domingo, 31 de março de 2019

Comentando Dumbo (EUA/2019)


A Disney decidiu transformar todas as suas animações em live actions, OK, não vejo razão, mas a empresa vai acabar ficando com o meu dinheiro.  Em condições normais, talvez não tivesse ido assistir Dumbo... mentira, iria, sim, o figurino da Eva Green nos trailers me chamou para o cinema, de qualquer forma, fui ver dublado, porque estava com a Júlia.  Será uma resenha curta, não vejo motivo para me estender demais, só deixo marcado desde aqui que foi um filme bem diferente do original e que figurino, fotografia e design de produção devem ser três indicações que Dumbo pode receber no Oscar do ano que vem.

O ano é 1919, Holt Farrier (Colin Farrell) retorna da Primeira Guerra Mundial mutilado e encontra o circo onde sempre trabalhou em péssimas condições financeiras.  Sua esposa morreu no surto de gripe espanhola e ele tem dificuldades para se relacionar com os dois filhos pequenos,  Milly (Nico Parker) e Joe (Finley Hobbins). Como os cavalos com os quais ele se apresentava foram vendidos, o dono do circo, Max Medici (Danny DeVito) o coloca para cuidar dos elefantes.  Há uma elefanta asiática grávida e tem um filhote, mais tarde chamado de Dumbo, que tem grandes orelhas e é visto por muita gente como uma aberração.  

Dumbo é separado de sua mãe.
Os filhos de Holt descobrem que Dumbo pode voar e o adestram para fazê-lo usando uma pena.  Depois de alguns atropelos e acidentes, Dumbo voa no picadeiro e atrai a atenção de um magnata do entretenimento, V. A. Vandevere (Michael Keaton).  ele deseja que Dumbo faça um número com sua estrela do trapézio,  Colette Marchant (Eva Green).  Os métodos de Vandevere, no entanto, são truculentos e causam sofrimento para toda a trupe do circo, que aprendeu a amar Dumbo, e, também, para o elefantinho, cujo maior desejo é reencontrar sua mãe.

Se você assistiu ao Dumbo original, percebeu a quantidade de personagens humanas novas e que nenhum dos bichinhos do original, especialmente o ratinho Timóteo (Timothy Q.) foram citados.  No desenho animado, era o rato que ajudava Dumbo a descobrir o seu talento.  Todos os animais com comportamento humano foram eliminados.  As elefantas que eram cruéis com Dumbo e sua mãe não existem.  Os corvos, acusados de serem elementos racistas no filme original de 1941, muito menos.  ainda assim, Dumbo e sua mãe, tem comportamentos que mesclam, há certos comportamentos típicos de elefantes e algo de humano nos dois.

O palhacinho mais triste que vocês já viram.
Temi que Tim Burton pudesse fazer um filme fora da curva, ele pode ser genial e pode errar a mão volta e meia.  A grife do diretor pode ser reconhecida em todo o filme.  Ele é um pouco escuro e visualmente deslumbrante, muito mesmo, há uma morte violenta (*o sujeito que trata os elefantes com crueldade*), um tiquinho de tensão sexual entre Holt e Colette (*Desculpe, com Eva Green seria impossível isso não acontecer*), mas é basicamente um filme infantil.  Celebram-se os bons sentimentos, o valor da família, seja a natural, ou a circense, a importância dos sonhos e de não desistir deles.

Milly, por exemplo, não quer trabalhar no circo, quer ser cientista.  Algo muito difícil para alguém em sua condição, de família circense, pobre e menina.  Holt quer voltar a trabalhar com seus cavalos, apesar de ter perdido um braço.  Dumbo quer sua mãe de volta.  O filme critica a violência contra os animais e como os circos eram (*alguns ainda são*) violentos com os bichos que aparecem em seus números.  Tudo isso é apresentado de forma bem orgânica, ou seja, o filme funciona, é visualmente muito bonito, ainda que não tenha me causado nenhum impacto.

Os corvos e outros animais com comportamentos
humanos estão ausentes do filme.
Da trilha sonora original, foi mantida a música de fundo do circo, ela é usada várias vezes e temos uma tocante execução da "Baby mine", a canção de ninar que é cantada quando Dumbo tenta se aninhar com a mãe que está presa.  A cena é quase idêntica a da animação.  E ficou lina a nova versão da canção principal do filme.  O recurso de utilizar a cegonha pousando sobre o vagão para marca o nascimento de Dumbo foi bem sacada, também.  Não me lembro se estava no original, mas acredito que, sim.  Milly tem ratinhos, um deles com uma roupinha igual a que Timóteo usava.

O figurino, aliás, é outro destaque.  Eva Green, a única mulher adulta com alguma presença no filme, está linda, elegante e, ao mesmo tempo, sedutora.  Eu acredito que Dumbo será indicado ao Oscar de figurino por causa dela.  Falando em Eva Green, não sei se o filme cumpre a Bechdel Rule, mas acredito que não cumpra.  Colette e Milly conversam, mas acredito que seja com Dumbo.  Elas são as mulheres importantes do filme, mais a filha de Holt do que a trapezista, claro.  As outras mulheres que trabalham no circo não tem nome, ou tem falas insignificantes.  Enfim, os machos são os protagonistas, Dumbo, claro, e Holt.  E ver Colin Farrell atuando bem só me faz lamentar que ele não seja Grindenwald.  Ele deveria ser e teria uma idade bem mais próxima a de Jude Law.  Só que já era, não é mesmo?

Eva Green está linda no filme.
É isso.  Dumbo é um bom filme de Tim Burton, no qual ele se coloca à serviço da narrativa e, não, como o centro das atenções.  Trata-se de um filme que se afasta do original com saídas sensíveis e inteligentes.  Não sei se será lembrado como devia, mas como filme me convenceu mais do que Cinderella e A Bela e a Fera.  Vamos ver como Alladin se sai logo em seguida.

E chegou o mangá da Rosa de Versalhes!


Finalmente, coloquei as mãos nos dois volumes da edição da JBC da Rosa de Versalhes  (ベルサイユのばら).  Não li, lerei, mas fiquei mais emocionada do que poderia imaginar.  Sabe abrir e ter vontade de chorar?  as mãos meio que tremerem?  Foi meio assim. São quase vinte anos esperando pela publicação dessa série no Brasil.  Parece até um sonho, sabe?  Ou delírio, sei lá. Eu estava na rua, então, segurei a onda.  Chegando em casa, fiz um pequeno, não tanto vídeo, comentando.  Achei melhor.  Não reparem, nem o cenário, nem a precariedade.  Acho que precisava, enfim... 



(O post originalmente foi feito no dia 25 de fevereiro, mas vamos deixá-lo em cima por um tempo.)

