimento de qualidade usando personagens que de fato existiram.  A gente torce por Bento Gonçalves, pelos Farrapos, por Garibaldi.  Eles atravessam os capítulos pintados com tintas heróicas e convincentes, mas e D. Pedro II?  O que vai sobrar dele para quem assiste a novela?

E a audiência vai mal, a Globo acredita que é porque as pessoas não sabem História e estão perdidas, pode ser em parte, mas é, também, pela falta de carisma da própria história que está sendo contada.  Vamos aos capítulos, então?  No capítulo #16, D. Pedro e a Barral transaram em um teatro vazio.  Os dois, adultos de mais de trinta anos, casados, gente acostumada com o rigor dos costumes e o olhar atento da sociedade, se comportando como dois adolescentes.  D. Pedro quer beijá-la no meio da rua, ela reclama, ela beija do mesmo jeito e  ainda lança um olhar meio cafajeste que fez aquela personagem parecer meio gente normal de repente.  Durou pouco, claro.  Da janela, Jorge/Samuel, o nosso protagonista negro que gira em torno das histórias alheias e acredita em racismo reverso, observa tudo.  O que D. Pedro fará?  Vai transformá-lo em mais um confessor, das suas agruras amorosas.  

Já tinha Caxias e D. Olú, já parecia ridículo demais, para quê mais um? Capítulo sim, outro, não, temos algum papo dele sobre sua vida de pobre órfão, ou seu casamento arranjado.  Estou com pena do Selton Mello. Dá meio que vergonha alheia essas cenas de D. Pedro choramingando por causa de sua infância triste, ou do seu excesso de responsabilidades (que a gente não o vê executando) e do casamento sem amor. Apesar do romantismo, o amor era algo ainda raro no casamento.  Matrimônios eram arranjos de família, nas casas reais eram questão de Estado.  Se houvesse amor, paixão, o que seja, era um bônus.  Vitória e Albert, Alexandra e Nicolau, Vicky e Fritz, eram casais incomuns.  

Havia, claro, casos em que os noivos podiam escolher dentro de uma lista limitada de pretendentes, podiam rejeitar A ou B, desde que ficassem com a opção C, mas nem sempre isso era possível e o que estava em jogo não era o coração das pessoas.  E essa história de D. Pedro expondo seu casamento de conveniências para todo mundo e se lamentando só debilita a personagem.  Ele me faz lembrar o Mr. Knightley do novo Emma (*resenha*).  Ele é sensível, ele chora, é uma revigorante abordagem moderna da masculinidade dizem algumas matérias.  Não, não, é um homem de 30 e poucos anos, chefe de família, senhor de si, se comportando de forma pueril, não é um modelo de masculinidade saudável, não, e era ainda menos aceitável no século XIX.

Outra coisa, pela moral da época, era admissível que um marido tivesse amantes, mas era esperado, era de bom tom, que ele fosse discreto.  Por tudo o que li, D. Pedro II era discreto.  Ele não agia como o pai, ele não humilhava a imperatriz, ainda que ela soubesse de seus casos, mesmo que houvesse alguma animosidade dela pela Barral.  E isso é tudo que esse Pedro da novela da Globo está fazendo.  A amante é quase pública, está dentro de casa, aos beijos e convivendo com as filhas dele.  "Ah, mas eles são almas gêmeas!"  Sei... 

Olha, eles poderiam construir um romance muito bonito entre Pedro e a Barral, se tivessem paciência para desenvolver a relação dos dois.  Poderiam colocar dúvidas em ambos, culpas (Barral era muito católica), mas eles se atiram para o romance sem reservas.  Nessas novelas mais recentes, todo mundo precisa transar rapidinho, ou não fica configurado que são um casal.  Esta semana, se não houver mudança, será a vez de Pilar e Jorge.  Só falta me inventarem que Pilar vai ser além de primeira médica do Brasil, mãe solo, também.  Enfim, D. Pedro que já não trabalhava, apesar de falar muito das suas obrigações, agora vive dando escapadinhas com a Barral, que tem a responsabilidade de supervisionar a educação das princesas e não deveria estar batendo pernas por aí.  

