sábado, 31 de outubro de 2015

Vídeos promocionais dão idéia de como será o Rurouni Kenshin do Takarazuka


Depois das primeiras imagens das atrizes do Teatro Takarazuka caracterizadas como as personagens de Rurouni Kenshin (るろうに剣心), dois vídeos promocionais com as atrizes vestidas e atuando nos ensaios, além de pequenas entrevistas, deram idéia do que será o espetáculo.  Bem, bem, Takarazuka no seu melhor.  Vai ficar fantástico. :D

Obra de Macoto Takahashi ganha mega exposição no Japão


Um dos motivos pelos quais o Shoujo Café ficou lento (*foram dois dias esta semana sem postagens*) foi a necessidade de arrumar tempo para terminar um artigo.  Terminado e enviado (*só não sei se será aceito*), tenho que selecionar de quase 30 páginas aqui abertas, quais notícias ainda vale a pena postar, isso, claro, se não tiver que escrever nada urgente para o blog.  O ENEM (*1-2*) foi urgente, por exemplo.  O caso do apelo da representante da ONU à respeito dos mangás pedófilos, idem.  De qualquer forma, foi engraçado abrir o Comic Natalie hoje e encontrar uma notícia sobre Macoto Takahashi, já que falei dele no artigo que terminei faz pouco.


Primeiro, o Macoto dele é com “c” mesmo, está na página dele assim.  Segundo, é homem e um dos grandes responsáveis pela definição da estética dos shoujo mangá.  Vejam bem, estética, não narrativa.  Ele era ilustrador, virou mangá-ka, e, quando deixou de fazer shoujo, voltou a fazer ilustrações avulsas, para artigos de papelaria e livros.  Seu traço é inconfundível e ele continuará ativo, imagino, até morrer.


E sobre o que o CN fala?  Mais uma exposição da obra de Macoto Takahashi.  Serão mais de 300 originais ao todo no evento chamado Takahashi Macoto no Gengaten ~Sakura de Egakareta Shoujotachi~ que estará aberto no Chiba Sakura City Museum of Art dos dias 14 de novembro até 23 de dezembro.  Nos dias 6 e no dia 13, o próprio Takahashi estará no museu falando ao público.  O primeiro encontro é para 30 pessoas, o segundo, para 85.  Inscrições por e-mail.  Já, no dia 21 de novembro, a professora Yukari Fujimoto, da Meiji University, estará dando uma palestra sobre as origens do shoujo mangá e Macoto Takahashi.  Só para constar, usei um artigo dela no meu trabalho.  :D  Queria ler mais do que ela escreve.  A página da exposição é esta aqui.

Waki Yamato comemora seus 50 Anos de Carreira

Waki Yamato é uma das grandes autoras de shoujo mangá de todos os tempos e, como tantas, inédita no Brasil.  Haikara-san ga Tooru (はいからさんが通る), Asaki Yumemishi (あさきゆめみし), Yokohama Monogatari (ヨコハマ物語), New York Komachi (N.Y.小町) etc.  são muitas obras inesquecíveis.  Romances históricos, comédia, drama, romance escolar, adaptação de clássicos da literatura, acho que se procurar encontro até ficção científica.  

Segundo o Comic Natalie, ao longo do próximo ano, teremos vários eventos, como o sorteio de 10 cópias de originais da autora, séries serão republicadas (*imagino que em vários formatos*).  Para participar do sorteio dos originais, se entendi bem, é preciso comprar algumas das republicações e enviar os cupons para o sorteio, o prazo é 31 de maio de 2016.  


A principal exposição do trabalho da autora será no Osaka Kintetsu Abenobashi Terminal Building, de 26 de dezembro de 2015 até 12 de janeiro de 2016.  Yamato é de Osaka.  For a isso, a sua série atual    Ishutaru no Musume ~Ono Otsuuden~ (イシュタルの娘~小野於通伝~) é capa da última edição da Be Love.  Sei que ainda irei falar de novo dessas comemorações.  É só esperar.

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

ONU pede que Japão tenha leis mais duras a respeito da pornografia infantil


Estou muito ocupada esses dias, postei loucamente sobre o ENEM e o Shoujo Café meio que parou.  Rankings atrasados e tudo mais.  O nome disso é excesso de trabalho.  Uma colega me abordou no Twitter perguntando quando iria comentar sobre o pedido da ONU de banimento da pornografia infantil em todas as mídias.  Como esse assunto volta e meia aparece, olha esse da BBC de janeiro, eu comentei que já tinha falado disso em posts antigos.  Ela me mostrou esta notícia e eu vi que, sim, o assunto tinha retornado, mas que, vejam só, nem o Sankaku, que se revolta com essas coisas tinha comentado.

O que eu quero dizer com isso?  Volta e meia a ONU, grupos feministas japoneses e outros ativistas pedem ou exigem que o país torne suas leis contra pedofilia mais rígidas.   As leis japonesas foram reformadas, mas ainda são muito mais flexíveis em relação à pedofilia, especialmente a produção de imagens erotizadas com meninas de menos de 15 anos (U15), e as punições para quem mantém material pornográfico com crianças ainda é branda.  Mesmo com as mudanças na lei japonesa, deixaram de fora anime, mangá e games.  Afinal, não são meninas reais.  


A representante da ONU para questões relacionadas à infância e sua exploração, Maud de Boer-Buquicchio, visitou o Japão por uma semana e pediu - sim, pediu - que o país estivesse atento às representações de crianças em mangás.  Não fui procurar os fóruns da vida - cheios, via de regra, de machistas, misóginos e mesmo pedófilos - nem irei, eles não me interessam, mas imagino que a mensagem tenha repercutido como sempre, isto é, feministas malvadas, a ONU inútil, tentando impôr suas regras, blá-blá-blá.  Apareceram até dois comentários no grupo do Shoujo Café comparando My Little Poney e mangá hentai (*a pessoa estava sóbria ao escrever isso?????*) e outro dizendo que as pessoas não podem nem mais bater punheta em paz.  Olha, não expulsei a pessoa do segundo comentário, ela pode ir bater punheta onde quiser desde que não venha enxer o saco.

Outra coisa, o Japão é um dos países com maior desigualdade de gênero entre as nações desenvolvidas e desde muito tempo - a colega do Twitter me repassou um documento de 2009 - a ONU pede que o país tome providências em relação à questão.  Houve mudanças nas leis (*vejam o texto da BBC*) nos últimos anos, mas avanços, pouquíssimos.  Do documento, destaco o seguinte: “O Comitê está além disso preocupado com as atitudes estereotipadas particularmente prevalentes na mídia, onde homens e mulheres são frequentemente representadas de forma estereotipada e que a mídia está se tornando cada vez mais pornográfica.  As representações hiper-sexualizadas  das mulheres reforçam a os estereótipos existentes de que as mulheres são objetos sexuais e continua a alimentar a baixa autoestima das meninas.   O Comitê expressa sua preocupação em relação a alta incidência das afirmações discriminatórias de gênero e das falas sexistas feitas em público por oficiais do governo e a falta de ações para prevenir e punir a violência verbal contra as mulheres.”