Café com Jane Austen: Um novo Podcast


Fui convidada para participar de um podcast especializado em Jane Austen e o universo que gira em torno dela. O primeiro programa está gravado e entrou no ar.  Além de mim, participam da equipe do podcast Moira Bianchi (escritora e autora do blog Moira Bianchi), Adriana Sales (pesquisadora e fundadora da Jane Austen Sociedade do Brasil - JASBRA), que gravou os Shoujocasts sobre Orgulho e Preconceito conosco, e a Thaís Brito (jornalista e autora do blog Fantástico Mundo de Jane Austen), que editou o programa.  

Espero que vocês gostem.

 


O livro que eu sugeri no final.  é uma leitura muito legal.

No tempo em que as mulheres não podiam fazer nada, só ficar em casa: Conversando com a Júlia


Faz tempo que não escrevo no Shoujo Café sobre as minhas aventuras no mundo da maternagem.  Para quem não sabe, chegou agora, tenho uma filha de cinco anos e, infelizmente, crescendo rápido.  Para ela, claro, ela falou isso ontem, chegar aos cinco anos demorou uma eternidade.  Bom que seja desse jeito.  Ser criança saudável e com uma família que lhe proteja e dê amor é muito bom.  em outras condições, talvez não seja tanto.  Mas vamos para a minha conversa com a Júlia:

Júlia quer ser "youtuber" infantil. 😛

"Mãe, é verdade que antigamente os homens podiam fazer tudo e as mulheres não podiam fazer nada e tinham que ficar em casa?" "Quem disse isso para você?" "Foi a tia XXX." Isso foi dias atrás, mas a Júlia repetiu a conversa hoje. Ela está na fase de repetir conversas e informações, parece um reforço sem fim, mas sei que é coisa de momento.  Acho que, no geral, a professora da Júlia faz um excelente trabalho para a idade que as crianças têm e levando-se em consideração que muitos pais e mães mais atrapalham do que ajudam o processo de educação formal de seu filhos e filhas.
Um caso muito peculiar.
Daí, expliquei que não era tão assim, só que não dava para entrar em minúcias como explicar que mulheres pobres sempre precisaram trabalhar fora de casa e casos mais específicos, eu estava dirigindo,  e ela ainda é muito jovem para que eu discuta o conceito de "História do possível" com ela.  😄 Só tentei reforçar para ela que as mulheres tiveram que lutar muito para que nós pudéssemos ter vários direitos e que é muito fácil perdê-los. Sim, a ideia do coletivo.  Ninguém nos DEU nada como virou moda em certos círculos conservadores e religiosos repetir por aí.  

Yentl é um dos meus filmes favoritos.
Enfim, estávamos ouvindo o CD de Yentl em português.  Júlia tinha pedido que eu colocasse alguma coisa que ela pudesse entender, daí, tirei da versão original e fui para o CD que está no rádio do carro.  As músicas cantadas por Barbra Streisand são muito melhores, mas prestigiei a artista (Tania Apelbaum Novak) e Júlia pode compreender o que era cantado e perguntar sobre a música. Era a música "This Is One Of Those Moments" (Este é um daqueles momentos), quando Yentl é admitida na Yeshiva e canta que agora poderá ler todos os livros que sempre sonhou e nunca lhe deixariam ler. Já falei de Yentl para Júlia antes, sempre comparo com Mulan, uma queria estudar, outra ir para a guerra, ambas eram impedidas simplesmente por serem mulheres.

Ainda estou devendo uma resenha de Mulan.
Contei que a avó dela apanhou da minha avó simplesmente por querer jogar bola (*minha mãe quase foi levantadora da equipe de vôlei de escola, mas minha avó não deixou*), porque a mãe dela dizia (*diz até hoje*) que menina não brinca de bola. Minha mãe nunca impediu meu irmão e eu de brincarmos com nada, ela inclusive enfrentou meu pai em alguns momentos por preconceito dele em relação aos brinquedos que ela dava para meu irmão.  Minha mãe não reproduziu esse tipo de ideia, ela se libertou e fez melhor.  Meu irmão, hoje, é o pai mais amoroso possível; criança, ele era de uma paciência infinita penteando as bonecas que eu ganhava mesmo sem querer.  Se você acredita em horóscopo, o fato dele ser virginiano pode influir nessa obsessão por tudo sempre bem arrumado.  😉  Em tempos tão insanos como os nossos, é preciso marcar posição, o que Júlia vai fazer da vida dela adulta, será escolha da própria, por enquanto, cabe a mim orientar. "Você não ia poder brincar de bola, nem correr. Para você, só uma Baby Alive para brincar."  

Essas bonecas Baby Alive me parecem sinistras.
Júlia odeia essas bonecas Baby Alive, eu, também, aliás. Só que elas são o sonho de consumo de uma prima dela da mesma idade, essa priminha fala toda feliz que quer a boneca que faz cocô. Júlia ficava olhando com cara de nojo, isso quando não dizia que se a XXX fosse nos visitar, ela não poderia levar a tal boneca. Eu sempre brinco que vou dar uma de presente para ela. "E ela vai acordar você de noite e pedir para você limpar a fralda dela." "E eu vou atirá-la pela janela." Sim, ela planeja assassinar bonecas, se ficar só nas bonecas que ela nunca terá, está bom.  Mas, de novo, o que ela vai fazer da vida dela quando adulta, não me caberá decidir.

sábado, 30 de março de 2019

NHK usa ilustrações ao estilo anime e história Isekai para ensinar inglês


Isekai (異世界) significa "mundo diferente" e literalmente é um dos gêneros favoritos dos mangás e animações japonesas, seja shoujo, shounen, ou whatever.  Josei, não, curiosamente.  Fushigi Yuugi, Escaflowne, Sword art on Line, Twelve Kingdoms, até Anatolia Story, embora, pouco importa se Yuuri veio de outro mundo (*o futuro*) para o andamento da história.  Enfim, os japoneses gostam disso e o Sora News trouxe uma matéria sobre um livro didático da NHK que tem como seu fio condutor uma história Isekai que é a seguinte: "Runa Watsuki é japonesa e está no segundo ano ginasial, devido a estranhas circunstâncias, ela viaja entre um mundo misterioso e a realidade.  'O que?  Eu sou a garota da lenda?  Eu vou salvar o povo do reino de um dragão?! s-sem chance!!' Vamos seguir com Runa em uma emocionante aventura." 


Clichê, mas quem não gostaria de ter um livro de inglês desse para estudar quando era adolescente?  Eu me imagino tentando desenhar as personagens e tudo mais.  Segundo o SN, o livro faz parte de uma coleção de fundamentos da língua inglesa que é suporte didático para o programa de rádio Fundamentals 2, para quem quer aprender inglês como segunda língua.  Todos os meses, um novo encarte com vocabulário e exercícios será lançado.  O livro custa 486 ienes e pode ser encomendado aqui.