Não sei quem está achando bonito e romântico, mas eu estou achando forçado e injusto.  Como se tratam de personagens históricas, está quase chegando na difamação.  Aliás, foi o que fizeram com o Conde de Barral, ainda bem que a tal cena que apareceu relatada em uma matéria da internet de que ele bateria na esposa não se concretizou.  O Conde simplesmente se retirou silenciosa e civilizadamente da trama.  O consenso entre as pessoas que estudam a Barral é que, se houve um romance  completo entre D. Pedro e a condessa, isto é, se a coisa não foi só platônica, ele só teria começado de fato após a morte do marido.  E o Conde ainda vai viver bastante.

Nos dois capítulos, além desse desabrochar amoroso-sexual-afetivo de Pedro e Luíza, o que tivemos?  Pilar foi encontrada e resgatada por Jorge/Samuel.  Não que ela não tivesse se livrado sozinha do possível estuprador, mas ela ficara assustada demais e havia a chuva.  Ela adoece, mas se cura à jato, porque ela é forte, muito forte e quer ser a primeira médica do Brasil.  A cena dela com a irmã, o sonho de Dolores, o possível reencontro mediante viagem astral quando a mocinha estava febril, foi bonitinha. Gostei muito. É exatamente por estar na casa da Condessa cuidando de Pilar que Jorge vê o beijo.  No outro dia, Pilar é readmitida no curso de parteira, porque a menininha que ela salvara era filha de um homem negro rico.  Sim, existiam negros e negras ricos, mas eles eram a minoria da minoria.  A sequência inteira foi para mostrar os princípios da moça e a hipocrisia da freira.

Zaíla é repreendida por ter colocado a vida de Pilar em risco e vai se desculpar com ela, mas também afrontar a protagonista e dizer que Jorge será seu.  Colocar a adolescente negra como antagonista da mocinha branca não é a melhor ideia, na verdade, é um clichê que poderia ser evitado.  A parte interessante da cena é que Pilar se reconhece em Zaíla.  Ela queria ser médica, a garota quer Jorge.  Sim, continua muito ruim isso daí, é o dispositivo amoroso dominando a vida de uma mulher. Mas pode ser pior, a menina forte pode ser promovida à vilã da trama, depois do salto temporal. Na trama, Zaíla tem 12 anos neste momento, deve ser a mesma idade de Dolores, talvez.  A atriz que interpreta a personagem, Alana Cabral, parece ter 14 anos.  Ela tem muito potencial, basta que existam boas personagens para serem interpretadas por ela.

Tonico se liberta e tivemos boas cenas com ele em ambos os capítulos.  Ele chorou por estar realizando o sonho do pai, ele lembrou que vai se vingar de Pilar e Jorge, ele sonha com a corte e o quanto de dinheiro público poderá roubar.  A parte da eleição, com o padre colocando em questão os eleitores dele foi interessante, a fraude eleitoral era uma constante na época.  Foi meio que jogado, mas  o fato de ter aparecido um oponente possibilitou, também, ver como se dava a apuração dos votos.  O problema é que sabíamos que Tonico iria ganhar.  O núcleo de Tonico é muito bom e espero que não tirem José Dumont da novela.  Mesmo Julia Freitas, que faz Dolores, está muito bem no seu papel.

No palácio, a Imperatriz tentou interferir na política convidando um jornalista que estava difamando o imperador para conversar.  O sujeito acaba publicando uma matéria que irrita D. Pedro II que repreende a imperatriz. Ela é napolitana, ele milanês, talvez, o desprezo venha daí, se ele é republicano radical, ele teria todos os motivos para tentar prejudicá-la. Vejam, a única coisa que Teresa Cristina com certeza não fazia, era interferir em política, a esfera de ação dela era outra.  Ela também presencia o beijo que o marido dá na Barral e pede ajuda ao futuro Duque de Caxias para acabar com o caso dos dois.  Teremos, em breve, a visita à Bahia, é meio que uma imposição de Caxias que chama o imperador às suas responsabilidades.  Já Pedro invente de levar as filhas com ele para carregar a Barral junto.