Se vocês conhecem o Shoujo Café, sabem que, ainda que eu não coloque pedofilia real, isto é, com crianças de verdade, no mesmo patamar que os mangás e animes e games, eu concordo com esta parte do documento da ONU, isto é, as imagens têm poder.  Até hoje, por exemplo, um texto muito antigo sobre Kodomo no Jikan recebe comentários irados, da mesma forma que o meu texto comentando estupro consentido em materiais para o público feminino é lido e comentado de forma bem mais equilibrada.  Enfim, muitas imagens reforçam estereótipos negativos sobre o feminino e não somente entre as mulheres, o uso da pornografia é pedagógico e há séculos é consumido por meninos e homens dessa forma.  Essas imagens falam para eles, também.  Em alguns casos sublimando desejos (*que deveriam ser tratados com terapia*), em outras, os alimentando.  E a internet vira um esgoto onde esses sujeitos despejam seu lixo.  Pegue Welcome to NHK e vejam que os japoneses entendem bem esse mecanismo.  O sujeito começa com pornografia infantil em formato mangá/anime/game e, em dado momento da série, está na porta de uma escola de educação infantil fotografando escondido menininhas.


Curiosamente, e basta olhar o Shoujo Café, volta e meia revistas shoujo e josei de conteúdo erótico são confiscadas e/ou recebem o selo de material inadequado.  Mais recentemente, houve um caso em que os mangás homoeróticos foram impedidos de entrar em uma prisão japonesa.  Imagino que era material bara, mas poderia ser BL.  Segundo a fala dos representantes da prisão, mangás de conteúdo gay poderiam estimular a prática da violência sexual na prisão... Enfim, perdi o link, mas alguém que ler esse texto, pode me repassar.

De resto, não tenho nada mais a dizer.  O Japão caminha à passos lentos em relação a igualdade de gênero e está repensando suas legislações de proteção às crianças de forma igualmente lenta.  A idade de consentimento lá, por exemplo, é mais baixa que a brasileira, que já é considerada baixa se comparada com muitos países.  É disso que a representante da ONU está falando.  Mais ainda, quando as leis em relação aos mangás e animes começam a aparecer, não raro vem de políticos de postura muito complicada ou alvejam coisas que parecem ser censura pura e simples.  Não acredito que criminalizar o consumidor de mangás vá resolver, controlar o que corre na net é impossível, mas que, talvez, as editoras devam ser conclamadas a regularem o que elas mesmas publicam.  Auto-censura, bom senso, enfim.

P.S.: E, por favor, não venha comentar se você é a favor da disseminação livre e sem fronteiras de material lolicon - e shotacon - de que produtos com crianças sendo estupradas e torturadas, ainda que sejam crianças de anime, mangá e games, é legal.  Encontre outros espaços para comentar.  Também não venha falar de Simone de Beauvoir pedófila, porque, bem, ela e outros intelectuais assinaram sim mais de uma petição pela abolição da idade de consentimento nos anos 1970 (*quando eu estava nascendo, outra época, muito diferente de agora*) na França, direito deles, aliás, mas isso nada tem a ver com o post.  Mais ainda, feministas não tem heroínas inatacáveis, lideranças perfeitas.  E se algumas até têm, esta que escreve o texto nunca acreditou em heróis ou heroínas.  Por isso mesmo, nunca se decepcionou com nenhum ser humano, a começar com sua mãe e o seu pai, a ponto de se desmontar emocionalmente, questionar seus valores e outras coisas muito comuns por aí.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Mais um mangá de Hagio Moto nos EUA


O ANN anunciou que Barbara Ikai  (バルバラ異界) ou Otherworld Barbara de Hagio Moto será lançado nos EUA em agosto de 2016.  O mangá originalmente tem 4 volumes, mas a Fantagraphics vai publicar uma edição de luxo, capa dura, com tradução de Matt Thorn, em um volume somente.  O preço?  US$39.99.  Justo, claro, mas pouco acessível de o dólar não baixar.  

Barbara Ikai reúne ficção científica, mistério, drama psicológico e romance com o toque inteligente e elegante de Hagio Moto.  A série recebeu o Nihon SF Taisho Award, o maior prêmio para obras de ficção científica e fantasia do Japão, em 2006.  A Fantasgraphics já lançou dois outros mangás de Hagio Moto nos EUA, a coletânea Drunken Dream and Other Stories e O Coração de Thomas (トーマの心臓).  

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Mangá seinen de Akiko Higashimura entra em hiato acusado de desrespeito aos homens


Siiiiiiim!  Você leu direito.  O novo mangá de Akiko Higashimura, Himo Zairu (ヒモザイル), é, segundo a autora, baseado em fatos e pessoas reais e trata dos chamado "himo", homens sem emprego, ou expectativas de progresso na vida e que vivem às custas de mulheres, suas namoradas, ficantes e outras.   A série mostra um dojo que treina esses homens para que eles consigam ganhar a vida desse jeito.

Higashimura, que é conhecida pelo seu humor e crítica social, criou a série com a ajuda de seu assistente (*um homem*) e a resumiu em uma frase "Sem dinheiro, impopular, sem emprego.  Porque eu sou inútil na melhor das hipóteses, vou me tornar um himo!  A cortina sobe para o dojo formação  himo-man de Akiko Higashimura!"  O fato é que, segundo a Kodansha, as críticas dos leitores foram tantas que o mangá foi colocado na geladeira.  A série foi acusada de discriminar e difamar os homens e que mostrava o desprezo da autora por eles.


O ANN explicou que há um pedido de desculpas na página da revista explicando que o mangá não estaria na edição da Morning Two lançada em 22 de outubro.  O pedido de desculpas é tanto para os leitores que aguardavam o capítulo, quanto para os ofendidos... A própria autora se desculpou e disse que iria repensar a série.

Olha, o nome disso é auto-censura e uma revista tem todo o direito de fazê-lo.  A Kodansha é uma empresa e a tradição nipônica, muito positiva, aliás, é manter o diálogo com os leitores-consumidores.  Dito isso, vamos ao ato em si.  Quantas vezes você se sentiu ofendida com a forma como um mangá de qualquer demografia retratava as mulheres?  Quantas vezes você ouviu falar de um mangá sendo suspenso após o primeiro capítulo?  Quantas vezes você ouviu falar de um mangá suspenso - em qualquer momento - por ser ofensivo às mulheres?  Misoginia já causou cancelamento de mangá?  E mais uma: você acha que Higashimura inventou os himo?  


Realmente, não acredito que a indústria de mangás japonesa tão ciosa de sua liberdade criativa - há antologias especializadas em pornografia com bebês e crianças - se importasse com o trabalho de um autor ou autora criticando práticas sociais femininas, ou mesmo detonando as mulheres.  Pegue, por exemplo, um mega-sucesso como Death Note (デスノート) e como as mulheres são retratadas nele.  Não acredito que Higashimura tenha feito um mangá tão ruim (*vou atrás desse primeiro capítulo agora*), não creio, também, que uma autora consagrada e premiada como ela passasse por esse constrangimento desses em uma revista josei.  


Meu conselho, que não serve para nada, aliás, é Higashimura, pegue seu mangá e vá para a Cocohana ou a Feel Young ou a Kiss e seja feliz, porque eu duvido que sejam mulheres as principais críticas do seu mangá.  É isso.


Ainda o ENEM, só um pequeno toque sobre gênero


Está circulando em uma rede social por aí (*Cóf! Cóf! Facebook*), esta imagem com as anotações indignadas de uma candidata, ou sei lá, se alguém que viu a questão sobe Simone de Beauvoir e não entendeu.  "Ninguém nasce mulher: torna-se mulher.", é uma frase síntese da condição feminina nas sociedades ocidentais que já virou jargão, mas parece que muita gente não consegue parar para refletir que ser homem ou mulher em uma sociedade é algo aprendido. 