Já temos o pôster de Hana Yori Dango do Takarazuka (*Com breves explicações do que é o Teatro e Hanadan*)


Esta semana tinha postado a primeira imagem (*cortesia do querido amigo Igor*) e, ontem, ele me passou o poster com todas as atrizes caracterizadas.  Sim, se você caiu de pará-quedas aqui, o Teatro Takarazuka existe desde 1913 e todos os papéis são desempenhados por mulheres.  Todos os anos, a Revue, como também é chamado o Takarazuka, aceita novas alunas que passaram por duro treinamento.  Umas se tornarão otokoyaku, especializadas em papéis masculinos, outras, musumeyaku, as que desempenham os papéis femininos.  Há personagens femininos que podem ser interpretadas por otokoyaku em algumas situações, como Oscar (Rosa de Versalhes), ou Scarlet O'Hara (E o Vento Levou).
Adolescentes comemoram, porque seu nome
está na lista das 107 novas alunas do Takarazuka.
Se você também não conhece Hana Yori Dango (花より男子), provavelmente o shoujo mangá de maior vendagem da história, trata-se de uma série de Kamio Yoko, publicada na Margaret entre 1992 e 2008.  A série fechou, ou não, com 37 volumes e já foi adaptada para animação (*poderia ser melhor*) e live action várias vezes, no Japão, China, Taiwan, Coréia, EUA (*bem ruim*) e Índia (*tenho quase certeza, algum especialista, me dê uma ajuda aqui*).  É que umas adaptações são muito livremente inspiradas do que outras.
O elenco do mangá.
No mangá, Tsukushi Makino é uma garota de classe média baixa, sem muitas aspirações na vida a não ser ser independente e feliz, mas que a mãe deseja ver bem casada.  Por conta disso, a família se sacrifica para pagar a elitista Academia Eitoku.  Nesse colégio, quem manda são os F4, um grupo de quatro rapazes riquíssimos e cujo líder, Doumyoji, costuma se divertir praticando bullying.  Quem os F4 decidem hostilizar, está perdido.  Tsukushi, que não queria estar em Eitoku, tenta parecer invisível, afinal, ela não pertence àquele mundo.  
Elenco da versão live action japonesa mais famosa.
Só que a moça não quer bem sair do colégio, porque está apaixonada por Rui, o mais discreto e tímido dos F4.  Um dia, no entanto, o senso de justiça de Tsukushi não lhe permite se omitir.  Ela enfrenta Doumyoji e se torna alvo dos F4, só que ela não é uma frágil flor, ela é uma erva daninha, difícil de arrancar e matar. Ela resiste e a vida dos F4 nunca mais será a mesma.  Eu amo Hanadan com todos os seus defeitos e qualidades.  Queria uma nova animação com qualidade e eliminando as barrigas que a série tem.  Adoraria assistir ao espetáculo do Takarazuka.  Tomara que caia na rede.

O pôster completo.
Depois, usando "宝塚歌劇団" (Takarazuka Kagekidan), localizei o pôster no Twitter.  As pessoas estão eufóricas.  Em destaque, Yuzuka Rei como Doumyoji e Shiroki Mirei como Tsukushi.  Ela ficou fofa com o uniforme, diga-se de passagem.  Mais atrás, de branco, Seino Asuka (Hanazawa Rui) e os outros dois F4 Yuunami Kei (Mimasaka Akira), com o cabelo mais longo, como no mangá, e Kinami Raito (Nishikado Soujirou).

sexta-feira, 29 de março de 2019

Comentando Banho de Vida: Um Incrível Exército de Brancaleone na Piscina (França/2018)


Faz mais de uma semana que assisti Banho de Vida (Le Grand Bain), uma comédia francesa muito simpática, com o maior elenco de desajustados que eu já vi reunida e com um gostinho de conto de fadas.  Como definir um filme que gira em torno de sujeitos depressivos, desempregados, marginalizados de alguma forma, fracassados aos olhos da sociedade, que se une para formar uma equipe de nado sincronizado e termina por disputar o mundial da categoria que é uma das poucas nas quais as mulheres são o espetáculo e os homens são tratados com desdém?  Enfim, foi um filme bem surpreendente em certos aspectos e com algumas interpretações muito boas.

Bertrand (Mathieu Amalric) está no auge dos seus quarenta anos, sofre de depressão e está afastado do trabalho faz dois anos. Um belo dia, ele vê o anúncio de equipe de nado sincronizado masculina em uma das paredes da piscina municipal. Aceito, ele passa a se dedicar ao esporte junto com uma equipe de sujeitos que a gente não consegue entender muito bem por qual motivo abraçou um esporte tão inusitado. Sob o comando de Delphine (Virginie Efira), uma ex-atleta vitoriosa, mas que tenta superar o alcoolismo, Bertrand e os novos companheiros decidem participar do Campeonato Mundial de Nado Sincronizado e encontram, enfim, um novo propósito para sua vida.

Delphine quer que os rapazes libertem a mulher interior.
O filme começa com um prólogo narrado por Bertrand que faz a analogia entre um mundo que é redondo (*a Terra, o óvulo fecundado, a roda da bicicleta que nos leva livres para onde quisermos*) e como, ao longo da vida, vamos sendo colocados em um quadrado, a escola, o trabalho, os modelos familiares e adoecemos.  Imaginei que iria assistir a um filme sobre um depressivo, mas recebi um combo de sujeitos curiosos, todos altamente problemáticos, e que me lembraram na sua empreitada os sujeitos de O Incrível Exército de Brancaleone.  Rejeitados, desacreditados, meio à margem do sistema, mas que se propõe a uma louca e impossível missão e, bem, desculpem o spoiler, eles chegam lá.  

Há oito sujeitos na equipe e o filme não explica bem por qual motivo eles se juntaram ao grupo.  Bertrand foi por curiosidade e, talvez, para tentar sair de casa.  Thierry (Philippe Katerine) é funcionário da piscina, um sujeito solitário e, provavelmente, com algum atraso cognitivo.  Seu motivo maior, além de interagir com as pessoas, é Delphine, ele se derrama todo quando olha para a treinadora.  Já os outros, não sei mesmo.

A nova treinadora.
Marcus (Benoît Poelvoorde), o mais velho do grupo, é um picareta que vive levando à falência seus empreendimentos.   Simon (Jean-Hugues Anglade) é um roqueiro frustrado, que mora em um trailer e trabalha na cozinha da escola na qual sua  filha adolescente estuda.  Seu maior objetivo é que a menina o admire, algo difícil.  Basile (Alban Ivanov) é um sujeito de 38 anos que teve um empréstimo no banco negado, ele é muito próximo de Avanish (Balasingham Thamilchelvan), um sujeito que não fala francês e que usa boias no início do filme, porque não sabe nadar.  Basile é o único que parece incomodado em ter sua atividade esportiva associada ao feminino, ele e Avanish são muito próximos e tem menos espaço que os outros sujeitos.  Fiquei com meu gaydar zunindo.  Acho que eles são um casal de ursos.

