Sexta-feira passada fui assistir a adaptação para o cinema do primeiro livro da trilogia do Milênio de Stieg Larsson, chamado aqui no Brasil de Os Homens que não Amavam as Mulheres. Curiosamente, como a minha amiga Lina Inverse bem observou, é um título bem equivocado. Afinal, o original sueco "Män som hatar kvinnor" deveria ser traduzido como ficou em Portugal "Os Homens que odiavam as Mulheres". Afinal, "não amar", não quer dizer "odiar", não é mesmo? Eu, particularmente, não ficaria chateada se dessem uma versão para o título em inglês – The Girl with the Dragon Tattoo – pois a protagonista, para mim, é Lisbeth, ainda que no cartaz tenham privilegiado a personagem masculina (*Por que será, ein?*), Mikael Blomkvist, interpretada por Daniel Craig. Mas vamos adiantar essa conversa, pois preciso comentar o filme.
Já tinham me perguntado no Formspring se eu conhecia e tinha lido os livros de Stieg Larsson, não, eu não li. Nem assisti o filme sueco, a primeira adaptação da obra para o cinema. Mas as duas tarefas serão executadas em breve. Não conhecia detalhes maiores do filme, mas já tinha lido alguma coisa sobre a personagem de Lisbeth Salander, interpretada na versão americana brilhantemente por Rooney Mara, que ganhou indicação ao Oscar por isso. O básico da história é o seguinte, Mikael Blomkvist é um jornalista investigativo que faz uma bombástica matéria sobre um mega-especulador sueco e, por não conseguir provar o que disse, é condenado a pagar pesada indenização, passar algum tempo na prisão e ainda compromete a revista onde trabalha, a Millenium. Sabe, aquelas coisas que certa revista semanal faz por aqui e dá em nada? Pois é, na Suécia não é assim, não. Acusou, tem que provar. Já Lisbeth é uma hacker que trabalha para uma empresa que investiga pessoas e empresas. Seu trabalho poderia facilmente ser considerado ilegal, mas ela é brilhante. A moça é considerada incapaz pelo Estado e é tutelada por ele, podendo, a qualquer momento ser levada para o sanatório, onde já passou vários anos.
Blomkvist é tirado do fundo do poço pela proposta de um octogenário mega-empresário, Hendrik Vanger (Christopher Plummer), que por traz da desculpa de escrever sua biografia, deseja que o jornalista investigue o sumiço de sua sobrinha neta. A moça, Harriet, tinha 16 anos e desapareceu sem deixar vestígios da ilha da família. Hendrik crê que ela esteja morta e que seu assassino seja alguém da família. A família Vanger é totalmente disfuncional, boa parte dos parentes, que moram na tal ilha, não se falam e mesmo se odeiam. Com direito a dois nazistas militantes, um deles o avô da própria Harriet. Anualmente, em seu aniversário, o velho recebe um quadro com uma flor seca, como Harriet costumava fazer. Para ele, quem está por trás disso é o assassino. Blomkvist só foi contratado, porque Lisbeth fez um dossiê sobre ele. Mais tarde, ele precisará da ajuda da moça para tentar desvendar não somente o sumiço de Harriet, mas, também, conseguir descobrir quem foi o assassino que vêm matando mulheres há décadas na Suécia.
Os Homens que não Amavam as Mulheres é um filme satisfatório. Conseguiu me proporcionar alguns momentos de tensão e repulsa, especialmente nas duas cenas particularmente violentas de estupro (*há mais duas*). Na verdade, não imaginava que o filme americano pudesse ser tão violento. Por curiosidade, peguei o filme sueco e vi que ele pega muito mais leve. O mistério em si é bem clichê, trata-se da velha história do quarto fechado, usada exaustivamente em romances policiais desde sempre. A diferença é a forma inteligente como algumas questões são introduzidas, como o talento investigativo das personagens. Pois é isso que distingue um detetive, a capacidade de ver aquilo que escapa aos olhos do leigo. Como já disse Sherlock Holmes "Você vê, mas não observa". Blomkvist é perito observador, assim como Lisbeth, que tem memória fotográfica. No mais, eu não me importo com clichês, nem sou tão inteligente assim (*acho*) para matar em uma cena só, quem é o assassino.