Uma menina e um meninos aprendem desde cedo o que é esperado deles, porque ao nascermos, XX ou XY, nada, ou quase nada, está determinado pela biologia, mas os papéis que deveremos interpretar já estão pré-definidos pela sociedade. É disso que Beauvoir fala, não de termos pênis, vagina, nenhum dos dois, ou algo que não se define em uma primeira observação.  Aliás, é um equívoco muito grande confundir papéis de gênero com sexualidade/desejo, ou papéis de gênero com sexo biológico expresso na genitália externa ou nos documentos civis.


Quando Beauvoir - e outras antes e depois delas - pontuaram que "ser mulher" é algo construído para conclamarem todas nós à reflexão, estão se referindo às pressões que todas nós sofremos: o casamento como necessidade, a maternidade como destino, a felicidade atrelada ao olhar masculino, a opressão confundida com proteção, a culpa pela queda da humanidade etc.  

Uma mulher aprende desde cedo que seus desejos ou são sujos, ou são secundários, se não estiverem chancelados pela aprovação masculina.  Aprendem desde sempre que é desejável que sejam frágeis e dependentes - ou o sejam na medida que os homens significativos de sua vida considerem decente, belo e útil - para, logo em seguida, serem criticadas pela mesma fragilidade e submissão.  Taxadas de exploradoras, de aproveitadoras.  


Nós, mulheres, somos estimuladas a se despir, ou cobrir, para o prazer masculino, para resguardar a honra dos homens (*pais, irmãos, maridos, filhos*), ou reafirmar sua posição social.  Meninas são cuidadosamente enfeitadas, elogiadas pela sua aparência, estimuladas a se verem como princesas.  Correr e se sujar, para muitas meninas, é quase uma transgressão.  Desde cedo, são estimuladas a passar horas no salão e desejando e/ou comprando roupas e sapatos, algo fundamental para que sua função no mundo seja plenamente desempenhada.  Suas atenções acadêmicas - quando estimuladas - muitas vezes ocupam um papel secundário em relação à aparência.  

E as meninas crescem, se tornam mulheres, a maioria nunca atende aos padrões impostos pela mídia e pelas várias indústrias relacionadas ao corpo e aparência em geral.  Insegurança é algo constituinte dos papéis de gênero socialmente atribuídos às mulheres.  E quem pode lhe dar a confirmação de que, sim, tudo está bem?  O olhar masculino.  E mesmo que as mulheres atinjam os altos padrões de expectativas, não se enganem, pois, ainda assim, não escaparão das ofensas, sejam o "puta" e "vadia" de sempre ou o de "frígida" por outro.  

Sophie Grillet.  Não sou feminista, mas… Lisboa, Presença, 2001.
Meninos não nascem com carrinhos, caminhões e bolas; meninas não nascem com bonecas, panelas, kit de beleza.  São presentes de adultos.  Meninas não nascem odiando matemática, nem acreditando que a maternidade é seu destino. Meninos não nascem violentos.  Meninas não nascem desejando desesperadamente servir ao próximo.  Meninos jogam mais videogame, brincam mais, porque, talvez, sua infância, pelo menos em algumas classes sociais, seja mais respeitada.  Mesmo meninos pobres vão brincar mais nas ruas, correr mais, interagir mais com outros meninos, ainda que arriscando sua própria vida.  Meninas precisam crescer rápido e, quando pobres, ou nem tanto, assumir mais tarefas domésticas que seus irmãos.  É o destino!  É a natureza! "Sempre foi assim!" e quem é você para questionar?

Mesmo com emprego, salário, carreira, elas vão ter que servir, ou, na "melhor das hipóteses", conseguir outra mulher ou mulheres que lhe sirvam e a sua família.  É um ciclo de exploração que se renova e que reforça os laços entre as mulheres e seus homens, ao mesmo tempo que nos impele a não perceber que entre nós, mulheres, temos muito mais em comum, a começar pela forma como somo socializadas, passando pela maneira como nossos produtos - trabalho, tempo, corpos - são apropriados.  Trabalho de mulher vale menos.  O sistema ainda nos impele a desvalorizarmos umas às outras.


(Sophie Grillet.  Não sou feminista, mas… Lisboa, Presença, 2001.)
Não há escolha, nem escape se não repensarmos os papéis de gênero.  E, aqui, neste texto minúsculo, falo de papéis de gênero atribuídos às mulheres.  Os modelos de masculinidade precisam igualmente ser repensados para que tenhamos uma sociedade mais justa, feliz e sadia.  Opressão há dos dois lados, violência e coerção são a regra, porém, não há simetria.  Nosso modelo de sociedade privilegia o masculino e, ainda que muitos homens sofram com o peso das cobranças, eles têm vantagens inegáveis nos planos social e econômico.  

E apesar desse meu blá-blá-blá todo, a questão nem era sobre gênero, lamento informar aos que vivem da difusão da ameaça da suposta "ideologia de gênero", mas simplesmente da identificação de um movimento social de grande relevância nos anos 1960.  Poderia ser sobre o movimento negro, gay, flower power, descolonizador, mas foi sobre o movimento feminista. Movimentos de Contracultura é marca da década de 1960 e eu faço questão de pontuar isso nas minhas aulas ao falar de 1968 e da Guerra do Vietnã.  É isso!  Bom dia para vocês!  O ENEM foi muita emoção concentrada em dois dias.

domingo, 25 de outubro de 2015

Tema de Redação do ENEM ARRASOU!


Ah, pessoal, preciso comentar.  Ontem, o ENEM trouxe questão sobre Simone de Beauvoir, além de Paulo Freire e outros intelectuais respeitados, mas detestados pelos elementos (pseudo) conservadores de direita que pululam na net e pelos revoltados loucos de plantão.  Sim, porque uma coisa é defender as idéias de pensadores - filósofos, economistas, historiadores e outros - que estão posicionados à direita e/ou são vistos como conservadores, outra coisa, muito diferente, é esse festival de absurdos que o povo anda despejando na mídia e nas redes sociais.  Mas se ontem foi muito legal, hoje, para fechar com chave de ouro, ou LACRAR, como dizem por aí, o tema de redação é "Persistência da violência contra as mulheres no Brasil".  Tá-dá!

Sim, é para comemorar que a aprovação de alguns sujeitos (*e sujeitas*) esteja subordinada à reflexão sobre um problema que muitos negam que exista, ou, pior, que não possam culpar a vítima pela violência, coisa mais que comum entre os machistas e misóginos de plantão.  Sim, você vai ter que pensar a respeito e, não, se desrespeitar os direitos humanos vai levar zero, porque a regra é clara.  


Espero muitas lágrimas derramadas e que os calouros de nossas universidades públicas no ano que vem sejam melhores do que de safras anteriores.  Em uma semana cheia de notícias ruins - caso Master Chef Jr., PL do Cunha dificultando o atendimento às mulheres e meninas estupradas, mulher sendo obrigada a colocar o nome do pai-estuprador na certidão de nascimento do filho - o ENEM lavou a alma.  E vamos comemorar!

Houve quem defendesse, pessoas que prestaram o exame, que o tema da violência contra as mulheres fosse mais discutido nas escolas.  Bem, precisar, precisa. Sabe, discutir gênero, essas coisas que gente como Feliciano, Bolsonaro, entre outros, não desejam que a gente discuta nas escolas. Aliás, ambos estão indignados, o que indica que a prova deve ter sido uma das melhores dos últimos tempos, como aponta, aliás, este texto aqui (O Enem e a falácia da “doutrinação”), mas esperar bom senso desses senhores é demais.  