Laurent (Guillaume Canet) é o único sujeito bem sucedido profissionalmente do grupo. Gerente de uma metalúrgica, ele tem esposa e filho, porém, sofre de ataques de cólera.  Ele é um marido violento e um pai que não compreende as necessidades do filho, que tem dificuldades na fala. Bertrand desconfia que ele tem depressão, mas Laurent não busca ajuda médica e termina perdendo a esposa.  Estou dando destaque para ele, porque é uma das personagens mais desenvolvidas do filme, ainda que a que mais pareça fora do lugar na equipe de nado sincronizado.

A ideia do assalto, não é uma boa ideia.
A mãe de Laurent está em um sanatório e sofre de uma doença psiquiátrica bem perturbadora.  Ela é gentil e amorosa e, do nada, começa a agredir verbalmente as pessoas, especialmente, o filho.  Acredito que o maior medo de Laurent é ter a doença da mãe.  Na clínica, Laurent conhece John (Félix Moati), um jovem enfermeiro que rouba remédios dos idosos e desenvolveu a habilidade de prender o fôlego para não sentir os odores quando tem que limpar os quartos dos pacientes pela manhã.  Laurent o convence a ser o pilar da equipe, o sujeito que prende a respiração e dá sustentação para as piruetas dos demais.

Ao longo do filme, vemos os problemas de cada um.  Bertrand e a esposa se amam, mas seu casamento é prejudicado pela condição do marido.  Ele sofre preconceito de parentes que o veem como um encostado.  Termina aceitando emprego na loja do cunhado bem sucedido (Jonathan Zaccaï), onde termina sendo humilhado.  O filho mais velho, o despreza.  Só a filha caçula, uma criança, não lança sobre ele olhos julgadores.  É a piscina e a sociabilidade com outros sujeitos em situação complicada que lhe dá esperança.  E é legal ver como se desenvolve a amizade entre sujeitos tão diferentes e como isso, ter quem lhe ouça, ter gente solidária, ajudam a diminuir os sintomas da doença.

Claire apoia o marido e sofre, também.
A equipe de nado sincronizado era somente uma diversão até que Delphine, a treinadora, tem uma recaída na bebida por causa de uma decepção amorosa.  Dela sabemos somente que tinha uma parceira, era candidata ao ouro olímpico, mas que, por algum motivo, sua dupla se desfez e ela não conseguiu persistir na carreira.  Mais tarde, percebemos que a treinadora do pólo aquático, Amanda (Leïla Bekhti), que a olha de longe, era sua parceira.  Amanda é cadeirante. O filme não explica, mas, talvez, Delphine tenha se sentido culpada pelo acidente.

Quando Delphine tem a tal recaída, Amanda decide treinar os rapazes e, bem, ela é uma treinadora muito dura, diferente da amiga.  Ela grita com os sujeitos, bate neles, os submete a um treinamento exaustivo digno de anime de esporte.  Mas eles não a abandonam.  Há um momento em que Laurent perde a paciência e joga Amanda na piscina.  Todos os colegas vão resgatá-la e parece que ela amolece, se desculpa, mas era só fingimento, ela vai lá e se vinga. 😁  E parte da cena está no trailer. 

E eles terminam se empolgando.
E estamos nesse pé quando Thierry descobre que há um campeonato de nado sincronizado masculino, que não há equipe francesa e os caras decidem contra todo o bom senso, se inscrever.  Amanda pergunta se eles querem vencer, ou só participar.  Quando Basile responde participar, Amanda vira uma fera.  O treinamento se torna mais violento até que Delphine retorna e ambas passam a oferecer para os rapazes uma preparação mais equilibrada e sem castigos corporais.  Eles se tornam uma equipe de verdade.

Só que como arrumar dinheiro para ir para a Noruega?  Marcus quer um uniforme estiloso (*sunga, chinelos e roupão*) e Laurent diz que os outros colegas mal conseguem pagar o aluguel e não teriam como investir quase 300 euros no material.  Marcus, picareta como é, dá a ideia de roubarem.  Bem, não dá muito certo... Mas, sim, eles vão para a Noruega no trailer de Simon. E apesar dos contratempos, das loucuras, da precariedade, eles representam a França no campeonato.  Leurent, por exemplo, joga os remédios de John fora e o sujeito tem uma crise de abstinência que quase o impede de nadar... Quer dizer, ele vai, mas meio que à pancadas.  Não vou dar detalhes do desenrolar do campeonato em si, mas recomendo o filme.  Ah!  Na Noruega, o filme oferece uns fanservices inusitados, porque a câmera acompanha descaradamente a bunda dos nadadores das outras equipes, todos sujeitos jovens e em forma, em contraste com a equipe francesa.

Todo mundo no trailer.
Le Grand Bain foi indicado para vários Césars, o prêmio máximo do cinema francês: melhor filme, melhor diretor (Gilles Lellouche), melhor ator coadjuvante (Jean-Hugues Anglade e Philippe Katerine, que venceu), melhor ariz coadjuvante (Leïla Bekhti e Virginie Efira), melhor roteiro original (Gilles Lellouche, Ahmed Hamidi e Julien Lambroschini), melhor fotografia, melhor montagem e melhor som.  Enfim, uma trajetória de sucesso no seu país de origem.  A trilha sonora do filme é muito boa, também.  E parece que houve um filme com trama semelhante feito na Inglaterra chamado Swimming with Men, fiquei com vontade de assistir.

Banho de Vida é um filme otimista e a gente releva, porque ele é tão bem construído na sua simplicidade e tem uns tipos tão bizarros e, ainda assim, críveis.  O filme cumpre a Bechdel Rule?  Bem, acho que por um fio, mas o fato é que ele tem seis personagens femininas no mínimo.  As treinadoras tem destaque, assim como Claire (Marina Foïs), esposa de Bertrand, e Lola (Noée Abita), a filha de Simon que termina sentindo orgulho do pai.  Há a mãe de Laurent, com quem ele termina se acertando do seu modo, e a esposa dele, Diane (Erika Sainte), que rompe o casamento e deixa o marido para trás.  Eu gostei disso, porque mesmo que as personagens tenham a nossa simpatia, nenhuma mulher deve suportar um casamento violento.  Laurent, no entanto, se acerta com o filho e, bem, a julgar pelo desenrolar dos acontecimentos, se torna um homem melhor.