A imperatriz pergunta se a Condessa de Barral não se preocupa com o próprio filho, em educá-lo.  Enfim, pessoas da nobreza, gente rica, normalmente delegavam essa tarefa para outros.  No máximo, supervisionavam parte da educação, que é o que a Barral faz.  Mas este não foi o único erro grande dos últimos capítulos.  As tranças nagô que serviriam de mapa é uma história sem fundamento e que circulou na internet anos atrás.  Mais um problema de pesquisa dos autores.  Já Isabel e Leopoldina comendo à mesa com os pais é algo que não ocorreria nunca.  Crianças tomavam as refeições em separado nas casas ricas e nobres no século XIX.  Não fazer isso gerava espanto, era exceção.  Ao que parece, assim como foi com a filha mais velha da Rainha Vitória, a princesa Isabel só pode se sentar à mesa com os pais quando estava para se casar.  Era uma questão de etiqueta mesmo.  

De resto, procurem bons livros, As Barbas do Imperador da Lilia Schwarcz, historiadora e antropóloga, é um deles, a biografia de Pedro II do Paulo Rezzutti é outro.  E tem o canal do Rezzutti, também, houve uma longa live sobre a Barral com uma das grandes especialistas na Condessa dia desses.  Vale a pena.  E é tudo isso por hoje.

domingo, 29 de agosto de 2021

Série animada da Rosa de Versalhes ganha nova edição em DVD no Japão

Segundo o Comic Natalie, uma nova edição japonesa dos DVDs da animação da Rosa de Versalhes (ベルサイユのばら), que completou 40 anos em 2019, será lançada no Japão.  Serão cinco booklets com 8 episódios do anime cada um, mais informações sobre a história e detalhes da produção, além de ilustrações e ficha das personagens.  Para comemorar o lançamento, o episódio #1 estará disponível no canal da TMS no Youtube.  

Fui até o Amazon e lá temos a informação de que a edição é em um formato mais em  conta, o preço é 1.650 ienes, algo como 78,19 reais, sem impostos e postagem.  Pelo que costumo ver de DVDs e Blu-rays japoneses é mais em conta, sim, PORÉM serão CINCO VOLUMES.  Outra coisa que está no Amazon é a informação de que A Rosa de Versalhes encantou gerações de mulheres, não meninas.  Estou colocando isso, porque estou tendo que lidar faz dois meses com uns desocupados que não conseguem entender que uma obra pode ultrapassar seu público alvo e, exatamente por isso, se eternizar nos corações das pessoas.  Voltando, ano que vem o mangá completa 50 anos e muitos produtos serão lançados.  O anime não fez sucesso no Japão quando foi lançado, mas passou por um revival nos anos 1980 por causa de Cavaleiros do Zodíaco, o character design da primeira metade da Rosa de Versalhes é o mesmo, assinado pela dupla Shingo Araki e Michi Himeno.  Foi exatamente por isso, que doze episódios da série terminaram sendo lançados em VHS no Brasil.  

Lançado um relógio comemorativo dos 45 anos e Glass Mask

Suzue Miuchi começou a nos atormentar quarenta e cinco anos atrás com sua belíssima série Glass Mask (ガラスの仮面).  Sim!  Atormentar, porque ela já deveria ter terminado faz muito tempo.  Enfim, segundo o Comic Natalie, no dia 23 de agosto foi colocado à venda, em edição limitada, somente 4 mil e 500 exemplares, de um belíssimo relógio púrpura.

Para quem não conhece a série, Glass Mask conta a história de Maya, que está sendo treinada para interpretar um dos papéis mais difíceis do teatro japonês pela atriz que melhor fez a deusa escarlate, Tsukikage-sensei, a doente terminal mais longeva da ficção.  Enfim, muitas agruras, muito sofrimento, mas ela é consolada por um admirador secreto que lhe envia rosas púrpuras e ela chama de "Musasaki no Bara no Hito", exatamente a pessoa das rosas púrpuras.  O seu admirador secreto não é ninguém menos que Masumi, filho de um poderoso empresário e que trabalha com o pai, obcecado por comprar os direitos da tal peça, que pertence à Tsukikage.  

Durante vários e vários volumes, Maya o despreza, vê o pior nele, sem saber que ele é o sujeito que a apoia e que, inclusive, lhe paga os estudos.  Já ele, ama a menina (*depois moça*) em segredo, porque é bem mais velho que ela e está noivo de outra.  Noivado arranjado pelo pai, mas que ele pretende honrar.  Quando a primeira série animada saiu na França, eles foram certeiros e deram sobrenome de "Darcy" para Masumi.  