Só que tem um porém nessa história de "discutir mais o tema", amiguinhos, basta abrir os jornais - impressos ou digitais - e ser inundado com notícias sobre violência contra as mulheres. Esta semana mesmo, como pontuei acima, um foi intensivão para o ENEM. Atualidades é como a gente chama essas coisas.  E preciso deixar para vocês só mais um print desse mundão louco que é a internet.  Aliás, espero que a seleção do ENEM seja boa este ano:

P.S.: Só lamento não ter explicado o conceito de alteridade no aulão de quarta-feira do colégio.  Poderia ajudar os meninos e meninas na questão do Žižek... Mas era fácil, então, confio que a maioria conseguirá acertar.

Reeditando Textos Antigos - Passeando pela Era Heian: Pesquisas e Leituras

A História de Genji de Miyako Maki.
Estava remexendo no meu HD e acabei tropeçando em uma antiga coluna que escrevi para o Anime-Pro.  Algumas pessoas devem lembrar que eu tive uma coluna por lá.  O texto, ao que parece, é de 2003 ou 2004.  Como sei?  Há um marco temporal em um "P.S.", que não irei trazer para cá, que aponta que eu estava assistindo ao live action de Sailor Moon.  Enfim, dei uma lida, corrigi algumas mínimas coisas e continuei achando que é um texto gostoso de se ler.  Espero que vocês gostem, talvez seja a única coisa que eu possa postar neste domingo. :)

Passeando pela Era Heian: Pesquisas e Leituras

Asakiyumemishi, a História de Genji por Yamato Waki.
Semana passada, por sugestão de um amigo, eu comecei a pesquisar sobre a produção de shoujo mangá de Leiji Matsumoto, mangá-ka de vastíssima obra e criador de Patrulha Estelar, anime que conquistou muit@s fãs no Brasil dos anos 80.  A pesquisa não terminou e as informações não encheriam meia página, mesmo nos meus dias mais inspirados.  Entretanto, pesquisando sobre ele, acabei por rastrear a produção de sua mulher, Miyako Maki, uma das pioneiras na criação de shoujos mangás, ainda nos anos 50.  Mas não é nem de Miyako Maki nem de Matsumoto que vou falar hoje.  O assunto é o que escrever, como escrever e para quem se escreve.  Ah, e que ninguém pense que vou falar de correção gramatical, norma culta ou coisas do gênero.  O papo vai ser outro, até porque não tenho nenhuma condição de “brincar” com essas coisas.

Quando estava tentando encontrar imagens de algum mangá de Miyako Maki, descobri que uma das suas obras mais premiadas foi exatamente um mangá, de 1989, baseado na História de Genji (Genji Monogatari), um clássico da literatura japonesa e mundial.   Esse livro conta a vida de Genji, o príncipe brilhante, filho de uma concubina do imperador, suas aventuras e amores.  A autora da obra é Murasaki Shibiku, filha de um nobre de riqueza mediana, mas letrado, e que deu a filha a melhor educação que podia.  A autora, depois de viúva, conseguiu, graças a fama de obtida por sua obra, o lugar de dama de companhia da Imperatriz Ako.

De algum manuscrito da História de Genji.
A História de Genji já recebeu muita atenção em vários mangás, e certamente poderíamos achar várias autoras que já deram a sua versão da famosa história criada por Lady Murasaki durante o período Heian (794-1185) que é a minha época favorita dentro da História Japonesa.  Mas não ouvi falar de Murasaki e sua História de Genji via anime, mangá ou Internet, meu primeiro contato veio através de um livro chamado Uma História da Leitura do argentino Alberto Manguel.  Nesse livro bem interessante, existe um capítulo intitulado “Leitura Intramuros” que fala de vários tipos de limitações impostas aos leitores e leitoras, e de como, as mulheres, um grupo muitas vezes segregado, vai conseguir driblar as restrições.  É exatamente nesse ponto que o autor se concentra no Japão e nas mulheres da corte imperial japonesa no Período Heian.

Durante o a Era Heian a produção cultural vai ser intensa, mas as mulheres estavam – aparentemente – excluídas de várias esferas de atuação e do acesso à alguns saberes.  Uma das exclusões era o aprendizado do Kanji, a escrita japonesa derivada diretamente dos ideogramas chineses.  (Mas claro que havia exceções, ou a regra é falsa, já que Lady Murasaki aprendeu a escrever em kanji.)  Também na mesma época, começa a ser criada uma escrita cursiva japonesa o kana que vai dar base ao hiragana e ao katakana.  A esse tipo de escrita, menos nobre e menos “refinada” as mulheres bem nascidas tinham acesso, e a bela caligrafia era uma qualidade apreciada e que estas deveriam desenvolver.  

De algum manuscrito da História de Genji.
Esse acesso à escrita, ainda que uma forma de escrita desprivilegiada e chamada nessa época pejorativamente de “feminina”, permitiu que no Japão se desenvolvesse uma literatura feminina, e a releitura de Mangel, anos depois do meu primeiro contato com o texto, tornou impossível não fazer a ponte com o shoujo mangá.

No período Heian desenvolveu-se uma escrita tipicamente feminina e a História de Genji, considerada por muit@s como o primeiro romance moderno, é um excelente exemplo disso.  Mas sobre o que mulheres como Murasaki escreviam?  Sobre aquilo que viam no seu dia-a-dia e que podiam observar da vida dos homens, que volta e meia penetravam em seu mundo, das conversas que estes traziam de fora, e, principalmente, da sua própria vivência como mulheres bem nascidas.  Tempo para escrever elas tinham, até porque, como tantas mulheres da aristocracia de outras épocas e lugares, elas eram obrigadas ao ócio.  

A História de Genji de Miyako Maki.
Fantástico é que exatamente essas mulheres criaram a principal literatura desse período da História do Japão.  Interessante é que era uma literatura feita por mulheres e para mulheres; e apesar das possíveis críticas, qualquer imprecisão sobre a política e a forma de vida dos homens era secundária, pois, como diz Mangel, elas “exigiam da literatura não as imagens que interessavam aos seus equivalentes masculinos e com os quais eles se compraziam, mas um reflexo de um outro mundo (...)” e “destinava-se a ser lida por mulheres como a autora, mulheres que compartilhassem sua inteligência e perspicácia sutil em assuntos psicológicos”.

Esta última colocação de Mangel me fez reportar de novo ao universo do shoujo mangá.  Muitos dos defeitos que algumas pessoas apontam nesse grande mar da produção feminina de mangás é a falta de “realidade”, de representações precisas do masculino.  Efetivamente, talvez por uma tradição de escrita que vem de séculos  ou mesmo da desinformação fruto do afastamento entre as esferas femininas e masculinas de atuação, as mulheres japonesas colocam em suas obras, muito mais intensamente, as preocupações do cotidiano, o relacionamento entre as pessoas e o aprofundamento psicológico das personagens.  Competição, triunfo, isso pode estar presente, mas não com a mesma força que com que tais “valores” são cultivados dentro da cultura masculina.  Por isso, acredito que as pegadas de Lady Murasaki ainda sejam revisitadas por muitas autoras de shoujo mangá até os dias de hoje.

Genji Monogatari Sennenki, anime de Osamu Dezaki,
que deveria ter sido a versão anime do mangá de Waki Yamato. 
Murasaki não foi a única de sua época e posição a escrever ganhando notoriedade, temos também Sei Shonagon.  Esta outra dama nobre compôs uma obra, intitulada “O Livro no Travesseiro”, ainda mais apegada às minúcias do cotidiano da corte do século XI.  E ainda poderíamos citar outras mulheres, entretanto, a História de Genji tornou-se obra mais famosa da época e talvez uma das mais lidas da literatura japonesa.  E são lidas por mulheres e homens.  Quer sucesso maior para qualquer autora ou autor do que transcender seu público primordial de consumidores?  Isso é fazer diferença, mas o mais interessante é quando isso acontece sem que seja algo planejado.