Laurent meio distante dos colegas.
Falando do esporte nado sincronizado, é um dos casos curiosos em que o esporte começou masculino, ainda no século XIX, com campeonatos somente para eles.  Só que, no século XX, os homens começaram a ser banidos de muitas competições. Sim, banidos.  A Wikipedia em inglês diz que nos campeonatos nos EUA, havia duplas e equipes mistas, mas que depois de 1941, exigiu-se, sabe-se lá por qual motivo, que homens e mulheres competissem em separado e o interesse pelas apresentações masculinas caiu.  Eles terminaram sendo excluídos mesmo.  Sozinhos, nem pensar.  Parece que o que está em discussão é incluir programas de duplas mistas em Tokyo, 2020.  Enfim, que lástima isso.

Curiosamente, são poucos os momentos em que há alguma crítica aos moços por fazerem um "esporte de mulher".  Quando elas aparecem, são ignoradas, ou rebatidas em grande estilo, como no enfrentamento entre Claire e sua irmã dondoca e moralista (Mélanie Doutey).  O que importa, afinal, é que aqueles homens recuperaram a dignidade e a alegria de viver através do esporte.  E, bem, tentar ser feliz, ou pelo menos ter uns momentos de felicidade em um mundinho tão quadrado como o nosso é o que vale.  Recomendo muito Um Banho de Vida.  Duvido muito que você termine de assisti-lo sem refletir um pouquinho sobre a vida e dar algumas risadas.

Kodansha abre concurso para novos mangá-kas shoujo e shounen e o site tem versão em inglês!


A editora Kodansha está promovendo dois concursos voltados para jovens talentos de mangá.  Estava olhando o Twitter mais cedo e as informações estavam sendo repassadas pelo Twitter da revista Betsufure, uma das envolvidas, junto com a Shounen Sunday.  Como tem site em inglês, acredito que estrangeiros possam participar.  Para ambos os concursos, o prazo de inscrição é de 29 de março até 31 de maio.  O prêmio é 50 mil ienes, publicação em uma das revistas da editora e uma entrevista com um editor.


Um dos concursos é de ilustração e há o seguinte texto: "Existem algumas mangá-kas serializadas na Bessatsu Friend, como Hatsuharu-sensei (Ojou to Banken-kun) e Izumi-sensei (Cells at Work) que foram ilustradoras por muito tempo. Para quem costuma desenhar ilustrações mas tem interesse em desenhar mangás, esse concurso é para você! Faça sua estreia com o Bessatsu Friend!"  Link do concurso aqui.


Já o outro concurso é de mangá mesmo e a descrição é a seguinte: "Neste concurso organizado pela Monthly Shounen Magazine e pela Bessatsu Friend, procuramos shounen mangás que irão incendiar sua alma, e mangás shoujo que farão seu coração trepidar."  O link do concurso é esse aqui.  Nas páginas dos concursos, há todas as instruções de como participar e as regras.

quinta-feira, 28 de março de 2019

Poe no Ichizoku tem novo capítulo na revista Flowers


Hagio Moto lançou novo capítulo de Poe no Ichizoku (ポーの一族)  na revista Flowers. Segundo o Comic Natalie, trata-se de uma continuação de Unicorn (ユニコーン) com o nome de Edith (エディス).   


Já na próxima edição, a revista irá comemorar os 15 anos de carreira de Nao Iwamoto, sua série atual, Marronnier Oukoku no Shichinin no Kishi (マロニエ王国の七人の騎士), estará na capa, será a ilustração do brinde da edição, e a revista trará uma entrevista com a autora, que é muito premiada.

Aya Nakahara estreia nova série na revista Cocohana


Otona Najimi  (おとななじみ) é a nova série de Aya Nakahara na revista Cocohana, ela tem como protagonista uma moça e seu amigo de infância e vizinho.  São 24 anos de convivência, mas, de repente, as coisas começam a mudar.  Aya Nakahara, então, mesmo com a trama simples, até clichê, é difícil dar errado.  


Segundo o Comic Natalie, a edição comemora, também, o aniversário de 35 anos de carreira de Kusumoto Maki.  A edição atual traz a obra de estreia da autora Kasei wa Sabi de Dekite Ite Akai Noda (火星は錆でできていて赤いのだ).  Já na edição que sai no dia 27 de abril, teremos, se entendi bem, a continuação da mesma obra.

Nintendo lançará CD da trilha sonora do game inspirado na Rosa de Versalhes


Foi noticiado hoje que a Nintendo irá lançar, no dia 26 de junho, o CD da trilha sonora do game  Shiritsu Berubara Gakuen ~Versailles no Bara Re*imagination~ (私立ベルばら学園 ~ベルサイユのばらRe*imagination~), lançado no início de março.  Acredito que o jogo de relacionamento (datesim) esteja fazendo bastante sucesso.  Haverá duas versões, a normal (3024 ienes) e a limitada (3300 ienes).  

Os destaques da trilha são a abertura, Mikansei Actor (未完成アクター) do grupo ACRYLICSTAB, e o encerramento, Ring a Bell, de RIRIKO.  Agora, o que a edição especial irá ter, ainda não descobri.

Tom Hiddleston é o homem ideal, segundo as japonesas no Twitter


Ah, eu tinha que colocar isso, aqui, no Shoujo Café, desculpem.  está aberto faz dias no meu navegador.  Enfim, acho o tom Tom Hiddleston um grande ator e, bem, as japonesas tem lá suas razões... A materiazinha saiu no Sora News, estou somente traduzindo da tradução e entre colchetes estão meus comentários.



Atributos do lado esquerdo:

  • Altura: 188 centímetros e com pernas medindo 114 centímetros [*Pernas de shoujo mangá, vamos combinar!*]
  • É esbelto, mas com um corpo definido.
  • Tem uma ótima voz.
  • Tem um belo sotaque. [*Como assim?*]
  • É feminista.  [*"フェミニスト", em japonês, raramente tem a ver com o nosso significado, trata-se de "gentil com as mulheres", "cavalheiro".  Porém,  ele já se declarou feminista publicamente.*]
  • É um cavalheiro que não ousaria tocar a pele de uma mulher sem a permissão dela.  [*Como elas sabem?*]
  • É embaixador da UNICEF.
  • Ganhou um Globo de Ouro.
  • Parece um anjo.
Atributos do lado direito:

  • Renda anual estimada de cem a bilhões de ienes.  [*Lembrei da Sr.ª Bennet de Orgulho & Preconceito, agora.*]
  • Foi da super exclusiva Dragon School para o Eton College, o mesmo frequentado pelo príncipe William.
  • Graduado pela Royal Academy of Dramatic Art, que é conhecida por selecionar muito bem os seus candidatos.
  • Graduou-se com um "double-first" da Universidade de Cambridge. [*"double-first" é o primeiro lugar em pelo menos duas disciplinas, ou componentes curriculares de seu curso, se entendi bem.*]
  • Nascido em linhagem nobre pelo lado materno.
  • Fala quatro idiomas (inglês, francês, grego e espanhol).
  • Seu apelido é "O Príncipe".
  • Ele é tão bom que seus colegas de elenco dizem que ele é "o melhor cara do mundo".
  • Ele pode tocar tudo desde o piano até as colheres. [*Pensei umas bobagens aqui...*]
Gosto bastante do Tom Hiddlestone.  Ainda torço para caso façam uma nova adaptação de Scarlet Pimpernel, ele seja escalado como Sir Percy.  ainda dá tempo.