Correndo por fora, temos Ayumi, filha de uma famosa atriz e que é tão boa quanto Maya e pode lhe tirar o papel da deusa escarlate. Ayumi é uma pessoa legal, então, a gente gosta dela, também. Quarenta e cinco anos depois só há duas coisas a resolver em Glass Mask, quem será a deusa escarlate, acredito que as duas, Ayumi e Maya, farão o papel, e juntar Masumi e Maya.  Claro, Tsukikage tem que morrer, mas isso é dito lá no início do mangá.  E FIM!  Mas nada de terminar.  Bem, o artigo da CN traz várias fotos do relógio que tem um diamante, ou assim parece, e um mostrado multifacetado que parece brilhar.  Bonito mesmo.

O relógio custa 32.780 ienes, algo como 1.553.42 reais, sem o correio.  Aposto que teremos outros produtos comemorativos da série sendo lançados, mas o melhor presente mesmo seria o encerramento de Glass Mask, porque já deu faz muito tempo.

sábado, 28 de agosto de 2021

Comentando Kageki Shoujo!! #8: Um mergulho na Alma de Hoshino

O episódio #8 de Kageki Shoujo!! (かげきしょうじょ!!)  foi muito, muito bonito e emocionante, também.  Agora, que estamos na reta final, seguiremos para uma sequência de três episódios focando em Kaoru Hoshino,  nas gêmeas (Chika e Chiaki Sawada) e em Sawa Sugimoto, as outras meninas do grupo de Sarasa e Ai.  Yamada já foi abordada no drama da bulimia. Como escrevi na resenha anterior, não tenho mais o mangá para comparar, estou somente com o anime.  

O capítulo de hoje é um mergulho profundo em Hoshino, a garota muito competitiva e que entrou no Kouka na sua última chance, a quarta tentativa.  Filha e neta de top estrelas do Kouka, ela darrega um imenso peso sobre os ombros.  Alguns acreditam que ela só entrou por seu pedigree, outros argumentam que como demorou tanto tempo para entrar, ela não seria digna de estar lá.  Há quem acredite que foi fácil, apesar dos fracassos na seleção, afinal, ela teve a quem puxar.  Outros creem que o sonho não é dela.

O episódio #8 mostra como ela se esforçou e que multiplicou seus esforços na sua última chance.  Sete dias de aulas preparatórias. O episódio mostra sua relação com a mãe e a avó, ambas musumeyaku.  Ficamos sabendo que a avó de Hoshino era conhecida pela sua pele muito branca e foi mais popular que sua mãe, suas fãs ainda a visitam no hospital.  Hoshino, que é alta, deseja ser uma otokoyaku, especializada em papéis masculinos, mas tem a mesma obsessão pela pele branca, algo difícil de manter em uma cidade à beira mar. 

O capítulo mostra, também, que ela foi pressionada pela escola a se enquadrar.  Ela sempre anda com uma sombrinha e foi repreendida, porque a sombrinha não fazia parte do uniforme.  A garota usa a legislação da escola a seu favor: não existe proibição ao uso de sombrinha.  E ela se impõe e isso a torna alguém que se destaca.  Nada pior na escola japonesa do que se destacar de alguma forma. E estou dando a atenção a isso, porque, hoje, saiu um podcast da BBC sobre bullying contra alunos brasileiros no Japão e, em dado momento, um especialista em educação japonesa pontua o quanto a escola é autoritária e que alunos e alunas são formatados, podem ser constrangidos se o cabelo está longo  ou curto demais, por algo colorido no uniforme, porque seu cabelo, mesmo natural, não é da cor certa, e, como mostra Kageki Shoujo, por causa de uma sombrinha.

Muito bem, mas temos romance no capítulo.  Hoshino conhece e se relaciona, de forma até mais estreita do que eu supunha, com um rapaz chamado Rikuto Tsuji.  Ele estuda em outra escola, ele joga baseball, seu irmão é profissional, um grande atleta, e todos esperam o mesmo dele.  Ele ouve, enquanto aguarda o ônibus, as meninas falando da Hoshino, de como ela é estranha, e do Kouka.  E o rapaz tenta a sorte e para o padrão japonês, é ato de grande coragem, ele puxa assunto, ele diz que a mãe, ou a avó, é fã do Kouka e consegue atenção de Hoshino.  Acredito que foi uma mentira inventada para conseguir falar com a moça.