Mas o que Murasaki, Genji e pesquisas inacabadas tem a ver com a proposta da coluna?  Bem, se você chegou até aqui e enfrentou essa falação toda (Espero que não tenha ficado chata, porque me deu muito prazer escrevê-la!), talvez consiga ver o objetivo de tudo... Se não pode, perdoe a incompetência da escritora.  Entretanto, mais do que falar de shoujo mangá e de uma tradição japonesa de escrita feminina que foi solo fértil para seu desenvolvimento, eu estava pensando em fanfics  (do inglês fan fiction) e outras formas de expressão feitas de fã para fãs.  Loucura?  Vamos ver se eu explico.

Genji Monogatari pelo Teatro Takarazuka.
Eu nunca escrevi um fanfic na vida mas já li alguns que achei muito bons, outros nem tanto.  Se apossar de personagens alheios pode  parecer um crime para alguns, mas é uma das formas mais prazerosas e criativas de mostrar afeto e admiração.  E para quem um fã que escreve sobre Sango e Miroku de InuYasha ou cria uma saga alternativa de Yu Yu Hakushô está escrevendo?  Para pessoas como ele ou ela que também ficam imaginando como suas personagens favoritas reagiriam em determinadas situações, ou como seria se aquele casal que nunca deslanchou se acertasse.  São essas coisinhas que a gente fica imaginando, às vezes, quando termina de assistir o filme, mas que só colocando no papel podem ser deliciadas por um público maior.

E nesse terreno, vale tudo, daí a proliferação de sites com ficção escritas pel@s fãs.  Um dos sites brasileiros mais interessantes é o Ayanami-Souryou – Arquivo de Fanfics (Que mudou-se para o Facebook) que tem um acervo relativamente grande de fics escritas em português.  Um dos internacionais mais interessantes é o FanFiction.net com centenas de fics divididos em várias seções.  Outros tantos sites com fics poderiam ser encontrados em uma rápida pesquisa no Google, por exemplo.  Mas por que e para que escrever?

Asakiyumemishi, a História de Genji por Yamato Waki.
Apesar de nunca ter escrito um fanfic, como disse acima, já imaginei muitos crossovers entre personagens minhas e de filmes, livros, mangás que eu gostei de ler, mas talvez alguma trava tenha me impedido de colocar isso no papel.  Talvez excesso de senso crítico ou mesmo falta de disciplina, talento e organização.  De qualquer forma, uma das maiores alegrias que eu tive – se voltar a retomar as histórias, talvez volte a ter – é de escrever uma história que me dê prazer e perceber que ela pode oferecer o mesmo para outras pessoas.  De certa forma, me sinto assim quando escrevo uma coluna com um texto que realmente gosto.  Assim, quando leio um fanfic escrito por alguém (ou um fanzine) e deixo minhas impressões, acredito que o autor ou a autora sinta um prazer semelhante ao meu.

Outro ponto interessante é que escrever é sempre um exercício.  Você desenvolve capacidade de exprimir idéias, domínio do idioma, recursos estilísticos que mesmo que você não decida seguir uma carreira “nas letras” serão válidos na sua luta cotidiana.  Saber escrever com clareza e correção é sempre um trunfo.  Fora isso, quem sabe se algo que começou por prazer não pode se tornar uma carreira futura?  

Asakiyumemishi, a História de Genji por Yamato Waki.
Quando Lady Murasaki ou outra das damas japonesas de sua época começaram a pôr no papel o seu dia-a-dia ou suas histórias não poderiam imaginar o impacto da sua obra nem quantas pessoas poderia inspirar.  Elas simplesmente falavam do que viam, ouviam, sentiam, de suas angústias e medos, desilusões e esperanças, usando seus diários (Já percebeu o quanto são comuns os diários no universo shoujo?) ou através de personagens fictícias.   Acho que nesse sentido, os principais conselhos a um escritor ou escritora de fics seriam: escreva sobre aquilo que gosta e conhece; e pense que seu público começa com você, nunca o traia, dialogue com ele, pois de seu sucesso e prazer depende d@s leitor@s. 

Assim sendo, dê asas a sua imaginação. Crie o último capítulo que como você imaginava que deveria ser.  Construa um universo só seu, ou povoe mundos que já existem.  Só não deixe de escrever se lhe der vontade, de criar.  Já vi algumas pessoas dizendo que fanfics e fanarts são coisa para gente sem criatividade que se aproveita do que já foi feito por outros; eu diria que é somente um começo, e mesmo que seja se torne um fim, é direito de cada um construir o seu caminho e vivê-lo da melhor maneira que puder.

A História de Genji de Miyako Maki.

*********************************************************************************
Notas:

*** Graças à pesquisa que iniciei e que me conduziu à História de Genji e Lady Murasaki, descobri coisas muito legais, inclusive a página do Museu de Vestimentas Japonesas que tem versão em inglês e japonês.  Com muitas imagens e fotos de bonecas vestidas em trajes de várias épocas, é uma boa fonte de referência para desenhistas ou curiosos sobre o que japoneses e japonesas poderiam vestir em outros períodos de sua história.  Existe inclusive uma seção dedicada à História de Genji e Lady Murasaki.  Vale a visita.  

*** Outra página interessante, para quem se interessou por ler fragmentos dos escritos  de algumas damas japonesas do Período Heian é esta.  Nesta outra página, existem imagens de ilustrações feitas para uma das edições de Genji Monogatari com alguns resumos.  Infelizmente, todos os textos estão em inglês.  

*** Ano passado eu encontrei esse site que tem um breve histórico sobre o desenvolvimento da escrita japonesa e passei para minhas turmas quando estava dando aula de Japão.  É simples, básico, mas interessante.

*** Para quem se interessar pelo livro que usei na coluna, a referência é essa: MANGUEL, Alberto.  Uma História da Leitura.  São Paulo: Cia das Letras, 1997.  É uma leitura bem agradável, e não é um livro de História nem algo pesado, é somente uma leitura bem prazeirosa.  (Se quiser comprar e ajudar o Shoujo Café, use o link da Livraria Cultura, por favor!)

*** O Período Heian equivale a uma pequena fatia do período de tempo que foi a Idade Média Européia e muitos poderiam dizer que enquanto as mulheres no Japão eram alfabetizadas, mesmo que com limitações, na Europa viviam “nas Trevas”.  Nada mais equivocado.  Eu diria, a única e forte diferença, é que, na Europa, as mulheres alfabetizadas – e talvez estas fossem mais numerosas do que os homens – não tinham uma escrita feminina, mas tinham que se enveredar pelos códigos e estruturas criadas por homens.  Algumas foram muito bem sucedidas, como Hildegard de Bingen, Heloísa ou Marie de France, só que não se criou um gênero de literatura tido como feminino com suas obras.



sábado, 24 de outubro de 2015

Comentando Colina Escarlate (Crimson Peak, 2015)


Quarta-feira fui ao cinema assistir Colina Escarlate.  Filme de época, gótico e com Tom Hiddlestone?  A gente precisa ver.  Foi o que eu pensei de imediato.  OK, o primeiro desafio foi achar uma sessão legendada.  Segundo desafio, um que batesse com o horário da Júlia na creche.  Por conta disso, tive que ir para longe de casa, aqui em Brasília, era Pier 21 (Lago Sul) ou Iguatemi (Lago Norte).  Fomos para o primeiro.  Meu marido já foi resmungando que, nos últimos tempos, eu só o levava para filmes fracos ou chatos... Bem, bem, não achei “Que Horas ela Volta?” chato ou ruim, mas Colina Escarlate me decepcionou muito.  Vamos ao resumo.