quarta-feira, 27 de março de 2019

Josei mangá sobre sujeito com disfunção erétil que pede "ajuda" para uma amiga vira dorama

Acho que nunca tinha ouvido falar do mangá Kakafukaka  (カカフカカ), de Ishida Takumi, mas a série sai na revista Kiss e vai virar dorama.  O resumo do mangá no Bakaupdates é o seguinte: "Aki tem 24 anos e terminou um longo namoro depois de descobrir que estava sendo traída pelo namorado.   Ela decide, então, dividir um apartamento com um antigo colega e namorado de ginásio, Tomoya, mas o rapaz tem seus próprios problemas.  Faz dois anos que Tomoya está sofrendo de difunção erétil, mas ele descobre que seu corpo está reagindo à presença de Aki e ele pede que a moça o ajude a se curar.".  OK, para vocês?  


Não sei se quero assistir, ou ler isso, ou manter distância, não sei mesmo... De qualquer forma, tem scanlations de alguns capítulos.  A série tem oito volumes até o momento.  Aoi Morikawa e Masaki Nakao irão estrelar a série, segundo o Comic Natalie.  A estreia em vários canais japoneses será no dia 25 de abril, no dia seguinte, começa o streaming no Amazon Prime Video.

Takako Shimura lança série sobre duas mulheres apaixonadas na revista Kiss


Takako Shimura, que completou recentemente vinte anos de carreira, ficou conhecida internacionalmente por seu mangá Aoi Hana  (青い花) e tem prática em criar histórias sobre o amor, ou o romance, entre mulheres.  Pois bem, a mangá-ka estreou na última edição da revista Kiss com direito a capa e tudo mais.  Não achei a capa muito interessante, Takako Shimura tem um traço peculiar que me agrada, mas a capa ficou disforme, não sei.  Talvez, a ideia seja essa mesmo.


Enfim, segundo o Comic Natalie, o mangá Otona Ni Natte Mo (おとなになっても) gira em torno do romance entre uma professora primária e uma moça que trabalha em um bar.  Elas se conhecem por acaso, porém, a moça que trabalha no bar tem um segredo.... O CN também avisa que Akiko Higashimura estreia nova série na edição de 25 de junho.  Mais um mangá de Higashimura saindo do forno... 

Comentando Coisa Mais Linda - Primeira Temporada (Brasil/Netflix/2019)


Vi o trailer de Coisa Mais Linda e entre domingo e segunda, usei minhas horas vagas para assistir todos os sete episódios da série, por isso, praticamente não postei no blog anteontem.  Olha, o que vi não foi uma série espetacular, mas a partir do momento que comecei a assistir, queria seguir para o próximo episódio e o último capítulo terminou com uma cena de grande impacto simbólico e emocional.  Espero que tenhamos a próxima temporada.  E, algo muito importante, trata-se de uma série feminista e cheia de sororidade que não tem vergonha de dizer a que veio, nesse sentido, perdoo os deslizes, houve alguns gritantes, e a escolha de um sujeito tão inexpressivo quanto Leandro Lima para ser o par romântico da mocinha. 

O ano é 1959 Malu (Maria Casadevall), uma  socialite paulista, descobre que foi roubada e abandonada pelo marido que estava no rio de Janeiro preparando o restaurante que pretendia abrir. No Rio, Malu reencontra uma amiga de infância,  Lígia (Fernanda Vasconcellos) e conhece sua cunhada Thereza (Mel Lisboa).  Convidada para uma festa em um barco, ela conhece a bossa nova e se encanta com Chico (Leandro Lima), um cantor talentoso, que a inspira a querer abrir um clube de música no endereço que o marido alugara para ser o restaurante de ambos.  


O clube que dá nome para a série.
Seu pai lhe nega qualquer ajuda financeira, quer que ela retorne para São Paulo e sua vida "normal", que finja que seu marido morreu e tente arrumar um partido decente que a aceite mesmo manchada.  Ela recusa, mas tem os empréstimos negados pelo banco e por conhecidos por ser mulher, Maria Luiza termina tendo que recorrer a meios pouco ortodoxos para atingir seu sonho.  No processo, cria um laço de amizade com Adélia (Pathy Dejesus), mulher negra e moradora de uma favela, que luta para sustentar a irmã mais nova Ivone (Larissa Nunes) e a filha Conceição (Sarah Vitória).  Adélia guarda um segredo que pode prejudicar sua relação com o músico Capitão (Ícaro Silva) e envolve Thereza e seu marido.  Juntas, Malu e Adélia abrem um clube de música, enfrentando toda uma série de obstáculos que a sociedade da época impõe às mulheres. 

Coisa Mais Linda se propõe a falar da opressão às mulheres e como elas criaram estratégias para superar as limitações que lhes eram impostas.  O título é uma homenagem à canção gravada por João Gilberto e Tom Jobim de 1959 e à bossa nova, o estilo musical que despontava na época.  É a bossa nova que serve de pano de fundo para a história das quatro amigas.  Acredito que mesmo tendo falhas, comentarei algumas a seguir, Coisa Mais Linda tem muitos mais méritos, pois foca nas mulheres, na sua amizade e mesmo tendo três protagonistas brancas e ricas (*é o que elas são*) tem em Adélia um contraponto importante.  


Pathy Dejesus confere dignidade para Adélia.
A personagem de Pathy Dejesus não está ali para cumprir cotas, ela tem personalidade sendo, talvez, a mais complexa das amigas.  Pensei que iriam investir na linha de que ela foi estuprada pelo patrão, sim, estou dando um spoiler ao escrever que a filha de Adélia não é de Capitão, mas ela e Nelson (Nelson Soares) viveram uma história de amor.  Quando eu já estava pronta para colar a plaquinha de canalha na testa de Nelson, a série oferece a ele um papel digno a desempenhar.  Qual a possibilidade do romance da empregada com o jovem patrão dar certo nos altos círculos da boa sociedade brasileira da época no início dos anos 1950?  Mínimos.  