Os dois abrem seus corações, conversam com frequência, dão força um para o outro, mas ele interpreta mal a menina, ele acredita que ela está tentando seguir no Kouka por pressão, por causa desse componente familiar, não é assim, nunca foi (*ainda que eu defenda que tem papel na vocação dela*).  E isso acaba causando o rompimento entre os dois.  A menina apaga o contato do rapaz e tenta esquecê-lo, ela não pode ser uma garota normal, ela será uma top star do Kouka.

Achei interessante algumas pequenas cenas.  Hoshino encostar a cabeça no ombro do rapaz no ônibus, ela deixar que ele segurasse sua mão em público no festival.  Isso é mais contato físico do que muitos casais de anime e mangá tem, mesmo quando estão namorando. E há o momento no qual, por  distração (*que deve ter causado um imenso efeito no garoto*), ela lhe mostrar a perna e explicar que está aproveitando os últimos dias para usar roupas muito femininas.  São momentos muito bem marcados em um episódio que se destacou pelo roteiro bem amarradinho.  Poderia ser um filme inteiro, mas foi somente um episódio de 20 minutos.

Enfim, gostei muito do episódio, houve momentos bem comoventes com Tsuji, com a avó (*que parece ser  muito mais amorosa com Hoshino do que a mãe*) e com a própria garota que agora conhecemos bem melhor.  Quando ele termina, e Hoshino aparece de cabelo cortado e repreende Sarasa e Ai por terem se bronzeado, temos uma surpresa bonitinha.  Não comentarei.  Assistam ao episódio.  Espero que os próximos capítulos consigam ser muito bons e que tenhamos uma boa surpresa, uma merecida temporada dois.  É isso.  Há resenha de todos os capítulos da série, basta clicar na tag reviews.

Comentando A Jornada de Vivo (2021/Netflix): A Primeira Resenha da Júlia

Sábado passado, a Júlia, minha filha de sete anos, me fez assistir A Jornada de Vivo, nova animação da Netflix, e com a intenção de fazer uma resenha depois.  Ontem, já com um bom atraso, ela e ditou o texto.  Ele está abaixo com poucas correções minhas.  Quando ele terminar, eu volto e faço algumas observações.

O filme A Jornada de Vivo é muito bom.  Vivo é um jupará que vivia em Cuba com seu amigo, Andrés.  Um dia, Andrés recebe uma carta para um show com sua amada, Marta, que vive há 60 anos em Miami e a quem ele nunca revelou o seu amor, porque quando ele iria se declarar, ela foi convidada por um agente para se mudar e realizar o seu sonho.  Vivo não gosta nem um pouco da ideia de ir para o último show em Miami, então, ele vai embora, mas ele termina voltando para casa e percebe que Andrés morreu.  No funeral de Andrés, ele acaba conhecendo uma parente de Andrés, Gabriela.  


Vivo teve a ideia de se esconder na bagagem cheia de instrumentos e coisas de Andrés que ela recebeu, mas ele é descoberto e decide ir com a menina para Miami para entregar a música que André tinha composto para sua amada.  Mas a garota era parte de um grupo de escoteiras e quando eles estão indo para Miami, eles encontram as escoteiras.  

E, então, eles decidem ir em um barco montado pela garota para Miami, mas eles acabam parando numa floresta.  Eles estavam cantando no barco na floresta até que começa uma chuva forte e que faz eles se perderem.  Vivo encontra uma ave que está tentando achar seu par e a ajuda, depois disso, ele fica resmungando e acaba atraindo uma jiboia.  Ele consegue fugir e encontrar Gabi e as escoteiras com quem se aliam, a jiboia apareceu de novo, Vivo luta com ela e a vence novamente, mas a canção cai no pântano e o papel estraga.

Mesmo assim, ele decide ir para Miami.  Gabi dá o celular para Vivo, porque lá havia um aplicativo de piano, assim, ele poderia reproduzir a canção e ela escrever a partitura em um papel.  Eles conseguem chegar a Miami, mas a mãe da garota a estava procurando, Gabi é pega e Vivo continua em busca de Marta, que se preparava para seu último show. Marta recebe um jornal com a notícia de que Andrés tinha morrido.  Vivo consegue entrar no camarim de Marta e é reconhecido por ela, porque o jornal trazia uma foto dele juto com Andrés.  Vivo entrega a música para Marta.  Depois disso, ele volta para Gabi, que está no carro com a mãe.  E a mãe decide voltar e assistir o último show de Marta com eles. 