Estados Unidos, final do século XIX.  Desde menina, Edith Cushing (Mia Wasikowska)  sabe que existem fantasmas.  Ela viu  mãe morta quando criança.  O fantasma parecia querer lhe mandar uma mensagem “Afaste-se da Colina Escarlate!”.  Quatorze anos depois, em 1901, Edith é uma mulher adulta, filha de um rico empreiteiro, e aspirante a escritora.  Rejeitada por ser mulher e, também, por não escrever sobre temas femininos, ainda assim, ela não desiste.  Um belo dia, o baronete inglês Sir Thomas Sharpe (Tom Hiddleston) aparece no escritório de seu pai, ele parece fascinante e Edith não consegue disfarçar o interesse.  Já o pai de Edith (Jim Beaver) não consegue gostar do nobre e não aceita sua proposta de associação em uma máquina mineradora.



Sir Thomas começa a fazer a corte à Edith e ela corresponde para preocupação de seu pai e do eterno amigo apaixonado Dr. Alan McMichael (Charlie Hunnam).  O pai de Edith, desconfiado de Sharpe desde o primeiro encontro, contrata um detetive, Mr. Holly (Burn Gorman) e descobre coisas terríveis sobre Sharpe e sua irmã, Lady Lucille (Jessica Chastain) intimando-os a deixar os Estados Unidos em troca de um polpudo suborno.  Outra exigência é que Sharpe magoe Edith a tal ponto que ela desista dele.  Assim o rapaz procede e Edith recebe outara visita do fantasma da mãe com a mesma advertência “Afaste-se da Colina Escarlate!”.   Ele erra, no entanto, ao avisar a dupla que não comentou as informações com mais ninguém.

No outro dia, o pai de Edith é assassinado.  Antes de descobrir a tragédia, Edith lê uma carta de Sharpe contando parte da conversa com seu pai e se reconcilia com ele.  Órfã, rica e apaixonada, Edith se casa com Sharpe e se muda para  Inglaterra. Chegando lá, descobre que a mansão de seu marido está em ruínas e que o local se chama “Colina Escarlate” por causa da argila vermelha da região.  Edith passa a ser então atormentada por fantasmas, ouve barulhos estranhos e desconfia de Lucille.  Sharpe parece obcecado com sua máquina e, agora, tem dinheiro para terminá-la.  Ainda assim, ele se mostra apaixonado pela esposa, mas não consuma o casamento com ela.  Nos EUA, o Dr. McMichael, leitor de Conan Doyle, isto é, Sherlock Holmes, começa a somar 2 + 2 e se preocupar com Edith.



A moça parece adoecer na atmosfera opressiva da casa e é privada por Lucille de qualquer assunto da administração.  Os fantasmas a atormentam e Sharpe decide levá-la para um passeio.  Na cidade, longe da casa e de Lucille o casamento é consumado, mas uma carta da Itália para Lady Sharpe faz com que Edith decida investigar a fundo os mistérios da Colina Escarlate.  Isso e o casamento consumado fazem com que Lucille mostre quem ela realmente é e a tragédia parece ser o destino da protagonista.

Resumi em linhas gerais um filme que falha totalmente em seu objetivo, isto é, contar uma história de suspense e horror gótico.  Digo isso, porque desde o início sabemos o que vai acontecer, quem vai morrer, que os Sharpe não são confiáveis e que Edith vai cair como uma patinha.  Aliás, a protagonista é aquele tipo de personagem vendida como feminista, moderna e independente.  A forma de vestir, sua vontade de ser bem sucedida em um mundo de homens, seu desprezo por “coisas de mulher”, tudo aponta para isso.  Querem dois exemplos?  A mãe do Dr. McMichael sugere, com desdém, que a moça quer ser a nova Jane Austen e ficar solteirona, a mocinha faz cara de tédio e diz que prefere ser a nova Mary Shelley e que ela morreu viúva.



Jane Austen foi muito bem sucedida tratando de temas vistos como femininos, romance, vida privada, família etc., Mary Shelley, além de declaradamente feminista, ela escreveu um manifesto sobre os direitos das mulheres, se aventurou em temáticas pouco femininas, Frankenstein é de sua autoria.  Edith quer escrever sobre fantasmas, não sobre romance, no entanto, basta a personagem de Tom Hiddlestone piscar os olhinhos que ela cai feito patinha.  Sua habilidade aguda de observação funciona com Sharpe somente para perceber que ele é um falido, nada mais. E a audiência sabe que será assim, porque o roteiro é tão óbvio que nada pode obstruir ou trazer tempero para um esquema pré-fabricado.  Sim, lamento peos fãs de Guilhermo Del Toro, mas este não é outro Labirinto do Fauno.

No fim das contas, toda a modernidade e autonomia de Edith se desmontam rapidamente e ela se torna a dócil mocinha, a menininha do papai, que vai direto para a boca do lobo.   Ao ver a casa desmoronada, qualquer pessoa minimamente sensata iria se recusar a entrar.  Só que ela ama Sharpe, é isso que a história quer que pensemos.  Ama tanto que aceita viver em uma casa que está caindo aos pedaços e afundando na argila vermelha.  Aceita morar lá mesmo sem nenhum criado ou criada, coisa que inviabilizaria os mínimos cuidados de uma casa tão grande, e com uma cunhada esquisitíssima e fantasmas sanguinolentos.




Aliás, o fantasma da mãe de Edith lhe aparece duas vezes na América.  Meu marido e eu debatemos e chegamos à conclusão que, para o filme, fantasmas estavam ligados ao lugar de seu martírio ou afetos, enfim, coisa bem óbvia e recorrente.  Só que o pai da moça não dá as caras para lhe dizer nada antes dela ir para a Colina Vermelha.  Ô fantasminha sacana esse, não?  Na verdade, só mais um sintoma do quanto o roteiro é capenga.

Até imaginei quando vi Sharpe com roupas defasadas em vinte anos e sua irmã bandeirosa e fria que eles poderiam ser vampiros.  Vampiros é coisa que me agrada, que faz com que meu senso crítico se abrande um tiquinho, mas não era o caso, eles eram bem humanos.  Eu estou me coçando para despejar todos os spoilers aqui no texto, enfim, oreciso falar pelo menos um, algo que me deixou encucada: como os dois conseguiram falir?  Deram três golpes do baú, roubaram a fortuna de três mulheres vulneráveis.  O que fizeram com o dinheiro?  Enterraram tudo na máquina dos sonhos de Sharpe que nem parecia ser uma coisa grandiosa????  Que incompetência financeira é essa?



Um dos fantasmas das ex-esposas, aliás, aparece para avisar Edith, mostra-lhe inclusive o bebê que teve com Sharpe...  É importante dizer que os fantasmas são horríveis, destroçados.  Muito dinheiro foi investido em efeitos especiais e reconstituição de 'época, isto é, locações e figurinos.  Esta é a parte ótima do filme.  Agora, o filme é sanguinolento e se utiliza disso para tentar encobrir suas falhas de roteiro.  Simples assim.  Há muito sangue e analogia com ele, crânios estourados, cadáveres descarnados, isso, aliás, fez com que a censura fosse alta nos EUA.  Agora, não há nenhuma nudez de Mia Wasikowska, ela sempre está vestida, aliás, muito bem vestida, apesar da camisola repetitiva.