A série mostrou muito bem os mecanismos de obstrução e de como os envolvidos, Nelson, Adélia e Capitão carregam cada um deles a sua cota de sofrimento.  Adélia tem que enfrentar muito mais obstáculos que as demais personagens principais, mulheres brancas e bem nascidas.  Elas pensam em expandir os horizontes das mulheres na sociedade, para elas, o direito do trabalho remunerado fora de casa é uma conquista, Adélia tem que pensar em colocar comida na mesa e em não permitir que sua filha tenha uma vida miserável.  Adélia sempre trabalhou dentro e fora de casa, assim como gerações de mulheres pobres e/ou negras antes dela.  Ao embarcar na aventura com Malu, ela arrisca muito mais do que a amiga, porque ela não terá para quem correr caso o clube de música não dê certo.


Thereza e Nelson mantém um casamento aberto e feliz.
Mentir para Capitão foi errado, mas Adélia não é um monstro por causa disso, de novo, ela estava tentando sobreviver em um mundo racista e classista que nunca a acolheu.  Já Capitão é, até o momento, o melhor homem da trama, ele tem todos os motivos para odiar Adélia.  Tem, sim, não vamos colocar panos quentes, mas ele a ama e reconhece que pai é quem dá amor, quem se faz presente.  O problema é que Nelson não teve escolha nessa história.  Agora, resta saber se seu coração bate mais forte por Capitão, ou por Nelson, seu primeiro amor.

Nelson, no entanto, está casado com Thereza, a personagem de Mel Lisboa.  Eles são um casal moderno, que vive um casamento aberto.  É engraçada a cena em que Nelson é interpelado pelo irmão "Você está com alguma dificuldade financeira?", porque permite que sua esposa trabalhe.  Thereza é uma jornalista de sucesso, dentro das possibilidades da época, que gosta do que faz, mesmo enfrentando toda sorte de machismo na redação da revista feminina Ângela. A personagem, que morou na França por muito tempo, é a única conscientemente feminista e que se indigna, por exemplo, quando descobre que a cunhada apanha do marido.


Helô acredita que Thereza quer mais que um flerte.
Um traço importante de Thereza é que ela é bissexual.  Não, não acho que ela seja lésbica, ela ama o marido, ele sabe da orientação sexual da esposa, e Thereza gosta da vida que leva com ele.  Agora, apesar de feminista, ela não está imune à questão da maternidade compulsória.  Ela sofreu uma perda gestacional, ficou estéril e descobrir que o marido tem uma filha foi um duro golpe.  Mesmo muito bem resolvida, isso a magoa bastante.  Eu realmente não gosto desse tipo de trama, isto é, a mulher que acusa o homem de infidelidade por algo acontecido antes de se encontrarem e que ele mesmo desconhecia.  Mas, vá lá, a coisa se sustenta, porque há a fragilidade de Thereza em relação à maternidade e a interpretação de Mel Lisboa é convincente.

Thereza não é sincera com o marido em tudo, ou seja, ela não é perfeita, longe disso, apesar da cobrança no caso da filha de Adélia.  A personagem tem uma aventura com uma colega de redação (*na verdade, ela que conseguiu o emprego para a moça*), Helô (Thaila Ayala).  Diferente de Thereza, ela é lésbica e na relação das duas se monta uma discussão interessante.  Helô acredita piamente que Thereza está assujeitada aos pressupostos da sociedade patriarcal, ela precisa casar com um homem para ter um lugar no mundo.  A ideia da bissexualidade é muito difícil de digerir para muitas pessoas até hoje, sejam hetero, ou gays.  Fora, claro, que Helô lamenta não ter exclusividade, coisa que Thereza nunca ofereceu.  Como pontuei acima, Thereza ama o marido e ama esse casamento aberto que eles tem e, sim, gosta de meninos e meninas.


Seja bem-vindo 1960 e à segunda temporada.
A protagonista de fato da série é Maria Luiza, ou Malu, apelido que Chico lhe dá, uma mulher bem nascida que sofre um duro golpe, mas tenta aproveitar-se do acontecido para tomar as rédeas da sua vida.  Se Thereza é uma feminista que domina a teoria, Malu é uma feminista na prática, inclusive ao estabelecer suas prioridades e estratégias de vida.  Ela, por exemplo, deixa o filho em São Paulo enquanto tenta organizar sua vida.  Nos anos 1950, ou hoje, uma mãe que se comporta dessa maneira é vista por muitos como uma desnaturada.  Curiosamente, se uma mulher burguesa deixasse o filho para trás com babás, com os avós, para ajudar a carreira de um marido, isso seria visto como aceitável, seja no século XIX, no século XX, ou mesmo hoje.  Já pararam para refletir sobre isso?

Malu sabe que com a criança consigo ela teria menos chances de ser bem sucedida e está ciente, também, que seu pai não permitiria que o neto fosse jogado em uma situação de incerteza.  Aliás, um dos momento tensos da trama é quando Malu corre o risco de perder a guarda do filho para o avô, afinal, ela não é uma mulher direita.  Essa tensão rende boas cenas e um dos temas da série é a maternidade.  O trauma de Thereza em não poder gerar um filho, Adélia e a questão da paternidade de sua menina, Lígia e a maternidade indesejada.  O fato é que a sociedade alimenta expectativas em relação às mulheres e somos construídas para que vejamos duas questões como prioritárias, casamento e maternidade.  A recusa, o deslize, a culpa, são constantes nas vidas das mulheres.


Chico, o "galã" da série.
Malu mantém um relacionamento atribulado com o cantor Chico, cuja primeira coisa que faz é levá-la para conhecer a favela (*clichê*), como temos a praia, faltou só o futebol.  Como a bossa nova é um dos pilares da série, começando pelo título, querem vender Chico como um gênio incompreendido e alguém com um apelo irresistível.  Eu não sou fã de bossa nova, na cena da inauguração do clube, entendi bem a reclamação do sujeito de que Chico estava cantando muito baixo.  Lembrei do meu querido professor de literatura do 3º ano, Sérgio Fonseca, criticando o caráter elitista da bossa nova, ele comparava o estilo ao Parnasianismo, isto é, importa mais a forma do que o conteúdo que, normalmente, eram as amenidades da vida dos meninos e meninas bem nascidos da Zona Sul carioca, e ainda acrescentava que eles cantavam para dentro, "É masturbação musical", disse ele uma vez.  Meu professor era compositor e sambista, mas eu sou mais pronta a concordar com ele do que discordar, especialmente, com a interpretação oferecida por Leandro Lima.

Enfim, não sei o que viram nesse rapaz, devem achar que ele é cool, ou se parece com algum astro da bossa nova quando jovem.  Eu só vejo um sujeito desinteressante, limitado como ator e antipático.  Só que eu não gosto dessa construção estereotipada do cara que bebe, sofre e causa sofrimento, faz bobagem e todo mundo aceita, perdoa, porque, bem, ele é um gênio.  Eu acho muito mais interessante o Roberto (Gustavo Machado), dono da gravadora, que subestima a Malu e, depois, reconhece seu talento e inteligência, arrastando um bonde por ela.  O sujeito é inteligente, bem humorado e não é chato, vejo mais química entre ele e a Maria Casadevall do que com o Chico.