E chega a parte em que Marta a música que Andrés compôs para ela.  Vivo cumpriu sua missão e passou a morar com Gabi.  Eu percebi uma coisa que eles fizeram, no início do filme, Vivo e Andrés tocam na praça e no fim do filme, Gabi e Vivo tocam na praça.  Eu achei esse filme ótimo.  Você pode ver o filme na Netflix.

Aqui, sou eu de volta.  Vivo, em português, A Jornada de Vivo, é um projeto envolvendo o premiadíssimo  Lin-Manuel Miranda, que estava previsto para ser feito pela Dreamworks, mas acabou saindo pela Sony.  Nos Estados Unidos, chegou a ser exibido nos cinemas, aqui, acredito que foi direto para a Netflix.  A Júlia começou a ver na escola, mas não deu tempo de terminar, ela concluiu em casa, mas ficou insistindo para que eu assistisse.  Vamos lá!

Confesso que não me impressionei muito com Vivo.  Achei curioso que usassem um bichinho como o jupará (kinkajou) como protagonista e eu achei que era um macaquinho.  Quando olhei, percebi que a cidade usada como cenário inicial me parecia familiar.  Havana?  Sim, era, mas sem menção alguma à Revolução Cubana (1959), mesmo que os carros antigos, marca da cidade, estivessem em cena.  Marta, a amada de Andrés, o artista de rua que tem como companheiro o jupará, dublado no original por Lin-Manuel Miranda, tinha partido sessenta anos antes para Miami, 1960, 1961.  Isso bate com o momento em que ainda era possível sair de Cuba para os Estados Unidos e vice-versa sem grandes obstruções.  Parentes de Andrés também partiram, afinal, para os funerais do velho vem a esposa de seu sobrinho, Rosa, e a sobrinha-neta, Gabi.

Algo que Júlia não pontuou, mas que me chamou a atenção, é que a relação entre mãe e filha não é da melhores.  Rosa quer obrigar Gabi a se enquadrar e, para isso, ela quer que a menina, que é muito excêntrica, se torne uma escoteira.  Não sei se era o sonho da mãe e ela nunca conseguiu concretizar, mas o fato é que as meninas escoteiras são apresentadas como uma versão infantil das garotas populares de high school norte-americana.  São estereótipos ambulantes, mas há algo positivo, elas conseguem criar laços com Gabi despois dos conflitos iniciais.  A mãe, por outro lado, ao externar a exigência, enfatizá-la, mostra não somente a preocupação com a menina, mas uma rejeição ao fato da garota ser, além de latina, como a própria Rosa, alguém fora da caixinha.  

O filme faz aquela exaltação da aceitação, mas não faz discussão sobre isso, o que me pareceu um problema, uma falta de aprofundamento mesmo.  Não vi ganho aqui, Valente, por exemplo, faz melhor.  De resto, é um desenho que diverte, fiquei surpresa com a morte de Andrés, bastante mesmo, ainda que tenha sido um clichê.  E as músicas são boas.  O filme cumpre a Bechdel Rule, porque há várias mulheres com nomes e elas conversam principalmente sobre outras mulheres, Marta, Gabi. 

As cenas em flashback não usam 3D, mas animação tradicional.  E é muito bonito.  Achei a parte com os idosos, seja André, ou Marta, a mais tocante do filme, para mim, pelo menos. É isso.  Outras resenhas de Júlia virão.  Queria que ela gravasse um vídeo, mas ela preferiu me ditar o texto enquanto corria pela sala e pulava.

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Ranking da Oricon


Saiu o novo ranking da Oricon com os trinta mangás mais vendidos no Japão na semana de 16 até 22 de agosto.  Na semana passada tínhamos Chihayafuru no top 10 junto com dois volumes de Gekkan Shoujo Nozaki-kun que, vejam bem, não é shoujo, mas fala do universo da criação dos mangás femininos.  Os dois continuam entre os mais vendidos, mas saíram do topo da lista.  Agora, entre os dez mais tempos Akatsuki no Yona, que é um dos mangás mais pedidos pelos fãs brasileiros.