Já Hiddlestone tem seu momento de fanservice.  Um só, aliás.  Se você acredita que a bundinha do moço vale o ingresso, é sua chance, mas ele já fez coisa muito melhor no cinema e já mostrou o corpo outras vezes.  A cena de amor entre ele e Wasikowska é bonita.  Toma os gifs para vocês:




A irmã de Sharpe, a sombria Lucille é a grande força do mal, sim, porque o filme, com todas as limitações que ele tem, é um veículo de promoção de Tom Hiddlestone – como seria de Benedict Cumberbatch, caso ele tivesse permanecido no papel – e como peça óbvia que é teria que o redimi-lo de alguma forma.  Todos já devem saber como: ele se apaixona por Edith e vai tentar salvá-la. Consumado o casamento com ela, e Lucille quer apressar a morte da moça, mas os papéis não foram assinados ainda, eles não têm todo o dinheiro da moça.  Edith sabe que será a próxima, já descobriu tudo o que aconteceu e Sharpe lhe avisa para ter cuidado com a irmã.  Sim, o moço lá no fundo tem bom coração, a malvada, maquiavélica, enlouquecida é uma mulher.  OK, chega a hora do herói aparecer...

Do outro lado do Atlântico, McMichael usa suas leituras de Sherlock Holmes para impulsioná-lo a ir atrás de Edith.  Ele consegue descobrir tudinho a respeito dos Sharpe, afinal, basta falar com o detetive e pagar o seu preço.  E lá vai o moço salvar Edith...O filme segue para um clímax que, como todo o filme, é cheio de situações sanguinolentas e exageradas.  A casa está isolada por uma nevasca e o Dr. McMichael anda 4 horas sob o clima inclemente para confrontar os Sharpe.  Leitor de Holmes, como faz questão de propagandear, deveria saber que o detetive nunca ia sozinho e desarmado para um encontro com vilões perigosos.



A coisa, claro, não se encaminha bem para ela, mas Edith precisa sobreviver, o filme abre com ela mesma, nos escombros da casa, falando que acredita em fantasmas... Para se ter uma idéia dos malabarismos, Edith tem sua perna quebrada e consegue, ainda assim, fazer uma série de coisas para somente lá pelas tantas lembrar que, bem, sua perna não lhe permitiria grandes movimentos... Lucille, ao contrário, é de uma força e resistência sobre humanas, como se vampira fosse de verdade.  São muitas situações absurdas e muito sangue esguichando ao estilo Cavaleiros do Zodíaco, enfim, o final é a cereja do bolo de um filme que, com esforço, vale 3 estrelinhas pelo figurino, reconstituição de época, cenários e efeitos especiais.  E, sim, a cena do baile é linda, linda... Mas morre aí.

Para fechar, o filme cumpre a Bechdel Rule?  Sim, cumpre, mas só reforça os papéis de gênero mais rasteirinhos, mocinha tola, mesmo que se salve sozinha, por assim dizer; vilã terrível que faz gato e sapato dos pobres homens, inclusive seu irmão que de parceiro nos crimes se torna quase vítima, mãe e filha americanas ricas que querem um casamento na nobreza britânica, criadas sem nome (duas delas negras) e outras com nome.  Nada que torne o filme notável, mas o elenco feminino com falas e nomes é mais extenso que o da maioria dos filmes.



Depois de ver o filme, fiquei até aliviada quando soube que o papel principal era do Benedict Cumberbatch e ele acabou pulando fora.  Deve ter percebido a canoa furada que era o filme.  Na falta do Benny, o Tom.  O filme não enriquece em nada o seu currículo, mas não deve manchá-lo, também.  É isso.  Vou tão pouco ao cinema, agora, que um Colina Escarlate termina me deixando deprimida... 


Japoneses respondem quais mangás abandonaram por serem muito longos


O Sankaku Complex (+18/NSFW) publicou uma pesquisa feita pelo site Gakumado (*ou o My Navi*), não entendi bem, que perguntou para 500 japoneses “Qual o mangá que você abandonou por ser longo demais?”, ou algo assim.  Sabia que ia encontrar algumas respostas óbvias como Glass Mask e não me enganei. :)  Segundo a página que publicou a pesquisa, 325 pessoas responderam, eles não explicitam idades, nem sexo, mas a lista é bem coerente e ampla mesmo com poucos votantes.  O top 10 foi o seguinte:

1. Detective Conan – 43 pessoas (13.2%)
2. One Piece – 41 pessoas (12.6%)
3. Kochikame – 22 pessoas (6.8%)
4. HunterX Hunter – 13 pessoas (4.0%)
5. Oishinbo – 8 pessoas (2.5%)
6. Naruto – 6 pessoas (1.8%)
7. The Glass Mask – 5 pessoas (1.5%)
7. Kimi ni Todoke – 5 pessoas (1.5%)
9. Gintama – 4 pessoas (1.2%)
10. Kindaichi Case Files – 3 pessoas (0.9%)

Eu imagino que não houvesse uma lista prévia e que as pessoas só pudessem sugerir somente um título.  Vejam que os três primeiros colocados concentram boa parte dos votos, são séries shounen muito populares.  Kimi ni Todoke nem é tão longo e deve ter entrado porque muita gente já cansou da história.  Vejam que Chihayafuru, que tem mais ou menos o mesmo número de volumes, não aparece, assim como Skip Beat!, que é bem mais longo.  Entre os shoujo, senti falta de Ouke no Monshou, que começou na mesma época que Glass Mask e vem em publicação até hoje sem nenhum sinal da autora de que ela pretenda fechar a história.

Kindaichi, que aparece em décimo, nem deveria ter sido cogitado, acredito, porque não é uma série contínua e o mangá é episódico.  Funciona como Eroica de Yasuko Aoike ou mesmo Golgo 13, que foi citado na pesquisa e não entrou no top 10.  São mangás com muito tempo de publicação, mas sem uma linha de história para acompanhar.  Outras séries citadas na lista foram: Kaze Hikaru, o único josei a aparecer, Yu☆Gi☆Oh, Initial D, NINKU, Shizuka Naru Don, Shingeki no Kyojin, Inuyasha, Hajime no Ippo, Chibi Maruko-chan e Golgo 13.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

TV Fuji Anuncia seu primeiro Dorama Lésbico


O Japan Times anunciou que pela primeira vez a TV japonesa irá exibir um dorama (*série ou novela*) com temática lésbica.  O nome do dorama é Transit Girls e tem como protagonistas duas moças, uma de 18 e outra de 21 anos, cujos pais se casam.  As novas irmãs, interpretadas pelas atrizes Sairi e Yui Sakuma, terminam se apaixonando.  

Bem, irmãs ou moças que se descobrem irmãs e se apaixonam parece coisa saída dos shoujo mangá dos anos 1970, só que, neste caso, a cosia normalmente terminava em tragédia...  Ter uma delas de cabelos curtos e outra de longa madeixas, também, parece recurso aos velhos clichês relacionados aos papéis de gênero na relação.  Espero que não seja assim, mas Maki Muraki, líder da ONG  da Nijiiro Diversity, que defende os direitos LGBT, parece preocupada com isso.  A foto promocional mostra duas moças deitadas juntas, aparentemente nuas e sorrindo, e o uso da palavra “proibido”, algo que está ligado à idéias ultrapassadas de relacionamento lésbico e homossexual em geral, isto é, de reduzir o ser gay ao sexo.  É esperar para ver.