Casadevall está muito bem como a corajosa Malu.
Falando da Maria Casadevall, gosto muito dela, é uma excelente atriz e ela está linda nos figurinos de época.  Aliás, o figurino é um dos destaques da série, eu diria.  Thereza se veste de forma moderna, sempre, ou quase sempre, com cores fortes.  Malu é elegante e me lembra um pouco a Audrey Hepburn.  Adélia usa roupas simples, afinal, ela é a moça  pobre da história.  Lígia, e falo dela a seguir, parece presa entre o passado e o presente.  Seu cabelo curto é moderno, seu figurino parece conservador e romântico, mesmo que sua vida nada tenha de sentimentos ternos.  E temos a Thaila Ayala, a Helô, que se veste de forma moderna, talvez, e posso estar errada, um pouco adiante de seu tempo.  Eu olho para ela e algumas de suas roupas e penso na Trixie, a namoradinha do Speed Racer.  E algumas de suas roupas parecem muito pouco formais para o ambiente de trabalho.

E chegamos em Lígia, deixei para o final, porque ela é uma personagem importante, que concentra muitas das contradições da época em relação às mulheres, e, também, porque alguns dos problemas da série estão ligados a ela. Lígia é colega de infância de Malu, ela é paulista como a amiga.  Ambas eram ousadas e aventureiras na adolescência, tinham sonhos, Lígia queria ser cantora, Malu sonhava trabalhar com música, ser sua empresária, talvez.  Só que Lígia acabou casando com um bom partido, um político promissor, Augusto (Gustavo Vaz), e teve que esquecer de seus sonhos.


Esposa de político, apanha na véspera
 e posa para foto no dia seguinte.
A série mostra Lígia reatando sua amizade com Malu.  Motivo do rompimento?  Homem.  Lígia sabia que o marido de Malu, que só é falado e não aparece na primeira temporada, mas já deu sinal de vida ligando para a protagonista, não prestava.  Malu, como era esperado de uma boa mulher, confia no noivo e futuro marido, rompendo com a amiga de uma vida.  A ideia de que as mulheres são rivais, invejosas, faz com que acreditemos menos umas nas outras e muito mais nos homens.  Já eles, os homens, são estimulados a confiarem uns nos outros e firmarem sólidas amizades.  A classe dos homens prevalece, porque é unida e se fia na desunião e na rivalidade que as mulheres aprendem que é o normal entre elas.

Lígia sofre vários abusos do marido, mas tolera, porque é o que se espera dela, porque ela deve apoiá-lo em sua carreira, porque ela não tem coragem de tomar sua vida nas mãos.  Mas eis que as amigas possibilitam a ela essa força que lhe falta e ela é capaz de cantar no Coisa Mais Linda.  Muito bem, o marido pretendia ser candidato à prefeito do Rio de Janeiro.  Se eu não me distraí, está tudo errado aí.  Primeiro que até a transferência da capital para Brasília, em 1960, o prefeito era indicado.  Daí, suponho que ele estivesse se referindo ao cargo de governador do Estado da Guanabara, criado em substituição ao Distrito Federal.  Essas minúcias são importantes?  São.


Quando Lígia subiu no palco, já estava
acabando com a carreira do marido.
Coisa Mais Linda não fala em partidos políticos, cita por cima a construção de Brasília, o governo JK, D. Sara, sua esposa.  OK.  Mas qual era o partido de Augusto?  E Lacerda, a figura política carioca mais proeminente desse período?  Tudo é silenciado.  Quando o assunto é política, a ideia é dialogar com o presente e as representações de políticos corruptos que temos hoje.  Pois bem, digo o seguinte, a partir do momento que Lígia sai de casa e canta no clube, a carreira do marido acabou.  Não estamos nos dias de hoje, quando é normal um político ser divorciado.  Nos anos 1950, poderiam relevar-lhe as amantes, desde que fosse discreto, mas desquite (*separação*) e coisas do gênero, de forma alguma.  Querem falar de política, sem falar de verdade, eu diria.

Uma mulher de político sequer poderia ter profissão, mas, caso tivesse, seria professora, no máximo médica, algo que pudesse engrandecer o marido.  Daí, a série dá a entender que a família está falida, não Thereza e Nelson, que não sei o que faz na vida, mas Augusto e sua mãe, Eleonora (Esther Góes).  É a mãe, aliás, a voz patriarcal que justifica a violência contra Lígia, se ela apanhou, fez por merecer, os homens são assim.  Se o marido aceita que a esposa esteja na rua, na noite, ele é um bundão, precisa lavar sua honra com sangue.  Mas eis que nessa solidão de Augusto, que diz amar profundamente a esposa, o vemos passando sua própria roupa.  Nunca, nunca, nunca isso aconteceria.  Parece uma cena surreal, porque ele perdeu Lígia, mas continua morando em um apartamento luxuoso e tem empregadas.  Não é Estados Unidos, eles são classe média alta brasileira.


Essa foto ficou bem legal.
Voltando para Lígia, ela é usada para discutir a questão do aborto.  Ela está grávida.  Ela não quer o filho que espera, porque ele atrapalharia sua carreira, nada é falado, mas há um outro detalhe, aquele bebê pode ser fruto de um estupro que vimos acontecer.  Li críticas a Thereza, porque ela não ajuda Lígia, mas esquecem do contexto.  Thereza está chorando sua perda gestacional, chega a cunhada e lhe pede que ela lhe ajude a fazer um aborto.  Thereza está em luto e sofrendo, ela é humana e, não, uma militante estereotipada.  Ela não consegue ajudar.  "Que tipo de feminista é você?", grita Lígia.  Uma de carne e osso, com sentimentos, um ser humano, eu diria.  Malu e Adélia se encarregam de dar para Lígia o suporte que ela precisa e isso inflama mais ainda o marido, Augusto, e encaminha o final da série.

Concluindo, Coisa Mais Linda é uma boa iniciativa.  Dá protagonismo às mulheres, discute feminismo, permite que dialoguemos com o péssimo momento que vivemos hoje.  As atrizes estão muito bem.  Eu gosto muito de Maria Casadevall e Fernanda Vasconcellos desde muito antes, não sou fã de Mel Lisboa e Thaila Ayala, mas elas estão atuando muito bem.  Já Pathy Dejesus dá o tom certo para sua sofrida e corajosa Adélia.  Há o que melhorar?  Sim, acho que uma série de coisas foram capengas.  Eu veria uma segunda temporada?  Sim.  Agora, ninguém vai me convencer das qualidades de Leandro Lima como ator, espero que Chico vá fazer sua turnê nos EUA e não volte mais.