A única coisa que eu sabia desde o início é que o gatinho ia morrer, porque sempre matam o gato do protagonista. Sempre! Não lembro de terem matado cachorros em filmes. Vocês lembram de algum? Agora, um clichê cansativo, e que está no filme, é aquela coisa do vilão ficar detalhando como matou ou deixou de matar só para dar tempo da cavalaria chegar. Todo psicopata é boca mole assim? Duvido! Mas, como quem vem ao salvamento é Lisbeth, eu não me importo. Ela já se tornou uma das minhas personagens favoritas. ^___^ De resto, achei o filme muito longo, mais de duas horas e meia, e que os protagonistas demoraram muito para se encontrar. Muito mesmo! Só por conta disso, ele perdeu uma estrelinha das dez. Outra coisa que incomoda é que, após desvendado o sumiço de Harriet, o filme prossegue por mais 20 minutos. Essa parte é importante? Sim e não. Depois da seqüência de cenas eletrizantes da solução do mistério, esse resto de filme foi meio anti-climático. Ou, assim, eu senti.
Focando em Lisbeth, eu a considero uma personagem feminista. Ela é inteligente, independente, não tem medo de homem algum, e resolve seus problemas e os dos outros. Violenta? Disfuncional? Certamente, e isso se expressa em seu visual alternativo, na vontade de chocar. Os motivos de Lisbeth não ficaram claros, mas alguma coisa é dita sobre seu passado ao longo da película. No início, quando ela perde seu tutor e amigo, e é colocada sobre a responsabilidade de um funcionário abusivo, um estuprador, ela parece frágil, mas logo, tal impressão é desfeita. E o tutor, de quem a moça se vinga exemplarmente, é o tipo de sujeito que deve proliferar em estruturas burocratizadas. Ele tem poder sobre pessoas e abusa delas, mas não contava encontrar Lisbeth pela frente...
De resto, me incomodou muito o romance de Lisbeth com Mikael. Vejam bem, a moça parece ter aversão por homens, ou, pelo menos, por homens abusivos e autoritários. Mikael não é nada disso, claro. Lisbeth é mostrada fazendo sexo com uma mulher e, mais tarde, do nada, ela leva Mikael para cama. A iniciativa é dela, imaginei eu que a situação fosse se desenrolar de forma bem subversiva, com a moça querendo somente sexo e o jornalista, de repente, ficando caído por ela. Qual nada! Lisbeth se apaixona por Mikael sem aparente motivo a ponto de achar que tem um futuro com ele. O final foi bem não-hollywoodiano no caso do romance dos dois, mas eu, se fosse a autora, jamais teria iniciado o caso que não teve função alguma a não ser debilitar a personagem de Lisbeth e, talvez, colocar mais algumas cenas de sexo no filme. Menos uma estrelinha aqui. Ah, sim! O filme cumpre a Bechdel Rule? Só parcialmente. Não lembro de nanhuma conversa significativa entre mulheres no filme.
Mesmo com as críticas, recomendo Os Homens que não Amavam as Mulheres. O filme tem mais méritos que defeitos: um bom mistério, interpretações consistentes, drama, suspense, violência... está tudo lá, em doses mais ou menos equilibradas. Até acho as cinco indicações ao Oscar um tanto exageradas (atriz, fotografia, montagem, edição de som, mixagem de som), se bem que são todas indicações técnicas, menos a justa indicação de Rooney Mara pelo papel de Lisbeth Salander. E ele me fez ter vontade de ler o livro, isso é importante em uma adaptação. Por exemplo, quando assisti Cowboys & Aliens, com o mesmo Daniel Craig, não tive nenhuma vontade de ler o quadrinho. Achei muito significativo que o filme se passe na Suécia, já que americanos tendem a tentar levar a ação para o seu próprio país. De resto, ainda temos o pai do Alexander Skarsgård, o Eric de True Blood, Stellan Skarsgård fazendo o irmão de Harriet. Fiquei olhando para o rosto dele e até localizei algo do filho. Ridículo, eu sei, mas eu fiz mesmo, e daí? Enfim, Os Homens que não Amavam as Mulheres é bem na linha "as aparências enganam", afinal, o tio velho nazista é um fofo e o povo é que não vai visitá-lo. ^___^


















































