1. Kaguya-sama wa Tsugera Setai ~Tensai-tachi no Renai Zunousen~ Bangai-hen #23
2. Uma Musume: Cinderella Gray #4
3. BLACK LAGOON #12
4. Blue Lock #15
5. Oshi no Ko #5
6. Daya no Ace act2 #28
7. Enen no Shouboutai #30
8. Akatsuki no Yona #36
9. Kanojo, Okarishimasu #22
10. My Hero Academia #31
14. Gekkan Shoujo Nozaki-kun #13
16. Chihayafuru #47

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Algumas palavras sobre o Afeganistão no Dia Internacional da Igualdade Feminina

No dia em 26 de agosto de 1973 o Congresso dos Estados Unidos decidiu que nesta data seria comemorado o Dia Internacional da Igualdade Feminina, em homenagem à aprovação, 53 anos antes, da 19ª emenda, que garantiu o direito de voto a todas as mulheres nos Estados Unidos.  Apesar de criada nos Estados Unidos, ela nasceu com esse nome de internacional e passou a ser usada no mundo inteiro.  Depois das Olimpíadas mais inclusivas da história, com praticamente 50% de homens e mulheres participando, estamos assistindo ao vivo o desespero dos afegãos, e, em especial, das mulheres do país.  Me pediram para falar de Afeganistão aqui, da situação das mulheres, mas, sinceramente, eu me sinto muito triste para escrever e muito desestimulada para ficar repetindo o que foi dito em vários lugares.  A situação do país com a retirada das tropas norte-americanas e da OTAN do jeito que foi feita, era tragédia anunciada.

Olhando por alto no blog, desde o ano de 2005, tenho bem umas vinte menções ao Afeganistão.  Há posts diretos, há citações dentro de resenhas e outros artigos diversos e em traduções de matérias.  Alguns dos mais recentes são o do recente atentado à escola de meninas às vésperas do Dia das Mães, o assassinato de uma jornalista e ativista pelos direitos das mulheres.  Eu acompanho desde sempre o que o Talebã faz com as mulheres afegãs e no vizinho Paquistão, ouvi falar de Malala pela primeira vez quando a filial paquistanesa do grupo tentou matá-la por defender o direito das meninas de frequentarem a escola.  Enfim, o que o Talebã quer é arrastar todo o Afeganistão para um mundo soturno no qual somente a versão do Islã defendida por eles pode existir.  

E, não, não é Idade Média, é um mundo imaginário, algo que nunca existiu.  Se quando alguém escreve ou diz que "o talebã quer arrastar o Afeganistão para a Idade Média" está pensando na Idade Média Ocidental, com seus mil anos e muita diversidade, desculpe, na maioria dos lugares havia lei e justiça, poderia não ser a nossa, não partia do princípio de que todos eram iguais, mas não tão simples matar alguém, estuprar alguém, como seu seriado de fantasia machista (pseudo) medieval lhe informou.  Não havia nenhum obstáculo formal para a educação das mulheres, ainda que saber ler ou escrever não fosse lá tão fundamental para a maioria da população, sejam do sexo feminino, ou masculino.  Havia mulheres que exerciam o governo, seja em seu próprio nome, ou em nome de seus pais, maridos, às vezes até irmãos.  Ainda que nem sempre sua voz fosse respeitada, segundo as regras tanto o noivo, quanto à noiva, tinham que consentir. 

E se você for ao Oriente, havia outra multiplicidades de realidades, e isso vale para o mundo islâmico, também.  O que o Talebã, ou o Estado Islâmico, ou qualquer seita fundamentalista misógina quer é tentar criar a sua versão de passado ideal segundo suas conveniências.  Também, segundo os seus interesses, o grupo pode abrir mão de um ou outro princípio.  Ainda não vi nenhum grupo fundamentalista que não abrisse exceções aqui, ou ali, justificando a partir de seu texto sagrado, ou da intimidação pelas armas de quem apontasse a perversão.  