De qualquer forma, uma das fantasias perversas dos hetero a respeito dos gays é exatamente essa de que homossexuais são criaturas sexuais por princípio.  Daí, um beijo entre um casal  gay parece uma relação sexual explícita.  O canal Fuji descreve o dorama como uma “uma história de amor comovente e simples, mas tendo como personagens principais duas garotas” e acrecenta que “é o primeiro drama lésbico que a nação japonesa terá que lidar”.   A estréia de Transit Girls será em 7 de novembro e terá 8 capítulos.  

De qualquer forma, a matéria relembra que o ano de 2015 é um marco para os direitos dos LGBT no Japão com algumas prefeituras reconhecendo as uniões do mesmo sexo e o novo ministro da Educação, Cultura, Esporte, ciência e Tecnologia, Hiroshi Hase, afirmando que irá promover o apoio aos estudantes LGBT nas escolas japonesas.  

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Sobre Sexualização de MENINAS ou alguns comentários sobre o caso Master Chef Jr.


Problema antigo que muitos querem não ver, não discutir e, claro, não querem ver associada às práticas cotidianas de opressão contra as mulheres.  Sim, meninas são mulheres e muitos pedófilos são homens casados, ou com namoradas adultas,  que não têm interesse por meninos.  Aliás, muitos pedófilos quando assediam e estupram meninos, os vêem como mulheres substitutas, assim como são as meninas.  Sim, isso joga por terra aquela falácia de alguns conservadores de que pedofilia e homossexualidade estão conectadas.  Lamento, mas isso é somente um argumento criminoso, tão criminoso quanto escrever que todos os padres são pedófilos quando a maioria dos padres não é, aliás, são homens honestos e comprometidos com seus votos.  Enfim, será um post curto, prometo, porque tenho que ir trabalhar daqui a pouco.  

Não vejo Master Chef, nem Marter Chef Jr., mas sei que são programas de sucesso que muita gente nos meus contatos do Twitter assiste.  O que chocou muita gente, especialmente algumas pessoas que devem achar que nós, feministas, que já falamos de coisas assim várias vezes, umas chatas ou inimigas da humanidade, foi o assédio promovido contra uma das participantes do programa.  Coisas repulsivas, obscenas e nojentas, algumas delas, aliás, são ditas em voz alta por homens quando meninas passam por eles nas ruas.  Sabe?  As meninas precisam se acostumar a serem elogiadas e só gente chata, que quer regular o direito ao assédio sex..., oops!... o direito à corte, querem que sejam banidas.  Gostaram do uso da palavra?


Não colocarei o nome da menina aqui, ele já foi divulgado por vários veículos de comunicação, mas trata-se de menina branca, magra, loura, de míseros 12 anos.  Poderia ser uma aspirante à modelo e, portanto, ícone sexualizado dentro da lei.  Sim, estou provocando, porque a hipocrisia é grande em relação a certas práticas, mas era, simplesmente, uma criança competindo com outras crianças para ver quem cozinhava melhor.  Veja a fala do pai da menina em uma matéria do site da Exame: “A gente já tinha chamado uma pessoa para tomar conta do Twitter dela porque estávamos preparados para o assédio e as consequências possíveis, mas não imaginávamos encontrar tarados”, disse o pai, Alexandre, ao portal. “Teve gente que pediu que ela mandasse foto nua.”  Alguém ainda vai dizer que foi só uma brincadeirinha?

Uma menina vista pelos tarados, que acreditam na impunidade, como mulher ou, como um ou outro admitiu, estuprável mesmo criança, isto é, o cara estava ciente do crime e fez apologia ao mesmo.  Havia - denunciei, mas o Facebook disse que estava OK - pelo menos uma comunidade defendendo que esta menina era o ideal de mulher - sim, mulher - perfeito e vindo de outras épocas, nas quais mulheres casavam cedo, puras, intocadas e viviam para seus maridos e filhos. Quando nós feministas falamos e falamos que isso é característica da cultura do estupro, agravada pelo clima de impunidade, somos taxadas de loucas, anti-homem.  Além disso, há os que dizem que o politicamente correto quer acabar com a liberdade de expressão.  Por exemplo, não é politicamente correto assediar meninas de 12 anos, aliás, é crime.  Queria muito que todos os envolvidos fossem rastreados e punidos.  


Enquanto isso, aliás, nosso Congresso, the House of Cunha, aprovou o Projeto de Lei 5069/13, que dificulta o acesso das mulheres e meninas estupradas (*sim, esses homens estão se lixando para os meninos*) ao atendimento no SUS com o único intuito de impedir o acesso ao aborto legal ou qualquer profilaxia que impeça uma gravidez indesejada.  Ainda vai para o Senado, mas é aviltante que se discuta algo assim e que uma maioria o aprove.  Respira... Respira... Respira... 

Agora, mais nojento, para mim, é ver um pseudo-cristão (*não é meu contato, mas de uma pessoa conhecida*) tentando traçar analogia entre pedofilia e questões que só envolvem adultos, "Ah, é preciso se decidir se pedofilia é crime ou mais uma opressão da moral judaico-cristã". Sujeitos assim me dão náuseas, porque nivelam tudo, relações entre adultos ou mesmo adolescentes (*em idade de consentimento*) pautadas por vontade e consenso em violência sexual.  Ser contra crianças - meninas, especialmente - serem assediadas é só o caso em discussão, o canalha adaptaria o discurso em qualquer caso.  Podem ter certeza que ao emitir esse tipo de discurso, ele está pensando no direito dos homossexuais.  É o mesmo tipo de gente que tentará associar homossexualidade à pedofilia com o objetivo de tornar a vida dos homens gays ainda mais miserável.


Aliás, bom que se diga, a moral judaico-cristã, aquela tradicional, de raiz, historicamente nunca esteve realmente preocupada com pedofilia.  Durante muito tempo, para o direito canônico católico romano, a idade para casamento era de 12 anos para meninas e 14 para meninos (*príncipes casavam cedo, também*), mas sempre se podia dar um jeitinho.  Aliás, era muito importante  garantir o acesso de homens mais velhos às meninas, seja pelo casamento, estupro sacramentado pela "lei de Deus de dos Homens", ou pela prostituição, estupro regulamentado, também, mas onde a vítima era desimportante e, portanto, poderia ser abusada como se bem entendesse.  

Até muito recentemente, em países como o nosso, casavam sem problema velhos e meninas, algumas vezes de branco e enfeitadas com flores de laranjeira, tudo isso era aceitável e muitas piadinhas picantes alegravam a festa de casamento ou eram compartilhadas entre os convidados.  Hoje, continuam acontecendo de forma ilegal e casamentos ou relações ilícitas  e ilegais são toleradas no social, muitas vezes, culpabilizando a vítima, meninas que, não raro, tem menos de 12 anos.  


A Bíblia mesmo nem entra na questão de forma direta, não fala em idade de casamento, por exemplo.  Agora, quando fala alguma coisa relacionada à questão aparece, e isso lá no velho Testamento, não o faz de forma muito bonita ou moderna, vide Números 31:17 e 18.  Trata-se de texto que precisa ser lido em seu contexto e que nunca será conclamado nem mesmo pelos irresponsáveis empresários da fé que temos por aí, inclusive no Congresso.

O caso Mastr Chef Jr. não é exceção, não é fruto de um punhado de mentes doentias, é a visibilização de desejos que são tolerados em uma sociedade patriarcal, que reduz as mulheres de todas as idades aos seus corpos e vê como lícita a expressão do desejo masculino em múltiplas formas.  Uma sociedade que sexualiza meninas-modelo, que vende crianças em embalagem "de mulher", mas que se ruboriza e revolta quando a coisa emerge com selvageria na internet.  É preciso punir, ms é preciso, também, repensar a sociedade como um todo.