E não se enganem quanto a qualquer promessa a respeito dos direitos das mulheres, eles não irão respeitar e devem ir atrás daquelas mulheres que ousaram exercer alguma posição de protagonismo nos vinte anos que o Afeganistão esteve ocupado pelas tropas da OTAN.  Em áreas que já haviam sido tomadas pelo Talebã, há testemunhos de sobre de abusos.  Li o depoimento de uma parteira que atende vilas do interior e ela relatou que tão logo o Talebã assumiu o poder na região, ela passou a ser proibida de se reunir com os médicos, coisa que fazia semanalmente, para buscar orientações e trazer notícias sobre as grávidas.  Ela, também, está proibida de sair sozinha para fazer seus atendimentos, precisa de um homem da família com ela.  As coisas podem não estar ainda tão terríveis em Cabul, porque tudo ainda está mais ou menos visível para o mundo, mas a capital, ou alguma cidade mais arejada da fronteira com o Irã, país islâmico fundamentalista no qual as mulheres tem acesso à educação, trabalho, locomoção e voto assegurados, as coisas estão feias.

Na segunda-feira do colapso, e enquanto escrevo, as bombas estão explodindo na vizinhança do aeroporto, eu cheguei a chorar e tive que explicar para a minha filhinha de sete anos que os direitos das mulheres são muito frágeis.  E isso vale para o Afeganistão, onde a coisa beira o insuportável, neste caso o fundamentalismo religioso esteja armado e podem nos tirar tudo, sem que a gente se aperceba.  O caso do Afeganistão é uma das maiores tragédias dos últimos tempos. Pior era ver gente comemorando a "derrota" dos imperialismo, como se o Talebã fosse um grupo a ser apoiado naquele esquema imbecil do inimigo do meu inimigo é meu amigo.  E eu não sou a favor do imperialismo, mas isso não me obriga a aplaudir um grupo que destrói a vida de mulheres e de homens, também.

Só de ontem para hoje, vi pelo menos umas cinco matérias falando em feminicídios e tentativas de feminicídio.  Tantas, tantas, que era de embrulhar o estômago.  E tudo bem normalizadinho.  A violência ganha contornos ainda mais violentos quando a vítima tem cor.  A jovem babá que teve que pular do terceiro andar porque a patroa se recusava a deixá-la ir embora, demitir-se, é um exemplo.  "Ah, mas a criminosa é uma mulher, também!" Sim, é, mas que acredita que pode ser dona de uma outra mulher que, não por acaso, na verdade, exatamente por isso, é negra.  As mulheres negras são as maiores vítimas da desigualdade de gênero em nosso país.  Sofrem violência dos homens e, não raro, das mulheres brancas.  Agora, o curioso em todas as matérias é omitirem o rosto da patroa e se ela tem um marido, ou companheiro, porque, bem, se tiver, ela não está sozinha na violência.

E fecho escrevendo que enquanto coisas como o estupro de mulheres forem usadas como alívio cômico, nunca teremos um sociedade mais igualitária.  De que estou falando?  Ontem, a novela Nos Tempos do Imperador introduziu um novo casal cômico, Batista e Lota, dois ricaços que queriam comprar escravos do policial malvado da trama.  Batista se interessa por comprar Lupita para usá-la sexualmente, a esposa, enciumada, o impede e diz para levar somente a gordinha, Minervina. Era uma cena para ser engraçada, mas vamos lá!  Primeiro, a atriz não é gorda. Segundo, os padrões de beleza e apelo sexual da época eram diferentes. Terceiro, mulheres fora dos padrões de beleza, o que nem era o caso, são estupradas, também. Qualquer mulher pode ser estuprada e uma escrava, ou uma jovem, ou menina afegã requisitada para ser esposa de um combatente, mais ainda.  Depois, a novela é criticada, como no caso do racismo reverso, e a autora vem tentar se desculpar pelas bolas foras.  

E, não, você não precisa saber história para entender que um estupro nunca é engraçado, ou nunca é "prazer" como apareceu no título de uma matéria equivocada da Deutsche Welle sobre a prática entre alguns grupos do Afeganistão, o Talebã entre eles, de sequestrarem meninos, ou usarem os "serviços" de garotos desesperados.  Eles se vestem com roupas femininas, algo que denota uma inferioridade, usam maquiagam e são sexualmente usados pelos homens adultos, alguns são escravos.  O DW tratou essa prática, que envolve os chamados garotos dançarinos, como se fosse uma expressão da homossexualidade.  Não é.  Trata-se de violência pura  e simples e algo que está ligada à misoginia e a situação de grande inferioridade das mulheres.

P.S.: As ilustrações do post são amostras da arte da afegã Shamsia Hassani.  Ela faz grafitis e lecionava na Universidade de Cabul.  Conhecida no mundo inteiro, espero que ela tenha conseguido deixar o país.